Tempo Comum - 26º Domingo
Serra do Pilar, 27 setembro 2015
Eu venho Senhor, à vossa presença,
ficarei saciado ao contemplar a vossa glória.
Ouvi, Senhor, uma causa justa, atendei a minha súplica.
Escutai a minha oração, feita com sinceridade.
Irmãos:
A nossa geração precisa de ser capaz de afirmar a sua esperança
numa sociedade de homens cujas relações não sejam exclusivamente de
produção, de força, de prestígio, mas relações de fraternidade ou de
solidariedade, se quiserem, de justiça, de respeito e de tolerância.
E nós, os cristãos, precisamos de ser capazes de afirmar que a Palavra
de Deus nos aponta caminhos bem diferentes dos duma sociedade que
tudo avassala e espezinha, a todos prometendo uma riqueza impossível.
«Vós, os ricos, prestai-me atenção. [...] Levastes na terra uma vida
regalada e libertina, enchestes a barriga para o dia da matança!
Condenastes e assassinastes o justo, que não pôde resistir!», são
palavras muito duras!
Kyrie eleison!
Christe, eleison!
Kyrie eleison!
Deus misericordioso tenha compaixão de nós,
perdoe os nossos pecados e nos conduza à vida eterna!
Amen!
Oremos (…)
Dá-nos, ó Pai,
a consciência de quanto nos liga a todos os Outros,
para além das portas da nossa Casa,
dos muros do nosso quintal,
e para além de todas as fronteiras;
que os membros do teu Povo, ó Senhor,
presentes e dispersos por toda a parte,
sejam os primeiros a remover montanhas
para ir em socorro dos que desfalecem sem Vida,
de modo que a Fraternidade se manifeste,
tanto nos bens como nos males.
Por Jesus Cristo, teu Filho e nosso irmão,
na Unidade do Espírito Santo.
Ámen!
Leitura do Livro dos Números (11,25/29)
No deserto, o Senhor desceu numa nuvem, falou com Moisés e
derramou sobre os Setenta Anciãos o Espírito que estava nele. Logo que o
receberam, os Anciãos começaram a profetizar, facto que não se repetiu
depois. No acampamento, tinham ficado dois homens do grupo dos
Setenta, Eldad e Medad. Embora não estivessem com os outros na Tenda
da Reunião, também sobre eles pousou o Espírito do Senhor; começaram,
portanto, a profetizar no acampamento. Quando isso sucedeu, um jovem
correu a contar a Moisés o que acontecera: Eldad e Medad estão a
profetizar no acampamento! Então, Josué, que acompanhava Moisés
desde a juventude, tomou a palavra e disse: Moisés, meu senhor, impedeos de profetizar! No entanto, Moisés respondeu-lhe: Estás com ciúmes por
causa de mim? Oxalá fossem profetas todos os membros do povo do
Senhor e sobre eles IAVÉ fizesse pousar o seu Espírito!
Canto responsorial (do Salmo 18)
Os preceitos do Senhor alegram o coração
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A lei do Senhor é perfeita
e reconforta a alma;
as ordens do Senhor são seguras,
sabedoria dos simples!
O louvor do Senhor é puro,
permanece para sempre;
as sentenças do Senhor são verdadeiras,
todas elas são justas.
Leitura da Carta do Apóstolo Tiago (5,1/6)
Vós, os ricos, prestai-me atenção. Chorai copiosamente por todas as
desgraças que sobre vós vão cair. As vossas riquezas estão podres e
todas as vossas vestes roídas pela traça. O vosso ouro e a vossa prata
encheram-se de ferrugem; esta mesma ferrugem testemunhará contra vós
e, como o fogo, devorará a vossa carne. Acumulastes tesouros nestes dias
que são os últimos. Privastes de salário os trabalhadores que ceifaram nas
vossas propriedades. Mas o seu salário clama e os brados dos ceifeiros
chegaram aos ouvidos do Senhor do Universo. Levastes na terra uma vida
regalada e libertina, enchestes a barriga para o dia da matança!
Condenastes e assassinastes o justo, que não pôde resistir!
Aleluia!
Se nos amarmos uns aos outros,
Deus permanece em nós
e o seu amor em nós é perfeito!
Aleluia!
Leitura do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos (9,37/42 e 44/47)
João, um dos Doze, disse a Jesus: Mestre, vimos um homem que não é
teu discípulo a expulsar demónios em teu nome! Como ele não é dos
nossos, tentámos impedi-lo de o fazer! Mas Jesus respondeu: Não o
impeçais, pois ninguém pode fazer um milagre em meu nome e, logo a
seguir, dizer mal de mim: quem não é contra nós está a nosso favor. Se
alguém vos der a beber um copo de água por serdes de Cristo - em
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verdade vo-lo digo, - não ficará sem recompensa. Mas se alguém for
ocasião de pecado para um destes pequeninos que têm fé, melhor seria
para esse homem que lhe atassem ao pescoço uma dessas mós que só
um jumento pode mover e o lançassem ao mar. Se a tua mão for para ti
ocasião de pecado, corta-a. É melhor entrares mutilado na vida eterna do
que ires com ambas para o Abismo, para a corrupção que não acaba. Se o
teu pé for para ti ocasião de pecado, corta-o. É melhor entrares coxo na
vida eterna do que seres lançado no Abismo com ambos os pés. E se um
dos teus olhos for para ti ocasião de pecado, deita-o fora. É melhor
entrares no Reino de Deus só com um dos olhos do que, com ambos,
seres lançado no Abismo, pois lá o verme que os corrói não morre, nem
tão pouco o fogo se apaga!
Aleluia!
Homilia
«Vós, os ricos, prestai-me atenção. [...] Levastes na terra uma vida
regalada e libertina, enchestes a barriga para o dia da matança!
Condenastes e assassinastes o justo, que não pôde resistir!».
Antes do Fórum de Davos que todos os anos se celebra em janeiro, na
Suíça, a Organização Humanitária Oxfam publicou um relatório segundo o
qual o fosso entre pobres e ricos está a aumentar. Em 2016, 49,27% da
riqueza mundial estará nas mãos de apenas 1% da população mundial.
Mas o referido 1% mais rico tem visto a sua riqueza aumentar: era de 44%
em 2009 mas subiu em 2014 para 48%. E as projeções da Oxfam preveem
que, em 2016, repito, aumente para cerca de 50%; no ano 2020, andará já
à volta de 54,50%.
O diretor executivo da Oxfam, Winnie Byanyima, presente na
conferência de Davos, disse ali que “a explosão da desigualdade está a
atrasar a luta contra a pobreza no mundo, numa altura em que uma em
cada nove pessoas não tem o suficiente para comer e mais de mil milhões
de pessoas ainda vivem com menos de 1,25 dólares (pouco mais de um
euro) por dia”. E perguntava: “Queremos mesmo viver num mundo onde
1% da população tem mais do que todo o resto? A escala da desigualdade
mundial é assombrosa”, comentou (Público, 2015.01.20).
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A esta realidade contraponhamos o papa Francisco na Evangelii
gaudium (191 e 192): «Os cristãos são chamados, em todo o lugar e
circunstância, a ouvir o clamor dos pobres, como bem se expressaram os
Bispos do Brasil: “Desejamos assumir, a cada dia, as alegrias e
esperanças, as angústias e tristezas do povo brasileiro, especialmente das
populações das periferias urbanas e das zonas rurais – sem terra, sem
teto, sem pão, sem saúde – lesadas em seus direitos. Vendo a sua
miséria, ouvindo os seus clamores e conhecendo o seu sofrimento,
escandaliza-nos o fato de saber que existe alimento suficiente para todos e
que a fome se deve à má repartição dos bens e da renda. O problema se
agrava com a prática generalizada do desperdício".
Mas queremos ainda mais, o nosso sonho voa mais alto. Não se fala
apenas de garantir a comida ou um decoroso «sustento» para todos, mas
‘prosperidade e civilização em seus múltiplos aspetos’. Isto engloba
educação, acesso aos cuidados de saúde e especialmente trabalho,
porque, no trabalho livre, criativo, participativo e solidário, o ser humano
exprime e engrandece a dignidade da sua vida. O salário justo permite o
acesso adequado aos outros bens que estão destinados ao uso comum.»
São enormes os problemas que se deparam em todo o mundo, a nível
da consciência individual e das políticas nacionais e globais. De um lado,
as questões do desenvolvimento, da pobreza e da exclusão social, da
educação, do aumento da criminalidade, da rutura dos laços familiares, da
transformação do papel da mulher, da revolução levada a cabo pela
tecnologia ao mundo do trabalho, da desafeição popular pela política a que
se juntam os apelos por uma profunda reforma democrática, e ainda as
múltiplas questões sobre o ambiente e a segurança que requerem ações
concertadas a nível mundial.
Do outro, a necessidade de apoiar valores como a fraternidade (a que
hoje se chama solidariedade) e a justiça social, e a urgência de abandonar
quer a velha ideia de um Estado controlador, coletor de impostos pesados
mas que defende os interesses ora dos cidadãos ora dos produtores, quer
a de um Estado defensor de um individualismo egoísta na convicção de
que os mercados livres são a solução para todos os problemas.
Nós, os cristãos, temos algumas coisas a ver com isto, ou isto é só com
os profissionais da política e os técnicos da economia? A fé é só a
aceitação de umas determinadas verdades (Creio em Deus, Pai todo
poderoso…), dogmas e doutrinas, ou também uma forma de viver, a que
nos ensinou Jesus de Nazaré na trajetória de toda a sua vida? A fé não
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está nos livros, nos papéis, nos documentos, nas doutrinas, mas nas
pessoas, isto é, na vida. Somos seguidores de Jesus ou seguimos
acriticamente a mentalidade única do sistema de pensamento único?
Hoje fala-se das "estruturas de pecado" de que nenhum indivíduo é
responsável, embora com elas todos tenhamos a ver. Eu dou um exemplo:
em Portugal, conduz-se pessimamente. Toda a gente que algum dia fez
meia dúzia de quilómetros em Espanha ou em França sabe. De quem é a
culpa? De tudo e sobretudo de todos, até de mim, que por vezes tenho de
fazer coisas que não faço lá fora, senão não saio do sítio.
É por isso que há uma grande relação entre conversão individual e
mudança de estruturas: "A originalidade da mensagem cristã não consiste
diretamente em afirmar a necessidade da mudança de estruturas mas na
insistência na conversão do homem que exige essa mudança. Não
teremos um continente novo sem novas e renovadas estruturas; mas,
sobretudo, não haverá um continente novo sem homens novos que à luz
do Evangelho saibam ser livres e responsáveis" (Medellín, 1969; Justiça,
3).
Um dia, no já longínquo ano de 1654, num célebre Sermão de Santo
António aos peixes, pregado na cidade de São Luís do Maranhão, o Padre
António Vieira dizia assim:
«A primeira coisa que me desedifica, peixes, de vós, é que vos comeis
uns aos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o faz ainda
maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem
os pequenos. Se fora pelo contrário era menos mal. Se os pequenos
comessem os grandes, bastava um grande para muitos pequenos; mas
como são os grandes que comem os pequenos, não bastam cem
pequenos, nem mil, para um só grande. Olhai como estranha isto Santo
Agostinho: “Os homens, com suas más e perversas cobiças, vêm a ser
como peixes que se comem uns aos outros”. Tão alheia cousa é não só da
razão, mas da mesma natureza, que sendo todos criados no mesmo
elemento, todos cidadãos da mesma pátria, e todos finalmente irmãos,
vivais de vos comer. Santo Agostinho, que pregava aos homens, para
encarecer e fealdade deste escândalo, mostrou-lho nos peixes; e eu, que
prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável é, quero que o
vejais nos homens. Olhai, peixes, lá do mar para a terra. Não, não; não é
isso que vos digo. Vós virais os olhos para o mato e para o sertão? Para
cá, para cá; para a cidade é que haveis de olhar. Cuidais que só os
Tapuias se comem uns aos outros, (mas) muito maior açougue é o de cá,
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muito mais se comem os brancos. Vedes vós todo aquele bulir, vedes todo
aquele andar, vedes aquele concorrer às praças e cruzar as ruas: vedes
aquele subir e descer as calçadas, vedes aquele entrar e sair sem
quietação nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os homens
como hão de comer, como se hão de comer.»
Mas a verdade é que cada um de nós tem de se perguntar em que
medida é que, com ações ou omissões, contribui para estabelecer, manter
ou acrescentar estas estruturas de pecado.
Preces
Senhor atende a nossa voz.
Senhor, escuta o nosso grito de esperança!
Foi o escândalo mais sentido pela Igreja:
nos dias do Proletariado, os pobres deixaram a Igreja,
enquanto os Ricos se tornaram seus donos e senhores!
Sinais dos tempos entre os Católicos:
os Ricos do tempo viram as costas à Igreja
e os Pobres de todo o lado estão a voltar!
Diante dos persistentes sinais exteriores de riqueza,
no mundo e mesmo na Igreja em que vivemos,
dá-nos, ó Pai, a coragem e o desassombro do despojamento
para que a Luz do Mundo brilhe sem quebra-luzes!
Sem os Ricos, podemos progredir, mas não sem os Pobres,
pois que o Reino de Deus é de quem tem coração de pobre:
dá-nos, ó Pai, a coragem de acolhermos os pobres!
Ensina, ó Pai, aos discípulos desta hora
que não basta socorrer e amar os pobres:
que é preciso ser pobre entre os pobres!
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à comunhão
Como é admirável Senhor a vossa bondade!
À sombra das vossas asas se refugiam os homens!
Senhor, até aos céus se eleva a vossa bondade
e até às nuvens a vossa fidelidade.
A vossa justiça é como os montes altíssimos,
os vossos juízos são como o abismo profundo.
Oração final
Oremos (…)
Concede-nos, Senhor,
que estes sacramentos que nos reúnem com fé
cada primeiro dia da semana
nos alimentem a verdadeira vida,
de modo que, dia a dia, demos frutos que permaneçam.
Por Jesus Cristo, teu Filho e nosso Irmão,
na Unidade do Espírito Santo que nos habita!
Ámen!
Final
Benedic anima mea Domino,
(Bendiz a minha alma o Senhor,)
todo o meu ser bendiga o seu nome santo!
LEITURAS DIÁRIAS
2.ª-feira:
3.ª-feira:
4.ª-feira:
5.ª-feira:
6.ª-feira:
Sábado:
Zc 8,1-8; Sl 101; Lc 9,46-50
Zc 8,20-23; Sl 86; Lc 9,51-56
Ne 2,1-8; Sl 136; Lc 9,57-62
Ne 8,1-4a, 5-6,7b-12; Sl 18; Lc 10,1-12
Br 1,15-22; Sl 78; Lc 10,13-16
Br 4,5-12,27-29; Sl 68; Lc 10,17-24
Zc = Livro de Zacarias; Sl = Salmo; Lc = Evangelho de Lucas;
Ne = Livro de Neemias; Br = Livro de Baruc
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