SORÇÃO DOS PESTICIDAS CARBENDAZIM E THIAMETOXAN EM SOLOS DE LAVOURAS DE
ALGODÃO NA REGIÃO DE PRIMAVERA DO LESTE, MATO GROSSO*
Leandro Carbo1, Ermelinda M. De-Lamônica-Freire2, Eliana F. G. C. Dores3, Cláudia J. Nehme4,
Marcelo L. F. Cunha5, Oscarlina L. S. Weber6. (1) Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal de
Mato Grosso (UFMT), e-mail: [email protected]; (2) Programa de Pós-Graduação, Universidade de
Cuiabá (UNIC), (3) Departamento de Química, Universidade Federal de Mato Grosso, (4) UNIVAG,
Centro Universitário, GPA, Biologia/Agronomia, (5) Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal
de Mato Grosso (UFMT), (6) DSER, Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária (FAMEV).
RESUMO
Realizou-se estudo de sorção do carbendazim e thiametoxan em dois solos numa fazenda da
região de Primavera do Leste, Mato Grosso. Foram coletadas amostras de solos em duas trincheiras,
sendo 4 horizontes no Latossolo e 3 no Gleissolo e realizado ensaios de sorção com os pesticidas
acima mencionados com todos os horizontes. Os coeficientes de sorção (Kd e Kf) do carbendazim nos
horizontes do Latossolo e Gleissolo, apresentaram correlação significativa somente com o teor de
carbono orgânico e para o thiametoxan não foi verificado correlação com nenhuma propriedade dos
dois tipos de solos. No entanto, verificou-se que o thiametoxan foi mais sorvido nos últimos horizontes
dos solos, principalmente no Gleissolo, pois à medida que o teor de carbono orgânico do solo diminui, a
argila tornou-se o fator mais importante na sorção de compostos orgânicos. Entretanto, como os teores
de argila apresentaram-se praticamente constantes nos horizontes dos dois solos, não foi verificada
correlação significativa com os coeficientes de sorção. Foram coletadas amostras de água do lençol
freático e água de escoamento superficial na área de estudo, no período de novembro de 2002 a
março de 2003. Nenhum dos dois pesticidas foi detectado.
INTRODUÇÃO
Desde a Segunda Guerra Mundial, a agricultura vem passando por grandes mudanças que
incluem principalmente a utilização de pesticidas sintéticos, usados em ambientes domésticos,
industriais e urbanos, mas o uso destes é principalmente agrícola, objetivando aumentar a produção e
reduzir as populações de pragas e doenças. No entanto, com o uso destes produtos, aumentaram
também as preocupações com problemas de contaminação ambiental, bem como com seus efeitos
sobre os seres vivos.
De maneira geral, o solo acaba sendo o destino final dos pesticidas utilizados na agricultura, nele
o pesticida poderá seguir diferentes rotas, como, por exemplo, ficar retido na fração orgânica e ou
mineral, mas se disponível na solução do solo, dentre outros processos, pode ser lixiviado pelos seus
horizontes chegar às águas subterrâneas. Os processos de sorção que ocorrem no solo constituem-se
em importante fator de regulação da lixiviação de pesticidas utilizados na agricultura e da contaminação
de águas sub-superficiais, variando muito em função das características físicas e químicas deste e das
propriedades do produto aplicado.
O cultivo do algodão data de milhares de anos atrás em muitas partes do mundo. É uma planta
de grande importância econômica, cultivada, basicamente pelas fibras que envolvem suas sementes e
as propriedades especiais dessas fibras e sua fiação em filamento resistente, amplamente usado como
fibra têxtil. O estado de Mato Grosso destaca-se nesse tipo de cultura, pois é o maior produtor
*
Financiadora: Fundo de Apoio a Cultura do Algodão (FACUAL).
Parceria: Associação Mato-grossense de Produtores de Algodão (AMPA).
brasileiro. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), o Estado deverá colher uma
safra de algodão em pluma de 395,6 mil toneladas em 2002/03, número que poderá representar alta de
1,1% em comparação com as 391,4 mil toneladas da safra 2001/02 (FAMATO, 2002). No cenário matogrossense, em relação à cultura do algodão, a região de Primavera do Leste destaca-se por ser
considerada uma das maiores produtoras.
O presente trabalho teve por objetivo estudar a sorção dos pesticidas carbendazim e
thiametoxan utilizados nas lavouras de algodão em dois solos e discutir o potencial de contaminação
de águas superficiais e subterrâneas na região de Primavera do Leste, Mato Grosso.
MATERIAL E MÉTODOS
Este estudo foi realizado em uma fazenda na micro-bacia do córrego Chico Nunes, pertencente
ao município de Dom Aquino, micro-região de Primavera do Leste, Mato Grosso. Foram coletadas,
através de duas trincheiras feitas numa vertente de aproximadamente 2 m de comprimento, amostras
de 4 horizontes de um Latossolo Vermelho Amarelo e 3 de um Gleissolo, sendo os resultados das
análises físicas e químicas encontrados na Tabela 1.
As amostras de solo foram transferidas para bandejas de alumínio, secas a temperatura
ambiente, peneiradas em malha de 2 mm e submetidas aos ensaios de sorção de acordo com o
método utilizado por Souza et al. (2000), com algumas modificações. A sorção dos dois pesticidas foi
determinada pesando-se 5 g de solo em erlemeyer, adicionando-se 25 mL de CaCl2 0,01 mol/L com as
seguintes concentrações dos pesticidas em estudo: 0 (branco); 1; 2; 4; 8 e 16 µg/mL, em duplicata,
deixando-se agitar horizontalmente por um período de 24 horas. Em seguida procedeu-se à filtração
em papel quantitativo e em membrana filtrante Millipore de 47 mm de diâmetro e porosidade de 0,45
µm e analisou-se 1 mL do sobrenadante em cromatógrafo líquido de alta eficiência com detector de
ultravioleta com arranjos de diodos (HPLC-DAD).
Foram coletadas também, entre os meses de novembro de 2002 a março de 2003, período que
corresponde ao início das chuvas, do preparo do solo e do plantio do algodão, amostras de água do
lençol freático por meio de 3 piezômetros e 2 amostras de água de escoamento superficial coletadas
por meio de calhas confeccionadas com placa de zinco e uma torneira de teflon, instaladas na parte
final da vertente acompanhando a direção dos piezômetros. A extração procedeu-se com 500 mL de
água em fase sólida (estirenodivinilbenzeno), eluição com 2 x 5 mL da mistura metanol/acetonitrila
(1:1), concentrado em evaporador rotatório até a secura, retomado com acetonitrila, adicionado padrão
interno (terbutilazina) e analisado em HPLC-DAD.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O teor de carbono orgânico (CO) no Latossolo variou de 0,32 – 1,56 e no Gleissolo de 0,48 –
1,40, tendo diminuído ao longo dos horizontes, devido a uma maior quantidade de materiais em
decomposição nas camadas superficiais dos solos. Os teores de argila apresentaram-se bem maiores
que os de areia, na maioria dos horizontes (Tabela 1).
De acordo com a Tabela 2, quanto ao poder de lixiviação, verifica-se que de uma forma geral, a
sorção do carbendazim, ambos Kd e Kf foi diminuindo ao longo dos horizontes dos dois solos, variando
de 3,66 – 31,09 e de 1,89 – 34,51, respectivamente, aumentando a possibilidade de contaminação do
lençol freático, se este passar pelo primeiro horizonte. A sorção do thiametoxan no Latossolo
apresentou-se muito variável nos horizontes, com valores de Kd, apresentando-se semelhantes nos
horizontes L2 e L4. Porém no Gleissolo, a sorção deste pesticida foi significativamente diferente entre
os três horizontes, aumentando ao longo do perfil. Esse comportamento do thiametoxan no Gleissolo
indica que se este sofrer lixiviação ao longo do perfil, há uma grande possibilidade de ficar retido ao
longo dos horizontes deste tipo de solo. Entre os dois modelos de isotermas utilizados, o que de uma
maneira geral melhor descreveu os ensaios de sorção dos pesticidas, foi a equação Linear de acordo
com os coeficientes de regressão (r2).
Como pode ser verificado na Tabela 3, os coeficientes de sorção Kf para o carbendazim
apresentaram correlação altamente significativa (p < 0,01) com os teores de carbono orgânico do
Latossolo e do Gleissolo. Para o coeficiente de sorção Kd foi observado a mesma situação, mas com
uma significância menor (p < 0,05). Os valores de Kd e Kf do thiametoxan não apresentaram
correlação com nenhuma propriedade dos solos, no entanto, nota-se que a sorção torna-se maior nos
últimos horizontes, este fato pode ser devido ao conteúdo de argila, pois, por mais que o carbono
orgânico exerça uma grande influência na sorção de compostos orgânicos, à medida que o teor desse
constituinte vai diminuindo, a sorção vai se tornando dependente da argila. Como os teores de argila
nestes solos variaram pouco entre os horizontes, não foi possível observar a influência destes teores
sobre o valor das constantes.
Nas águas de piezômetros e de escoamento superficial não foi detectado nenhum dos dois
pesticidas analisados (limite de detecção 1 µg/L), fato que pode ser devido aos coeficientes de sorção
bastante altos do carbendazim em todos os horizontes (de 1024 a 2644) e aos coeficientes
relativamente elevados do thiametoxan (944 no Latossolo e 2877 no Gleissolo) nos horizontes mais
profundos nos dois tipos de solos.
CONCLUSÕES
¾ Os coeficientes de sorção do carbendazim (Kd e Kf) apresentaram correlação significativa
com o teor de carbono orgânico dos dois tipos de solos. Os coeficientes de sorção ao carbono orgânico
(Koc) não variaram muito de um horizonte para outro, variando de 1024 – 2644 como os valores de Kd
e Kf que variaram de 3,66 – 31,09 e de 1,89 – 34,51, respectivamente.
¾ Mesmo não tendo apresentado correlação significativa com nenhuma das propriedades dos
dois tipos de solos, observou-se que os valores de Kd e Kf do thiametoxan foram maiores nos últimos
horizontes, mostrando que as argilas podem ter sido responsáveis pela sorção dessas substâncias.
Este fato pode ser observado quando o teor de carbono orgânico do solo diminui ao longo dos
horizontes.
Tabela 1. Propriedades físico-químicas dos horizontes os dois tipos de solos.
Hor.2
L1
L2
L3
L4
G2
G4
G5
1trincheiras; 2horizontes
pH
H2O
5,92
5,30
5,09
5,77
5,00
4,98
5,05
CO3
CaCl2
4,70
4,60
4,90
5,10
4,30
4,50
4,20
do solo; 3carbono orgânico.
Areia
Silte
Argila
3,80
3,04
2,36
1,64
1,36
0,64
3,24
63,08
69,76
63,08
63,08
66,40
59,76
59,76
(%)
1,56
1,47
0,99
0,32
1.40
0.73
0.48
33,12
27,20
34,56
35,28
32,24
39,60
37,00
Tabela 2. Parâmetros de sorção do carbendazim e thiametoxan através dos modelos Linear e
Freundlich.
Pesticidas
Solo
LVA6
carbendazim
GL7
LVA
thiametoxan
GL
H.1
L1
L2
L3
L4
G2
G4
G5
Kd2
26,77 A
15,05 BC
15,51 BD
3,66 F
31,09 A
13,00 CE
12,69 DE
r2
0,974
0,962
0,978
0,991
0,993
0,979
0,990
Koc3
1716
1024
1567
1144
2221
1781
2644
Kf4
34,51 A
25,88 B
19,82 D
1,89 E
29,11 AB
8,07 C
8,91 C
r2
0,977
0,954
0,976
0,934
0,952
0,981
0,975
1/n5
0,602
0,453
0,776
1,395
1,165
1,405
1,317
L1
L2
L3
L4
G2
G4
G5
1,63 B
3,41 A
1,27 C
3,02 A
1,92 D
3,61 E
13,81 F
0,992
0,993
0,958
0,972
0,940
0,980
0,992
104
232
128
944
137
495
2877
2,02 A
3,16 C
0,86 B
2,07 A
0,7 B
1,37 D
11,14 E
0,984
0,971
0,977
0,971
0,956
0,968
0,976
0,924
1,052
1,131
1,170
1,419
1,554
1,195
1
Horizonte; 2coeficente de sorção linear; 3calculado pelo Kd; 4coeficiente de sorção de Freundlich; 5grau de
linearidade; 6Latossolo Vermelho Amarelo; 7Gleissolo.
Letras diferentes mostram que há diferença significativa de Kd e Kf entre os horizontes dos solos (p < 0,05).
Tabela 3. Correlação de Pearson entre os coeficientes de sorção (Kd e Kf) e as propriedades de todos
os horizontes dos solos para o carbendazim e o thiametoxan. Os valores de P estão entre parênteses.
Pesticidas
carbendazim
Kd
Kf
thiametoxan
Kd
Kf
Argila
Silte
Areia
CO
%
- 0,34 (0,460)
- 0,66 (0,107)
0,18 (0,669)
0,46 (0,294)
0,31 (0,493)
0,58 (0,174)
0,82* (0,025)
0,97** (0,000)
0,33 (0,468)
0,19 (0,678)
0,28 (0,545)
0,48 (0,273)
- 0,45 (0,307)
- 0,37 (0,419)
- 0,51 (0,239)
- 0,40 (0,376)
**Correlação significativa com nível de p < 0,01; *Correlação significativa com nível de p < 0.05.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FAMATO - Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso Algodão: CONAB estima
crescimento
de
3,3
%
na
safra
2002/03
do
pluma.
Disponível
em:
http://www.famato.org.br/artigo.php?sid=1666. Acesso em: 19 dezembro 2002.
SOUZA, M. D.; BOEIRA, R. C.; GOMES, M. A. F. Adsorção e dessorção de diuron em solos tropicais.
Revista de Ecotoxicologia e Meio Ambiente, Curitiba, v. 10, p. 113-124, 2000.
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