Comemoração dos 500 anos da Freguesia de
Reguengo do Fetal
Este ano comemoram-se os 500 anos da criação da Freguesia de
Reguengo do Fetal, precisamente a 24 de junho de 1512, pelo PriorMor de Santa Cruz de Coimbra, com jurisdição sobre Leiria, na época
Bispo da Guarda, D. Pedro Vaz Gavião. A sua criação teve origem no
desmembramento da freguesia da Igreja de S. Martinho, da então Vila
de Leiria, e foi dedicada à Santíssima Trindade. Só mais tarde, julga-se
que aquando da construção da atual Igreja Matriz em 1585, foi este
orago mudado para Nossa Senhora dos Remédios, que ainda hoje se
mantém. No início do século XVII foi-lhe desanexada a freguesia do
Alqueidão
da
Serra.
E
no
ano
de
1916
verificou-se
um
novo
desanexamento populacional, com a criação da freguesia civil de São
Mamede, constituída em Paróquia em 1920.
O nome desta terra tem variado ao longo dos tempos, tendo sido antes
chamada de Reguengo da Magueixa ou apenas de Reguengo para se
fixar no nome que tem hoje. Reguengo significa “Terra do Rei”. Fetal,
nome certamente adotado em homenagem a Nossa Senhora do Fetal,
onde existe uma ermida em sua invocação. O brasão de armas da
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freguesia representa de modo expressivo os seus símbolos essenciais,
ou seja, as coroas, os ramos de fetos e o arado.
Os vários achados arqueológicos da época romana encontrados na
região, tais como, lápides, fragmentos de cerâmica e moedas,
testemunham que o seu povoamento é muito antigo, uma vez que esta
região foi das que nos arredores de Leiria tiveram uma mais intensa
romanização, devido naturalmente à proximidade da antiga cidade
romana de Colipo, que tem sido considerada como situada na atual
quinta de São Sebastião. No entanto, em 1527, Reguengo do Fetal
tinha apenas 80 habitantes e aquando das Memórias Paroquianas de
meados do século XVIII contava cerca de 480 habitantes. Daí em
diante o seu povoamento continuou naturalmente a fazer-se, sendo
que hoje a população residente na freguesia, de acordo com o último
censo, anda à volta dos 2100 habitantes, praticamente a mesma que
existia há três décadas atrás. Note-se, em todo o caso, que se
verificou um ligeiro aumento da população residente nas décadas
anterior e posterior ao virar do século passado, o qual foi no entanto
absorvido por uma idêntica diminuição na última década. Torna-se
necessário, portanto, inverter esta tendência, tendo em vista o
desenvolvimento sustentado da freguesia.
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Deixemos, porém, a história desta freguesia e o seu percurso para os
historiadores ou outros interessados, para recordarmos aqui e agora
tão somente algumas memórias, alguns retratos, da terra e da gente
que nos viu nascer.
Recuemos então não mais do que uma meia dúzia de décadas para
recordar coisas muito simples, mas que faziam e fazem toda a
diferença para os dias de hoje. Basta lembrar que as pessoas da
minha idade nasceram numa terra em que não havia eletricidade na
maioria dos lugares e das casas da freguesia, não havia água
canalizada, não havia saneamento básico e não havia as estradas, os
caminhos e os meios de transporte que hoje nos servem. Não havia
telefone, nem televisão, muito menos telemóvel, computador ou
internet, nem todo um conjunto de outros meios e equipamentos agora
ao dispor das populações. Sendo que, a par disso, havia naturalmente
manifestações
etnográficas,
musicais,
desportivas,
culturais
e
religiosas, entre outras, o que felizmente, em boa medida, continua a
acontecer, em homenagem aos costumes e tradições da nossa terra.
Mas é inquestionável que havia e há uma terra, uma gente e uma
vontade. Havia e há uma terra, que tem constituído e constitui a razão
de ser e de vida de muita da sua gente. Havia e há uma gente
laboriosa, honrada, inteligente e de carácter. Havia e há uma vontade
enorme de quem queria e quer ir mais além e de quem queria e quer
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participar
e
usufruir
do
movimento
civilizacional
que
nos
tem
acompanhado. E foi com esta terra, com esta gente e com esta
vontade que fomos crescendo e vivendo, forjando assim o molde das
nossas vidas e dando ao mesmo tempo o nosso contributo para o seu
desenvolvimento.
Terminada a instrução primária, a grande maioria de nós não pode
prosseguir os estudos. Só uma pequena minoria o pode fazer. As
dificuldades
eram
imensas,
não
só
ligadas
à
alteração
de
mentalidades e às perspetivas de vida futura, como também de ordem
económica, financeira e social. Por isso, ao deixarem a escola
primária,
uns
passavam
a
ocupar-se
do
amanho
das
terras
essencialmente agrícolas e florestais ou da lida da casa e outros iam
trabalhar na construção civil, na indústria, no comércio ou nos
serviços, contribuindo desde cedo para ajudar a família na sua
vivência do dia-a-dia. Infelizmente, muitos sonhos não puderam ser
concretizados e muitos talentos, muita inteligência e muita vontade
não puderam ser aproveitados.
Entretanto o mundo e a sua circunstância foram mudando. Fruto não
só das diversas linhas de orientação e ação política que ocorreram por
esse mundo fora e nas suas instituições e organizações nacionais e
supranacionais, como também em resultado do progresso tecnológico,
económico e social entretanto verificado. O que proporcionou, por sua
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vez, uma evolução e uma melhoria das condições de vida das
populações em geral, abrindo novos horizontes e perspetivando novos
desafios e oportunidades.
E como é natural, a nossa terra e a nossa gente não ficaram imunes a
essa mudança, nem a esses novos desafios e oportunidades. A nossa
gente tem labutado, tem continuado a subir e a descer as serras, os
montes e os vales desta sua terra e tem despendido o seu saber, o seu
engenho e o seu suor a desbravar, a amanhar, a cuidar e a
desenvolver a terra que a viu nascer, faça chuva ou faça sol, faça frio
ou faça calor, por regra, desde o nascer ao pôr-do-sol e sem lugar, a
maioria das vezes, a umas merecidas férias. A nossa gente tem
colaborado e participado no desenvolvimento económico, social e
cultural da sua terra, da sua região e do seu país. Mas tem tido
também sonhos e horizontes mais largos e uma vontade indómita de
participar e de usufruir do progresso civilizacional que tem ocorrido no
mundo. E é assim que tem prosseguido a sua diáspora pelo mundo,
atravessando fronteiras, conhecendo outros países e outras gentes e
abraçando novas vidas. Regra geral, a nossa gente tem feito isso com
o fito de melhorar a sua própria condição de vida para depois voltar
definitivamente à sua terra, sem prejuízo do seu regresso ocasional
durante o período de férias. Nos últimos anos, porém, essa regra tem
vindo a verificar-se cada vez menos. As diferentes perspetivas
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geracionais proporcionadas por um mundo cada vez mais próximo e
atrativo e, ao mesmo tempo, cada vez mais global têm sido
seguramente as causas principais para esse acontecer. Mesmo tendo
isso em conta, quaisquer que sejam os lugares em que a nossa gente
se encontre, ela não esquecerá a sua terra, apesar de se sentir em
geral integrada, respeitada e considerada nesses lugares.
Passada esta meia dúzia de décadas e apesar dos costumes estarem
cada vez mais dissolvidos, da prática da vida se orientar não poucas
vezes pelo relativismo e pela conveniência, do apego às ideias estar a
diminuir,
de
não
haver
princípios
e
valores
que
não
sejam
permanentemente postos em causa e das dificuldades económicas e
sociais por que estamos a passar, o certo é que a nossa terra e a
nossa gente estão hoje bem diferentes para melhor. Hoje em dia, há
mais direitos, liberdades e garantias, há mais e melhor instrução e
preparação cultural, científica e técnica e há mais e melhores
infraestruturas e outros bens económicos, sociais e culturais, em
suma, há mais e melhores condições e qualidade de vida.
Apesar dos sinais dos tempos antes mencionados e das diferenças
para melhor havidas nesta meia dúzia de décadas, é justo dizer, por
fim, que a nossa gente mantém por inteiro as suas características de
trabalho, de honradez, de inteligência e de carácter e mantém
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igualmente o seu sonho e a sua vontade e alegria de viver, em prol
dela própria, da sua terra, do seu país e do mundo que a rodeia.
Continuemos, pois, a acreditar na nossa terra, na nossa gente e na
nossa vontade.
José Vieira dos Reis
Natural das Torrinhas e atualmente
Presidente da Assembleia Municipal da Batalha
Junho de 2012
Fontes históricas: Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Editorial Enciclopédia,
Limitada, Lisboa/Rio de Janeiro, págs. 847 e 848, e Wikipédia.
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