Editorial Laranjeiras
EDITORIAL LARANJEIRAS
Vol. 1, No 4, Setembro 2004
REVISTA
DO INSTITUTO
DE
REVISTA DO
INSTITUTO
NACIONALNACIONAL
DE
CARDIOLOGIA
RIODE
DEJANEIRO-RJ
JANEIRO-RJ
CARDIOLOGIALARANJEIRAS
LARANJEIRAS-RIO
EDITORES:
Ademir Batista da Cunha
Daniel Arkader Kopiler
Luis Carlos Simões
CONSELHO EDITORIAL
Ademir Batista da Cunha, Antonio Carlos Campos de Carvalho,
Daniel Arkader Kopiler, Regina Maria Xavier de Aquino, Augusto
Bozza, Jose Geraldo Amino, Paulo Sérgio de Oliveira, Antônio
Sérgio C. Rocha, Paulo Roberto Dutra, Luis Carlos Simões,
Helena F. Martino, Clara Weksler, Marco Aurélio dos Santos,
Renato Vieira Gomes, Marco Antônio Mattos, Luis Henrique
Weitzel, Walmir Barzam, Berdj Meguerian, Luis Eduardo Tessarolo,
Roberto Sá, Lílian Faertes Nascimento, Paulo Moura, Ivan Luiz
Cordovil de Oliveira, Jose Barbosa Filho, Cynthia Karla Magalhães,
Paulo José de Andrade, Ana Carolina Gurgel Câmara, Renato
Dias Barreiro Filho.
Assessoria: Ayrton Seixas Jr. e Jefferson Fernandes
Editoração em Inglês e revisão de português: Paulina Becher
A REVISTA EDITORIAL LARANJEIRAS é editada
trimestralmente pelo Centro de Estudos do Instituto Nacional de
Cardiologia, Rua das Laranjeiras 374,
12 o andar, CEP 22240002 – Rio de Janeiro, RJ.
Tel. (21) 2557-0894 / Fax: (21) 22055097
E-mail:
[email protected]
Impressão: Grafica e Editora La Salle
Tiragem: 5.000 exemplares
Distribuição Dirigida
1
ISSN
1806-1079
Editorial Laranjeiras
2
Editorial
Editorial Laranjeiras
Laranjeiras
Vol. 1, No 4, Setembro 2004
ISSN
1806-1079
S U M Á R I O
Entrevista
A CORREÇÃO CIRÚRGICA PRECOCE DA ORIGEM
ANÔMALA DE UMA ARTÉRIA PULMONAR DA
AORTA ASCENDENTE PODE PREVENIR O
DESENVOLVIMENTO DA HIPERTENSÃO
ARTERIAL PULMONAR?
Marco Aurélio Santos, Vitor Manuel Pereira Azevedo
Opinião
O DURO CAMINHO DO ENSINO SUPERIOR NO
BRASIL
Dr. Daniel Arkader Kopiler
7
Artigos de Revisão
Artigos originais
A ANÁLISE DA VEIA CAVA INFERIOR É UM
PARÂMETRO FIDEDÍGNO EM PACIENTES SOB
CUIDADOS INTENSIVOS E VENTILAÇÃO
MECÂNICA?
Ana Cristina Camarozano, Fernanda Sampaio,
Maria Auxiliadora Pereira, Walter Homena, Plínio
Resende, Bernardo Tura, Martha Savedra, Luis
Henrique Weitzel
8
FATORES DE RISCO CONVENCIONAIS E DOENÇA
ARTERIAL CORONARIANA.
Antônio Sérgio Cordeiro da Rocha, Felipe José
Monassa Pittella, Áureo do Carmo Filho, Daniella
Santana Bastos, André Luis Caldas de Oliveira,
José Artur Lopes de Albuquerque, Bruno Costa do
Nascimento, Alexandre Sahate Silva, Bernardo Tura,
Paulo Roberto Dutra da Silva
13
UTILIZAÇÃO DE ENXERTOS DE MAMÁRIA BOVINA
PRESERVADA EM SHUNTS SISTÊMICOPULMONARES
José Alberto Caliani, Pascal Vouhé, Rodrigo Minatti
Barbosa, José Augusto Toledo Marinho e Luiz Carlos
Simões
17
TROMBOSE DE PRÓTESES VALVARES NO INCL:
UM ESTUDO OBSERVACIONAL DE 4 ANOS
Clara Weksler, Wilma Felix Golebiovski, Mario
Wagner, Jacob Fucks, Renato Faria, Márcia
Barbeito, Alexandre Sahate Silva, Andre Casarsa
Marques, Áureo do Carmo Filho, Bruno Costa do
Nascimento, Vitor Agueda Salles
22
VALVOPLASTIA MITRAL PERCUTÂNEA
Paulo Eduardo Kyburz, Paulo Sergio de Oliveira,
Marta Labrunie, Norival Romão, Sergio Leandro,
Waldyr Malheiros, Marcelo Lemos, André
Pessanha, Clara Wecksler, Maria da Conceição
Alves, Marcio Macri
29
INSUFICIÊNCIA VENTRICULAR ESQUERDA E
SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO
Ademir Batista da Cunha
35
BASES METABÓLICAS DO MIOCÁRDIO
ISQUÊMICO – MIOCÁRDIO STUNNED,
HIBERNADO E PRÉ-CONDICIONAMENTO
ISQUÊMICO
Felipe José Monassa Pittella
38
ARRITMIA CARDÍACA NO IDOSO - CONTINUAMOS
APRENDENDO
Roberto LM Sá, Fernando ES Cruz F, Márcio LA
Fagundes, LeonardoB Arantes, Cláudia M Perez,
Rafael L.Fagundes, Angela CB Valverde e Luiz H.Loyola
42
Relato de Caso
SIRS NO TRATAMENTO ENDOVASCULAR DA
DISSECÇÃO CRÔNICA TIPO B DE STANFORD.
Flávio Reis Gouvêa, Mônica Resende P. Gouvêa, Bruno
Reis Gouvêa, César A.S. Nascimento, Odilon Nogueira
Barbosa, Oscar Reis Brito
49
Renovação Estrutural
O ARQUIVO MÉDICO EM FOTOS – INCL 2001
A 2003
Marcio Arnaldo da Silva Gomes
52
Destaque em Gestão
25
3
POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO:
DESAFIOS DA IMPLEMENTAÇÃO EM UM
HOSPITAL PÚBLICO DE ALTA COMPLEXIDADE
Lilian F. Nascimento, Ionete de Oliveira, Lúcia Pimenta,
Ademir B.da Cunha, Verossemilia M. Silva, Ana Lúcia
Tarouquella, Raul G. Marques, Telmo Carvalho, José
Souto, Izabel Cristina V. de A. Lima, Bernardo R. Tura,
Regina Maria de A.Xavier
56
PREFERE – DA INFORMAÇÃO A PREVENÇÃO
Regina Maria de Aquino Xavier, Mônica Nolasco,
Regina Elizabeth Müller, Marisa da Silva Santos, Ana
Beatriz Ribeiro Lima, Maria José Lucas, Ana Lúcia
Taranquella Schilke
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Editorial Laranjeiras
REGRAS PARA PUBLICAÇÃO
A Revista EDITORIAL LARANJEIRAS do Instituto Nacional de Cardiologia tem como objetivo divulgar o saber na área de Cardiologia
baseando-se na publicação de artigos originais,de revisão e atualização além de relatos de casos especiais e documentados.
Os trabalhos para publicação deverão ser enviados ao Conselho editorial da revista para apreciação e julgamento, e só serão aceitos
se forem inéditos, não sendo permitido sua publicação em quaisquer outras revistas.
Os artigos poderão ser enviados em português, espanhol ou Ingles e terão como limite de extensão 20 páginas de texto para os artigos
originais, de revisão e atualização (incluindo ilustrações, tabelas e anexos);para os casos clínicos o limite é de 2 páginas, incluindo
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Todos os tipos de trabalho deverão apresentar o resumo em Ingles.
Os autores deverão enviar 2 cópias impressas em papel ofício, digitadas em espaço duplo, com margens de 2.5 cm e páginas
numeradas, bem como um disquete na versão Word for Windows 6.0
A sequência dos artigos deverá ser a seguinte:
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e serviços a que se vinculam, bem como o endereço para correspondência
c) resumo de até 250 palavras, na língua original em que foi escrito o artigo e descritores ou ‘palavras-chave’
que identificam o conteúdo do trabalho, que devem estar contidos nos “Descritores em Ciências da Sáude (DeCS) publicada pela Bireme
d) introdução constando o objetivo do trabalho e) Casuística e Métodos constando a análise estatística utilizada f) resultados g) Comentários
ou Discussão h) Conclusões i) título, resumo e descritores em ingles (abstract e Key words) j) agradecimentos , se houver. k) referências
bibliográficas e l) legenda e ilustrações.
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títulos na parte superior de cada coluna e as abreviaturas, se houver, no rodapé.Todas as ilustrações devem constar em folhas separadas ,
numeradas normalmente, seguindo as referências bibliográficas. As ilustraçoes podem utilizar cores.
As regras para publicação na EDITORIAL LARANJEIRAS estão fundamentadas nas recomendações do International Committeé of
Medical Journals Editors. Uniform requirements for manuscripts submited to biomedica journal. N Engl Med l991: 324:424-8, que recomendam
observações como:
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Somente os trabalhos consultados devem ser mencionados, e os autores deverão ser citados no texto. Informações ou referências a
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Referências Bibliográficas no texto:
Deverão seguir a ordem de citação no texto e serem numeradas sequencialmente em algarismos arábicos.
Os autores citados podem ser identificados apenas pelo número índice ou então pelo ultimo sobrenome,seguido do número indice. Ex.
Cunha 1 relatou...Simões, Cunha 23 ou segundo varios autores 4,5,6
Lista de Referências Bibliográficas:
Deverão ser apresentadas ao final do trabalho e respeitando a ordem de citação do autor no texto. Tratando-se de trabalhos de colaboração
deverão ser citados até 6 autores, seguindo a expressão et al. Os títulos de periódicos deverão ser abreviados de acordo com a List of Journals
Indexed in Index Medicus, publicada no fascículo de janeiro do Index Médico de 1997.
Artigo de Periódico:Sobrenome e iniciais do prenome dos autores.Título do artigo. Título do periódico abreviado. Ano e mês abreviado:
volume (n.º do fascículo): número das páginas inicial e final. Em publicações em que as páginas são continuadas a cada volume pode-se
omitir o n.º do fascículo e o mês.Ex: Bigger JT, Fleiss JL , Steinmam RC, Rolnitzky LM , Kleiger RE & Rottman JN . Correlations among time
and frequency domain measures of heart period variability two weeks after acute myocardial infarction. Am J Cardiol 1992 ; 69: 891-898.
Volume com suplemento:
Nesse caso após o n.º do volume acrescentar (Suppl I).
Livro:
Sobrenome e iniciais do prenome dos autores. Título do livro.N.º da edição. Local da publicação:Editora, ano.
Capítulo de livro:
Sobrenome e iniciais do prenome dos autores do capítulo. In: Sobrenome e iniciais do prenome dos autores do livro. Título do livro:
Subtítulo. Local da publicação : Editora, ano : páginas específicas do capítulo.
Tese ou dissertação:
Sobrenome e iniciais do prenome do autor.Título (Grau acadêmico do trabalho).Local de publicação: Instituição onde foi defendida, ano.
Ex: . Pedrosa,CR. Contribuição ao estudo da etiopatogenia do distúrbio de condução e da eletrogênese na cardiopatia chagásica crônica.
Efeitos de anticorpos IgG de pacientes chagásicos crônicos na eletrogênese e no sistema de condução do coração isolado de mamíferos.
Tese de Doutorado.Rio de Janeiro: Faculdade de Medicina. Universidade Federal do Rio de Janeiro,1998.
Procedimentos para publicação: Enviar os trabalhos para o Centro de Estudo do Instituto Nacional de Cardiologia, à R. das Laranjeiras,
374-12º andar . Cep 22.240.002. Rio de Janeiro – RJ. Em caso de dúvidas entrar em contato com o Centro de Estudo pelo tel. (0XX-21)25570894.
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O Conselho Editorial determinará se os trabalhos estão aptos à publicação e poderá sugerir ao autor a modificação do trabalho ou sua
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e nome dos autores, de acordo com a legislação sobre direitos autorais.
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Editorial Laranjeiras
DR. ROBERTO COURY PEDROSA
Por, Ademir Batista da Cunha
1. Sendo você um profissional formado pela Universidade Federal de Minas Gerais, encaminhado à
UFRJ pelo saudoso Prof. Mário Lopes, com a finalidade de cursar o Mestrado em Cardiologia, quais as razões que o impediram de voltar? E por que ficou no Rio
de Janeiro?
O
Sempre fui um curioso em relação à medicina e na
UFRJ achei uma oportunidade de obter respostas. Nessa época (1990) tive o convite do Prof. Carlos Chagas
Filho, então diretor do Instituto de Biofísica, para promover uma integração científica entre o Instituto e o Hospital
Universitário. A partir de então, com a ajuda do Prof. Edson A. Saad, foi criado o ambulatório de doença de Chagas objetivando estabelecer a utilidade dos diversos métodos de exploração cardiológica no diagnóstico precoce do dano miocárdico, estudar sua evolução e elucidar
os mecanismos etiopatogênicos da cardiopatia
chagásica crônica
Dr. Roberto Pedrosa, 48 anos, hoje representa
um dos principais destaques na pesquisa nacional caracterizando-se como um exímio cardiologista clínico envolvido em pesquisa de base. Dessa combinação têm
surgido excelentes trabalhos científicos que culminou com
a publicação na revista Circulation 1997; 96:20031-7 do
estudo antológico “Sera from chronic chagasic patients
with complex cardiac arrhythmias depress electrogenesis
and conduction in isolated rabbit hearts”.
No início da década de 90, o Dr. Roberto Pedrosa
criou, no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho,
um ambulatório especial para assistência aos pacientes
portadores de doença de Chagas. Aquilo que inicialmente parecia um preciosismo acadêmico transformou-se em
um foco de pesquisa clínica que ultrapassou os muros
do Hospital, ligando-se aos centros de pesquisa básica da Universidade como os de Biofísica, Bioquímica e
constituindo-se em inestimável fonte de produção científica refletida em — teses de mestrado , doutorado e
publicações.
2. O nosso mundo científico , a meu ver, apresenta
uma dicotomia: por um lado pesquisa de base, por outro
pesquisa clínica. Como promover a união dessas duas
vertentes tão importantes sem perder o que há de original em cada uma delas?
Do meu modo de ver, essa integração é mais do
que necessária. A ciência precisa de uma consciência e
não de uma evolução neurológica do lobo frontal e seus
acessórios.
Todo esse trabalho ininterrupto vem sendo desenvolvido com muita persistência, dedicação e, sobretudo,
com a simplicidade característica do Pedrosa (como é
chamado pela maioria de seus discípulos, alunos e admiradores). E, para nos contar um pouco de sua travessia
pelo mundo da ciência, pesquisa e assistência é que formulamos 10 questões para o Dr. Roberto Coury Pedrosa.
3. Os alunos vão até o ambulatório de Cardio-Chagas, como é conhecido, e se deparam com uma patologia complexa, cujo esclarecimento e, conseqüentemente, estabelecimento de condutas terapêuticas eficazes,
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Editorial Laranjeiras
experiência, promover um intercâmbio maior.
no estágio atual de desenvolvimento, passam pela realização de pesquisas sofisticadas e caras. Quais são suas
respostas para tais problemas?
8. Quais são os maiores obstáculos para o progresso da ciência , hoje, e quais as suas propostas para
sua eliminação?
O aluno, no final do seu convívio conosco, sai com a
noção de que o ambulatório é direcionado para pesquisa
e de que são muitas as dificuldades inerentes ao serviço,
tais como a falta de recursos econômicos e materiais, a
desorganização dos orgãos fomentadores de pesquisa e
até mesmo os interesses pessoais. O que tentamos passar para o aluno é mostrar como é possível superar essas dificuldades e não ficar avaliando a sua extensão assim como seus componentes. O aluno aprende o respeito ao sujeito pesquisa com uma boa relação médico-paciente embasada numa boa anamnese e num bom exame físico.
No Brasil, um deles é a crise da universidade, fruto
provavelmente de barreiras econômicas/políticas. O outro obstáculo é a falta de conscientização na pesquisa. A
proposta é tentar superá-las com labor diário e perseverança.
9. Roberto, existe marketing na ciência de hoje em
detrimento da verdadeira pesquisa, ou são apenas formas mais superficiais de apresentar o problema, decorrentes de uma formação acadêmica deficiente?
Acho que existem ambas. O problema maior é que a
pós-graduação dentro da universidade não cumpre seu
papel de modificador de opiniões e atitudes, levando a
uma deficiência na formação acadêmica, que, por sua
vez, propicia a existência de marketing.
4. Mesmo envolvido em pesquisa clínica de alta
qualidade, você acredita que essa ação possa ser expandida para inúmeros centros de nosso país, buscando soluções para problemas caracteristicamente “nossos” como a doença de Chagas?
Sem desconhecer os graves problemas da pesquisa no Brasil, deparamos hoje com uma universidade brasileira em crise. Em que pese as dificuldades neste momento, no meu modo de pensar, a pesquisa se insere
dentro de um papel modificador de opiniões e atitudes
dentro da universidade. É nosso dever e obrigação buscar soluções para problemas nossos.
10. Qual o seu envolvimento com o projeto “Células-Tronco”na cardiopatia chagásica crônica? Poderia
descrevê-lo , seguido de uma avaliação sincera?
Sou o responsável clínico pelo projeto no Hospital
Universitário Clementino Fraga Filho. O projeto é extensão de trabalho feito na Universidade Federal da Bahia na
fase I humana, já tendo passado pelas fases em modelo
experimental animal. Inicialmente, objetiva-se segurança
no que se está propondo e evidência de que é eficaz.
Quanto à eficácia/benefício necessita de mais tempo.
Células tronco ainda têm muitas perguntas a serem respondidas e é um campo vasto de pesquisa tanto à nível
básico como clínico.
5. É fácil publicar no Brasil ? Mesmo quem apresenta uma produção permanente, como você, encontra
barreiras nesse aspecto?
Não, é difícil qualquer publicação. Temos poucas
opções. Como exemplo, uma revista brasileira respeitada e que publica trabalhos relativos a mecanismos é o
Brazilian Journal of Medical and Biological Research,que,
no momento. passa por sérios problemas financeiros e,
para você submeter um artigo a essa publicação, tem que
desembolsar em torno de quase 1.000,00 reais
6. Cite 2 personalidades marcantes na Cardiologia
carioca, que representem modelos para os jovens
cardiologistas.
Prof Edson A. Saad, por fazer ver aos seus discípulos que, para o florescimento da pesquisa, é preciso que
o interesse pela resposta à pergunta seja maior que a
preocupação pela pessoa que a responde, Prof
Waldemar Decache, de referência insubstituível.
7. Nas apresentações de trabalhos em congressos, qual a melhor opção, mural ou tema livre oral? Por
quê?
Mural, porque 1- dá à pessoa a opção de ler somente o que interessa; 2-você está frente ao autor do trabalho
e esse é o melhor momento para discutir dúvidas, trocar
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Editorial Laranjeiras
O DURO CAMINHO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
Rio de Janeiro - RJ
Dr. Daniel Arkader Kopiler*
O ensino superior, no nosso país, passa por uma crise
cujo reflexo na área médica pode ser observado através da
queda na qualidade técnica, cultural e ética dos profissionais
que se formam a cada ano nas diversas universidades, sejam públicas ou privadas. Esses fatos nos levam a profundas reflexões sobre as bases da formação dos médicos,
desde a educação familiar, passando pelo ensino fundamental e atingindo o curso superior.
Outro problema que aflige mais acentuadamente as
faculdades particulares é a queda do poder aquisitivo da população, fazendo com que as universidades privadas tenham
que se adequar a essa realidade, diminuindo os valores das
mensalidades, com conseqüente diminuição de recursos para
a formação de profissionais. Em contrapartida, nas universidades públicas, o acesso é dado, preferencialmente, aos alunos que tiveram possibilidade de estudar em “colégios de
primeira linha” e, paralelamente, em cursinhos de reforço, de
custo bem alto, que permitem uma capacitação superior.
Em geral, fazem parte desse grupo, as classes sociais
mais favorecidas, com a agravante de que o pagamento
das pequenas taxas mensais durante a permanência nas
instituições públicas é reservado justamente a quem tem
melhor poder aquisitivo.
A crise é moral, financeira e intelectual, e, nesse caminho, cruzam alunos e professores, com problemas semelhantes, porém com objetivos diversos. Os alunos com sonhos de obter um diploma, muitas vezes sem saber o que
fazer com ele, acabam encontrando um mercado saturado,
principalmente nos grandes centros, e uma concorrência “feroz”. Na maior parte das vezes, estão despreparados para
enfrentar tal situação e terminam por aceitar qualquer tipo de
emprego, independentemente das condições de trabalho,
remuneração e atendimento aos pacientes.
O número de faculdades particulares teve um crescimento muito grande entre 1990 e 2000, aumentando em 100%
na região sudeste e em 225% na região norte (maior
percentual de crescimento). O quadro atual sugere que a rede
privada já tenha atingido dimensões suficientes para a demanda até agora existente. Essa expansão, porém, vem diminuindo, dando motivo para preocupação.
Já os profissionais de ensino, na sua grande maioria,
estão desestimulados e, como são mal remunerados, tendem a desistir da vida acadêmica e a partir para a iniciativa
privada ou, então, a procurar vários empregos simultâneos
em outros estabelecimentos de ensino para complementar
a sua renda.
Em resumo, vemos um crescimento do setor privado,
com tendência em alguns segmentos a ultrapassar as necessidades do número de alunos, bem como levantamos um
questionamento quanto à qualidade da maioria dos profissionais que compõe o seu quadro e dos recursos investidos em
suas instalações. No setor público, os profissionais qualificados estão sendo levados à iniciativa privada de ensino ou não,
por salários bem maiores. Por outro lado, o governo vem
diminuindo cada vez mais os investimentos, o que gera uma
queda na qualidade dos cursos e desestímulo aos profissionais que permanecem.
O número de estabelecimentos de ensino particular vem
crescendo, sem, muitas vezes, apresentar uma estrutura
adequada para atender à sua demanda.
Quase todos os números do ensino superior brasileiro
demonstram que o crescimento desse setor continua acelerado. Porém, um estudo recente do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA) revelou que, de 1990 a 1999, a
proporção de alunos para cada vaga nas universidades particulares caiu de 2,94 para 2,26, uma queda de 23%.
Nesse mesmo período, registrou-se o inverso nas universidades públicas, onde a proporção subiu de 5,69 para
8,26, um crescimento de 45%. A qualidade do ensino, no
entanto já não é a mesma, pois muitos professores, atraídos
por melhores salários, são levados para a iniciativa privada,
e a migração de mestres capazes e experientes vem afetando a qualidade desse ensino.
A relação acima tem que ser avaliada com cuidado,
pois reflete a proporção aluno/vaga, mas não o número absoluto de alunos nas universidades públicas e privadas, já
que o crescimento em números absolutos é bem maior no
setor privado.
No ensino universitário privado, o grande crescimento
do número de faculdades e de seus pólos faz com que a
excelência do ensino sofra uma queda importante, uma vez
que os objetivos econômicos suplantam os científicos, com
implicações na formação dos alunos.
*Coordenador da Residência Médica do INCL
*Mestre em Cardiologia – UERJ
*Doutorando em Cardiologia – UFRJ
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Opinião
Editorial Laranjeiras
A ANÁLISE DA VEIA CAVA INFERIOR É UM PARÂMETRO
FIDEDÍGNO EM PACIENTES SOB CUIDADOS INTENSIVOS
E VENTILAÇÃO MECÂNICA?
Rio de Janeiro - RJ
Ana Cristina Camarozano*, Fernanda Sampaio, Maria Auxiliadora Pereira, Walter Homena, Plínio Resende,
Bernardo Tura, Martha Savedra, Luis Henrique Weitzel
RESUMO
Objetivo: Avaliar a correlação entre o diâmetro da veia
cava inferior (DVC) e sua variação inspiratória com a pressão venosa central (PVC) de pacientes que estão ou não
sob ventilação mecânica com pressão expiratória final
positiva (PEEP).
Results: Left-ventricular function was normal in 67%
of the cases, and right ventricular function was normal in
100% of the patients. Inferior vena cava (IVC) average was
2.1cm in group I and 1.7cm in group II (p=0.004). In group
lI, 48% of the patients showed IVC variation <50%
(p=0.002), while in 100% of group I patients, IVC varied
less than 50%.(p=0.02) for an average PEEP of 13cmH2O.
CVP in group II was also lower than in group I (p<0.01).
The correlation between VCD and CVP was 0.43 in the
population studied, but enlargement of CVD had a good
correlation with the presence of PEEP (p=0.007) when
compared to group II. IVC diameter was also higher in
patients who had a ICV variation <50% (p=0.009). In our
analysis, CVP did not correlate significantly with the
presence of PEEP (p=0.13).
Métodos: Estudamos, prospectivamente, no período de fevereiro a dezembro de 2002, 48 pacientes críticos,
em unidade de terapia intensiva, idade média de 57 anos,
74% do sexo masculino. Consideramos para análise a
DVC e a oscilação deste vaso com a inspiração (> ou <
50%) e a PVC, dividindo os pacientes em dois grupos: I)
aqueles sob ventilação mecânica e PEEP, e II) aqueles em
ventilação espontânea.
Resultados: A função ventricular esquerda foi normal em 67% dos casos e a função do ventrículo direito foi
normal em 100% do grupo. A média da VCI no grupo I foi
de 2,1cm e no grupo II de 1,7cm (p=0,004),sendo que 48%
dos pacientes do grupo II tiveram oscilação da VCI<50%,
enquanto em 100% dos pacientes do grupo I a VCI oscilou
menos que 50% (p=0,02) para uma PEEP média de
13cmH2O. A PVC no grupo II também mostrou-se menor
do que no grupo I (p<0,01). A correlação entre DVC e PVC
foi de 0,43 na população estudada, porém o aumento do
DVC apresentou boa correlação com a presença de PEEP
(p=0,007) quando comparado ao DVC do grupo II. O diâmetro da VCI também mostrou-se maior em quem teve
variação da VCI<50% (p=0,009). A PVC não teve correlação significativa com a presença da PEEP em nossa análise (p=0,13).
Conclusion: We observed that neither PEEP nor VCD
or its variation can predict CVP. However, VCD enlargement
has a strong correlation with the presence of PEEP,
suggesting that IVC measure is a non-reliable parameter
in patients receiving mechanical ventilation.
Key-Words: Vena cava, PEEP, CVP
INTRODUÇÃO:
A análise da veia cava inferior (VCI) é, hoje em dia,
bastante utilizada, especialmente nas unidades de terapia intensiva, com o intuito de fornecer de modo nãoinvasivo, dados auxiliares sobre a volemia (pré-carga). Tais
dados permitem a estimativa da pressão artrial direita através de suas dimensões e variação com o ciclo respiratório. O principal grupo de interesse é dos pacientes que
não apresentam indicação para monitorização
hemodinâmica com cateter em artéria pulmonar. Essa
indicação vêm apresentando caráter cada vez mais seletivo e esses pacientes precisam de uma definição sobre
o “estado volêmico” para determinação da estratégia terapêutica. Nos pacientes em ventilação espontânea a avaliação da VCI possui confiabilidade, mas em relação aos
pacientes sob ventilação mecânica esse dado ainda não
está bem definido.
Para responder a essa questão, objetivamos
correlacionar o diâmetro da veia cava (DVC) e sua variação inspiratória com a pressão venosa central (PVC) em
pacientes que estão ou não sob ventilação mecânica com
pressão expiratória final positiva (PEEP).
Conclusões: Observou-se que nem a PEEP nem o
DVC ou sua variação, ajudaram a predizer a PVC. Contudo, o aumento do DVC apresenta forte correlação com a
presença de PEEP, sugerindo ser a medida da VCI, um
parâmetro não fidedigno em pacientes sob ventilação
mecânica.
Palavras-chave: Veia cava, PEEP,PVC.
ABSTRACT:
Objectives To evaluate the correlation between the
inferior vena cava diameter (VCD) and its inspiratory
variation with central venous pressure (CVP) of patients
with or without mechanical ventilation and positive endexpiratory pressure (PEEP).
Methods: A prospective study of 48 critical patients, in
intensive care therapy, age average 57 years 74% males,
was performed between February and December 2002. To
analyze VCD and its inspiratory variation (> or < than 50%),
and CVP, we divided patients in two groups: I - patients
under mechanical ventilation and PEEP, and II -patients
with spontaneous ventilation.
* Instituto Nacional de Cardiologia – Rio de Janeiro
Hospital Barra D´Or – Rio de Janeiro
Mestre em cardiologia pela UFRJ
Médica do setor de Ecocardiografia do INCL e Hospital Barra D´or
[email protected]
8
Editorial Laranjeiras
Artigos Originais
Foram considerados como critérios de exclusão:
Disfunção do ventrículo direito
Insuficiência tricúspide e/ou pulmonar moderada
Cardiopatia congênita
Doença do pericárdio
Pressão sistólica em artéria pulmonar (PSAP>40mmHg)
Idade<18 anos
Visualização inadequada da VCI
Análise Estatística:
O teste de qui-quadrado e o teste exato de Fischer foram utilizados para comparação de proporções. Foi utilizado
também o teste t de Student ou teste de Mann-Whitney, para
comparação de médias ou medianas entre dois grupos, e o
teste de correlação de Pearson para correlação entre variáveis numéricas.
Considerou-se um valor de p<0,05 como estatisticamente significativo.
Pacientes e Métodos:
Estudamos, prospectivamente, no período de fevereiro
a dezembro de 2002, 48 pacientes críticos, em unidade de
terapia intensiva. A idade média foi de 57 anos, 74% eram do
sexo masculino e 26% do sexo feminino. Os grupos foram
separados em I) pacientes sob ventilação mecânica e PEEP
e II) pacientes sem PEEP (ventilação espontânea).
Dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva, 18 (38%) estavam em pós-operatório de cirurgia cardíaca; 10 (21%) tinham sepsis pulmonar; 9 (19%) sepsis abdominal; 3 (6%) sepsis cutânea, 1 (2%) sepsis por cateter; 1
(2%) sepsis de foco indeterminado; 4 (8%) eram
politraumatizados e siréticos, 1 (2%) tinha mastoidite; e 1 (2%)
infecção puerperal.
Todos apresentavam função ventricular direita normal
pela análise subjetiva feita através do ecocardiograma
transtorácico prévio à avaliação da VCI, e 32 (67%) tinham
função ventricular esquerda preservada.
O tratamento instituído foi padrão para cada patologia e definido pela equipe especializada e responsável
pela terapia intensiva do hospital.
O DVC foi medido pelo ecocardiograma
unidimensional através do corte subcostal, eixo longo, a
2cm da entrada no átrio direito, durante a expiração. A
oscilação da VCI foi medida no seu ponto máximo de
colabamento, na inspiração.
A medida da PVC seguiu os padrões de aferição;
após “zerar” e calibrar o sistema, com o paciente em posição supina, obteve-se a PVC fornecida pelo monitor. Essa
medida foi realizada imediatamente após a execução do
ecocardiograma.
Os seguintes parâmetros foram considerados para
análise: DVC, oscilação da VCI (se > ou <50%) e PVC.
O aparelho utilizado foi um HDI-3000 da ATL, com
transdutor de 4,0 MHz.
Resultados:
Dos pacientes estudados, 17 (36%) estavam sob ventilação mecânica e 31 (64%) sob ventilação espontânea.
Disfunção ventricular esquerda esteve presente em 33% dos
casos, e a presença de cateter em artéria pulmonar ocorreu
em apenas 35% dos casos, motivo pelo qual não estabelecemos medidas hemodinâmicas adicionais para comparação. Entretanto, todos apresentavam um acesso venoso profundo através da veia subclávia ou jugular interna, de modo
que pudéssemos medir a PVC.
A figura 1 abaixo separa o DVC e a PVC nos pacientes
com e sem ventilação mecânica e mostra que a média do
DVC e da PVC foram significativamente maiores nos pacientes ventilados mecanicamente. A média da VCI no grupo I foi
de 2,1cm e no grupo II de 1,7cm (p=0,004), ressaltando-se
que 48% dos pacientes do grupo II tiveram oscilação da
VCI<50%, enquanto em 100% dos pacientes do grupo I a VCI
oscilou menos que 50% (p=0,02) para uma PEEP média de
13cmH2O. A PVC no grupo II também mostrou-se menor do
que no grupo I (p<0,01).
Figura 1: Análise do DVC e da PVC em pacientes com e sem ventilação mecânica (VM).
9
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Nenhum paciente do grupo I utilizou PEEP abaixo de 6cmH2O. Os níveis de PEEP,
nesse grupo, variaram de 6 a 23cmH2O de acordo com cada situação, e a média da
PEEP apresentou-se elevada (13cmH2O). A pressão venosa central também apresentou grande variação entre o grupo estudado (de 1 a 23cmH2O), e o diâmetro da VCI
variou de 0,6 a 2,8cm.
Outro achado representativo de nossa análise foi a não associação entre a variação da VCI e a PVC, quando consideramos a variação > ou < 50% e PVC > ou <10cmH2O
(figura 2).
Figura 2: Associação entre a variação da VCI e a PVC.
p=0,53
A figura 3 corresponde a uma análise de correlação de Pearson, cujo intuito foi
avaliar se o diâmetro da VCI mantinha correlação com a estimativa da PVC. O desenho
demonstra que existe uma correlação significativa entre essas duas variáveis (p=0,002),
porém o grau de associação foi moderado (r=0,430). Por outro lado, o aumento do
DVC apresentou boa correlação com a presença de PEEP (p=0,007) no grupo I, quando comparado ao DVC do grupo II, e o diâmetro da VCI também mostrou-se maior em
quem teve variação da VCI<50% (p=0,009).
Figura 3: Correlação de Pearson para DVC e PVC.
Para um melhor entendimento desse resultado, optamos por estratificar somente os pacientes que estavam sob ventilação mecânica, suspeitando serem esses os
causadores da dispersão dos dados da amostra
(figura 4).
10
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Figura 4: Correlação de Pearson para DVC e PVC nos pacientes sob ventilação
mecânica e PEEP.
A figura 4 confirma que não existe correlação significativa entre o DVC e a PVC
(p=0,37 e r=0,20) nesse grupo, o que sugere ser a ventilação mecânica associada à PEEP
o fator determinante da ausência de correlação entre DVC e PVC.
Para finalizar a abordagem estatística e demonstrar a relação entre PVC e presença
ou ausência de PEEP, adotamos o modelo “box-plot” exibido na figura 5. A mediana
representativa da PVC foi menor no grupo II do que no grupo I, porém sem significância
estatística (p=0,13).
Figura 5: Relação entre PVC e presença de PEEP.
N= Grupo II
S= Grupo I
11
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PEEP tão baixos quanto 5cmH2O. Essa redução apresentou relação diretamente proporcional com o aumento na
PEEP. Os estudos de Jue e col.7 e Nagueh e col.8 também
constataram dados similares aos nossos para pacientes
sob ventilação mecânica, porém, a despeito da pobre correlação encontrada entre DVC e PVC, o primeiro autor infere que o DVC>1,2cm não tem valor preditivo para a PVC,
e o segundo conclui que a dinâmica do fluxo nas veias
hepáticas pode ser usada para estimar a PVC nesse grupo de pacientes, com melhor correlação do que a VCI. Ao
contrário desses autores, Bendjelid e col 9 mostraram que
a metodologia aplicada para análise da VCI (se pelo uni
ou pelo bidimensional) interfere no resultado e que, através do modo M, a medida da VCI pode ser um método
alternativo para estimar a PVC em pacientes ventilados
com pressão positiva. Entretanto, estudos denotam boa
correlação entre essas duas técnicas. Além disso, os pacientes estudados na publicação em questão apresentavam níveis de PEEP<5mmHg,considerado baixo e “fisiológico”, que não traduz a realidade dos pacientes críticos
que ocupam os leitos da unidade de terapia intensiva na
atualidade.
Discussão:
O diâmetro da VCI e sua resposta com a respiração
têm sido usados para estimar a pressão atrial direita em
pacientes que ventilam espontaneamente, havendo correlação direta entre dimensões da VCI e pressão atrial direita, quando comparado o ecocardiograma bidimensional à
cateterização cardíaca1. Há, ainda, evidências de boa correlação entre variação da VCI menor que 50% e
PVC>10mmHg, e/ou variação da VCI maior que 50% e
PVC<10mmHg 2. Além disso, Moreno e col 3 mostraram
que não existe correlação entre a análise da VCI e características gerais do paciente como: idade, sexo, ritmo cardíaco ou superfície corporal, de modo que consideramos não
haver influência dessas variáveis nos parâmetros avaliados. Porém, o valor da análise da VCI em pacientes sob
ventilação mecânica e pressão expiratória final positiva ainda apresenta aspectos controversos.
Nesta pesquisa, essa associação entre a variação
da VCI e níveis de PVC > ou < 10mmHg não ocorreu, mas
vale ressaltar que boa parte dos pacientes estudados
pertenciam ao grupo I (sob PEEP), o que certamente contribuiu para a não associação desses dados.
Nesta análise, os pacientes elegíveis foram aqueles que apresentavam função ventricular direita normal,
hipertensão arterial pulmonar menor que moderada e ausência de doença pericárdica, a fim de minimizar possíveis fatores de confundimento. Contudo, os mesmos
parâmetros, extrapolados para pacientes com alterações
estruturais do ventrículo direito e/ou do pericárdio, demonstraram que o colapso da VCI foi inversamente proporcional à PVC quando esta era menor que 10cmH2O, mas não
se correlacionou com pressão atrial direita mais elevada10, onde o colapso do VCI manteve-se reduzido para
qualquer nível de PVC >10cm20.
Nosso estudo mostrou que tanto a média quanto a
mediana da PVC estiveram maiores nos pacientes sob
PEEP, em comparação àqueles que estavam sem ventilação mecânica. A média da VCI no grupo I também foi maior (2,1cm) do que no grupo II (1,7cm) com p=0,004, sendo
que 48% dos pacientes do grupo II tiveram oscilação da
VCI<50%, enquanto em 100% dos pacientes do grupo I a
VCI oscilou menos que 50% (p<0,02), considerando-se
que todos os pacientes críticos estavam com níveis de
PEEP acima dos valores considerados “fisiológicos”, ou
seja, com PEEP maior que 5cmH2O (média de 13cmH2O).
Mitaka e col 4, estudando os efeitos da ventilação com
pressão positiva intermitente e níveis de 0, 10 e 15cmH20
de PEEP na VCI, observaram dados semelhantes aos
nossos pelo ecocardiograma, descrevendo que, quando
os níveis de PEEP estavam elevados, as dimensões da
VCI na inspiração e na expiração estiveram maiores, e o
índice de colabamento apresentou-se reduzido. O mesmo ocorreu com o débito cardíaco na presença de níveis
de PEEP de 10 e 15cmH2O que mostrou-se reduzido. Os
autores justificam esse fato atribuindo-o ao aumento da
estase venosa e conseqüente diminuição do retorno venoso para o átrio direito na presença de níveis elevados
de PEEP. Sabidamente a pressão intratorácica sofre mudanças durante a ventilação mecânica com pressão positiva, afetando tanto a PVC quanto a VCI 5.
Conclusões:
No presente estudo observou-se que nem a PEEP,
nem a DVC ou sua variação ajudaram a predizer a PVC e,
ainda, que o aumento da DVC se correlacionou fortemente com a presença de PEEP, sugerindo ser a medida da
VCI um parâmetro não fidedigno em pacientes sob ventilação mecânica e pressão expiratória final positiva.
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caval configuration. Am Rev Respir Dis. 1979 – 120(2): 421-7
No presente estudo, a correlação entre a DVC e a
PVC foi moderada para a amostra geral, porém, quando
estratificados para os pacientes com e sem ventilação
mecânica, nossos dados demonstram que a dispersão
foi gerada pelos pacientes sob PEEP, com boa correlação
entre DVC e PVC para aqueles sob ventilação espontânea. Além disso, o aumento do DVC apresentou boa correlação com a presença de PEEP (p=0,007), e o diâmetro
da VCI também mostrou-se maior em quem teve variação
da VCI<50% (p=0,009), o que está em concordância com
a literatura 4. A PVC não se correlacionou significativamente
com a presença de PEEP em nossa análise (p=0,13), o
que é corroborado por Theres e col.6 que, em pesquisa
experimental, observou através de medidas
hemodinâmicas na VCI, uma redução significativa do fluxo e do débito cardíaco do ventrículo direito com níveis de
12
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FATORES DE RISCO CONVENCIONAIS E
DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA.
Rio de Janeiro - RJ
Antônio Sérgio Cordeiro da Rocha*, Felipe José Monassa Pittella, Áureo do Carmo Filho, Daniella Santana Bastos,
André Luis Caldas de Oliveira, José Artur Lopes de Albuquerque, Bruno Costa do Nascimento,
Alexandre Sahate Silva, Bernardo Tura, Paulo Roberto Dutra da Silva
Resumo
were slightly older (64,4±9,7 vs 61,8±9,3 years; p=0,20).
Two or more TRF were present in 76,1% of the patients.
One TRF was present in 96,3% of men and 96,6% of
women (p=1,0). DLP was present in 374 (57,5%), SAH in
485 (80,3%), FH in 239 (39,6%), DM in 196 (32,5%) and
CS in 124 (20,5%) patients. Women were more likely to
have SAH (89,1% vs 76,7%; p=<0,0001) and less likely to
have CS (13,7% vs 23,3%; p=0,008) than men.
Fundamento: Admite-se que 50% ou mais dos pacientes portadores de doença arterial coronariana (DAC)
não apresentem os fatores de risco convencionais (FAT)
para a ateroclerose coronária.
Objetivo: Avaliar a prevalência dos FAT em uma população selecionada de pacientes com DAC comprovada
e indicação de cirurgia de revascularização miocárdica
(CRVM).
Conclusion – Patients with CAD and indication for
CABG have a high prevalence of TRF in clear contrast with
conventional thinking.
Métodos: Foram estudados 604 pacientes com doença arterial coronariana (DAC). Os FAT avaliados foram:
hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes mellitus
(DM), dislipidemia (DLP), tabagismo corrente (TBG) e história familiar de DAC (HFA).
Resultados: Pelo menos um FAT foi encontrado em
604 (96,4%) dos casos. Os 22 (3,6%) sem FAT eram mais
velhos do que os demais (64,4±9,7 vs 61,8±9,3 anos),
mas sem significância estatística (p=0,208). Cerca de
76,1% dos casos apresentavam dois ou mais FAT. Pelo
menos um FAT estava presente em 96,3% dos homens e
96,6% das mulheres (p=1,0), DLP estava presente em
374 casos (57,5%), HAS em 485 (80,3%), HFA em 239
(39,6%), DM em 196 (32,5%) e TBG em 124 (20,5%). HAS
(89,1% vs 76,7%; p<0,0001) era mais freqüente entre as
mulheres, enquanto TBG era mais freqüente entre os homens (23,3% vs 13,7%; p=0,008).
Conclusão: Em pacientes com DAC comprovada e
indicação de CRVM a prevalência de FAT é alta e se contrapõe à crença vigente.
Palavras-chave: fatores de risco, aterosclerose
coronariana, doença arterial coronariana
Key-words: risk factors, coronary atherosclerosis,
coronary artery disease Introdução
Apesar da conhecida importância dos fatores de risco convencionais (tabagismo, hipertensão arterial
sistêmica, dislipidemia, diabetes e presença de doença
arterial coronariana em parentes do primeiro grau),
alicerçada em inúmeros estudos epidemiológicos 1-6, dizse que, em pacientes com doença arterial coronária (DAC),
esses fatores de risco estão presentes em aproximadamente metade dos casos 7-11. Isto tem motivado a procura
por outros fatores que poderiam desempenhar um papel
relevante no desenvolvimento da DAC.
O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência
dos fatores de risco convencionais (FAT), isto é, diabetes
mellitus (DM), hipertensão arterial sistêmica (HAS),
dislipidemia (DLP), tabagismo (TBG) e história familiar de
DAC (HFA), em um grupo de pacientes com indicação de
cirurgia de revascularização miocárdica, ou seja, com DAC
comprovada através da cinecoronariografia.
Abstract
Pacientes e Métodos.
Background – It is believed that 50% or more of
patients with coronary artery disease (CAD) do not present
traditional risk factors (TRF) for coronary atherosclerosis.
Analisamos a presença dos FAT em 604 pacientes
portadores de DAC grave, comprovada através de
cinecoronariografia, no período de outubro de 2001 a dezembro de 2003, em uma única instituição. Esses pacientes faziam parte de um grupo submetido, consecutivamente, à cirurgia de revascularização miocárdica (CRVM),
Objective – To investigate the prevalence of TRF in
patients with CAD.
Patients and Methods – We studied 604 patients with
CAD and indication for coronary artery bypass grafting
surgery (CABG). TRF were present in patients with systemic
arterial hypertension (SAH), dislipidemia (DLP), family
history of CAD (FH), diabetes mellitus (DM) or current
smoking (CS).
À admissão, foram colhidos dados demográficos,
história clínica e realizado exame físico. Também foram
registradas as comorbidades de cada paciente utilizando-se os critérios da Associação Americana de Cardiologia
e do Colégio Americano de Cardiologia 12. Foi considerado como portador de HAS todo paciente que tivesse, na
Results – Among patients with CAD, at least one TRF
was present in 582 (96,4%). Patients without CAD (3,6%)
*Chefe da Divisão de Doença Coronária do Instituto Nacional de
Cardiologia Laranjeiras, Ministério da Saúde, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
13
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
admissão. níveis tensionais iguais ou superiores a
140mmHg de sistólica ou 90mmHg de diastólica ou que
estivesse sob uso de medicação anti-hipertensiva. Todos
realizaram exames laboratoriais de rotina, após 10 horas
de jejum. Dislipidemia foi considerada presente quando
os níveis sangüíneos de LDL eram iguais ou superiores a
130mg/dL e/ou HDL iguais ou inferiores a 35 para os homens e 55 para as mulheres e/ou triglicerídeos iguais ou
superiores a 150mg/dL para ambos os sexos. Foram considerados tabagistas todos os pacientes que inalavam
tabaco cronicamente, em qualquer quantidade, até a
internação para CRVM. Diabetes foi diagnosticado quando a glicemia de jejum era igual ou superior a 126mg/dl,
ou quando o paciente fazia uso regular de hipoglicemiante
oral ou insulina. História familiar positiva para doença arterial coronariana foi considerada em todos os pacientes
que apresentavam DAC (história de morte súbita, infarto
agudo do miocárdio ou revascularização miocárdica) em
parentes de primeiro grau.
Discussão
Nosso estudo indica que em pacientes com DAC
comprovada e indicação de CRVM, os fatores de risco
convencionais estão presentes em altas proporções, em
níveis superiores ao que se supunha 7-11. Na população
de pacientes estudada, pelo menos um fator de risco convencional foi encontrado em 96,4% dos casos. Esses
números são pouco superiores aos encontrados por Khot
e col 13, que, em estudo envolvendo mais de 120.000 pacientes oriundos dos ensaios terapêuticos GUSTO I, III, IV, V
e IIB, PURSUIT, PARAGON A e B, CAPTURE, GUSTO IV
ACS, EPIC, EPILOG, CAVEAT I e IMPACT II, verificaram que
pelo menos um de quatro fatores de risco convencionais
(HAS, DM, TG e DLP) estava presente em 84,6% das mulheres e em 80,6% dos homens. Nossos resultados também são parecidos aos encontrados por Greenland e col
14
. Estes autores observaram que exposição a pelo menos um dos fatores de risco maiores (HAS, DM, TBG e
DLP) é bastante comum antes de eventos coronarianos
fatais e não-fatais, ocorrendo de 87 a 100% dos eventos
fatais e de 87 a 96% dos infartos agudos do miocárdio
não-fatais em homens entre 40 e 59 anos de idade.
O grupo era composto por 429 homens (71%) e 175
mulheres (29%), com idade de 62±9,4 anos (29 a 86 anos).
Cerca de 97,5% eram portadores de doença multivascular
ou lesão do tronco da coronária esquerda.
Segundo alguns autores, pacientes acima dos 70
anos de idade têm menor proporção de FAT em relação
aos mais jovens 13-14. Observamos que, mesmo acima
daquela idade, há uma proporção elevada de pacientes
com pelo menos um FAT (94,0%). Embora não haja significado estatístico, em razão do pequeno número de pacientes sem FAT (n=22), a idade deles é um pouco maior do
que a dos pacientes com FAT (64±9,7 vs 61,8±9,4
p=0,208). De acordo com o estudo de Framingham 7, a
idade aumenta o risco absoluto de DAC independentemente dos FAT, o que poderia explicar a presença da doença em nossos pacientes sem FAT.
Os dados contínuos foram apresentados pela média e um desvio-padrão e os dados categóricos, como
percentagens. As freqüências foram analisadas pelo teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher. e as comparações entre os dados contínuos pelo teste t de Student
ou a análise da variância (ANOVA). O nível de significância
aceito foi de 5%.
Resultados.
Cerca de 582 pacientes (96,4%) apresentavam
pelo menos um FAT. A figura 1 mostra a distribuição
percentual dos FAT entre os pacientes. Os 22 pacientes
(3,6%) que não apresentavam nenhum dos FAT eram
mais velhos do que os demais (64,4±9,7 vs 61,8±9,3 anos;
p=0,208), mas sem alcançar significância estatística. A
figura 2 mostra que as mulheres apresentavam igual
percentual de FAT em relação aos homens, no entanto
mais mulheres apresentavam dois ou mais FAT do que
os homens (83,4% vs 73,2%, respectivamente; p=0.008;
OR=1,84; IC95%=1,17 a 2,89).
De acordo com nossos dados, o TBG e a HFA têm
papel importante no desenvolvimento da DAC prematura,
isto é, abaixo dos 50 anos, como pode ser observado na
tabela 1. No entanto, essa influência é dependente do
sexo, isto é, nos homens é nítida a influência de ambos
os fatores; nas mulheres, entretanto, apenas o TBG tem
influência (tabela 3). Khot e col 13 também observaram
que o TBG estava relacionado com a DAC prematura em
ambos os sexos. Também observaram que, nas mulheres, também o DM influenciava o aparecimento de DAC
prematura. Na nossa casuística, o DM manteve-se em
proporções semelhantes em todas as faixas etárias e de
maneira similar em ambos os sexos.
A figura 3 mostra que os FAT diminuem com o aumento da idade, mas esse fato não é estatisticamente
significativo (p=0,556).
Como pode ser visto na figura 4, HAS estava presente em 485 (80,3%), DLP em 374 casos (57,5%), HFA em
239 (39,6%), DM em 196 (22,5%) e TBG em 124 (20,5%).
A proporção de mulheres com HAS (89,1% vs 76,7%;
p<0.0001) era significativamente maior do que de homens,
enquanto o tabagismo era mais freqüente entre os homens (23,3% vs 13,7%; p=0,008). Os demais FAT foram
encontrados em iguais proporções entre ambos os sexos. Na tabela 1, observa-se que a proporção de pacientes com TBG (p<0,0001) e com HFA (p<0,0001) diminui à
medida que a faixa etária aumenta. Esse comportamento
não é uniforme entre os sexos. Nos homens, o comportamento é semelhante tanto para o TBG quanto para HFA;
nas mulheres, no entanto, ele é observado apenas no
TBG (tabela 2).
Observamos que, diferentemente de outros estudos
, a proporção de FAT foi igual entre os homens e mulheres. É possível que a elegibilidade para a cirurgia de
revascularização tenha exercido papel importante na nãodiferenciação entre os sexos, em nosso estudo. Entretanto, ao analisarmos cada um dos FAT isoladamente, a proporção de HAS foi maior nas mulheres e de TBG maior
nos homens (tabela 2), como observado em outros estudos 13.
13
A observação de que os pacientes mais idosos, ou
seja, acima dos 70 anos, apresentam proporções de FAT
elevados – em torno de 94% – faz supor que também
nessa faixa etária os FAT têm bastante influência no desenvolvimento da DAC e que, portanto, esses indivíduos
devem ter a mesma atenção que os mais jovens na correção desses fatores.
14
Editorial Laranjeiras
A assertiva de que cerca de 50% dos pacientes com
DAC não apresentam FAT não encontra respaldo em nossas observações. Segundo Magnus e col 15 há falta de
acurácia na interpretação dos dados primários referendados para dar suporte àquela assertiva. Na verdade, pacientes sem os tradicionais FAT estão menos propensos a
desenvolver DAC 16-19. Além disso, não há evidência conclusiva corrente de que os fatores de risco não-convencionais sejam marcadores de risco superiores aos fatores
de risco convencionais 20-21.
Artigos Originais
Figura 2 – Distribuição do número de FAT de acordo
com o sexo
Nosso estudo tem limitações. Talvez a mais importante seja a ausência de um grupo controle, isto é, sem
DAC comprovada, com igual número de homens e mulheres e de mesma faixa etária, para afastar a possibilidade de um epifenômeno ambiental ou comportamental na
incidência dos FAT. No entanto, se confrontarmos nossos
dados com os relatados sobre a prevalência dos fatores
de risco na população brasileira, poderemos notar que os
índices de FAT aqui observados são superiores aos da
população em geral. Desse modo, no Brasil, de acordo
com estudos transversais realizados no estado do Rio de
Janeiro e em São Paulo, a estimativa da prevalência de
HAS na população é de 30 e 25%, respectivamente 22.
Ainda mais, a prevalência de DM, ajustada pela idade foi
de 7,6% e, em estudo envolvendo 81.262 indivíduos na
Campanha Nacional de Alerta sobre Colesterol Elevado,
verificou-se que nenhum fator de risco convencional foi
detectado em 39%, um fator em 36% e dois ou mais fatores em 34% desses indivíduos. Verificou-se, também, que
cerca de 40% deles apresentavam níveis de colesterol
total maior do que 200mg/dl 23.
Figura 3 – Distribuição de pelo menos um FAT de
acordo com a faixa etária
Nossa análise se restringe a uma população de
pacientes que apresentava grave comprometimento arterial coronariano, com indicação de cirurgia de
revascularização. Desse modo, não sabemos se em outros grupos de pacientes com DAC se encontrará a mesma prevalência de FAT.
Faixa etária em anos (p=0,556)
Em conclusão, podemos afirmar que, em pacientes
com DAC comprovada e indicação para cirurgia de
revascularização miocárdica, a prevalência de fatores de
risco convencionais é alta e se contrapõe à crença vigente.
Figura 4 – Distribuição da hipertensão arterial
sistêmica (HAS), dislipidemia (DLP), história familiar de
DAC (HFA), diabetes mellitus (DM) e tabagismo (TBG) entre
homens e mulheres (vide texto).
Figura 1 – Distribuição percentual do número de FAT
nos pacientes estudados
15
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Tabela 1
Distribuição dos fatores de risco de acordo com a
faixa etária
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(*)= p<0,0001; HAS=hipertensão arterial sistêmica; DLP=dislipidemia;
HFA=história familiar de doença arterial coronariana; DM=diabetes
mellitus; TBG=tabagismo corrente.
Tabela 2 – Distribuição dos fatores de risco por faixa
etária e sexo
H= homens; M= mulheres; demais abreviaturas como na tabela 1.
16
Editorial Laranjeiras
Artigos Originais
UTILIZAÇÃO DE ENXERTOS DE MAMÁRIA BOVINA
PRESERVADA EM SHUNTS SISTÊMICO-PULMONARES
Rio de Janeiro - RJ
José Alberto Caliani*, Pascal Vouhé, Rodrigo Minatti Barbosa
José Augusto Toledo Marinho e Luiz Carlos Simões.
Resumo
experimented with a vascular graft.
Portadores de cardiopatias congênitas com baixo
fluxo pulmonar, freqüentemente, necessitam de shunt
sistêmico-pulmonar. Este é usualmente confeccionado
com politetrafluoroetileno (PTFE). Entretanto, este material pode apresentar inconvenientes: porosidade com perda serosa, permeabilidade tardia insatisfatória nos enxertos de 4mm, possibilidade de distorções nos ramos
pulmonares de pequeno calibre, no caso dos enxertos de
5mm. Objetivando reduzir esses inconvenientes, decidimos testar outro tipo de enxerto vascular.
Since March 1998, 68 cyanotic patients underwent
81 systemic-pulmonary shunts using a preserved bovine
internal mammary artery.
The overall probability of adequate shunt function was
74+/-7% in one year. Univariate analysis revealed that central shunt was a risk factor predictive of early failure
(probability of adequate function after central shunt = 31+/
-18%, after lateral shunt = 80+/-6%; p<0,001). Among lateral shunts, size of grafts was a predictive risk factor
(probability of adequate function with 3mm grafts = 75+/9%, with 4mm grafts = 87+/-8% ; p<0,005).
Desde março de 1998, 68 pacientes cianóticos foram submetidos a 81 shunts sistêmico-pulmonares utilizando enxertos de mamária bovina. Em um ano de seguimento, a permeabilidade do foi de 74+/-7%. Análise estatística revelou que o shunt central foi um fator de risco
preditivo na falência precoce (probabilidade de adequação do central = 31+/-18%, periférico = 80 +/-6% ; p<0,001).
Entre os shunts periféricos, o diâmetro do enxerto foi um
fator de risco preditivo (probabilidade de adequação do
enxerto de 3mm = 75+/-9%; do enxerto de 4mm = 87+/-8%
; p<0,05)
Conclusion: 1) central shunts entail a high rate of
failure but involve high risk patients (hypoplastic pulmonary
artery); 2) adequate palliation is obtained with lateral
shunts, but 4mm grafts may be superior to the 3mm grafts;
3) complications related to the use of PTFE grafts are
probably avoided. Although further experience is mandatory,
the preserved bovine internal mammary artery may be the
conduit of choice for shunting procedures in infants and
children.
Conclusão: 1) shunts centrais apresentam um
percentual elevado de falências, mas envolvem pacientes
de alto risco (hipoplasia de ramos pulmonares); 2) melhores resultados são obtidos com shunts periféricos,
sendo os enxertos de 4mm superiores aos de 3mm; 3) as
complicações relatadas com o PTFE foram, provavelmente, evitadas. Um estudo a longo prazo é necessário, mas
podemos afirmar que o enxerto de mamária bovina pode
ser utilizado como conduto de escolha nos shunts paliativos em crianças e lactentes.
Key-words: systemic-pulmonary shunt – bovine
mammary artery
INTRODUÇÃO
Os recentes progressos aportados à cirurgia cardíaca pediátrica permitem a correção completa de muitas
cardiopatias congênitas com baixo fluxo pulmonar. Porém,
um número considerável de pacientes ainda requer procedimentos paliativos para aumentar o fluxo pulmonar na
infância.
Palavras-chave: shunt sistêmico-pulmonar e mamária bovina
A operação de Blalock-Taussig clássica 1 ou o shunt
central usando enxerto de politetrafluoroetileno (PTFE) 2
tem sido recomendada. Entretanto, o shunt de BlalockTaussig modificado usando PTFE é, usualmente, considerado como procedimento de escolha 3,7.
Abstract
Systemic-Pulmonary Shunts Using a Preserved
Bovine Internal Mammary Artery
A utilização de enxertos de PTFE pode apresentar
alguns inconvenientes: 1) transudação serosa através da
microporosidade 8,9; 2) baixa permeabilidade dos enxertos de 4mm a longo prazo 1,3,4; e 3) possível ocorrência de
significativa taxa de distorções pulmonares induzida pelos enxertos de 5mm quando anastomosados sobre ramos pulmonares 5.
Patients with congenital heart disease and reduced
pulmonary blood flow often require a systemic-pulmonary
shunt during infancy. These shunts are usually constructed
using a polytetrafluoroethylene (PTFE) graft. This material
may be less than optimal: serous leakage is not
uncommon, late patency of 4mm grafts is unsatisfactory,
and 5mm grafts may cause distortion of small pulmonary
arteries. In an attempt to reduce these drawbacks, we have
Objetivando reduzir ou eliminar esses problemas,
*Dr. José Alberto Caliani: cirurgião cardíaco pediátrico do INCL – RJ – Brasil
Dr. Pascal Vouhé: chefe do serviço de cirurgia cardíaca pediátrica do Hospital Necker Enfants Malades – Paris – França
Dr. Rodrigo Minatti Barbosa: cirurgião cardíaco do INCL – RJ – Brasil
Dr. José Augusto Toledo Marinho: cirurgião cardíaco do INCL – RJ – Brasil
Dr. Luiz Carlos Simões – chefe do serviço de cardiologia pediátrica do INCL – RJ – Brasil
Endereço para correspondência : José Alberto Caliani
Rua das Laranjeiras, 374 Rio de Janeiro – cep 22240-002 RJ / Brasil
Email: [email protected]
17
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
decidimos utilizar um enxerto biológico na confecção de
shunts centrais ou Blalock-Taussig modificados em uma
série consecutiva de 68 pacientes.
vio padrão (dp) e percentuais com intervalos de confiança
(IC) de 70%. O teste de significância foi usado para avaliar
a adequação do e estimar a importância dos seguintes
fatores de risco: idade, tipo de cardiopatia,, tipo do (central, periférico) e diâmetro do enxerto (3 ou 4mm). Os fatores de risco foram estudados segundo seus respectivos
efeitos, utilizando-se o teste do log-rank e foram também
graficamente estruturados com métodos de estimação
de Kaplan e Meier. Os testes de Breslow e de Mantel-Cox
foram usados para comparar as curvas atuariais no seguimento dos pacientes.
CASUÍSTICA E MÉTODOS
Entre março de 1999 e dezembro de 2001, no Hospital Necker Enfants Malades (Universidade de Paris, França) 68 crianças portadoras de cardiopatias congênitas
cianóticas e baixo fluxo pulmonar foram submetidas a 81
shunts sistemo-pulmonares utilizando mamária bovina
preservada em solução de glutaraldeído. Havia 37 do sexo
masculino e 31 do sexo feminino. A média de idade foi de
2 meses. Quarenta e quatro (65%) crianças tinham idade
inferior a 3 meses e 33 (49%), menos de 1 mês de idade.
Seis crianças haviam sido previamente beneficiadas com
shunts sistemo-pulmonares com enxerto de PTFE (2
shunts centrais e 4 Blalock-Taussig modificados).
RESULTADOS
Ocorreram 4 óbitos hospitalares (6% IC =3%-10%).
Três deles (4% IC = 2%-8%) estavam relacionados ao
shunt; dois ocorreram após shunts centrais. Um neonato
de 15 dias, portador de atresia pulmonar com comunicação interventricular (CIV) e ramos pulmonares
hipoplásicos, faleceu de insuficiência cardíaca e edema
pulmonar, provavelmente devido a um fluxo pulmonar excessivo provocado por um enxerto de 3mm. Um lactente
de um mês, portador de atresia pulmonar com CIV, faleceu com cianose crescente: o enxerto de 3mm apresentava-se obstruído na necropsia. Um caso de endocardite
bacteriana ocorreu, 3 semanas após a cirurgia, em um
lactente de três meses, que foi a óbito com hemorragia
importante, a despeito da intervenção imediata: o enxerto
estava infectado. O quarto óbito aconteceu devido a uma
infeção pulmonar fulminante.
As cardiopatias foram divididas em quatro categorias (tabela 1).
Oito shunts centrais foram confeccionados entre a
aorta ascendente e o tronco pulmonar (em 6 pacientes foi
usado enxerto de 3mm e, em dois, enxertos de 4mm).
Todos esses pacientes apresentavam hipoplasia severa
de ramos pulmonares (2mm em 6 pacientes e 3mm em
2).
Setenta e três Blalock-Taussig modificados foram
realizados (35 com enxerto de 3mm e 38 com enxerto de
4mm) entre uma artéria sistêmica (subclávia em 48 casos, tronco inominado em 16 e aorta descendente em 9)
e um dos ramos pulmonares (ramo pulmonar direito em
52 casos, esquerdo em 21). O calibre dos ramos pulmonares encontra-se na tabela 2.
Ocorreram 3 óbitos tardios (5% CL = 2%-9%). Nenhum deles estava relacionado ao shunt. Uma criança
portadora de atresia tricúspide e atresia pulmonar faleceu
subitamente 2 meses após a intervenção: o shunt estava
permeável na necropsia. Um paciente faleceu de infeção
pulmonar 6 meses após a cirurgia: o shunt estava permeável na necropsia. Uma criança, portadora de atresia pulmonar com CIV e hipoplasia extrema dos ramos pulmonares, apresentou oclusão do shunt um mês após a operação. Uma reoperação foi realizada, mas o paciente faleceu 3 meses depois (Figura 1).
Quatro pacientes foram operados com circulação
extracorpórea. Alguns procedimentos concomitantes foram incluídos: valvotomia pulmonar (6 pacientes); alargamento da via de saída do ventrículo direito (2 pacientes);
ligadura de colaterais aorto-pulmonares (1); e desmanche de central de PTFE (1 paciente).
Durante as cirurgias, os enxertos de mamária bovina foram lavados com solução de heparina, sendo que os
pacientes permaneceram heparinizados por um período
de 3 a 5 dias. Na seqüência, terapia com antiagregantes
plaquetários foi instituída.
Foram realizados estudos hemodinâmicos em 16
pacientes em um período variável de 8 dias a 11 meses
(média 5 meses) após a cirurgia. Havia discreta estenose
de ramo pulmonar em um caso.
O seguimento dos pacientes foi concluído integralmente. As crianças não acompanhadas nesses dois hospitais foram contatadas através de seus médicos referentes. O seguimento variou de 1 a 22 meses, com média de
8,4 meses para um total de 572 pacientes/mês.
Quinze dos 81 shunts (18,5% IC= 14-24%) estão incluídos nos critérios de falência previamente descritos:
óbito relacionado ao (3), oclusão (2) e insuficiência (10). A
probabilidade global da adequação do foi de 74+/-7%
após um ano de seguimento.
A adequação do shunt foi controlada clinicamente
(ausculta, cianose), com exames laboratoriais (saturação
arterial, hemoglobina e eco-dopller).
A significância demonstrou que o shunt central é um
importante fator de risco preditivo de falência precoce do
shunt. A taxa de permeabilidade a um ano de distância foi
de 31+/-18% para os shunts centrais e de 80+/-6% para
os periféricos (p<0,001).
A falência do foi definida quando ocorreram as seguintes situações: 1) óbito relacionado com o ; 2) oclusão
total; 3) cianose progressiva necessitando de um segundo ou correção total não eletiva (insuficiência do shunt).
A taxa de falência do central foi de 62,5% (IC = 38%
- 83%) (figura 2). As causas destas falências foram:
hiperfluxo pulmonar (1), oclusão (1) e insuficiência do (3).
Os shunts centrais foram realizados em 4 pacientes portadores de atresia pulmonar com CIV e extrema hipoplasia
pulmonar (ramos pulmonares com 2mm de diâmetro), e
em um recém-nascido portador de atresia pulmonar com
septo intacto e hipoplasia de ramos pulmonares (3 mm).
Quando foi necessário um segundo shunt do lado
oposto, em razão de estenose ou interrupção de ramos
pulmonares, não consideramos como ter havido falência
do primeiro.
Análise estatística
Análise atuarial foi apresentada como média +/- des-
A taxa de falência com a cirurgia de Blalock-Taussig
18
Editorial Laranjeiras
modificado foi de 14% (IC = 9% - 9%). As causas de falência foram: endocardite (1), oclusão (2) e insuficiência do
shunt (7). A significação foi usada para calcular a importância dos seguintes fatores de risco: idade, tipo de
cardiopatia e diâmetro do enxerto (Tabela 3). A atresia
pulmonar com septo intacto foi fator de risco nos casos de
falência precoce; igualmente o uso do enxerto de mamária bovina de 3mm pode ser considerado um fator preditivo
(p= 0,036 com teste de Breslow e p= 0,057 com teste de
Mantel-Cox).
Artigos Originais
casos). Entretanto, a permeabilidade é baixa quando usamos enxertos de 3mm. Dessa maneira, é sempre desejável usar, quando encontramos ramos pulmonares
satisfatórios, o enxerto de mamária bovina de 4mm.
Houve um caso de endocardite bacteriana no
enxerto no qual a antibioticoterapia foi ineficiente. A supressão do foi realizada em dois casos durante a correção anatômica das cardiopatias dos pacientes. Esse procedimento foi realizado sem dificuldades técnicas, mas
há que se ressaltar a fragilidade da parede do enxerto em
ambos os casos.
Nove shunts secundários foram realizados após a
primeira cirurgia. Um paciente aguarda ulterior intervenção por falência do shunt.
CONCLUSÃO
Um grupo adicional de cinco pacientes se beneficiou de um segundo , mas eles apresentavam
estenose ou interrupção de ramos pulmonares. Dois pacientes foram submetidos à correção anatômica total.
Uma casuística mais ampla com seguimento a longo prazo será, sem duvida, necessária para se determinar a incidência exata de distorções pulmonares e adequação do . Contudo, acreditamos que o enxerto de mamária bovina pode tornar-se um conduto de escolha na
cirurgia de Blalock-Taussig modificado em lactentes e crianças.
COMENTÁRIOS
Em nossa conduta atual, realizamos shunts centrais
somente nos casos de hipoplasia severa de ramos pulmonares, nos quais a confecção de um periférico é de
difícil execução e a permeabilidade a longo prazo aleatória. Em geral, esses casos são constituídos pela atresia
pulmonar com CIV. O prognóstico reservado desses pacientes já está bem documentado. Os resultados
insatisfatórios obtidos nessa série com shunts centrais
estão intimamente ligados à própria gravidade das
cardiopatias.
Nos pacientes com ramos pulmonares de calibre
normal, os shunts periféricos representam a escolha terapêutica adequada: Blalock-Taussig clássico ou modificado usando enxerto de PTFE. Em razão da alta
permeabilidade a longo prazo e baixa incidência de
distorções pulmonares, a cirurgia de Blalock-Taussig
modificado tem sido preconizada, sobretudo em recémnascidos e crianças. Esses shunts são confeccionados
com enxertos de PTFE, de paredes finas e diâmetro pequeno (4 ou 5mm). Resultados satisfatórios são usualmente obtidos 3,7, entretanto a utilização do PTFE pode
apresentar inconvenientes.
A transudação serosa necessitando o desmanche
da operação não é incomum 8,9. A durabilidade do shunt e
a permeabilidade a longo prazo são insatisfatórias com
enxertos de 4mm 1,4. Além disso, quando um enxerto de
5mm é anastomosado sobre pequenos ramos pulmonares, há um incremento no risco de haver distorção pulmonar, podendo comprometer a futura correção anatômica
4,5
.
Por essas razões, o enxerto de PTFE pode ser questionado sobre a otimização do material a ser utilizado.
Assim sendo, a possibilidade de se utilizar um material
biológico de pequeno calibre deve ser avaliada.
Com o enxerto de mamária bovina, o inconveniente
da transudação serosa é evitado e, malgrado o aspecto
ainda preliminar de nossa série, a incidência de distorção
pulmonar é baixa (apenas um caso de estenose discreta
em 16 angiografias realizadas). Isto é, provavelmente,
devido ao pequeno calibre do enxerto, bem como à sua
flexibilidade.
A taxa global de permeabilidade a um ano de distância é satisfatória (80+/- 6%). A oclusão total é rara (dois
19
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
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Editorial Laranjeiras
Artigos Originais
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21
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
TROMBOSE DE PRÓTESES VALVARES NO INCL:
Um Estudo Observacional de 4 Anos
Rio de Janeiro - RJ
Clara Weksler *, Wilma Felix Golebiovski ** , Mario Wagner **, Jacob Fucks **, Renato Faria **, Márcia Barbeito **
Alexandre Sahate Silva ***, Andre Casarsa Marques ***, Áureo do Carmo Filho ***,
Bruno Costa do Nascimento ***, Vitor Agueda Salles ***
RESUMO
A ocorrência de trombose valvar cardíaca é uma complicação grave com incidência variando de 0,5 a 6% por
pacientes/ano. A trombólise é uma alternativa terapêutica
eficaz, mas ainda há controvérsias quanto à sua utilização, quando comparada à cirurgia.
INTRODUÇÃO
O acompanhamento clínico de pacientes com
próteses valvares cardíacas ainda é um desafio para os
cardiologistas. Apesar de todo o avanço na tecnologia de
confecção das próteses e do advento da anticoagulação,
a trombose valvar cardíaca ainda é uma complicação grave, embora relativamente incomum. Sua incidência varia
de 0,5% a 6% por paciente por ano em próteses mitrais e
aórticas, a cerca de 20% em próteses tricúspides, dependendo do grau de anticoagulação e do desenho da
prótese 1-2.
O objetivo deste estudo foi analisar nossa experiência no tratamento dos pacientes com trombose de prótese
valvar cardíaca (TPVC). Entre jan/2000 e jan/2004, recebemos 15 pacientes com diagnóstico de TPVC com idade
média de 34±17,4 anos, 67% do sexo feminino, 80% com
trombose de prótese valvar mitral mecânica. Do total de
pacientes, 46,67% receberam tratamento trombolítico com
estreptoquinase, 33,33% foram à cirurgia para troca valvar
e 33,33% receberam heparina não-fracionada. Houve 20%
de óbitos. Esses resultados são semelhantes aos estudos recentes publicados na literatura e, apesar do desafio constante no manuseio desses pacientes, conseguimos oferecer recursos propedêuticos e terapêuticos adequados e similares às instituições terciárias de outros
países.
Ainda há muita controvérsia no tratamento ótimo de
pacientes com trombose protética obstrutiva. Desde a
década de 70, quando Luluaga e cols 3 Baille e cols 4 e
Witchitz e cols 5 descreveram a utilização bem-sucedida
de trombolíticos nessa situação, essa terapia tem sido
amplamente aplicada como alternativa à cirurgia. Porém,
ainda há dados conflitantes na literatura sobre a eficácia
da trombólise quando comparada ao tratamento cirúrgico
6-13
.
Palavra-chave: Trombose valvar, terapia trombolítica,
complicação
A anticoagulação inadequada dos portadores de
próteses valvares cardíacas ainda é um problema bastante freqüente, em virtude das dificuldades tanto na aderência do paciente ao tratamento quanto no alcance de
um valor alvo de anticoagulação eficaz 12.
ABSTRACT
Cardiac valvular thrombrosis is a serious
complication with incidence varying from 0,5 to 6% patient
per year. Thrombolytic therapy is an effective alternative for
treatment, but its adoption as a substitute for surgery is
still controversial.
O propósito deste trabalho é analisar nossa experiência no tratamento de trombose de próteses valvares
cardíacas (TPVC) durante um período de cerca de 4 anos,
bem como os fatores associados à ocorrência dessa patologia.
The objective of this study is to analyze our experience
on the treatment of patients with valvular thrombosis from
January/2000 to January/2004. Fifteen patients were
included in this study, mean age = 34+/-17 years, 67%
female and 80% with mitral thrombosis. A total of 46,67%
of the patients received thrombolytic therapy (streptokinase);
33,33% were submitted to surgery; 33,33% used just
heparin during the in-hospital period; and 20% died.
MATERIAIS E MÉTODOS
Estudo retrospectivo observacional foi realizado em
15 pacientes com diagnóstico de TPVC, admitidos em
nosso hospital no período de janeiro de 2000 a janeiro de
2004. O diagnóstico foi feito por uma combinação de dados clínicos (sintomas de insuficiência cardíaca, diminuição ou abolição do ruído protético), ecocardiográficos (gradiente transprotético elevado, mobilidade comprometida,
identificação de trombo obstruindo o fluxo transprotético)
e fluoroscópicos (movimento anormal de discos
protéticos).
These results are similar to previously published
data. Despite the difficulties found in treating such patients,
we managed to overcome the social and financial problems
by using adequate and modern resources of diagnosis
and treatment, becoming up-to-date with similar healthcare
institutions worldwide.
Key-Words: Valvular thrombosis, thrombolytic theraty,
complication
Revisando criteriosamente os prontuários desses
* Chefe do Departamento de Doenças Orovalvares do Instituto
Nacional de Cardiologia de Laranjeiras
** Médico(a) do Departamento de Doenças Orovalvares do Instituto
Nacional de Cardiologia de Laranjeiras
*** Médico Residente em Cardiologia do Instituto Nacional de
Cardiologia de Laranjeiras
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Artigos Originais
pacientes, foram recolhidos dados demográficos, da história clínica, do exame físico, de exames de imagem e da
terapêutica utilizada e seus resultados, realizados durante a internação hospitalar por TPVC.
Definimos como INR adequado aquele >2.5 e <3.5 para próteses valvares mecânicas e INR entre 2.0 e 2.5 para
pacientes portadores de próteses biológicas e fibrilação atrial ou aqueles que se encontram no período inicial do
implante da prótese biológica (até 3 meses). Consideramos “não- aderência” o não-comparecimento a consultas
médicas para ajuste de INR por período igual ou superior a 2 meses. “Refratariedade” foi definido como INR inadequado, mesmo com ajustes regulares na dose de anticoagulante pelo médico assistente.
RESULTADOS
Dentre os pacientes do estudo, a idade variou entre 8 e 62 anos (34±17,4 anos); houve predomínio do sexo
feminino (67%), as próteses mais comumente trombosadas eram mecânicas (80%) e a posição mais comum foi a
mitral (80%). Os pacientes apresentaram trombose protética a partir do 3º mês pós-operatório, mas a média de tempo
da ocorrência de TPVC após a cirurgia foi de 49,89±40,49 meses (tabela I). A anticoagulação não estava adequada em
67% dos pacientes, sendo que o principal motivo para tal fato foi a não aderência do paciente ao tratamento (72,73%
dos pacientes com INR não-ótimos).
Quanto à sintomatologia, observou-se que dispnéia foi o sintoma mais comum (86,7%), seguido por dor torácica,
choque e AVC tromboembólico (13,33%). Dos pacientes, 80% encontravam-se em insuficiência cardíaca grave à
admissão, NYHA III ou IV (tabela II).
O tempo de internação variou entre 3 e 104 dias (35,07±27,11 dias). Quanto ao tratamento inicial, 46,67% dos
pacientes receberam tratamento trombolítico com streptoquinase em doses variáveis, sendo que 28,57% desses
pacientesforam encaminhados à cirurgia de urgência por fracasso da trombólise (13,33% do total); 20% foram submetidos à cirurgia para troca valvar como primeira opção terapêutica; em 33,33%. dos pacientes foi utilizada anticoagulação
com heparina não-fracionada em doses terapêuticas. Ocorreram 3 óbitos (20%).
23
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A nossa população estudada é mais jovem, reflexo
da principal etiologia de patologia orovalvar em nosso
meio: a febre reumática. Entretanto, apesar da média de
idade ser menor, 80% dos pacientes encontravam-se em
classe funcional III ou IV. Inclusão nessa classe funcional
e dispnéia como sintoma mais freqüente são dados compatíveis com a literatura 7 .
Inúmeros trabalhos citam a cirurgia como primeira
opção para trombose de prótese, porém a terapia
trombolítica vem ganhando notoriedade em tromboses
do lado direito em pacientes críticos e naqueles em que
há uma contra-indicação formal à cirurgia.
Ainda existe a necessidade de trabalhos comparativos no que tange às diversas drogas fibrinolíticas e às
precisas indicações do uso de tais drogas no manejo da
trombose de prótese valvar.
CONCLUSÃO
Como avaliado neste estudo, a trombose de valva
protética é um evento associado a altas taxas de
morbimortalidade e requer não só diagnóstico precoce
como também terapêutica agressiva e individualizada. Em
nosso meio, onde se observa uma população mais jovem e de baixo nível socio-econômico, o acompanhamento
clínico ambulatorial criterioso é fundamental, inclusive com
o fornecimento de medicação anticoagulante própria.
DISCUSSÃO
A trombose de válvula protética é uma complicação
grave, que requer terapêutica agressiva e imediata. Nos
últimos anos, tem-se observado indicação cada vez mais
freqüente de cirurgia como terapêutica primária nesses
casos. O diagnóstico precoce da TPVC é decisivo para a
terapêutica adequada, visto que tal evento é uma complicação grave e de alta mortalidade 7.
Apesar dos problemas inerentes à nossa sociedade, conseguimos oferecer recursos diagnósticos, particularmente ecocardiograma transesofágico, e obtivemos,
com a terapêutica empregada, resultados compatíveis
com a literatura mundial.
Nosso estudo mostra os resultados de 15 pacientes admitidos no Instituto Nacional de Cardiologia nos
últimos 4 anos e que tiveram terapêutica diversa no tratamento de tal complicação. Como já mencionado nos resultados, a valva mitral foi a mais freqüentemente acometida, assim como as valvas mecânicas também foram
mais afetadas que as biológicas. Esses dados são compatíveis com a literatura disponível e indicam que o fluxo
sanguíneo de menor velocidade através da válvula mitral,
quando comparada à valva aórtica, pode ser responsável
pela maior incidência de trombose protética. Fato relevante observado em nosso estudo foi a inadequação da terapêutica anticoagulante em 67% dos pacientes à admissão no INCL, o que chama atenção para a necessidade
do controle rigoroso dos parâmetros de coagulação em
nível ambulatorial. O tempo entre implantação da prótese
e ocorrência da TVPM foi menor em relação à literatura,
talvez traduzindo as dificuldades socioculturais da nossa
população, que interferem na anticoagulação adequada .
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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valvular heart disease. Circulation 1998;98:1949-84.
A terapêutica trombolítica prevaleceu entre nossos
pacientes, provavelmente pela não disponibilidade de
equipe cirúrgica de urgência, bem como decorrente dos
melhores resultados apresentados por essa terapia nos
últimos trabalhos, de uma melhor seleção dos pacientes
e de maiores recursos como ETE. Ressalta-se, porém, o
uso de heparina como única opção em 33% dos pacientes. A droga mais utilizada foi a estreptoquinase e 28%
dos que a utilizaram como primeira opção foram encaminhadas à cirurgia em um segundo momento, o que denota falha terapêutica primária. A mortalidade de 20 % aproxima-se da observada por Roudaut e cols 7 que relataram
12% de mortalidade em um estudo recentemente publicado com 127 casos.
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VALVOPLASTIA MITRAL PERCUTÂNEA
Rio de Janeiro - RJ
Paulo Eduardo Kyburz*, Paulo Sergio de Oliveira**, Marta Labrunie*, Norival Romão*, Sergio Leandro*, Waldyr
Malheiros*, Marcelo Lemos*, André Pessanha* , Clara Wecksler***, Maria da Conceição Alves*, Marcio Macri*
Resumo:
Foi realizada valvoplastia mitral percutânea (VMP)
em 213 pacientes, sendo 205 pela técnica de balão único,
3 pela técnica de Inoue e 5 pela técnica do balão Multitrack.
Eram do sexo feminino 88,3% dos pacientes. A idade
média dos pacientes foi 36±11 anos. Cerca de 8% dos
pacientes já havia sido submetido a valvoplastia mitral
cirúrgica e 9,1% tratava-se de restenose pós valvoplastia
percutânea. Apresentavam ritmo sinusal ao eletrocardiograma
93,9% dos pacientes. Estavam em classe funcional III ou IV
70,4% e cerca de 82% apresentavam escore de Block até 8.
A área valvar mitral média prévia foi 0,76±0,19cm2 pelos
dados hemodinâmicos, e 0,85±0,17cm2 pela ecocardiografia.
O gradiente pré-procedimento era 22,1±6,7mmHg. O
gradiente pós foi 4,4±3,1mmHg e a área mitral média foi
2,24±0,40cm2. Obtivemos sucesso em 95,8% dos
pacientes. Um apresentou insuficiência mitral severa pós
procedimento, foi encaminhado para cirurgia e foi a óbito
por acidente cirúrgico. Dois pacientes apresentaram
perfuração do ventrículo esquerdo, sendo um tratado
cirurgicamente e o outro clinicamente, com sucesso em
ambos os casos.
No acompanhamento tardio 67,6% estão em
classe funcional I, 26,8% em classe funcional II e 5,6%
em classe IV.
Palavras - chave: Valvoplastia percutânea mitral,
escore de Block, Área valvar mitral.
Introdução:
A doença reumática é responsável por aproximadamente 30% das internações hospitalares de origem cardiovascular.
Apesar das medidas profiláticas, no Brasil ela ocupa o 12o
lugar em incidência, segundo Timerman 1. Em nosso país,
os gastos com a doença reumática cardíaca representam
um dos maiores custos para o sistema de Previdência, pois
tolhe o trabalho a indivíduos muito jovens e ocasiona múltiplas internações hospitalares e cirurgias cardíacas, que
correspondem a aproximadamente 30% das cirurgias realizadas no país.
A valvoplastia mitral percutânea (VMP) com balão surgiu como uma boa alternativa para o tratamento da estenose
mitral sintomática, como demonstrado por Charanjit & cols
2
. A experiência cirúrgica com técnicas para comissurotomia
mitral tanto aberta como fechada, usando valvulótomos ou
simplesmente os dedos para separar as comissuras fundidas, deu início ao desenvolvimento das técnicas percutâneas
com a dilatação mecânica da valva mitral, conforme as publicações de Cutler e Beck 3, Bayley e cols 4, e Harken e cols 5,
desde 1920. No início da década de 60, Brockenbrought e
cols 6 e, em 1966, Rashkind e cols 7 descreveram, respectivamente, a técnica de cateterização transeptal das cavidades esquerdas e a septostomia interatrial com balão.
Em 1982, Kam e cols 8 descreveram, pela primeira vez,
o uso de balão para o tratamento da estenose pulmonar em
crianças. Pepine e cols 9 reportaram, no mesmo ano, a realização de valvoplastia pulmonar percutânea num paciente
adulto. Em 1982, Inoue e cols 10 introduziram um novo cateter balão para VMP e, em 1984, publicaram seus primeiros
resultados 11..
ABSTRACT
Two hundred and thirteen patients were submited to
percutaneous mitral valvoplasty. 88,3% female. Medium age
was 36±11 years. 8% of patients had gone through surgical
mitral valvoplasty before, and 9,1% through percutaneous
mitral valvoplasty. Block score was up to 8 in 82% of patients.
Medium mitral valve area before the procedure was
0,76±0,19cm2 from hemodynamic dates and 0,85±0,17cm2
from ecocardiography.
Success was acchieved in 95,8% of the procedure.
One patient had severe left ventricular disfunction after the
procedure, and was sent to surgery, where he died from a
surgical intercorrence. Two patients had left ventricular
perforation. One of them was treated surgically and the
other clinically, with good result in both cases. The late
follow up shows 67,6% in class I (NYHA), 26,8% in class II
and 5,6% in class III.
Em 1985, Lock e cols 12 aplicaram a técnica do balão
único em 8 crianças e adolescentes com estenose mitral
sintomática. Palácios e cols 13 e Mckay e cols 14, em 1986,
utilizaram a técnica do balão para o tratamento de estenose
mitral calcificada em pacientes idosos, com sucesso.
Nesse mesmo ano, Al Zaibag e cols 15 publicaram os primeiros casos de valvoplastia mitral com duplo balão.
Em 1987, Peixoto 16 publicou os primeiros 6 casos
de valvoplastia mitral percutânea e, em 1994, Peixoto e
cols 17 publicaram os resultados de uma série maior de
casos.
Keywords: Percutaneous Mitral Valvoplasty, Block score,
mitral valve area.
Em 1986, Babic e cols 18 publicaram uma técnica
diferente para valvoplastia mitral, realizada de forma retrógrada, através da aorta. Essa técnica não teve muito sucesso e foi abandonada.
Uma importante contribuição foi a avaliação
ecocardiográfica da morfologia da válvula mitral, descrita
por Wilkins e cols 19. Nesse processo, são avaliadas qua-
* Médico do Serviço Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras
** Chefe do Serviço de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras
*** Chefe do Departamento de Doenças Orovalvares do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras
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tro características morfológicas da válvula mitral: mobilidade
dos folhetos, espessamento dos folhetos, calcificação valvar
e aparelho sub-valvar. São atribuídos valores de 0 a 4 para
cada uma dessas características, perfazendo um total de até
16 pontos.
esquerdo e faz-se a dilatação do septo interatrial com o bastão. Introduz-se, então, o cateter balão de Inoue, que é
posicionado no ventrículo esquerdo, e com sua insuflação e
tração, dilata-se a válvula mitral. Na técnica do duplo balão
Multitrack ou na do balão único Balt, coloca-se o cateter de
Berman no átrio esquerdo, insufla-se o pequeno balão e penetra-se no ventrículo esquerdo, introduzindo então o guia
extra-stiff 0,035’’. Através do guia, introduz-se o balão Balt,
quando pela técnica do balão único, ou os 2 balões, quando
pela técnica Multitrack, e, então, são feitas as insuflações para
abertura da válvula mitral.
Material e Método
Foram submetidos à valvoplastia mitral percutânea 213
pacientes, sendo 3 pela técnica de Inoue, 5 pela técnica do
duplo balão Multitrack e 205 pela técnica do balão único Balt.
Os pacientes, após avaliação clínica, foram submetidos ao procedimento de punção da artéria femoral esquerda
e da veia femoral direita. Foram introduzidos os cateteres de
Cournand, até o capilar pulmonar, e o cateter pig-tail, até o
ventrículo esquerdo, para se obter as medidas de pressão.
Foram colhidas amostras de sangue em artéria pulmonar e
aorta, antes e após o procedimento, para os cálculos de débito cardíaco pelo método de Fick.
Após a abertura da válvula mitral, realizam-se as medidas de pressão para análise do resultado. Faz-se uma injeção de contraste no ventrículo esquerdo para avaliação da
competência da válvula mitral.
Dos 213 pacientes submetidos à VMP, 88,3% eram do
sexo feminino e 4 estavam grávidas. A idade média foi 36±11
anos de idade. Nenhum paciente apresentava doença
coronária associada. Uma fração de 8% já havia sido submetida à comissurotomia mitral cirúrgica prévia e 9,1%, à
valvoplastia mitral percutânea prévia. Ao eletrocardiograma,
antes do procedimento, 93,9% apresentavam ritmo sinusal.
A classificação dos pacientes quanto à classe funcional, de
acordo com a New York Heart Association, encontra-se na
tabela 1:
Após o posicionamento do cateter pig-tail junto à válvula aórtica, introduz-se a bainha de Mullins até a veia cava
superior, e, em seu interior, coloca-se a agulha de
Brockenbrough. O conjunto é recuado até o septo interatrial
e se realiza a punção transeptal, atingindo assim o átrio
esquerdo. Só então são administradas 5000 UI de
heparina. Nesse momento, as técnicas se diferenciam.
Na técnica de Inoue, introduz-se, inicialmente, o guia no átrio
Tabela 1. Classe Funcional
Classe Funcional
I
1,6%
II
28,0%
III
60,2%
IV
10,2%
O escore ecocardiográfico de Wilkins-Block médio foi de 7,9±1,1 pontos, distribuídos conforme a tabela 2:
Tabela 2. Escore Ecocardiográfico
Escore
5
1,1%
6
7
12,8%
18,4%
8
39,7%
9
20,7%
10
6,7%
11
0,6%
O escore ecocardiográfico demonstrou um valor médio para a característica espessamento de 2,33±0,51 pontos;
para calcificação de 1,47±0,68; para mobilidade de 2,15±0,49; e para o aparelho sub-valvar de 2,00±0,67 pontos.
Esses valores mostram que o espessamento e a mobilidade valvar diminuídos foram os achados mais freqüentes.
Em dois pacientes, iniciamos o procedimento pela técnica do balão Balt e, por dificuldades técnicas, passamos
para a do Multitrack. Em um paciente, iniciamos pela técnica Multitrack e passamos para o balão Balt, também por
dificuldades técnicas.
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Resultados:
Obtivemos sucesso em 95,8% dos pacientes. Uma paciente apresentou insuficiência mitral severa após o
procedimento percutâneo e foi encaminhada para cirurgia de troca da válvula. Devido a acidente na cirurgia, foi a óbito
na sala de operação.
A área mitral média pré-procedimento, medida pela ecocardiografia, foi de 0,85±0,17cm2. O gradiente médio
entre o átrio esquerdo e o ventrículo esquerdo foi de 14,6±8,0mmHg e o gradiente telediastólico de 17,7±6,5mmHg. Os
valores hemodinâmicos pré e pós procedimento estão relacionados na tabela 3:
Tabela 3. Dados hemodinâmicos
Pré
Pós
p
Gradiente mitral telediastólico
22,1±6,7 mmHg
4,4±3,1 mmHg
<0,05
Pressão capilar Pulmonar
30,5±6,9 mmHg
15,6±4,9 mmHg
<0,05
Pressão artéria pulmonar
59,3±18,7 mmHg
45,3±12,7 mmHg
<0,05
Área valvar mitral
0,76±0,19 cm2
2,24±0,40 cm2
<0,05
Um fato já de conhecimento de todos é a discrepância da quantificação da regurgitação mitral quando avaliada
pela angiocardiografia e pela ecocardiografia. Naturalmente, a quantificação do refluxo mitral após o procedimento
também se mostrou discrepante nos nossos pacientes. Naqueles com leve ou nenhuma regurgitação, houve grande
discordância, porém o resultado foi semelhante nos casos de regurgitação moderada ou severa, não interferindo,
portanto, na avaliação global dos pacientes. Os dados da ecocardiografia e da angiocardiografia estão na tabela 4:
Tabela 4. Comparação ecocardiográfica e angiográfica da regurgitação mitral.
Insuficiência Mitral
Ecocardiografia
Angiocardiografia
Negativa
18,2 %
56,5 %
Leve
60,6 %
22,8 %
Moderada
14,1 %
12,0 %
7,1 %
8,7 %
Grave
As complicações que ocorreram durante a VMP e no pós operatório estão relacionadas na tabela 5.
Tabela 5. Complicações
Comunicação interatrial
1 caso
Endocardite bacteriana
1 caso
Insuficiência Mitral severa
3 casos
Perfuração do VE
2 casos
Pseudoaneurisma de artéria femoral
1 caso
Foi realizado acompanhamento clínico de 70 pacientes. A distribuição da classe funcional desses pacientes está
na tabela 6. A classe funcional média foi 1,38±0,5. O ecocardiograma tardio demonstrou uma área valvar média de
1,7±0,3cm2.
Tabela 6 . Evolução tardia
Classe Funcional
I
67,6 %
II
26,8 %
III
5,6 %
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Discussão
Indubitavelmente, a valvoplastia mitral percutânea foi
um avanço no tratamento da estenose mitral. Num país
como o nosso, que tem um elevado número de pacientes
com estenose mitral e dispõe de poucos recursos para a
área da saúde, temos uma preocupação em tentar diminuir os custos de procedimentos dispendiosos como a
VMP. No nosso serviço, demonstramos que a técnica do
balão único Balt é 10 vezes mais barata que a técnica de
Inoue.
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outcome and mechanism of dilatation. Br Heart J 1988; 60: 299.
Na evolução a longo prazo, observamos uma grande melhora clínica dos pacientes, caracterizada pela mudança da classe funcional, pois 70,4% estavam em classe funcional III/IV antes do procedimento e, após a VMP,
apenas 5,6% se encontrvam na classe funcional III e nenhum na classe IV. Esse dado evidencia a efetividade do
método.
A técnica com o balão Balt apresenta, a nosso ver,
duas limitações. Devemos evitar utilizá-la em pacientes
idosos pela fragilidade da parede do ventrículo esquerdo,
que se torna mais susceptível de perfuração, e nos pacientes que apresentam cavidade ventricular esquerda de
menor volume, o que dificulta a introdução do balão. Nesses dois casos, preferimos a técnica de Inoue.
Quase um terço dos nossos pacientes (28%) apresentavam escore de Wilkins-Block acima de 8, sendo
portanto desfavoráveis para a VMP e, mesmo assim, os
resultados foram excelentes.
Como complicações, tivemos 3 casos de
regurgitação mitral severa, correspondendo a 1,4%, que é
o índice esperado nesse procedimento. Desses 3 pacientes, um foi operado de urgência e faleceu num acidente
cirúrgico. Os outros dois foram operados com sucesso.
O pseudoaneurisma de artéria femoral, que ocorreu
num dos casos, foi solucionado apenas com compressão da artéria femoral.
Conclusão
A valvoplastia mitral percutânea é o tratamento de
escolha para a estenose mitral, principalmente nos casos de escore de Wilkins-Block até 8 pontos.
A VMP pela técnica do balão único Balt apresenta os
mesmos resultados da técnicas de Inoue e Multitrack, com
a grande vantagem de ter um preço dez vezes menor, num
país que sofre grande contenção com gastos em saúde.
BIBLIOGRAFIA
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A CORREÇÃO CIRÚRGICA PRECOCE DA ORIGEM
ANÔMALA DE UMA ARTÉRIA PULMONAR DA AORTA
ASCENDENTE PODE PREVENIR O DESENVOLVIMENTO
DA HIPERTENSÃO ARTERIAL PULMONAR?
RIO DE JANEIRO - RJ
Marco Aurélio Santos*, Vitor Manuel Pereira Azevedo**
Resumo
Conclusion – The surgical correction of the anomalous
origin of one pulmonary artery from the ascending aorta should
be done as soon as possible, mainly if there are no associate
defect forms. The surgical results are excellent and can prevent
a possible development of pulmonary vascular disease.
Objetivo – Enfatizar a possibilidade diagnóstica da origem anômala de uma artéria pulmonar da aorta ascendente,
em lactentes com quadro de insuficiência cardíaca clinicamente intratável e sem defeito estrutural intracardíaco.
Key words: anomalous pulmonary artery, obstructive
vascular pulmonary disease, acyanotic congenial
cardiopathy
Paciente e Método – Estudo retrospectivo em 4 lactentes
com insuficiência cardíaca intratável. Todos foram submetidos a estudo ecocardiográfico bidimensional com cortes
subcostal, supra-esternal e paraesternal. Em todos também
se realizou estudo hemodinâmico e angiocardiográfico na
projeção ântero-posterior.
Introdução:
A origem de uma artéria pulmonar (AP) da aorta ascendente é uma malformação rara, freqüentemente fatal
sem correção cirúrgica precoce. Sua primeira descrição
se deve a Fraentzel em 1868 1. A origem da AP direita ou,
menos freqüentemente, da AP esquerda da aorta ascendente ocorre na presença de válvula aórtica e pulmonar
separadas e deve ser diferenciada do truncus arteriosus,
nos quais as AP se originam da aorta ascendente, porém
em presença de uma válvula semilunar comum.
Resultados – Três dos quatro lactentes tinham a artéria pulmonar direita originando-se da aorta ascendente como
diagnóstico principal. No quarto paciente, a artéria pulmonar
esquerda originava-se da aorta ascendente associada à ampla comunicação interventricular. Todos tinham pressão em
ambas as artérias pulmonares em nível sistêmico. Os quatro
pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico que consistiu na translocação da artéria pulmonar anômala da aorta.
Não houve óbitos cardíacos imediatos ou tardios.
A origem de uma AP da aorta ascendente é responsável por um grande shunt esquerdo-direito ao nível
sistêmico pulmonar.
Conclusão – Uma vez estabelecido o diagnóstico de
origem anômala de uma artéria pulmonar da aorta ascendente, na forma isolada, a correção cirúrgica deverá ser
prontamente realizada, não só para prevenir o desenvolvimento de doença vascular pulmonar, como pelos excelentes resultados cirúrgicos atualmente obtidos.
O pulmão contralateral recebe todo o débito cardíaco, além do eventual fluxo sangüíneo de anomalias associadas como o ductus arteriosus, janela aórtico pulmonar,
comunicação interatrial e comunicação interventricular, que
podem aparecer em aproximadamente 40% dos casos 2-4
(tabela 1). A apresentação clínica costuma ocorrer no
lactente e, mais raramente, no RN por apresentarem resistência pulmonar elevada, na forma de desconforto respiratório ou insuficiência cardíaca congestiva 5-10. O diagnóstico poderá ser feito pelo ecocardiograma 2D com
Doppler 11, 12. Informações adicionais são obtidas pelo
cateterismo cardíaco e pela cineangiocardiografia 5. Sem
a correção cirúrgica no primeiro ano de vida, poderá haver
desenvolvimento de hipertensão arterial pulmonar (HAP)
em ambos os pulmões, independentemente da origem
anômala direita ou esquerda da AP.
Palavras-chave: artéria pulmonar anômala, doença
vascular pulmonar obstrutiva, cardiopatia congênita acianótica.
Abstract:
Objective – To stress the diagnostic possibility of
anomalous origin of one pulmonary artery from the ascending
aorta in patients with severe heart failure, in the absence of a
structural intracardiac defect.
Patients and Method – This is a retrospective study in
four patients with severe heart failure. All patients were
submitted to an echocardiographic study with sub-costal,
supraesternal and paraesternal views. Hemodynamic and
angiocardiographic studies in antero-posterior projection
were performed in all of them.
2.
Results – Three of the patients had anomalous origin
of right pulmonary artery from the ascending aorta as the
main diagnosis. The fourth patient had the left pulmonary
artery originating from the ascending aorta and a ventricular
septal defect. In all of them, pressure in both pulmonary
arteries was on the systemic level range. Translocation of
one anomalous pulmonary artery was done in all patients,
as the surgical solution. There was no early or late
cardiovascular mortality.
Material e Métodos:
Estudo retrospectivo de 4 pacientes portadores de
origem anômala de uma artéria pulmonar da aorta ascendente. A idade variou de 2 a 6 meses e três eram do sexo
masculino. Na apresentação todos se encontravam em
insuficiência cardíaca clinicamente intratável e acianóticos.
Todos foram submetidos ao estudo ecocardiográfico
bidimensional e color Doppler. Os cortes mais
freqüentemente utilizados foram: supra-esternal, subcostal
*Pesquisador do INCL, **Pesquisador do INCL
29
Artigos Originais
Editorial Laranjeiras
alongado e paraesternal transversal. No estudo
hemodinâmico, procurou-se determinar as pressões em
ambas as artérias pulmonares e na aorta. No estudo
angiográfico, realizou-se injeção de contraste no ventrículo
direito em ântero-posterior bem como no ventrículo esquerdo e na aorta também na mesma incidência. Não foi
possível a determinação das resistências das artérias pulmonares nem da aorta por problemas técnicos.
3.
proximal ao tronco braquiocefálico direito. A incidência da origem anômala da artéria pulmonar direita não só é mais freqüente como também não está patogenicamente relacionada à origem anômala da artéria pulmonar esquerda. Também
a origem anômala da artéria pulmonar direita que se origina
próximo ao tronco braquiocefálico direito, é patogenicamente
distinta do tipo que se origina próxima à válvula aórtica 3. Acreditam os autores que a origem anômala da artéria pulmonar
esquerda da aorta ascendente seja patogenicamente uma
anomalia do arco aórtico, já que todos os casos por eles estudados estavam associados à Tetralogia de Fallot, a
anomalias do arco aórtico ou a ambas as situações. No
nosso único caso (paciente n° 2), a única malformação
associada foi uma comunicação interventricular. Exceto
nos pacientes que apresentam a Tetralogia de Fallot como
defeito associado, o tamanho da artéria anômala e da
artéria pulmonar contralateral é igual.
Resultados:
Dos quatro pacientes, 3 tiveram o diagnóstico de
origem anômala da artéria pulmonar direita da aorta ascendente feito somente pelo estudo ecocardiográfico (figura 1). O estudo angiográfico (figura 2) confirmou a anomalia principal; em 2 pacientes, a anomalia secundária
era uma pequena comunicação interatrial; e, no outro paciente, um ductus arteriosus persistente (tabela 2). A origem anômala da artéria pulmonar esquerda da aorta ascendente foi diagnosticada através de estudo
ecocardiográfico (figura 3) e teve seu diagnóstico confirmado pelo estudo cineangiocardiográfico (figura 4). Este
último caso apresentava como anomalia secundária à
presença de uma ampla comunicação interventricular. A
avaliação pressórica realizada nos 4 pacientes evidenciou pressão arterial sistêmica na artéria pulmonar anômala bem como na contralateral (tabela 3).
A primeira correção cirúrgica com sucesso foi realizada por Armer et al em 1961 utilizando um graft de dacron
colocado entre a artéria pulmonar direita e o tronco da
artéria pulmonar 15. Em 1967, Kirkpatrick et al realizaram a
primeira correção anatômica com a translocação da artéria pulmonar direita para o tronco da artéria pulmonar 6.
O diagnóstico pode ser feito pela ecocardiografia
bidimensional 11, 12 através de cortes supra-esternais quando existe um vaso se originando posteriormente da aorta
ascendente. Nestes casos, deve-se excluir a possibilidade de janela aorto-pulmonar e truncus arteriosus. Sendo
assim, é necessário que não exista a bifurcação normal
do tronco da artéria pulmonar. Em situações nas quais a
artéria pulmonar anômala se origina da face lateral da
aorta ascendente, os cortes subcostais permitem o diagnóstico com bastante segurança 16.
Em nenhum dos 4 pacientes, foi observado, ao estudo angiográfico ou pressórico, a presença de estenoses
na origem ou no trajeto da artéria pulmonar anômala, assim como na contralateral. Todos os pacientes foram submetidos ao tratamento cirúrgico corretivo, que consistiu
na translocação da artéria pulmonar anômala da aorta.
A técnica cirúrgica utilizada consistiu no estabelecimento de circulação extracorpórea, pinçamento da aorta e
infusão de solução cristalóide de cardioplegia gelada. A
seguir, a artéria pulmonar anômala era seccionada junto
à aorta e estabelecida uma anastomose término-lateral
entre a artéria pulmonar anômala e o tronco da artéria
pulmonar. No paciente com origem anômala de uma artéria pulmonar esquerda da aorta ascendente, a comunicação interventricular (18mm) foi corrigida com patch de
pericárdio bovino. Não houve óbito imediato ou tardio, com
exceção da paciente número 1, em conseqüência de acidente dois anos após a cirurgia.
Na avaliação pré-operatória, torna-se necessária
uma análise cuidadosa da fisiopatologia do pulmão direito, do esquerdo e do ventrículo direito. Quando a origem
anômala da artéria pulmonar direita ou esquerda não está
associada a defeitos intracardíacos existirão dois circuitos pulmonares separados, não paralelos, com fluxo e
resistência independentes 17. Considerando-se inicialmente o pulmão direito, existirão pressões sistêmicas na artéria pulmonar direita e um fluxo que dependerá da resistência do sistema vascular pulmonar direito com elevada
pressão. No pulmão esquerdo, o fluxo pulmonar será igual
ao do retorno venoso sistêmico. Variações na resistência
vascular pulmonar esquerda serão transmitidas ao
ventrículo direito e, conseqüentemente, ao débito cardíaco total. As razões que justificam a elevação da resistência vascular pulmonar esquerda não são claramente entendidas; tal elevação não parece decorrer do aumento
isolado do fluxo pulmonar, visto que, em pacientes com
ausência congênita de um pulmão e com um ventrículo
direito manuseando todo o débito cardíaco, não se observam maiores elevações da resistência vascular pulmonar
em seu único pulmão 18.
Após a translocação da artéria pulmonar anômala,
houve em todos os pacientes normalização da pressão
em ambas as artérias pulmonares. O estudo
ecocardiográfico pós-operatório excluiu a presença de
estenoses no local da anastomose.
4.
Discussão:
A origem anômala de uma artéria pulmonar da aorta
ascendente é entidade definida e bem reconhecida 7. É
uma malformação completamente distinta daquelas em
que as artérias pulmonares se originam da aorta via ductus
arteriosus ou são supridas através de colaterais entre as
artérias sistêmicas e pulmonares 13. A morfologia da artéria pulmonar anômala é constante. Ela se origina na parede da aorta ascendente, 5-30mm acima da junção ventrículoarterial 14 . Kutsche e Van Mierop 3 , em um estudo
multiinstitucional. sobre a patogênese e anomalias associadas de 108 casos, relatam que é raro a artéria pulmonar
direita se originar na porção lateral da aorta ascendente justa
Com exceção do fluxo, outros fatores que poderão
modificar a resistência vascular pulmonar seriam: 1 –
anatomia arterial pulmonar tais como diâmetro, número e
distribuição de seus vasos; 2 – tônus vascular e 3 – reologia
sangüínea. Nos nossos pacientes, não existiam evidências de elementos sangüíneos anormais que poderiam
afetar as características de fluxo normal. Também as obstruções anatômicas foram afastadas pela determinação
da pressão capilar pulmonar encunhada.
30
Editorial Laranjeiras
A título de especulação, é possível que os eventos
fisiopatológicos no pulmão direito tenham sido produzidos por reflexos neurovasculares e/ou mediadores
vasoativos humorais – resistência excessiva no pulmão
esquerdo. Essas indagações justificariam a queda de
pressão na artéria pulmonar (independentemente de a
artéria pulmonar anômala ser a direita ou a esquerda)
imediatamente após a correção cirúrgica. Assim, o retorno imediato da pressão arterial na artéria pulmonar favoreceria um mecanismo reflexo, muito embora um fator
humoral não possa ser afastado. Não obstante todas essas considerações, o fluxo sangüíneo pulmonar parece
ser o fator crítico no desenvolvimento da doença vascular
pulmonar, pois os pacientes que apresentam Tetralogia
de Fallot como defeito associado evidenciam somente
alterações unilaterais.
Artigos Originais
ao elevado fluxo de sangue totalmente oxigenado no pulmão
anormalmente perfundido.
A intervenção cirúrgica precoce, preferencialmente antes dos 12 meses de vida, é muito importante no sentido de
impedir o possível desenvolvimento da doença vascular pulmonar irreversível 22. Nos pacientes em que a origem anômala é um achado isolado, a correção cirúrgica, também
deveria ser considerada tão logo o diagnóstico tenha sido
estabelecido, de preferência antes dos seis meses (em decorrência do possível desenvolvimento precoce da doença
vascular pulmonar). A correção poderá ser realizada com ou
sem circulação extracorpórea, dependendo das dificuldades
técnicas encontradas durante o procedimento 13, 14. Em pacientes com Tetralogia de Fallot como defeito associado, o risco cirúrgico é maior, muito embora a correção cirúrgica com
sucesso já venha sendo relatada 23, 24. A hipoplasia da artéria
pulmonar conectada ao ventrículo direito protegeria o pulmão
da doença vascular hipertensiva, o mesmo não ocorrendo no
pulmão anormalmente perfundido.
A elevação da resistência vascular pulmonar nos trouxe alguma dificuldade no diagnóstico ecocardiográfico do
paciente com origem anômala da artéria pulmonar esquerda da aorta ascendente porque o paciente apresentava também, como defeito associado, uma ampla comunicação interventricular. Entretanto, com o estudo
angiocardiográfico, ele foi estabelecido. A utilização da
biópsia pulmonar não trouxe maiores informações na diferenciação vascular pulmonar entre o pulmão anormalmente perfundido e o contralateral 5,19. Outros investigadores, porém, encontraram maiores alterações vasculares no
pulmão contralateral 20,21. Essas alterações foram atribuídas
Em conclusão, os resultados da correção cirúrgica
nestes últimos anos têm sido animadores, com exceção
daqueles pacientes com malformações cardíacas associadas. Nos nossos pacientes, não houve mortalidade
operatória imediata nem tardia. O tratamento paliativo,
como por exemplo, bandagem da artéria pulmonar, ligação de um ductus arteriosus associado e shunt aorto-pulmonar aumentará a mortalidade substancialmente.
31
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Figura 1 (#1): Corte subcostal alongado em que se observa dilatação do ventrículo direito e do tronco da artéria
pulmonar. A visualização da aorta permite a identificação do ramo direito da artéria pulmonar, também dilatado, originando-se a partir da porção proximal da aorta ascendente.
32
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Figura 2 (#1): A – ventriculografia direita em sístole. Existe opacificação do tronco da artéria pulmonar bastante
dilatado e também de seu ramo esquerdo. Não se visualiza o ramo direito da artéria pulmonar. B – ventriculografia
esquerda. A partir desta cavidade, emerge a aorta de onde se origina o ramo direito da artéria pulmonar, que se
encontra também aumentado de calibre. C – Corte subcostal: não se identifica a origem anormal da artéria pulmonar
direita da aorta ascendente. D – Ecocardiograma bidimensional pós-operatório no corte transversal paraesternal:
presença da bifurcação normal do tronco da artéria pulmonar.
Figura 3 (#2): No alto –
corte subcostal alongado. A partir do ventrículo esquerdo, origina-se a aorta da qual emerge
na sua porção proximal, o ramo
esquerdo da artéria pulmonar
de calibre aumentado. Embaixo – corte supra-esternal.
Visualiza-se claramente um
vaso de grande calibre, que se
origina da aorta ascendente e
orienta-se posteriormente –
ramo esquerdo da artéria pulmonar.
33
Artigos Originais
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Figura 4: No alto – ventriculografia direita demonstrando tronco e ramo direito da artéria pulmonar bastante
dilatados. O ramo esquerdo da artéria pulmonar não é
visualizado. Centro – Aortografia demonstrando claramente
a origem da artéria pulmonar esquerda a partir da aorta
ascendente. Embaixo – corte transversal. Observa-se o
ramo esquerdo da artéria pulmonar já conectado ao tronco pulmonar.
34
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Artigos de Revisão
INSUFICIÊNCIA VENTRICULAR ESQUERDA E
SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO
Rio de Janeiro - RJ
Ademir Batista da Cunha*
RESUMO
A insuficiência ventricular esquerda torna o coração
incapaz de exercer sua função de bomba e de manter a
pressão arterial sanguínea. Se ocorre hipotensão arterial,
poderosas ações protetoras vão ser acionadas para manter a pressão sanguínea, incluindo a estimulação dos
baro-reflexos com liberação de hormônios adrenérgicos,
que estimulam os receptores beta-adrenérgicos no rim,
liberam renina e ao mesmo tempo estimulam os receptores alfa-adrenérgicos e provocam vasoconstricção
arteriolar.
significant regional variation, such as an increase in the
distribution of NE by the cardiorenal system.
Under normal conditions, the inhibitory messages of
arterial and cardiopulmonay baroreceptors, through the
afferent nerves. are the major influences on sympathetic
nervous system activity.
The parasympathetic control of the heart rate is also
under the influence of the arterial baroreflex control. The
efferent sympathetic traffic and catecholamines arterial
levels are reduced and the heart rate variability is increased.
Diante da insuficiência cardíaca, verifica-se uma
generalizada ativação adrenérgica e uma inibição do sistema parassimpático. Sob condições normais, mensagens inibitórias dos baro-receptores arteriais e
cardiopulmonares, através dos nervos aferentes, representam as principais influências na atuação do simpático. O controle parassimpático da freqüência cardíaca (FC)
se dá também sob potente controle baro-reflexo arterial. O
tráfego simpático eferente e níveis arteriais de
catecolaminas tornam-se baixos e a variabilidade da FC,
alta. O comportamento do sistema nervoso autônomo
(SNA) na insuficiência cardíaca (IC) demonstra que, com
a progressão da IC, diminuem as mensagens inibitórias
dos receptores cardiopulmonares e arteriais e as mensagens excitatórias aumentam. O resultado desse balanço
alterado será um generalizado aumento no tráfego nervoso simpático, um amortecimento do parassimpático e o
controle simpático da FC com prejuízo da regulação simpática reflexa da resistência vascular. As conseqüências
serão claras: presença de taquicardia, retenção de sódio
(Na+), liberação de renina e generalizada vasoconstricção
sistêmica.
The behavior of the autonomic nervous system in
LVD shows that as LVD progresses, the cardiopulmonary
inhibitory messages of the arterial receptors decreases,
and the excitatory messages increases.
This altered balance will result in a generalized
increase in the sympathetic nervous traffic, the debilitation
of the parasympathetic system and the sympathetic control
of the heart rate, impairing the sympathetic reflex regulation
of the vascular resistance.
Key-Words: Left ventricular dysfunction, blood
pressure, beta-adrenergic receptors
O aumento da atividade simpática
A elevação de Norepinefrina (NE) circulante resulta de uma
combinação da liberação de NE aumentada nas terminações
nervosas adrenérgicas com seu conseqüente “derramamento”
no plasma, seguido de uma marcada variação regional, sobretudo um aumento da distribuição de NE pelo sistema cardiorrenal,
segundo Hasking e cols1, assim como pela reduzida recaptação
de NE pelas terminações nervosas adrenérgicas, como bem
demonstraram Liang e cols2.
Palavras-chave: Disfunção ventricular esquerda,
pressão arterial, receptores beta-adrenérgicos
Em pacientes com insuficiência cardíaca, observamos
um nível de atividade do nervo simpático aumentado, nível
esse relacionado com a concentração de NE plasmática e
com a pressão de enchimento do ventrículo esquerdo, como
relatado por Leimbach e cols3. A atividade adrenérgica aumentada em pacientes com falência cardíaca pode ser o limiar para taquicardia ventricular ou mesmo morte súbita cardíaca, particularmente na presença de isquemia miocárdica.
Porém não está claro se o elevado nível de NE circulante é
responsável pela morte de pacientes por insuficiência cardíaca como conseqüência do efeito vasoconstrictor,
arritmogênico, desse hormônio, ou se esse nível elevado de
NE representa um fenômeno que apenas reflete a gravidade
da insuficiência cardíaca já instalada. Além da ativação dos
receptores beta-adrenérgicos no coração, a ação intensificada do sistema nervoso simpático promove a estimulação dos
receptores adrenérgicos α1 miocárdicos, permitindo um mo-
Abstract
With left ventricular dysfunction (LVD) the heart
becomes unable to perform its pumping function and to
maintain blood pressure. In the case of arterial hypotension,
protective actions will be activated to maintain blood
pressure, including baroreflex stimulation with discharge
of adrenergic hormones, which stimulates beta-adrenergic
receptors in the kidney, releases renin, and, at the same
time, stimulates alfa-adrenergic receptors causing
arteriolar vasoconstriction.
The elevation of norepinephrine (NE) levels in the
blood results from the combination of an increased spillover
of NE to the adrenergic nervous terminations and its
consequent accumulation in the plasma, followed by a
*Prof. Adjunto de Cardiologia da Universidade Federal Fluminense
*Coordenador de Ensino do Instituto Nacional
de Cardiologia Laranjeiras
35
Artigos de Revisão
Editorial Laranjeiras
Thomas e Braunwald8 comprovaram, com a administração de guanetidina, a intensificação dos sinais e
sintomas de IC em pacientes com descompensação cardíaca. Como a guanetidina é uma eficaz droga
antiadrenérgica, sua administração e seus efeitos deixam evidente o papel do sistema adrenérgico como mecanismo de compensação na IC.
desto efeito inotrópico positivo, de acordo com achados de
Landzberg e cols4.
A estimulação dos receptores adrenérgicos α1 miocárdicos
pode também provocar hipertrofia dos miócitos e alterações em
fenótipo, caracterizadas pela reexpressão de um programa
genefetal, segundo observações de Bishopric e cols5. Os receptores α1 adrenérgicos são de baixa densidade em coração
humano, entretanto, em contraste com os receptores betaadrenérgicos, que são down regulados, os receptores α1
adrenérgicos parecem ficar inalterados na insuficiência cardíaca humana, conforme achados de Bristow e cols6.
Havendo diminuição dos depósitos de NE no
miocárdio e alterações na via pós-sináptica (receptores
beta-adrenérgicos), a capacidade miocárdica de produção do AMP cíclico é diminuída em pacientes com IC.
Colucci e cols9 observaram, em pacientes com IC, uma
atenuada resposta da freqüência cardíaca ao exercício, o
que se deve, pelo menos em parte, a uma
dessensibilização da via pós-sináptica dos receptores
beta-adrenérgicos no nó-sinusal. Observou-se, nesse
estudo, que, durante o exercício, a FC para quaisquer níveis de NE foi menor nos pacientes com IC, quando comparados aos indivíduos normais, sendo o aumento da FC
para qualquer aumento dos níveis de NE marcadamente
reduzido. Considerando-se que o aumento da FC acima
da FC basal é mediado primariamente pela ação do sistema nervoso simpático nos receptores beta-adrenérgicos,
conforme verificado por Jose e Taylor10, esses achados
sugerem que o nó-sinusal pode ser menos sensível à
estimulação beta-adrenérgica em pacientes com IC.
O sistema nervoso autônomo e a redistribuição do
débito cardíaco.
A insuficiência cardíaca apresenta uma generalizada ativação adrenérgica e uma inibição do sistema
parassimpático, como observado por Floras e cols7.
Sob condições normais, mensagens inibitórias dos
baro-receptores arteriais e cardiopulmonares, através dos
nervos aferentes, representam as principais influências
na atuação do simpático.
O controle parassimpático da freqüência cardíaca
(FC) se dá também sob potente controle baro-reflexo arterial. O tráfego simpático eferente e níveis arteriais de
catecolaminas são reduzidos e a variabilidade da FC é
aumentada.
Bristow e cols11 relataram a diminuição da densidade dos receptores beta-adrenérgicos no miocárdio de
pacientes com IC. Fowler e cols12 descreveram uma correlação inversa entre receptores adrenérgicos e concentração de catecolaminas no seio coronário de pacientes
com IC.
O comportamento do SNA na insuficiência cardíaca
(IC) demonstra que, com a progressão da IC, diminuem
as
mensagens
inibitórias
dos
receptores
cardiopulmonares e arteriais e aumentam as mensagens
excitatórias.
O resultado desse balanço alterado será um generalizado aumento no tráfego nervoso simpático, um amortecimento do parassimpático e o controle simpático da
FC com prejuízo da regulação simpática reflexa da resistência vascular. As conseqüências serão evidentes: presença de taquicardia, retenção de sódio (Na+), liberação
de renina e generalizada vasoconstricção sistêmica.
Colucci e cols13, estudando pacientes com IC e infusão de dobutamina intracoronária, concluíram que as conseqüências hemodinâmicas da dessensibilização dos
receptores beta-adrenérgicos miocárdicos não podem ser
superadas totalmente por altas doses de dobutamina.
Acrescentaram, ainda, que a habilidade da milrinona em
aumentar a amplitude máxima da resposta à dobutamina
sugere que uma importante ação dos inibidores da
fosfodiesterase pode melhorar, parcialmente, as conseqüências da dessensibilização dos receptores betaadrenérgicos.
A manutenção da pressão arterial na presença de
reduzido débito cardíaco é um efetivo mecanismo compensatório, já que, com hipovolemia e IC, esse importante mecanismo torna o limitado débito cardíaco o fator mais
útil para a sobrevida, e, nesse caso, a vasoconstricção
(mediada em parte pelo sistema nervoso adrenérgico)
desempenha um importante significado na redistribuição
do fluxo sanguíneo periférico. Em neurogramas obtidos
de nervos periféricos adrenérgicos dos membros, observamos um aumento de tráfego na vigência de IC, como
demonstraram Leimbach e cols3.
A observação de uma relação inversa entre
catecolaminas
circulantes
e
gravidade
da
dessensibilização fisiológica ao efeito inotrópico positivo
da dobutamina permite suporte à noção de que terapias
que reduzem a atividade do sistema nervoso simpático
ou a estimulação dos receptores beta-adrenérgicos podem levar à diminuição na dessensibilização beta-adrenérgica.
Com a acentuação da IC, o débito cardíaco é
redistribuído, mesmo em repouso. Essa redistribuição
mantém a liberação de oxigênio para órgãos vitais. como
o cérebro e o coração, enquanto o fluxo sanguíneo para
áreas menos cruciais, tais como pele, músculo esquelético
e rim é reduzido. A subperfusão do músculo esquelético
leva a metabolismo anaeróbico, acidose láctica, excessiva “dívida de oxigênio”, fraqueza e fadiga.
A depleção da norepinefrina cardíaca
Chidsey e cols14 publicaram suas observações sobre
a concentração de NE diminuída em biópsias atriais de alguns pacientes com insuficiência cardíaca congestiva (ICC),
levando à sugestão de que a depleção dos depósitos cardíacos da substância neurotransmissora adrenérgica pode ocorrer em descompensação miocárdica. Ainda Chidsey e cols15,
através da análise de músculos papilares extraídos do
ventrículo esquerdo, no curso de uma troca valvar mitral, revelaram pronunciada diminuição da concentração de
norepinefrina em alguns pacientes com IC, encontrando expressivas variações nos músculos estudados.
A importância do sistema adrenérgico como suporte na insuficiência cardíaca.
Podemos demonstrar a importância do sistema nervoso adrenérgico na manutenção da contratilidade
miocárdica na IC através dos efeitos do bloqueio
adrenérgico.
36
Editorial Laranjeiras
Artigos de Revisão
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Chidsey e cols16, com o objetivo de determinar se existe relação entre a concentração cardíaca de NE e o estado
funcional do miocárdio, mais uma vez, estudaram o músculo
palpilar do ventrículo esquerdo extraído de pacientes com ICC
por ocasião da cirurgia para troca valvar mitral. Os autores
concluiram que a depleção de NE parece estar associada
com disfunção miocárdica, pois encontraram uma relação
positiva e significante entre tensão máxima do músculo testado in vitro e a concentração de NE de músculos individuais.
As enzimas necessárias à biosíntese de NE têm sido
descritas por vários pesquisadores. Udenfriend17 fez importante publicação nesse sentido. Levitt18 mostra que a tyrosina
hydroxylase tem sido identificada como uma enzima taxalimitante na biosíntese de NE. A fim de tentar elucidar o mecanismo para a depleção de NE na IC, a atividade dessa
enzima em corações obtidos de cães normais foi comparada à de cães com ICC produzida experimentalmente, como
relatado por Pool e cols19. Nesse estudo, a redução dos depósitos de NE foi produzida pela administração de reserpina
e por desnervação, analisando-se, em seguida, o efeito dessas intervenções na atividade da tyrosina hydroxylase.
Os resultados desse estudo mostraram que a atividade da tyrosina hydroxylase em corações de cães com ICC
está acentuadamente reduzida, o que sugere que a depleção
dos depósitos de NE cardíaca, já observados previamente
em ICC, podem estar relacionados a uma redução de síntese de NE.
Após extensa revisão da literatura, é possivel concluir
que o sistema nervoso autônomo tem papel importante na
insuficiência ventricular esquerda e que se torna indispensável uma reflexão sobre o SNA, ao se promover uma intervenção clinica nessa patologia.
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37
Artigos de Revisão
Editorial Laranjeiras
BASES METABÓLICAS DO MIOCÁRDIO ISQUÊMICO –
MIOCÁRDIO STUNNED, HIBERNADO E
PRÉ-CONDICIONAMENTO ISQUÊMICO
RIO DE JANEIRO – RJ
Felipe José Monassa Pittella *
RESUMO
geradas pelo processo da glicose, portanto a disponibilidade de glicose sendo é importante para o metabolismo
cardíaco normal 1.
O metabolismo miocárdico em condições basais e
durante a isquemia é analisado neste artigo. Os mecanismos determinantes da disfunção contrátil do ventrículo
esquerdo – o miocárdio "stunned", o miocárdio hibernado e o pré-condicionamento isquêmico miocárdico – são
abordados.
Cerca de 60% dos fosfatos de alta energia produzidos pelo metabolismo celular são usados para o desenvolvimento de força contrátil, 15% aproximadamente para
o relaxamento, 3 a 5% para a manutenção da atividade
elétrica e os 20% restantes para a manutenção das atividades que garantem a integridade celular 8.
Palavras-chave: metabolismo miocárdico,
miocárdio "stunned", miocárdio hibernado e pré-condicionamento isquêmico.
Em caso de isquemia, o miocárdio é regulado para
preservar energia suficiente, a fim de proteger a integridade funcional e estrutural dos miócitos. Quando a isquemia
miocárdica é leve, a síntese de glicogênio aumenta, a
glicólise é estimulada, porém os ácidos graxos continuam a ser a maior fonte energética. Em caso de isquemia
severa, ocorre aceleração da utilização do glicogênio
tecidual e da glicose exógena, inibição da oxidação dos
ácidos graxos livres, cessação do metabolismo oxidativo
e diminuição dos níveis de ATP. Existe transformação do
metabolismo aeróbico em anaeróbico, com a glicólise
fornecendo uma quantidade de energia mesmo na ausência de oxigênio (ATP anaeróbico) 1,9 . A glicose
anaeróbica torna-se a principal fonte energética, entretanto sua capacidade para gerar fosfato altamente energético
é muito inferior às necessidades metabólicas do
miocárdio.
ABSTRACT
The myocardium metabolic state is examined in this
article, both in basal conditions and in ischemic state. The
causes of myocardium contractile dysfunction of the left
ventricle in the "stunned" myocardium, myocardial
hibernation and ischemic preconditioning are analyzed.
Key-Words: myocardium metabolism, "stunned"
myocardium,
myocardium hibernation, ischemic
preconditioning.
ALTERAÇÕES METABÓLICAS NA ISQUEMIA
MIOCÁRDICA
O metabolismo do músculo cardíaco é essencialmente aeróbico, pois retira a sua energia para contração
e metabolismo basais através de mecanismo oxidativo.
Esse processo envolve a oxidação de substratos que lhe
são ofertados pela circulação sistêmica e necessita de
oxigênio carregado pelo sangue para transformação em
trifosfato de adenosina (ATP) e fosfocreatina, os quais
são as fontes imediatas de energia da contração cardíaca. O coração sintetiza e usa diariamente 5kg de ATP e,
para este processo, necessita de um contínuo suprimento sangüíneo pela circulação coronariana, que é suficientemente flexível para aumentar as necessidades
energéticas durante o exercício. Em condições normais,
os ácidos graxos e a glicose são as principais fontes
energéticas e os ácidos graxos, as fontes preferenciais;
quando estes estão presentes, a utilização de glicose é
de certa forma inibida 1.
Se a isquemia é grave e persistente, há inibição da
glicose, depleção do glicogênio, com diminuição da disponibilidade tanto da glicose como do oxigênio, e acúmulo
de lactato, resultando em acidose intracelular. O miocárdio
sob essas circunstâncias pode sobreviver por um tempo
limitado pela combinação do inicio do metabolismo
anaeróbico e da inibição da contração miocárdica 1.
A célula miocárdica, durante a isquemia miocárdica,
reduz ou elimina o gasto de energia necessária para a
atividade contrátil e a direciona para a manutenção de sua
integridade. Tanto o processo de contração como o de
relaxamento são retardados devido a dois eventos
bioquímicos. O primeiro é o aumento da concentração de
íons de hidrogênio que competem com os íons de cálcio
para os locais de ativação da troponina, tornando o processo de ativação actina-miosina e, por conseqüência. a
contração, mais lentos. O segundo é a redução da concentração dos fosfatos de alta energia, o que diminui a
recaptação do cálcio no interior do retículo
sarcoplasmático, comprometendo o relaxamento 8.
A produção de fosfatos de alta energia se faz nas
mitocôndrias, sendo a via metabólica principal a
fosforilação oxidativa e o ciclo de Krebs. A fosforilação
oxidativa é o processo através do qual a síntese de ATP
se faz, acoplada à respiração aeróbica. Os ácidos graxos,
através do ciclo de Krebs, representam de 60 a 90% do
metabolismo oxidativo. Apesar da produção de ATP através da glicose ser pouco importante em condições normais, o ciclo de Krebs requer substâncias intermediárias
A recuperação da função ventricular após um episódio isquêmico é relacionada à duração e à gravidade da
isquemia e também à eficácia de reperfusão pós-
*Médico da Divisão de Doença Coronária do Instituto Nacional de Cardiologia (INC)
* Mestrando em Cardiologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF)
38
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isquemia miocárdica; na cirurgia cardíaca; e após parada
cardiorespiratória.
isquêmica. Entre a isquemia miocárdica de poucos minutos, plenamente reversível, e a prolongada, que pode levar à necrose, existe uma zona de transição em que a
isquemia é muito breve para causar necrose miocárdica,
porém suficientemente prolongada e grave para causar
disfunção contrátil persistente 3.
O miocárdio "stunned" tem perfusão miocárdica normal em repouso, metaboliza preferencialmente os ácidos
graxos e apresenta reserva contrátil. As alterações
histomorfológicas encontradas são dependentes da severidade e duração dos episódios isquêmicos antes de
ocorrer a reperfusão. Quando o fluxo coronário é restaurado rapidamente, os miócitos parecem histologicamente
normais apesar da alteração da função contrátil.
O miocárdio "stunned" ou atordoado, o miocárdio
hibernado e o fenômeno de pré-condicionamento
isquêmico são tipos de respostas reguladoras do
miocárdio relacionados à isquemia e à reperfusão. Essas respostas reguladoras do miocárdio são fisiológicas
e conseqüentes a uma redução temporária ou sustentada do fluxo sangüíneo coronário. O tipo de resposta é determinado pela severidade e duração da isquemia
miocárdica.
São vários os mecanismos que se interagem e que
podem levar ao miocárdio "stunned", sendo os mais importantes: 1) a formação de radicais livres de oxigênio; 2)
a sobrecarga de cálcio; 3) a diminuição da afinidade dos
miofilamentos contráteis ao cálcio 12,13 .
A isquemia miocárdica transitória seguida de
reperfusão resulta na formação de radicais livres de oxigênio, incluindo o ânion superóxido (O2 -), o radical hidroxila
(OH_) e o peróxido de hidrogênio (H2O2). Estudos experimentais sugerem que a liberação de radicais livres de
oxigênio imediatamente após a reperfusão possa contribuir para a depressão miocárdica pós-reperfusão. Os radicais livres de oxigênio são altamente reativos e capazes
de causar desnaturação de proteínas, inativar enzimas,
bem como provocar peroxidação lipídica e disfunção do
retículo sarcoplasmático e do sarcolema. São atribuídos
a eles interferências nos mecanismos de troca iônicas
Na+ e Ca2+ e também na inibição da atividade da Na +, K +
Atpase, o que resulta em sobrecarga de Na + com a conseqüente ativação da atividade de troca Na+ e Ca + .
MIOCÁRDIO “STUNNED”
O miocárdio “stunned” é caracterizado por depressão persistente da contração cardíaca, apesar do
restabelecimento do fluxo coronário que ocorre após curto período de isquemia miocárdica. A disfunção mecânica
é reversível, porém pode persistir por horas, dias ou semanas 10.
Esse fenômeno foi inicialmente descrito por
Heyndrickx et al em 1970, que demonstraram em cães
que a função mecânica regional permanecia deprimida
por um período superior a três horas quando da realização de obstruções coronárias de apenas cinco minutos.
Quando a oclusão coronária era estendida para quinze
minutos, a disfunção mecânica permanecia por mais de
seis horas 11. A redução da função miocárdica proporcional à redução do fluxo sangüíneo coronário, observada
em diversos estudos realizados com cães submetidos à
gradual redução do fluxo coronário, demonstra a existência de uma estreita ligação entre o suprimento miocárdico
e a demanda de energia miocárdica. Períodos de baixo
fluxo coronário, por curto período (menos de 10 minutos),
seguidos de reperfusão adequada, usualmente resultam em restauração completa e rápida da função
miocárdica. A redução do fluxo coronário por períodos mais
prolongados (mais de 15 minutos) usualmente não causa necrose, mas, com a reperfusão, associa-se a uma
disfunção que embora reversível é mais prolongada.
Esses fatos implicam que a excessiva produção de
radicais livres de oxigênio resulta no aumento do influxo
de cálcio no sarcolema e na ocorrência do fenômeno de
sobrecarga celular de cálcio. O mecanismo intrínseco pelo
qual ocorre aumento do cálcio durante a isquemia é atribuído à diminuição de sua utilização pelo reticulo
sacorplasmático ou da possibilidade de ser mediado pela
troca Na+ e Ca + secundária ao aumento do Na+ durante a
isquemia. Essa sobrecarga celular do cálcio pode lesar
organelas intracelulares e produzir disfunção mecânica
prolongada 12,13.
Estudos experimentais com varias drogas como os
inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA),
os antagonistas da angiotensina II (BRA), os bloqueadores
dos canais de cálcio e os antioxidantes foram efetivos em
modular a recuperação do miocárdio "stunned" 14-16. Entre
essas drogas, os IECA são os mais estudados. Na
oclusão aguda da artéria coronária, há ativação do sistema renina-angiotensina, com grande aumento da
angiotensina II e aumento da degradação da bradicinina.
Com a redução da bradicinina, há menor produção de
prostaglandinas, que apresentam atividade protetora no
miocárdio isquêmico, reduzindo o efeito do miocárdio
"stunned". Então, a ativação do sistema reninaangiotensina leva ao agravamento da isquemia e a
pontencialização do miocárdio “stunned”. Os estudos feitos com os IECA demonstram que a atenuação do
miocárdio "stunned" ocorre com o uso da droga antes da
oclusão coronária ou imediatamente antes da reperfusão.
Até o momento, não existem estudos clínicos
rondomizados que justifiquem o uso de algumas dessas
drogas com o objetivo de diminuir o tempo de recuperação do miocárdio “stunned”.
Em 1982, Braunwald e Kloner descreveram essa
entidade fisiopatológica 10. Braunwald, em 1991, observou que miocárdio "stunned" ocorria nas seguintes condições experimentais: 1) em regiões adjacentes ao tecido
necrótico; 2) em situações de aumento da demanda de
oxigênio em presença de estenose coronariana; 3) após
isquemia miocárdica provocada em cães com hipertrofia
miocárdica, submetidos ao esforço; 4) em corações isolados quando reperfundidos após isquemia ou
reoxigenados após anóxia 1.
O conceito de miocárdio "stunned" esclarece os
achados clínicos em paciente em que, apesar de uma
reperfusão miocárdica adequada após oclusão
coronariana aguda, não se verifica a imediata recuperação da função contrátil. Em pacientes portadores de doença arterial coronária existem evidências de miocárdio
"stunned" em uma variedade de situações clínicas como
no infarto agudo do miocárdio após reperfusão com
trombolíticos ou com angioplastia coronária; nas anginas
estáveis, instáveis e variantes após episódios de
39
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capacidade de contração quando o fluxo sangüíneo é restabelecido ou quando estimulado, indicando que o músculo era viável.
MIOCÁRDIO HIBERNADO
Diamond et al, em 1978, descreveram a melhora da
contração de segmentos miocárdicos isquêmicos após a
cirurgia de revascularização miocárdica 17.
Uma questão controversa, porém importante na definição e no mecanismo do miocárdio hibernado, é se
existe uma redução crônica do fluxo sangüíneo coronário
em repouso ou se, em alguns casos, ela poderia ser causada por episódios repetitivos de miocárdio "stunned".
Modelos animais estudados em curto prazo demonstram
que a redução do fluxo sanguíneo está diretamente relacionada com a diminuição da função contrátil 19,20. Modelos
animais estudados em longo prazo demonstram ser possível a indução do miocárdio hibernado com fluxo coronário
basal normal 21. Estudos clínicos têm sugerido que alguns pacientes têm fluxo sangüíneo miocárdico normal e
diminuição da reserva do fluxo coronário. Nesse conceito,
a estenose coronária seria responsável, não pela redução do fluxo sangüíneo basal, mas sim pela redução da
reserva coronariana. Episódios de aumento da demanda
de oxigênio causariam isquemia miocárdica por incapacidade das coronárias aumentarem o fluxo sangüíneo por
se encontrarem no máximo de sua capacidade
vasodilatadora. Cessando a isquemia, o miocárdio mostra déficit contrátil, por apresentar-se atordoado. Logo, a
disfunção contrátil seria explicada por uma redução do
metabolismo miocárdico com adaptação ao baixo fluxo
coronário, mas por períodos cumulativos de isquemia,
levando a um miocárdio cronicamente atordoado 19,20.
Em 1985, Rahimtoola definiu miocárdio hibernado
como um estado de disfunção ventricular persistente devido a um reduzido fluxo sangüíneo coronário, que pode
ser parcialmente ou completamente restaurado pela melhora do fluxo coronário ou redução da demanda de oxigênio 18.
O miocárdio hibernado é um processo adaptativo no
qual a contratilidade miocárdica e o consumo de oxigênio
miocárdico são reduzidos proporcionalmente a uma reserva de fluxo limitada. Como as reduções da utilização
de energia e da contração miocárdica são proporcionais,
o equilíbrio entre fluxo sanguíneo e função miocárdica é
mantido, preservando a viabilidade miocárdica 9. O processo adaptativo é caracterizado por uma diminuição da
atividade metabólica e reativação do fenótipo fetal. A
isquemia crônica e repetitiva resulta em diferenciação dos
miócitos cardíacos para um fenótipo fetal. O miocárdio
fetal se caracteriza pela redução da função contrátil do
ventrículo esquerdo, pela dependência da glicose para
produção de energia e por uma abundância em glicogênio.
O miocárdio hibernado tem como principal substrato metabólico a glicose, uma limitada reserva contrátil e um
potencial para recuperação da função contrátil somente
depois da restauração do fluxo sanguíneo coronário 9.
Existem demonstrações clínicas de pacientes com
miocárdio hibernado, os quais apresentaram melhora da
função depois de adequada reperfusão, tanto em
miocárdio com fluxo basal reduzido como com fluxo basal
normal. Provavelmente os mecanismos de miocárdio
"stunned" e hibernado apresentam-se mais inter-relacionados que as evidências têm demonstrado até o momento.
A presença do miocárdio hibernado sugere que existe
suficiente fluxo sangüíneo coronário para manter a viabilidade dos miócitos, mas não o bastante para manter sua
contração.
A extensão e a duração da hipoperfusão miocárdica
determina a severidade das alterações histomorfológicas
e estruturais do miocárdio. Hipoperfusão crônica resulta
em depleção do aparelho contrátil, deposição de
glicogênio e acúmulo de um grande número de
mitocôndrias
morfologicamente
anormais.
Freqüentemente existe perda substancial do reticulo
sarcoplasmático. Geralmente a perda das proteínas
contráteis começa em regiões perinucleares, evolui na
direção da periferia dos miócitos, podendo levar ao desaparecimento dos sarcômeros. A integridade da membrana celular pode ser preservada, apesar da perda significativa de proteínas contráteis. Embora o miocárdio hibernado seja um processo adaptativo, eventualmente pode
progredir para uma degeneração celular irreversível caso
o fluxo sangüíneo coronariano não seja restabelecido.
Quando as alterações estruturais e funcionais são extensas, podem levar à cardiomiopatia isquêmica com
disfunção ventricular esquerda e insuficiência cardíaca. O
miocárdio hibernado representa uma mistura variável de
miocárdio fibrosado, hibernado e células miocárdicas
normais. A probabilidade e o tempo de recuperação da
sua função correlaciona-se diretamente com a severidade das alterações estruturais e histológicas do miocárdio
9
.
PRÉ-CONDICIONAMENTO ISQUÊMICO
Outra evidência de resposta reguladora na isquemia
miocárdica é o fenômeno do pré-condicionamento
isquêmico. Esse fenômeno pode ser definido como um
mecanismo protetor endógeno, no qual curtos períodos
de isquemia e reperfusão conferem ao miocárdio resistência a um insulto isquêmico mais prolongado. Murray et
al descreveram o pré-condicionamento isquêmico através da experiência em cães submetidos a curtos períodos de isquemia seguida de reperfusão. Os autores observaram uma diminuição do tamanho do infarto quando
da oclusão coronariana definitiva 22.
O mecanismo do pré-condicionamento é controverso. A teoria atualmente aceita é que a adenosina liberada
durante o processo de isquemia e reperfusão se acopla à
proteína G e, por meio de segundos mensageiros, causa
a translocação da proteína quinase C do citosol para a
membrana, fosforilando uma proteína não identificada, que
medeia a proteção 23,24. Tal proteína pode ser o canal de
potássio dependente de trifosfato de adenosina (Katp),
que se torna ativado durante o pré-condicionamento
isquêmico e resulta na diminuição da duração do potencial de ação e na redução do influxo de cálcio, com perda da
função contrátil e efeito de economia de energia 25.
A presença de miocárdio hibernado deveria ser
investigada em todos os pacientes com doença arterial
coronária e disfunção ventricular esquerda crônica. Regiões do miocárdio podem apresentar deficiências severas
da contratilidade miocárdica com áreas assinérgicas por
longos períodos; no entanto, elas podem readquirir sua
No coração humano existem evidências experimentais e clínicas de que o fenômeno ocorra. Quatro tipos de
estudos publicados ratificam a ocorrência do pré-condici40
Editorial Laranjeiras
Artigos de Revisão
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onamento em humanos: 1) estudos em angioplastia demonstram menor alteração do segmento ST e produção
de lactato ao se comparar o primeiro episódio de
angioplastia com o episódio subseqüente 26; 2) estudos
clínicos sugerem que a ocorrência de angina precedendo
o infarto do miocárdio confere benefícios, apresentando
redução no tamanho do infarto do miocárdio independente do nível de vasos colaterais epicárdicos e ainda menor
taxa de mortalidade intra-hospitalar 27,28; 3) estudos sugerem que os pacientes podem desenvolver tolerância súbita à angina induzida pelo exercício. Esses estudos foram documentados por meio de teste de esforço que demonstraram ocorrer menor evidência eletrocardiográfica
de isquemia em um segundo teste de esforço 29; (4) estudos histoquímicos de amostras de miocárdio humanos
obtidas por meio de cirurgia de revascularização
miocárdica demonstraram marcadores bioquímicos do
pré-condicionamento. Um desses marcadores é a menor
taxa de depleção do trifosfato de adenosina após episódios de pré-condicionamento isquêmico miocárdico, como
foi observado por Yellon at al 30.
Sendo o pré-condicionamento uma forma de proteção miocárdica e tendo sido ela comprovada em seres
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farmacológicos que possam mimetizar o pré-condicionamento e representar uma importante forma terapêutica no
tratamento da doença isquêmica miocárdica.
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41
Artigos de Revisão
Editorial Laranjeiras
ARRITMIA CARDÍACA NO IDOSO CONTINUAMOS APRENDENDO
Old age is the most unexpected of things that
happen to a man
Trotski (1879-1940)
Roberto LM Sá, Fernando ES Cruz F*, Márcio LA Fagundes, LeonardoB Arantes, Cláudia M Perez*,
Rafael L.Fagundes**, Angela CB Valverde e Luiz H.Loyola.
RESUMO
entender como a ação do tempo exerce um efeito implacável sobre os objetos; não sendo de surpreender que o
organismo humano também esteja sujeito a transformações decorrentes do passar dos anos, porém mais danosas e complexas do que as citadas.
A idade na qual as pessoas tornam-se “idosas” é
difícil de ser definida, pois o envelhecimento é um processo contínuo, com limites mal estabelecidos entre a meiaidade e o idoso. Em alguns relatos os idosos são definidos para a seleção para benefícios médicos (65 anos).
Em outros o limite é de 70 anos ou mesmo 75 anos são
utilizados.
O envelhecimento é um processo contínuo, com limites imprecisos entre o que chamamos de meia-idade
e o indivíduo tido como idoso. Diversos relatos sugerem o
limite à partir de 65 anos para caracterizar o idoso. Outros
utilizam 70 anos e até 75 anos(1 ).
Nas populações mais idosas as doenças
cardiovasculares desempenham um papel significativo e
são a causa mais comum de morbidade e mortalidade. A
freqüência tanto de arritmias supraventriculares quanto
de ventriculares aumenta com a idade. A fibrilação atrial é
a arritmia sustentada mais comum na prática clínica e
também aumenta com a idade.
Sabemos perfeitamente que pode existir defasagem
significativa entre alterações cronológicas e as fisiológicas entre os indivíduos; e isto deve ser considerado na
abordagem e no manuseio de distúrbios clínicos que ocorrem nesta faixa da população. A idade aparente ou biológica, é com certeza mais relevante em termos médicos do
que a idade cronológica.
As alterações no nó sinusal e AV devidos ao envelhecimento junto com a diminuição da sensibilidade a
estimulação adrenérgica, cria e aumenta a incidência de
doença do nó sinusal e distúrbios de condução pelos ramos.
Epidemiologia
Palavras-chave: Idosos, arritmia, doença do nó
sinusal
Do ponto de vista demográfico, os “idosos” representam a faixa da população que mais cresce, em função
da melhor estrutura sócio-econômica hoje disponível, dos
avanços da medicina no controle de doenças outrora consideradas graves, e na descoberta de novas modalidades terapêuticas incorporadas rapidamente aos recursos
disponíveis ( 2).
ABSTRACT
The age at which persons became “elderly” is difficult
to define, because aging is a continuum process with
boundaries not well established between middle and old
age. In some reports the elderly are defined by eligibility for
Medical benefits (65 years). In others, age cutoffs of 70 or
even 75 years are used.
A expectativa de vida subiu de 47 anos nos Estados
Unidos em 1890 para 72 anos para homens e 79 anos
para mulheres no final do século XX.. O gasto global no
tratamento de doenças cardíacas em indivíduos com mais
de 65 anos foi da ordem de 58 bilhões de dólares em
1995 ( 3 ).
In the older population cardiovascular disease plays
a significant role and is the most common cause of
morbidity and mortality. The frequency of both
supraventricular and ventricular increases with age. Atrial
fibrillation is the most common sustained arrhythmia in
clinical practice and also increases with age.
Estudo recente ( 4 ) em pessoas entre 80 e 98 anos
de idade, demonstrou que a maioria preferia viver mais
com o seu comprometimento da saúde, do que viver uma
vida mais curta com saúde excelente.
The charges in the sinus and AV nodes due to aging
along with the decreased sensitivity to adrenergic
stimulation, create an increased incidence of sick sinus
syndrome, as well as AV and bundle branch conduction
disease.
Modificações do Sistema Cardiovascular Conseqüentes ao Envelhecimento
Das inúmeras alterações hoje identificadas no sistema cardiovascular decorrentes do avanço da idade, vão
nos interessar as que estejam possivelmente relacionadas ao aumento da prevalência de arritmias no idoso, a
saber ( 5 ).
Key-Words: Elderly, arrhithmia, sick sinus syndrome
“Enferrujam-se os arames e os ferros, cobrem-se
os panos de mofo, destrança-se o vime ressequido”...
Estas palavras ditas no início de um dos capítulos de
Memorial do Convento de José Saramago, ajudam-nos a
· Fibrose do nódulo sinusal concomitante à diminuiMédicos do Setor de Arritmia e Eletrofisiologia Clínica do INCL.
* Médica da Unidade Coronária do INCL.
** Médico Estagiário do Setor de Arritmia do INCL.
42
Editorial Laranjeiras
ção do número de células geradoras do estímulo elétrico
(automáticas). Estima-se que acima dos 75 anos, essa
redução seja de até 90%.
Artigos de Revisão
significância para doença arterial coronária (DAC) em idosos em seguimento de 10 anos (Baltimore Longitudinal
Study os Aging Project) ( 11 ). Em geral não requerem
tratamento, apenas tranqüilizar o paciente, salvo em caso
de sintomas desagradáveis.
· Degeneração e fibrose do esqueleto fibroso do
coração e porção superior do septo ventricular, bem como
fibrose e calcificação dos anéis valvares mitral e aórtico, e
adjacências.
Fibrilação Atrial
· Alterações ultra estruturais da junção AV e tronco
comum do feixe de His que provocam distúrbios de condução do estímulo elétrico a esse nível.
Representa a mais freqüente arritmia sustentada na
prática clínica, sua incidência aumenta com a idade ( 12 ),
aproximadamente dobra a cada década de vida, aumentando vertiginosamente com a idade avançada ( 13 ). Cerca de 60% da população com fibrilação atrial (FA) acima
de 75 anos é constituída de mulheres ( 14 ).
· Substituição fibrótica dos fascículos do ramo esquerdo e porções distais do sistema de condução, a partir
da sexta década.
· Aumento da massa ventricular esquerda, mesmo
na ausência de hipertensão arterial sistêmica e obesidade; diminuição do número de fibras miocárdicas, com
hipertrofia das células remanescentes e depósitos
interticiais de substância amilóide, hipofuscina, tecido
elástico, fibras colágenas e lipídios.
Uma classificação clinicamente útil é chamada dos
3 – P, proposta por Sopher e Camm ( 15 ).
1.
FA que termina espontaneamente, com retorno a ritmo sinusal, é definida como paroxística. Reverte
geralmente dentro de 24 a 48 h(16 ).
2.
FA que pode ser cardiovertida com sucesso
para ritmo sinusal é tida como persistente.
· Dilatação atrial, mesmo na ausência de doença
cardíaca subjacente.
3.
FA que é completamente refratária a reversão ou que se opta por permanecer, é classificada como
permanente.
· Modificações na vasculatura arterial sistêmica, na
sensibilidade dos barorreceptores e nos níveis de
norepinefrina circulante.
A prevalência de FA intermitente ou paroxística varia
de 22 a 65% na dependência da população estudada ( 17
). Cerca de ¼ dos pacientes que apresentam episódios
paroxísticos evoluem para formar mais persistentes. A
presença de valvulopatia, aumento atrial ou ventricular
esquerdo, hipertrofia ventricular, ou disfunção ventricular
sistólica aumentar o risco de progressão para FA permanente (18 ).
· Desbalanceamento autonômico por perda adequada de modulação da frequência cardíaca. Diminuição da
resposta dos beta-receptores, com conseqüências sobre
o cronotropismo, inotropismo e a vasodilatação periférica.
Frequência Cardíaca em Ritmo Sinusal
Existem diversos fatores etiológicos que podem ser
responsáveis pela ocorrência de FA, explicando sua
prevalência na população. Dentre estes estão incluídos
processos patológicos que produzem alterações no
miocárdio atrial, como distensão, inflamação, hipertrofia,
isquemia, fibrose ou infiltração. São descritas modificações normais no miocárdio relacionados com a idade,
talvez implicadas com o aumento da incidência de FA nos
idosos ( 19 ).
A freqüência cardíaca (FC) em repouso não sofre
alterações com a idade ( 6 ). Estudos epidemiológicos
recentes ( 7 ) em populações diferentes demonstraram
que uma FC em repouso mais elevada no jovem ou no
idoso representa um preditor forte de morte cardiovascular,
com um risco relativo de 1,35.
O estudo FINE (Finland, Italy, Netherlands, Elderly)
demonstrou que nos indivíduos idosos do sexo masculino , FC em repouso mais alta estava associado a um
aumento de mortalidade cardíaca global num acompanhamento de 10 anos(8). Esta associação pode ser
explicada pelo fato de a elevação de FC ser um marcador
de disfunção cardíaca assintomática ou de
descondicionamento físico e de um estilo de vida sedentário, ambas dessas condições sabidamente aumentam
o risco de mortalidade global. É interessante assinalar
que esta associação não foi observada na população feminina ( 9 ).
A FA na ausência de doença cardíaca estrutural detectada ou de enfermidade precipitadora é referida como
FA idiopática ou isolada. A prevalência relatada de FA isolada varia de 1,6% a 31% na dependência dos critérios
adotados de seleção e da intensidade dos meios diagnósticos utilizados ( 20, 21) .
Sintomas e morbidade ocorrem em pacientes idosos com FA. A resposta ventricular elevada pode causar
palpitações
desagradáveis.
As
repercussões
hemodinâmicas impostas pela FA são basicamente decorrente de 4 fatores: (a) extremos de frequência, podendo cursar com FC elevada ou períodos de alto grau de BAV
produzindo FC lenta e pausas; (b) perda da contribuição
atrial, diminuindo o volume sistólico e a qualidade de contração ventricular (Lei de Starling). No idoso devido a menor complacência do VE a perda da contração atrial é particularmente importante; (c) irregularidades dos ciclos,
permitindo consideráveis variações nas pressões de enchimento; (d) distúrbios de condução frequência dependente (22).
Instabilidade Elétrica Supraventricular
A prevalência tanto de arritmias supraventriculares
quanto de ventriculares aumenta com a idade. Extrasístoles atriais (ESA) são extremamente freqüentes na
população de idosos. ESA isoladas podem ser observadas no ECG basal em 50% de uma população normal
com idade superior a 60 anos. Utilizando-se
monitorização eletrocardiográfica contínua (Holter de 24h)
em indivíduos acima de 65 anos ESA e surtos não sustentados de TPSV foram detectados em cerca de 50% dos
pacientes (10). Estes tipos de arritmias parecem não ter
Um problema bastante relevante associado a FA refere-se ao tromboembolismo, devido a estase do fluxo
43
Artigos de Revisão
Editorial Laranjeiras
sangüíneo (turbilhonamento e remora) principalmente na auriculeta, com formação de trombo e com possível episódio
tromboembólico. No estudo de Framingham, a incidência de acidente vascular cerebral em pacientes com FA cresceu
de 1,5% no grupo de 50 a 59 anos para 23,5% nos pacientes com mais de 80 anos ( 23).
Recomenda-se que todos os pacientes idosos com FA sem contra-indicação (úlcera ativa, cirurgia recente,
história de sangramento recente, demência, quedas freqüentes ou trauma) sejam anticoagulados com warfarim sódio
oral, mantendo INR entre 2 e 3 ( 24).
O Flutter atrial apresenta uma possibilidade de abordagem com vistas a tratamento definitivo (ablação por cateter
com radiofrequência) bastante mais simples do que a fibrilação atrial. Apesar da incidência de tromboembolismo ser
menor no Flutter em comparação com a FA, a anticoagulação é geralmente indicada do mesmo modo como na FA(25)
.
Figura 1 : A- Ecocardiograma de uma paciente de 67 anos que apresenta episódios freqüentes de FA paroxística.
Observar a nítida remora ( contraste espontâneo no AE devido ao turbilhonamento de sangue produzido pela arritmia )
; B- O ECG da paciente ( V1 ).
Disfunção Sinusal e Hipersensibilidade do Seio
Carotídeo
de termos apenas os distúrbios funcionais sem sintomas associados e Doença do Nó Sinusal quando acompanhada de sintomas.
O termo Doença do Nó Sinusal (DNS) refere-se a
uma síndrome que engloba diversas anormalidades
anatômicas e funcionais nó sinusal (NSA), incluindo: (1)
bradicardia sinusal espontânea e persistente sem relação com ação medicamentosa é inadequada a circunstâncias fisiológicas, (2)
parada sinusal ou bloqueio
de saída, (3) a combinação de distúrbios da condução
sinoatrial (SA) e nodal atrioventricular (NAV), (4) alternância
de surtos rápidos regulares ou irregulares de
taquiarritmias atriais e períodos de freqüência atrial e
ventricular lenta (Síndrome Bradi-Taqui) ( 26 ). Uma ou
mais dessas condições podem ocorrer no mesmo indivíduo, em ocasiões diferentes, e os seus mecanismos podem estar interligadas e combinados com distúrbios de
condução ou do automatismo AV( 26 ). Pacientes sintomáticos com parada sinusal e/ou bloqueio de saída SA,
podem apresentar uma alta incidência de FA( 27 ).
As bases anatômicas da DNS podem envolver um
comprometimento parcial ou total do NSA, áreas de
descontinuidade nodal-atrial, alterações inflamatórias ou
degenerativas nos nervos e gânglios que circundam o
NSA e, modificações patológicas na parede atrial. Ocorre
fibrose e infiltração gordurosa, sendo que o processo
esclerodegenerativo geralmente compreende, o NSA e o
NAV ou o Feixe de His e seus ramos ou subdivisões distais
( 28 ). Oclusão da artéria do NSA pode ser significativa ( 29 ).
As modificações impostas ao NSA pelo envelhecimento, associado com a diminuição da sensibilidade a
estimulação adrenérgica favorecem a um aumento de incidência de DNS, bem como de distúrbio de condução AV
e de ramos.
Usa-se a denominação Disfunsão Sinusal em caso
44
Editorial Laranjeiras
Artigos de Revisão
Dificilmente encontra-se indivíduos com mais de 80 anos sem evidência de cardiopatia, com bradicardia sinusal
e FC inferior a 40 bpm ou pausas maiores de 2000ms. Achados dessa natureza devem ser manifestações de DNS
(10 ).
A identificação da DNS é importante para a terapia medicamentosa concomitante, pois uma bradicardia
assintomática pode tornar-se sintomática com o uso de medicação que deprima a função sinusal (30). Reconhecer a
DNS também é importante devido ao seu potencial embólico. A Síndrome Bradi-Taqui apresenta uma alta incidência de
embolismo sistêmico justificando anticoagulação preventiva em muitos casos ( 31 ).
Outra entidade clínica extremamente importante quando se avalia pacientes com possível (quadro de bradiarritmia
intermitente e que representa causa relevante de quadros sincopais, é a chamada Hipersensibilidade do Seio Carotídeo
(HSC). Esta condição é geralmente caracterizada por assistolia ventricular devido a cessação da atividade atrial decorrente de parada sinusal ou bloqueio sinuatrial avançado, ou ainda, porém menos freqüente, do aparecimento do BAV
Total Paroxístico ( 32 ). Seu mecanismo é controverso.
Existem 3 tipos de HSC, a saber:
(1)
cardioinibitória – com assistolia maior do que 3 segundos
(2)
vasodepressora – queda da PA sistólica de 50 mmHg ou mais
(3)
mista – a combinação de ambas.
A prevalência de HSC é variável, podendo chegar a mais de 20% nos pacientes submetidos a investigação de
causas de síncope recorrente ( 33 ).
A distinção entre as formas de resposta da HSC é fundamental pois implica em condutas terapêuticas bastante
diversas.
M.E.M. – 68 anos - Masc.
Figura 2 : Paciente com Hipersensibilidade do Seio Carotídeo do tipo predominante cardioini-bitório, produzindo pausa
associada a sensação de pré-síncope.
Doença Nodal AV e do Sistema His-Purkinje
Com o passar dos anos a incidência de bloqueios
AV e de ramos aumenta, provavelmente como resultado
do aumento de fibrose e calcificação do esqueleto fibroso
do coração ( 35 ). BAV de 1º ou 2º grau podem ser benignas a menos que estejam associados a intoxicação
digitálica ou a sintomas, mas geralmente decorrem de
exacerbação do tônus vagal. A presença de BAV do 2º grau
Mobitz II e de 3º grau é incomum, mesmo em pacientes
bem idosos (36), e estão quase sempre associados com
comprometimento avançado do sistema de condução, com
indicação formal para implante de marcapasso definitivo.
A anatomia e os tipos celulares do NAV são complexos, ainda ocorrendo muita discussão a respeito. Os diversos tipos celulares apresentam tipos particulares de
potencial de ação. Para o clínico, no entanto, é útil considerar o NAV como uma estrutura única, cuja condução é
determinada principalmente por células que dependem
da corrente lenta de influxo de cálcio (Ica) para a
despolarização de fase O, isto associado 3 considerações geométricas estruturais resulta em uma lenta velocidade de condução; tendo em mente que os tecidos
atriais, as vias lenta e rápida e o sistema His-Purkinje
possuem propriedades eletrofisiológicas distintas ( 34 ).
Estas particularidades do NAV limitam a passagem de
estímulos, produzindo uma filtragem de impulsos rápidos, protegendo assim os ventrículos, nos casos de
fibrilação ou flutter atrial. O registro elétrico intracavitário
permite avaliação da função do NAV.
O sistema His-Purkinje é composto de tecido cardíaco especializado que se estende do NAV as fibras terminais da rede de Purkinje com suas inserções no miocárdio
ventricular. Constitui uma “alto estrada eletrônica” que
transmite e distribui os impulsos despolarizantes para o
miocárdio ventricular , ocorrem de modo que a contração
45
Artigos de Revisão
Editorial Laranjeiras
possa ocorrer de uma maneira sincronizada e efetiva. A descontinuidade desta rede pode resultar em dissociação
entre a contração atrial e ventricular, ou em uma seqüência assincrônica de despolarização e da mecânica de contração, ou pode tornar-se sítio de impulsos anormais (37).
A localização estratégica do Feixe de His e das porções proximais dos ramos torna-os vulneráveis a processos
patológicos que envolvam o corpo fibroso central do coração, o anel mitral, o anel tricúspide, o anel aórtico e o septo
ventricular. Lesões calcificadas atingindo essas estruturas estão freqüentemente associadas a bloqueios fasciculares
e de ramos, ou o mesmo bloqueio AV. As causas de envolvimento valvular podem ser relacionados a cardiopatia
reumática ou degenerativa e a processos de envelhecimento do lado esquerdo do esqueleto cardíaco. Outras etiologias
para este tipo de agressão seria a hipertensão arterial, associada geralmente a fibrose do septo ventricular e alterações degenerativas do annulus fibrosus e do corpo fibroso central; as lesões isquêmicas também são importantes em
produzirem distúrbios de conclusão intraventricular (37 ).
Comprometimento primário do sistema de condução, no idoso tem sido definido como Doença de Lev, e no jovem
tem sido rotulado de Doença de Lenègre (38,39 ) Lev chamou a atenção para o efeito do envelhecimento e do estresse
hemodinâmico sobre o esqueleto cardíaco.
Observa-se desvio do eixo do QRS para a esquerda, com o envelhecimento, chegando a – 30º em 20% ao redor
dos 90 anos; talvez devido a aumento da massa do VE ou fibrose intersticial do hemifascículo anterior. Bloqueio de
ramo direito (BRD) é encontrado em 3% de população saudável com mais de 85 anos e em 8 a 10% em cardiopatas
(35,40 ). A presença de bloqueio de ramo esquerdo (BRE) correlaciona-se fortemente com a idade e pode representar
um progressivo processo degenerativo atingindo o miocárdio ventricular ( 41 ).
Figura 3 : Paciente com história de episódios sincopais. Observar no traçado contínuo de Holter a diversidade de ritmos
ectópicos e distúrbio de condução AV.
Instabilidade Elétrica Ventricular
As extra-sístoles ventriculares (EV) aumentam em prevalência e freqüência com a idade, incluindo formas isoladas, pareadas, polimórficas e surtos não sustentados de taquicardia ventricular (TVNS) ( 10,13 ). Com o exercício as EV
aumentam a prevalência de 11% na 3ª década de vida para 57% na 9ª ( 1 ).
O prognóstico das EV isoladas ou polimórficas depende da presença ou ausência de doença cardíaca de base
(35 ).
A prevalência de EV e de TVNS em pacientes com doença arterial coronária depende no estágio da doença em
que a monitorização eletrocardiográfica é feita. A prevalência e o tipo de ectopia estão relacionadas com o grau de
disfunção ventricular esquerda ( 42,43 ).
A maior prevalência de ectopia ventricular e TVNS é observada em pacientes com cardiomiopatia dilatada não
isquêmica. Neste caso praticamente todos os pacientes apresentam EV e cerca de metade TVNS ( 44,45 ).
Pacientes assintomáticos com doença arterial coronária e disfunção significativa de VE, a presença de EV freqüentes, complexas ou surtos de TVNS indica aumento significativo do risco de morte súbita ( 46 ).
O tratamento das EV isoladas e mesmo complexas nos indivíduos assintomáticos sem evidência de doença
46
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cardíaca estrutural, não está indicado ( 1 ).
A chamada taquicardia ventricular lenta ( slow ventricular tachycardia ) é comum no paciente idoso, e não apresenta valor prognóstico, não necessitam de tratamento, trata-se de ritmo de substituição momentâneo ( 32 ).
Figura 4 : Exemplo de TVNS do tipo polimórfica em paciente com cardiomiopatia dilatada de origem isquêmica.
Conclusões
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O envelhecimento representa um processo contínuo inerente a todas os seres vivos; durante o percurso
da vida ocorrem diversas modificações fisiológicas, bem
como distúrbios muitas vezes importantes produzindo
repercussões deletérias ao organismo. A identificação
precoce e precisa destas situações permitem ao médico
uma abordagem correta e racional com real benefício para
os indivíduos.
Os diversos distúrbios do ritmo e da condução apresentados compõem cenário complexo e com inúmeras
particularidades que esperamos ter contribuído para esclarecer.
Todos nós sabemos que o aprendizado é ilimitado
e cada informação adicional acumulada é sempre bem
vinda e muitas vezes preciosa.
A vida é uma “doença” sexualmente transmitida e
com 100% de mortalidade, cabe a todos nós vivê-la e
contribuir para que os outros igualmente possam desfrutála com qualidade e durante um período considerável.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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47
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Editorial Laranjeiras
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48
Editorial Laranjeiras
Relato de Caso
SIRS NO TRATAMENTO ENDOVASCULAR DA DISSECÇÃO
CRÔNICA TIPO B DE STANFORD.
Rio de Janeiro - RJ
Flávio Reis Gouvêa*, Mônica Resende P. Gouvêa** , Bruno Reis Gouvêa***, César A.S. Nascimento****, Odilon
Nogueira Barbosa*****, Oscar Reis Brito******.
RESUMO
do encaminhado ao ambulatório do Instituto Nacional de
Cardiologia (INC), onde foi iniciado tratamento com
betabloqueador e indicado cirurgia.
Paciente de 47 anos, com história de acidente automobilístico há 20 anos, apresentando quadro de dissecção de aorta crônica tipo B de Stanford sintomático (rouquidão). Submetido ao tratamento endovascular, evoluiu
com síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SIRS)
e óbito
Na avaliação pré-operatória, o ETE evidenciou
descontinuidade da parede posterior da aorta descendente, abaixo da subclávia esquerda, compatível com ruptura
da parede posterior da aorta, e ainda volumoso falso
aneurisma (+/- 6,5 cm), preenchido em grande parte por
trombos e com fluxo (in/out) para luz. (fig3). A
aortocoronariografia mostrou válvula aórtica normal com
volumoso aneurisma comprometendo a crossa da aorta
e a aorta descendente, com entrada após emergência da
subclávia esquerda. Vasos da base e coronárias apresentaram-se normais (fig 3). Na avaliação final da
angiorressonância, encontramos aneurisma sacular
emergindo da aorta descendente proximal, comunicando-se com o lúmen da aorta através de pequeno orifício e
formando grande massa trombosada em seu interior. Os
vasos da base estavam preservados e a artéria pulmonar
esquerda apresentava compressão extrínseca (fig 5) e
(fig 6).
Palavras-chave: dissecção aórtica, endoprótese, SIRS.
ABSTRACT
Patient 47 old years, with history of automobile
accident 20 years ago, presenting chronic aortic dissection
Stanford type B symptomatic. Submitted to treatment with
endoprothesis evolved to SIRS and death.
Key-words: aortic dissection, endoprothesis, SIRS
INTRODUÇÃO
A dissecção aórtica contribui para altas taxas de
mortalidade por doença cardiovascular: sua incidência
varia de 5 a 30 casos/milhão/ano, de acordo com a
prevalência dos fatores de risco na população estudada.
A escolha do método diagnóstico depende da disponibilidade e experiência de cada instituição. O ecocardiograma
transesofágico (ETE), a revasculalrização miocárdica (RM)
e a tomografia computadorizada (TC) possuem sensibilidade e especificidade semelhantes e acima de 95%. A
classificação da dissecção é baseada na sua localização
e extensão. e, nesse aspecto, as classificações mais utilizadas são as de Stanford e De Bakey. Classifica-se também, em relação ao tempo de evolução, em aguda (antes
de duas semanas) e crônica (mais de duas semanas)
(fig 1).
Paciente foi submetido à implante de endoprótese
aórtica sem intercorrências, com acompanhamento de
ETE, e liberação da endoprótese ao nível do arco aórtico e
aorta descendente.
À admissão no pós-operatório, encontrava-se estável hemodinamicamente, sem aminase, e foi prontamente extubado. Três horas após extubação, apresentou quadro de hipotensão e hipoxemia, evoluindo para reintubação.
Iniciado noradrenalina e aumentada a infusão de
cristalóide. Contactada a cirurgia, esta indicou a realização de ETE, que não mostrou dissecção.
A indicação cirúrgica na dissecção aórtica é baseada em parâmetros clínicos e classificação
anatomopatológica. A dissecção aguda da aorta ascendente e arco tem indicação cirúrgica imediata, enquanto
dissecção aguda da aorta descendente permanece em
tratamento clínico-farmacológico, inicialmente, que, na
maioria dos casos, é eficiente.
Indicado passagem de cateter de Swan-Ganz, que
revelou parâmetros oxihemodinâmicos sugestivos de
síndrome de resposta inflamatória sistêmica. Colhidas
hemocultura e urinocultura, deu-se inicio à
antibioticoterapia. Os exames se mostraram negativos e,
então, foi suspenso o antibiótico
O paciente, apesar do uso de altas doses de aminas,
azul de metileno, corticoterapia e hidratação vigorosa evoluiu com hipotensão, acidose metabólica refratária ao tratamento, febre alta e boa diurese. Apresentou taquiarritimia
com dissociação pulso-precórdio, evoluindo para óbito.
RELATO DE CASO
Homem de 47 anos, com história de acidente automobilístico há 20 anos, procurou assistência médica com
queixa de rouquidão. Realizado raio-x de tórax (fig 2), mostrando grande massa torácica. Indicado TC de tórax, que
revelou dilatação aneurismática da crossa da aorta, sen-
* Cirurgião do Instituto Nacional de Cardiologia.
** Médica staff do Pós-Operatório do INCL.
*** Acadêmico de medicina 5 º ano da Faculdade de Medicina de Teresópolis.
****Médico Staff do Departamento de Ecocardiografia do INCL.
***** Chefe do Departamento de Cirurgia Cardíaca do INCL.
****** Chefe da Cirurgia Cardíaca de Adulto do INCL.
EMAIL- [email protected].
49
Relato de Caso
Editorial Laranjeiras
DISCUSSÃO
A indicação cirúrgica na dissecção da aorta tipo B é baseada em critérios clínicos e anatomopatológicos. Na
dissecção tipo B aguda, a cirurgia está indicada em pacientes sintomáticos, com dissecção dita complicada, caracterizada por: 1. sinais de ruptura; 2. aneurisma de aorta pré – existente ou coarctação; 3. sinais de isquemia; 4. progressão da dissecção; 5. dor intratável; e 6. hipertensão arterial incontrolável. Nos pacientes assintomáticos, quando ocorre
controle clínico com desaparecimento da dor, não há vantagem do tratamento cirúrgico, no caso.
Na dissecção tipo B crônica, a cirurgia deve ser realizada nos pacientes sintomáticos com dor persistente,
isquemia de órgão, ou sintomas dependentes do aneurisma (dor, atelectasia, disfagia, ruptura e rouquidão). Nos
pacientes assintomáticos, a cirurgia depende do diâmetro da aorta descendente (>6,5cm).
Uma das maiores preocupações do tratamento cirúrgico é a irrigação medular feita pela artéria de Adamkiewiez,
ramo de uma intercostal entre T8 -T12, já que a cirurgia consiste em ressecção da aorta e interposição de enxerto.
A taxa de mortalidade na dissecção tipo B aguda ou crônica é de 15% e a de paraplegia de 8%; o maior determinante
da mortalidade é o estado clínico do doente.
O tratamento endovascular da dissecção da aorta descendente é uma alternativa eficiente e menos agressiva, e
sua indicação é baseada nas indicações cirúrgicas clássicas. O resultado do tratamento endovascular, comparado ao
cirúrgico, é mais favorável e responde por morbimortalidade menor.
As complicações do tratamento endovascular estão relacionadas à manipulação do cateter na aorta e do perfil da
prótese, podendo ocorrer acidente vascular cerebral, dissecção iatrogênica, complicação vascular, sangramento excessivo e infecção. Cerca de 20% dos pacientes evoluem com febre nos primeiros dias, devido à síndrome de resposta
inflamatória sistêmica; 4% desenvolvem SIRS grave podendo 2% evoluir para óbito, fazendo-se necessária uma
investigação de foco infeccioso. A ausência de paraplegia é destaque nas séries até agora estudadas.
Apesar de, em longo prazo, a eficiência ser indeterminada, a redução da estada hospitalar, a melhor recuperação
física e a diminuição da morbimortalidade tornam o tratamento endovascular encorajador.
50
Editorial Laranjeiras
Relato de Caso
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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51
Renovação Estrutural
Editorial Laranjeiras
O ARQUIVO MÉDICO EM FOTOS – INCL 2001 A 2003
RIO DE JANEIRO - RJ
Marcio Arnaldo da Silva Gomes*
Resumo
A evolução do trabalho de reorganização do arquivo de prontuários
O artigo apresenta o registro fotográfico das mudanças verificadas no arquivo médico do Instituto Nacional de
Cardiologia Laranjeiras após a introdução de métodos e instrumentos de arquivologia na gestão de documentos e da
informação.
Com uma série numérica que já atinge mais de 113.000
prontuários, os procedimentos de guarda, manutenção e organização desse acervo vão se tornando mais e mais complexos, exigindo o emprego em escala crescente do conhecimento especializado e das técnicas modernas da
arquivologia na gestão de documentos e da informação. Esteja a informação no tradicional suporte papel ou nos atuais
equipamentos digitais, que utilizam meios magnéticos ou a
laser para guardá-la, já está amplamente demonstrado que o
método (se assim pode ser chamado) empírico de
gerenciamento do arquivo de prontuários tem de ser substituído por procedimentos estruturados visando a permanente
avaliação dos resultados das ações, a previsão das tendências de crescimento e as necessidades futuras de espaço,
materiais, equipamentos e pessoal qualificado etc.
Palavras-chave: Controle de formulários e registros,
registros médicos, arquivos
Abstract
This article presents the photographic record of the
changes which took place at the Laranjeiras National
Institute of Cardiology after the introduction of archival
methods and techniques for data management
Key-words: Forms and records control, medical
forms, archives
As modificações introduzidas e um novo olhar sobre a
importância do prontuário não só para o atendimento mas
também para a acumulação de conhecimento, para fins de
estudo e pesquisa, sobretudo em uma unidade de saúde da
complexidade do INCL, começam a poder ser mensuradas.
Por exemplo, de 86 prontuários em cada 100 que, quando
solicitados, podiam ser fornecidos pelo arquivo médico em
2001 passa-se a uma taxa média de atendimento de 98 %
em 2003, conforme já reportado em artigo anterior desta revista1.
Introdução
Não é exagerado se afirmar que uma das coisas
que fazem diferença entre um bom e um mau atendimento em saúde é a presença do prontuário do paciente no
momento da consulta. Entretanto, nem sempre as unidades públicas de saúde estão devidamente organizadas
para propiciar esse encontro. Os setores que cuidam dos
prontuários de pacientes nessas unidades ainda não foram, em geral, alcançados pelo conhecimento acumulado pela disciplina da Arquivologia, e impera uma grande
e perigosa improvisação no tratamento de acervos de
prontuários.
Encontrar um documento entre muitos milhares pressupõe que uma tão simples quanto fundamental exigência esteja atendida: organização, tanto do ambiente quanto das tarefas e dos procedimentos efetuados. Um arquivo que visualmente se apresenta em desordem já permite ao observador a suposição, em geral fundada, de que
apresentará menor eficiência em suas atividades. Por isso
resolvemos apresentar uma seqüência de fotos que, recolhida desde o início do trabalho de consultoria da Fiocruz
até o momento presente, documentam as pequenas e
grandes transformações que atravessamos.
No Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras, o problema também se manifestava até alguns anos
atrás, e, apesar de grandes esforços, apenas lentamente o quadro vai se revertendo. Pôr em movimento uma
nova concepção de tratamento de arquivos e informação,
verdadeiramente profissional, tem obviamente seus custos, sendo talvez um dos maiores a superação da cultura
institucional, amplamente difundida, de que arquivo nada
mais seria que uma espécie de depósito de papéis, em
geral velhos e quase inúteis.
Além das fotos, apresentamos ainda o fluxograma
das operações de busca que se fazem necessárias quando um determinado documento não é encontrado em seu
endereço no arquivo. Considerando-se que diariamente
são movimentados em média 240 prontuários, que cada
movimento de retirada será acompanhado de outro de
recolocação do prontuário em seu endereço, e que as
condições ainda precárias do arquivo não permitem modificações em curto prazo daquele complicado algoritmo
de busca, deduz-se que a equipe de funcionários do setor
é uma das primeiras interessadas em que os prontuários
sejam imediatamente localizados assim que requeridos,
sem que seja necessário entrar na onerosa seqüência de
operações do fluxograma.
A situação no INCL começou a ser revertida a partir
da consultoria executada pela Casa de Osvaldo Cruz
(Fiocruz) no setor de arquivo de prontuários de pacientes,
em 2001. Naquele momento se iniciou um grande levantamento, ainda não concluído, da massa documental sob
nossa responsabilidade, de suas condições físicas e das
informações que contém, assim como se iniciou a introdução de técnicas de gestão compatíveis com seu tamanho e importância.
*
Médico psiquiatra, integrante da Coordenação de Planejamentodo do INCL, responsável-técnico pelo Arquivo Médico
52
Editorial Laranjeiras
Renovação Estrutural
O serviço de arquivo do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras é movimentado por 5 funcionários de nível médio de
escolaridade, sob a gerência imediata de um profissional de nível superior, formado em Arquivologia. Dos seis funcionários,
um é do quadro do Ministério da Saúde e os outros cinco são terceirizados. Ressaltamos que todos responderam com
entusiasmo aos novos métodos, e a eles se deve grande parte e os avanços verificados do setor.
Cabe ao serviço de arquivo médico:
- guarda dos prontuários do hospital;
- manutenção da integridade dos mesmos;
- fornecimento dos prontuários aos setores de internação, de ambulatório e para consulta pelos profissionais ou pelo
paciente, quando requisitado;
- planejamento e execução das atividades relacionadas à preservação da memória assistencial, científica e institucional
do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras;
- conhecimento da informação contida e organização desse patrimônio documental visando disponibilizá-lo para estudos e pesquisas.
As rotinas básicas do serviço são:
1 – enviar os prontuários ao ambulatório para as consultas;
2 – enviar os prontuários ao setor de internação;
3 – receber e arquivar os prontuários novos e os devolvidos pelos setores de internação e ambulatório;
4 – fornecer e arquivar prontuários requisitados para pesquisa e consultas;
5 – registrar no sistema informatizado toda a movimentação de prontuários;
6 – manter a organização das estantes de arquivamento;
7 – trocar capas de prontuários e envelopes de RX;
8 – acompanhar o movimento de abertura de prontuários para novos pacientes e planejar sua alocação;
9 – produzir mensalmente planilha relacionando a quantidade de prontuários fornecidos e a quantidade de não encontrados, para cálculo da produtividade do setor;
Conforme já dito anteriormente, o tamanho do acervo, as tarefas exigidas para um cuidado não improvisado desse
acervo, a situação periclitante em que se encontrava há poucos anos e, sobretudo, a dimensão reduzida do número de
profissionais e a exigüidade dos espaços disponíveis para o arquivo de prontuários do Instituto Nacional de Cardiologia mostram que, apesar dos avanços, muito ainda precisa ser realizado.
Acima, a situação em que se encontravam prontuários de óbitos e
prontuários do antigo Hospital N. Sra. das Vitórias em 2001. Pode-se constatar a desordem e ausência de identificação do material depositado. O
trabalho dos técnicos da Casa de Osvaldo Cruz – Fiocruz consistiu inicialmente em recolher todo o acervo de documentos referentes a pacientes
que se encontravam em várias salas, em diversos andares do INCL. Feito
o recolhimento, pôde-se separar e identificar o material segundo sua procedência, após o que foram embalados em lotes devidamente numerados. Procedeu-se em seguida à remoção do material assim tratado para
um local específico destinado unicamente aos prontuários inativos.
Os prontuários antigos do Hospital N. Sra. das Vitórias, do Hospital
de Clínicas e do Hospital de Cardiologia de Laranjeiras, assim como os
prontuários de óbitos do INCL estão guardados atualmente separados
dos prontuários ativos, que se encontram no arquivo do 3º andar do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras ( ver página seguinte).
53
Renovação Estrutural
Editorial Laranjeiras
Embora ainda não se apresentem em condições
ideais, os prontuários inativos amarrados em lotes
receberam etiquetas e foram devidamente endereçados por estantes e por prateleiras. Acima, a situação
em que foram alocados logo após a intervenção técnica da Fiocruz.
Ao lado, imagem mais recente mostrando a situação ideal em que devem ser arquivados documentos inativos de valor histórico e científico: embalados
em caixas-arquivos, devidamente identificadas e
endereçadas em sistema informatizado.
Vê-se o ambiente do Arquivo de prontuários ativos, no 3º andar do INCL, em 2001. Devido à enorme quantidade de prontuários
e o espaço exíguo, as estantes invadem os locais destinados à
circulação e ao trabalho dos funcionários do setor. Sequer havia
distância para um enquadramento mais amplo da fotografia.
As três últimas fotos mostram o mesmo ambiente após as reformulações procedidas a partir de 2001.
Embora o arquivo venha recebendo novos equipamentos –
estantes, computadores, mobiliário, carrinhos -, a grande
quantidade de novos prontuários a serem arquivados mensalmente continuam pressionando o espaço destinado aos
prontuários ativos, que já se
mostra insuficiente para acompanhar a demanda.
À direita, detalhe de concepção nova para ordenação
das estantes, em que chapas
de raios-X de um grupo de
prontuários são arquivadas
juntas em uma única prateleira, e os correspondentes prontuários ocupam as demais prateleiras. Essa nova forma de
arquivamento permite melhor
aproveitamento do espaço, e
inclusive a introdução de mais
uma prateleira por estante.
54
Editorial Laranjeiras
Renovação Estrutural
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
1. Gomes, Marcio Arnaldo da Silva. O Instituto Nacional de
Cardiologia Laranjeiras e a Memória da Medicina Brasileira.
Editorial Laranjeiras vol. 1 nº 3, novembro 2003
55
Destaque em Gestão
Editorial Laranjeiras
POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO : DESAFIOS DA
IMPLEMENTAÇÃO EM UM HOSPITAL
PÚBLICO DE ALTA COMPLEXIDADE
RIO DE JANEIRO - RJ
*Lilian F. Nascimento, Ionete de Oliveira, Lúcia Pimenta, Ademir B.da Cunha, Verossemilia M. Silva, Ana Lúcia
Tarouquella, Raul G. Marques, Telmo Carvalho, José Souto, Izabel Cristina V. de A. Lima,
Bernardo R. Tura, Regina Maria de A.Xavier
INSTITUTO NACIONAL DE CARDIOLOGIA
LARANJEIRAS
Métodos
Resumo
A partir das propostas do Ministério da Saúde, o Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras criou um grupo
de trabalho para implementação do programa de políticas de humanização, levando em conta as características
próprias da nossa unidade. O grupo foi composto à princípio, de cinco médicos, duas enfermeiras, uma assistente
social, uma pedagoga, um representante dos servidores
reunindo-se semanalmente com tarefas pré-determinadas para serem discutidas em cada reunião. Com o desenvolvimento dos nossos encontros, foi-se percebendo
uma boa coesão do grupo e a descoberta de múltiplas
propostas comuns, o que estimulou a criação e formulação de novos parâmetros para o desenvolvimento do trabalho. Primeiramente, optou-se por fazer um levantamento das ações já instituídas no nosso instituto, e o resultado nos surpreendeu positivamente. Constatamos uma
extensa lista de atividades já em andamento, voltadas especialmente para o usuário, as quais incluem, entre outras, grupo de preparo para cirurgia de adulto e infantil,
assinalando que nesta ultima é feita uma dramatização
com as crianças vestindo-se como profissionais de saúde e reproduzindo o procedimento cirúrgico com bonecos
e brinquedos, o que resulta em colaboração importante
ao longo do processo de internação, recuperação cirúrgica e alta hospitalar. Chamou-nos atenção a quantidade
de atividades já desenvolvidas, embora ainda não integradas em uma política específica de humanização. Foram ainda levantadas as ações voltadas para os servidores, sendo também encontradas atividades já em andamento.
O presente trabalho relata os passos que vêm sendo dados para a implementação de políticas de
humanização em um hospital público de alta complexidade, seguindo as diretrizes da Política Nacional de
Humanização - Humaniza SUS. Com esse objetivo, foi
criado um grupo de trabalho que optou por estabelecer
uma metodologia de avaliação das demandas primordiais do servidor, através da elaboração e aplicação de um
questionário de satisfação, de caráter anônimo e voluntário. São também descritos e comentados os resultados
da análise das respostas obtidas.
Palavras-chave: Política
metodologia, questionário
de
humanização,
Abstract This article presents the steps that have
been taken to implement a humanization policy in a public
hospital of high complexity, following the National
Humanization Policy Guidelines – Humaniza SUS Project.
For this purpose, a working group was created, who
decided to develop and apply a methodology to evaluate
the staff´s main demands, using a questionnaire to
assess their degree of satisfaction and to be answered on
an anonymous and voluntary basis. An analysis of their
responses is presented and discussed.
Key-Words: Humanization policy, methodology,
questionnare
Introdução
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi votado em 1988,
afirmando a universalidade, a integralidade e a equidade
da atenção em saúde, que não se reduzia à ausência de
doença, mas a uma vida com qualidade.
Após esse primeiro momento, sabendo-se que a
proposta atual da Política Nacional de Humanização visa
reestruturar uma oferta ajustada que atenda satisfatoriamente não só aos usuários mas também ao servidor, o
grupo optou por estabelecer uma metodologia de avaliação das demandas primordiais do servidor, elaborando e
aplicando um questionário de satisfação, de caráter anônimo e voluntário, que foi distribuído para todas as categorias de servidores do Instituto. O questionário constituise de oito questões estruturadas, com pontuações de
zero a cinco e cinco questões semi-estruturadas, com o
Após quinze anos de seu percurso, comemorando
avanços e se deparando com dificuldades que ainda persistem, o Ministério da Saúde vem construindo uma política nomeada de Política Nacional de Humanização na
atenção e gestão do Sistema Único de Saúde – Humaniza
SUS.
A humanização é entendida como a valorização dos
diferentes sujeitos implicados no processo de produção
de saúde – usuários, trabalhadores e gestores – considerando como fundamental o desenvolvimento de uma
série de ações voltadas para esse objetivo 1.
* Grupoterapeuta, Membro efetivo da SPAG - E-Rio
Chefe da Saúde Mental do INCL
56
Editorial Laranjeiras
Destaque em Gestão
mento do trabalho voltado para políticas de humanização.
A partir desses dados, o grupo definiu duas propostas
como ponto de partida, que seriam: buscar parâmetros
para a implementação de uma Política de Valorização Profissional de caráter permanente e criar uma rede de
multiplicadores, visando promover integração, socialização, aprimoramento da comunicação interna e avaliação
contínua das ações implementadas.
objetivo básico de analisar: o grau de satisfação do servidor, suas propostas e sua integração ao Instituto, além de
tentar dimensionar o seu conhecimento sobre o planejamento estratégico. A distribuição foi feita durante o período de uma semana, e seu recolhimento realizado através
das diversas urnas distribuídas amplamente pelo hospital, seguido da análise estatística das respostas obtidas,
através da análise de proporção (univariada) e do teste do
chi quadrado (bivariada). Vale assinalar que não houve
questões em branco ou anuladas, percebendo-se a boa
receptividade e seriedade com que este movimento foi
acolhido pelos servidores, tendo-se obtido uma adesão
de trezentos e setenta e cinco funcionários em um universo de cerca de mil e duzentos, apesar do curto prazo oferecido e da realização da pesquisa em um mês onde habitualmente há uma percentual maior de funcionários em
férias. (vide fig.1). Durante o período em que foi realizada
a avaliação dos resultados, chamou também a atenção
do grupo, a imensa possibilidade de percepção subjetiva
de desejos dos servidores, através da forma como eles
se colocaram nas respostas semi-estruturadas, gerando
com isso informações importantes para uma análise mais
apurada de suas expectativas. Nesse processo, portanto, foram obtidos resultados úteis e norteadores quanto
às novas propostas de implementação de políticas de
humanização dirigidas aos servidores; incluindo-se também as críticas, orientadoras para novos direcionamentos.
Figuras de 1 a 5 na pág. seguinte.
Resultados
Levantando-se os percentuais obtidos entre as pontuações 4 e 5 do questionário, encontramos o seguinte:
84,7% dos servidores que responderam ao questionário
apresentam prazer em trabalhar no Instituto; 71% estão
satisfeitos com o ambiente de trabalho; 73,5% têm satisfação com a chefia imediata; 94,6% têm interesse em se
qualificar; 89,3% têm interesse em permanecer no Instituto; 42,8% consideram-se alvo de injustiças; apenas
29,2% se acham valorizados quanto à categoria funcional; e 18,4% consideram sua remuneração justa.
Após essa etapa, prosseguindo na avaliação das
respostas, foram realizadas análises bivariadas das questões estruturadas, também estas geradoras de informações interessantes para orientar a implementação de
políticas de humanização dirigidas aos servidores. Foi feito
o cruzamento entre as questões referentes a remuneração justa e alvo de injustiça, e o resultado obtido foi que
sentir-se injustiçado está diretamente ligado a sentir-se
mal remunerado (vide fig.2). No cruzamento de valorização da categoria funcional e alvo de injustiça, foi verificado
que sentir-se injustiçado está diretamente ligado a sentir-se não-valorizado (vide fig.3). Quando cruzados os itens
remuneração profissional e valorização da categoria, verificou-se que a categoria sentir-se valorizada não estaria
diretamente ligado a ter uma remuneração justa (vide fig.4).
Quanto ao cruzamento de desejo de capacitação e alvo de
injustiça, depreendeu-se que sentir-se injustiçado não tiraria a motivação na capacitação (vide fig.5).
Considerações
Os dados obtidos fizeram o grupo refletir sobre o
fato de que insatisfação com a remuneração não exclui a
demanda por valorização da categoria funcional e a motivação pela capacitação, achados estes que nos pareceram parâmetros fundamentais para nortear o desenvolvi57
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
1- Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização; Humaniza - SUS: Política Nacional
de Humanização; Ministério da Saúde-Secretaria Executiva; Brasília; 2003.
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Editorial Laranjeiras
PREFERE – DA INFORMAÇÃO A PREVENÇÃO
RIO DE JANEIRO - RJ
*Regina Maria de Aquino Xavier, **Mônica Nolasco, ***Regina Elizabeth Müller, ****Marisa da Silva
Santos, *****Ana Beatriz Ribeiro Lima, ******Maria José Lucas, *******Ana Lúcia Taranquella Schilke
Resumo
Febre Reumática é a forma mais comum de doença
cardiovascular adquirida na infância e em adultos jovens em
todo mundo, com elevada morbi-mortalidade. É um problema
de saúde pública, com significantes custos(diretos e indiretos)
a sociedade. Hipócrates foi o primeiro a descrevê-la, em 350
aC.. Desde 1954 a Organização Mundial de Saúde (OMS)
tem se preocupado com a prevenção e controle da Febre
Reumática e Cardiopatia Reumática. O Instituto Nacional de
Cardiologia Laranjeiras desenvolveu um programa baseado
em prevenção primária, “PREFERE”. O projeto piloto em
Niterói está funcionando desde 2003, treinando professores,
alunos e profissionais de saúde a prevenir febre reumática e
atuar como multiplicadores em suas comunidades.
Prevenção de Febre Reumática, tendo como estratégia
principal, a prevenção primária. O programa se baseia na
criação de uma rede de informações nas escolas de ensino
fundamental, através da formação de agentes multiplicadores.
Professores e estudantes do ensino médio e fundamental e
profissionais que compõe a equipe multidisciplinar em saúde
das unidades básicas, são treinados e capacitados a
reconhecer e encaminhar novos casos de amigdalite e febre
reumática em suas comunidades. São também estimulados
a disseminar este conhecimento, para seus pais, amigos,
vizinhos enfim, toda sua comunidade, formando uma rede de
conhecimento, de forma que uma vez de posse da informação
aprenda a prevenir.
O Projeto Piloto no município de Niterói, apenas em
sua primeira fase, já beneficiou mais de 15 mil alunos, atingiu
as escolas fundamentais da rede municipal de ensino, treinou
cerca de 1/3 dos profissionais de saúde da rede básica e
agentes multiplicadores na área de saúde.
Abstract
Rheumatic Fever is the most common cause of
cardiovascular disease in children and young adults
worldwide, with significant morbidity and mortality. It’s a
major public health problem, with significant costs (direct
and indirect) to society. Hipócrates was the first to describe
in 350 bC.. Since 1954 World Health Organization(WHO)
has been concerned with prevention and control of
rheumatic fever and rheumatic heart disease. The National
Institute of Cardiology Laranjeiras developed a program
based in primary prevention, “PREFERE”. The pilot project
in Niterói is working since 2003, training teachers, pupils
and health workers to prevent rheumatic fever and to work
as multipliers in their community.
Apesar de apenas recentemente ter sido reconhecida
como um problema de saúde pública, há muito já é conhecida.
Hipócrates 2 foi o primeiro a descrever as
manifestações da febre reumática em 350 aC.. Apesar de
não ser identificada pelo nome, seus relatos sugerem
fortemente sua existência já nesses tempos, pelo menos 18
de seus aforismos faziam menção a doenças articulares.
Hipócrates criou a teoria dos “humores”, desmistificando a
teoria vigente onde maus espíritos eram os causadores de
todos os problemas, e esta foi a teoria que predominou até o
século XIX. Na intenção de retirar as impurezas causadoras
do estado mórbido, eram aplicadas numerosas sangrias.
Sangrias e sanguessugas constituíam-se na técnica
terapêutica mais utilizada naqueles tempos, sendo
abandonadas no século passado. Quando pensávamos que
já era coisa do passado, hoje vemos um ressurgimento da
utilização de sanguessugas, na França, através de alguns
estudos que tentam demonstrar benefício no tratamento da
artralgia da febre reumática e em outros campos da medicina.
No ultimo século a febre reumática tornou-se um
problema de saúde publica em todo mundo, com importante
impacto sócio-econômico, e elevada morbi-mortalidade. É
considerada em muitos países a principal causa de óbito por
doença cardiovascular nas primeiras cinco décadas de vida1 ,
é a forma mais comum de doença cardiovascular adquirida
na infância e em adultos jovens. Em 1999, para a Organização
Mundial de Saúde (OMS) a necessidade de desenvolvimento
e implementação de programas de prevenção e controle,
tornou-se prioridade.
A diferenciação do reumatismo agudo de gota foi
feita por Guillame de Baillou, médico francês. A origem do
termo “rheuma” vem do grego, foi introduzido há 2100 anos,
Em 2003, o Instituto Nacional de Cardiologia
Laranjeiras desenvolveu o PREFERE, Programa de
*Diretora geral INCL e coorderadora do projeto PREFERE,
**Médica INCL, ***Médica cardiopediatra e coorderadora do projeto
PREFERE, **** Médica infectologista e coorderadora do projeto
PREFERE, *****Assistente social colaboradora do projeto PREFERE,
****** Enfermeira colaboradora do projeto PREFERE, *******
Pedagoga colaboradora do projeto PREFERE
61
Editorial Laranjeiras
ainda é desconhecida, mas parece ser devido o surgimento
de cepas mais virulentas.
deriva do verbo rheo que significa fluir, em referência a teoria
hipocrática dos humores. Baillou foi o primeiro a usar o termo
reumatismo em seu livro “The Book on Rheumatism and Back
Pain” em 1642. Ele acreditava que as dores articulares seriam
causadas por “mal humores” que fluiriam do cérebro para as
articulações.
A incidência da febre reumática no mundo é
100casos/100.000 crianças/ano, levando a 400.000 óbitos/
ano11 . No Brasil faltam dados, mas estimamos uma incidência
de febre reumática aguda de 30.000 casos/ano, sendo que
50% destes cursariam com cardite. Segundo dados do
DATASUS para o ano de 2003, ocorreram 13.709 internações,
com um custo de R$ 65 milhões, 11.000 cirurgias valvares
com um custo de R$ 96 milhões (custo médio da cirurgia
para troca de válvula R$ 7.000) e 755 óbitos.
Em 1624 Sydenham3 descreveu a Coréia, porém
sem relacioná-la com reumatismo agudo. Ele acreditava
ser devido a “mal humores” que se depositariam nos
nervos causando irritação e espasmo. Coube a Richard
Bright, em 1831, fazer a associação entre Febre Reumática
e Coréia.
Além12 dos custos diretos ( custo do hospital com
consultas, internações, medicamentos, exames subsidiários
e custos em outros serviços) existem custos indiretos
decorrentes da falta do trabalho dos responsáveis, causando
desconto em salário ou desconto na produtividade). O custo
total por paciente da rede SUS é de R$ 43.730,00, do seguro
saúde R$ 213.494,00 e da rede privada R$ 441.520,00.
Somando-se a isso o custo social, estimamos uma perda
média de 26 anos por paciente e uma perda total a nação de
55.000 anos (considerando 755 óbitos no ano de 2003)13.
A faixa etária de maior incidência é de 5 a 15 anos, o que
propicia mau aproveitamento escolar e posterior dificuldade
de inserção no mercado de trabalho. Em contraste, o custo
da prevenção primária é R$ 1,50 dose única (penicilina
benzatina) e o da profilaxia secundária R$ 26,00/ ano/
paciente.
Até 1808 reumatismo agudo era o termo utilizado
para designar afecções articulares agudas. Nesta data
surgiu o termo febre reumática para denominar o
reumatismo agudo em adultos jovens. A relação ocasional
do reumatismo agudo com cardite foi descrita por vários
estudiosos da época entre eles David Pitcairn em 1788,
Edward Jenner em 1789, Baillie em 1803, David Dundas
em 1808, Charles Wells em 1812 e Scudamore em 1827,
porém a ligação íntima entre ambos, apenas foi feita em
1836 por Jean-Baptiste Bouillaud. Laennec4 inventou o
estetoscópio em 1816. Bouillaud5 o utilizava para examinar
seus pacientes, o que com certeza contribuiu para o
reconhecimento da relação entre reumatismo agudo e cardite,
explicado através da “lei da coincidência”. Na “lei da
coincidência” Boillaud afirmava “na grande maioria dos casos
de reumatismo articular febril agudo existe grau variável de
tecido fibroso no coração. Esta coincidência é a regra e não
a exceção”. Era adepto do uso de sangrias, e pregava que
estas deveriam ser precoces e copiosas, baseado na
existência de um “sangue inflamatório”. Através de estudos
anátomo-patológicos foi evidenciada a inflamação do
endocárdio, o que mais tarde seria confirmado pelos achados
de Aschoff e Gueipel em 1904, ao verificarem os nódulos
reumatóides no músculo cardíaco. Walter Cheadle em 1889
descreveu como parte do quadro de febre reumática a cardite,
poliartrite, nódulos subcutâneos e eritema marginatum.
Considerando tudo o que já foi dito anteriormente,
em 1954 a OMS 14 realizou o primeiro encontro para
discussão da febre reumática e desde então tem lançado
esforços em todo o mundo para redução da incidência e
da morbi-mortalidade desta patologia. Em 1972 criou um
programa de prevenção secundária em sete países da
África, Ásia e América.
A Costa Rica em 1971 implementou um programa
de prevenção primária. Até 1991 houve redução na
incidência de 90.0 para 1.0 por 100.000/hab, entre 1970 e
1990. Em 1990 não foi constatado nenhum óbito por febre
reumática aguda, notando também uma importante
diminuição na gravidade dos casos e da necessidade de
cirurgia.
Em 1914 foi descoberta a Penicilina, porém apenas
em 1940 o uso de antibióticos foi introduzido no tratamento
da febre reumática. Os critérios diagnósticos de Jones foram
criados em 1944, sofreram algumas modificações desde
então, sendo a última em 1992.
Outro projeto bem sucedido é o de Pinar del
Rio,Cuba(1986-96) baseado em prevenção primária e
secundária. Os resultados mostram uma redução de 92%
na incidência, de 34.3 para 2.7 /100.000 crianças em idade
escolar. Redução de 93% na prevalência de 2.9 para 0.2 /
1.000 crianças em idade escolar entre 1986 e 1996. Neste
período não houve nenhum óbito por febre reumática aguda.
Redução da gravidade dos casos em pacientes com idade
entre 5 e 25 anos, da recorrência, das seqüelas de 25.4%
para 20.3 %, insuficiência cardíaca de 11.2% para 5.1% ,
da necessidade de cirurgia de 4.5% para 1.7% e dos custos
com febre reumática aguda e crônica: de US$264,000 em
1986 para US$26,000 em 1996.
Em 1948 foram realizadas as primeiras cirurgias6
com sucesso, mudando a evolução da doença. É interessante
notar que, mesmo antes da introdução do uso da penicilina, a
incidência7 já vinha em queda em toda Europa e Estados
Unidos, tendo praticamente desaparecido na década de 708 .
No início da década de 40 a incidência9 nos EUA era de 50/
100.000 hab, e no início dos anos 80 reduziu para 0.5 a 2.0/
100.000 hab. Muitos são os fatores relacionados com esse
declínio, a melhora na qualidade de vida, principalmente na
era pré-antibiótico, do tratamento médico, introdução do uso
da penicilina, programas de prevenção primária e secundária,
mudanças na virulência das cepas de streptococcos e outros
fatores ainda pouco conhecidos.
Programas de prevenção vêm sendo adotados
em todo o mundo nas últimas décadas demonstrando
redução na incidência, prevalência, morbi-mortalidade e
custos.
Até 1940 acreditava-se que esta doença era rara
em países tropicais e subtropicais, provavelmente por falta
de informação, porém desde então vem sendo
reconhecida como um problema de saúde pública nesses
países, refletindo as condições sócio-econômicas locais.
Na tentativa de atingirmos a compreensão e cura
promovemos sessões de exorcismo, aplicamos sangrias e
sanguessugas para retirar os “mal humores”, criamos
critérios, indicamos cirurgias, realizamos ensaios clínicos
Em 198010 , houve um aumento da incidência de
febre reumática nos EUA. A razão para esse ressurgimento
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Editorial Laranjeiras
para no final concluirmos, como já sabiam nossas crianças ,
que o “melhor remédio ainda é prevenir” 15 . Trabalhar com a
manutenção do estado de saúde é algo que, por muitas vezes,
nos distanciamos em nossa prática clínica. Aprendemos a
lidar com a doença, como tratá-la, e nos desapontamos ao
perceber que em poucos casos conseguimos o que
buscamos há milênios, a cura. Esperamos que dentro de
pouco tempo o PREFERE não seja mais apenas um projeto
piloto, mas a realidade em nosso país, e mais uma vez,
mudarmos a história da febre reumática . Nossas crianças
agradecem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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