Energia Nuclear – os superpoderes do átomo – parte 1
Histórico
No início do século 19, quando John Dalton percebeu que todas as substâncias da matéria eram
constituídas de átomos, ele jamais poderia supor que aquelas unidades microscópicas conteriam
tanta energia. Todas as evidências experimentais indicavam que o átomo seria “indivisível”, muito
estável e aparentemente imutável, pois não variavam de massa durante as reações químicas e
Dalton caracterizava e identificava os átomos pela massa.
Mas, em 1897, J. J. Thomson descobriu o elétron, que é uma partícula muito menor que o átomo,
responsável pela eletricidade e integrante da estrutura do átomo. Como o elétron tem carga
negativa, sua descoberta obrigava Thomson a supor a existência de outras partículas
subatômicas positivas, pois a matéria se mantém quase o tempo todo com carga neutra. Era
evidente que o átomo não era a “menor partícula da matéria”, como supunha Dalton; e deveria ter
uma estrutura bem mais complexa do que a de uma bolinha maciça. Com os avanços dos
estudos, os cientistas perceberam que os elementos químicos se diferenciavam pelo número de
cargas positivas, hoje chamadas prótons, e não pela massa.
Em 1911, Ernest Rutherford e sua equipe descobriam algo surpreendente: o átomo tinha um
núcleo atômico de 10 mil a 100 mil vezes menor que o próprio átomo; mas que, mesmo tão
pequeno, concentrava grande parte da massa e todas as cargas positivas nele. O átomo parecia
ser um minúsculo “sistema solar”, com muito maior proporção de espaços vazios do que de
matéria maciça, enquanto os elétrons estariam girando em volta desse núcleo, como planetas ao
redor do Sol.
Muitas perguntas e dúvidas “choviam” nas cabeças dos cientistas: Como o átomo poderia ser a
unidade básica da matéria, sendo tão “vazio”? Por que os elétrons não “caem” no núcleo, já que
são atraídos por ele? Como os núcleos dos átomos podem se manter estáveis com tantas cargas
positivas próximas, repelindo-se umas às outras? Como uma estrutura tão “estranha” pode ser a
base de tudo?
Muitas dessas perguntas foram sendo respondidas mais rápida ou mais lentamente, ao longo das
décadas seguintes, com a colaboração de inúmeros cientistas, em diversos países. Teorias
importantes e revolucionárias, como a Física Quântica, surgiram para explicar o átomo,
explicando o estranho comportamento e a energia dos elétrons. Mas uma outra descoberta foi
crucial para o entendimento do átomo: a radioatividade.
Em 1896, Henri Becquerel guardou uma pedra de urânio em uma gaveta de seu laboratório,
sobre uma pilha de chapas fotográficas, as quais ficavam protegidas da luz, envoltas em um pano
escuro. Depois de algum tempo, ele resolveu usar as chapas para tirar algumas fotos; mas,
quando foi revelá-las, Becquerel percebeu “manchas” em cada uma das chapas, do tamanho da
pedra. Era como se ele tivesse tirado “fotos embaçadas” da pedra, sem o uso de câmeras.
A pedra emitiu alguma energia invisível, que conseguiu
atravessar não só o pano escuro, como todas as chapas,
uma a uma, como se elas não estivessem no caminho,
causando as manchas.
Percebendo que estava diante de uma descoberta
importante, Becquerel passou a usar chapas fotográficas
para identificar mais elementos que emitissem essa
energia. O casal Pierre e Marie Curie passaram a
pesquisar também essa estranha energia, chamando-a
Chapa fotográfica de Becquerel impressa com
de “radioatividade”, ou seja, “atividade do rádio”. O “rádio”
radioatividade. Disponível em (acesso 11.11.2013):
é um elemento metálico descoberto pelo casal Curie, em
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Becquerel_plat
e.jpg
1902, que emite três tipos diferentes de radioatividade,
ao mesmo tempo: radiações “alfa”, “beta” e “gama”.
O que mais surpreendia os cientistas era a quantidade de energia liberada pelos elementos
radioativos, que parecia ser infinita. Como isso seria possível? Em 1905, o cientista Albert
Einstein lançou a Teoria da Relatividade, que causou grande impacto no meio científico,
revolucionando os conceitos de tempo, espaço, matéria, energia e o entendimento sobre as
propriedades da luz. Os conceitos defendidos por Einstein eram tão novos que a comunidade
científica não sabia se apoiava, condenava ou ignorava suas ideias.
Mas a equação “E = m.C2” - a equação mais famosa da história da Ciência – prometia explicar a
imensa energia liberada pelos elementos radioativos. Na medida em que sua teoria se tornava
mais difundida, causando fascínio no público pela relação com a ficção científica dos livros e do
cinema, Einstein, aos poucos, adquiria aura de “astro pop”. De acordo com a sua equação, a
energia (E) pode ser convertida em massa (m) e vice-versa; na verdade, são a mesma coisa, já
que há um sinal de igualdade entre elas (=). Como a massa é multiplicada pela velocidade da luz,
ao quadrado (C2), pequenas massas podem ser transformadas em grandes quantidades de
energia.
Antes de Einstein, “energia” e “matéria” eram conceitos totalmente
distintos. Além disso, a Lei de Lavoisier (século 17) afirma que “a
massa dos reagentes é sempre igual à massa dos produtos”;
portanto, não se imaginava um processo qualquer em que a
massa pudesse “desaparecer” ou ser convertida em energia.
Albert Einstein, em 1921.
Disponível em:
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ei
nstein1921_by_F_Schmutzer_2.jpg
Acesso em: 11.11.2013
Em outras palavras, alterações e transformações naturais da
matéria podem acontecer, transformando-a parcial ou totalmente
em energia; e a radioatividade era uma prova de que isso era
possível. O próprio Sol poderia ser explicado pela equação de
Einstein, pois, se sua energia fosse uma simples “combustão”, já
teria se extinguido há milhões de anos. E mais: a equação de
Einstein não especificava qual tipo de matéria poderia ser
convertida em energia; teoricamente, qualquer substância serviria.
Mas, para que isso acontecesse na prática, seria necessária uma tecnologia de divisão do núcleo
do átomo. E essa tecnologia ainda não existia.
Fissão nuclear
Na década de 1930, os trabalhos dos cientistas Enrico Fermi, Otto Hahn e Fritz Strasman levaram
à reação de “fissão” ou “divisão” do núcleo do átomo de urânio, a partir do bombardeamento de
nêutrons no núcleo do urânio. O núcleo se divide, formando dois novos átomos de menor número
atômico. Além disso, havia a possibilidade de ser criada uma reação em cadeia, em que os
nêutrons restantes da divisão dividissem os núcleos de outros átomos, que liberariam mais
nêutrons, dividindo mais átomos, num processo contínuo e rápido, liberando grande quantidade
de energia.
No final dessa década, os nazistas estavam no poder na Alemanha e a II Guerra havia começado.
Em 1939, Einstein escreveu uma carta para o presidente Roosevelt, alertando sobre a
possibilidade de os alemães estarem próximos de produzir a primeira bomba nuclear, ressaltando
a importância da criação de um projeto americano para a produção da bomba, antes que os
nazistas o fizessem. Essa carta motivou a criação do Projeto Manhatan, que construiu as
primeiras bombas, sem que Einstein fosse convidado para o projeto.
Antes que as bombas ficassem prontas, a guerra contra os nazistas tinha acabado. Einstein
imaginou que elas não seriam mais usadas; mas, ao contrário, foram lançadas em Hiroshima e
Nagasaki, em 1945. Apavorado com o poder de destruição das bombas, Einstein se culpou e fez
campanha para que as armas nucleares fossem abandonadas, nas décadas seguintes, sem
sucesso.
Como se percebe, a humanidade deu um grande salto de conhecimentos, em poucos anos: antes
de 1900, havia total ignorância sobre a radioatividade e até sobre o núcleo; mas, dos anos 30 até
a metade dos anos 40, chegou-se à produção de armas nucleares.
Da década de 1950 em diante, os países do bloco soviético e os países do bloco capitalista,
liderados pelos EUA, investiram pesado em programas nucleares, não só para aperfeiçoamento e
multiplicação do arsenal de bombas atômicas, mas também para a construção de usinas.
Teoricamente, as usinas nucleares produziriam a energia nuclear de forma controlada, para a
produção de energia elétrica.
A partir dos anos 60, a era da “inocência” sobre o átomo havia acabado. O átomo “indivisível” de
John Dalton era, na verdade, perigosa e violentamente “divisível” e podia ser usado para produzir
energia elétrica, mas também, para a destruição. A corrida armamentista entre os blocos
capitalista e socialista prosseguiu, até o momento em que ambos tinham tantas bombas
nucleares com as quais seria possível destruir a humanidade inteira. O medo de uma guerra
nuclear mundial era constante. As bombas de fissão nuclear, semelhantes à lançada em
Hiroshima, passaram a ser consideradas de pequena potência, sendo usadas apenas para criar a
temperatura elevada para detonar as bombas de fusão nuclear - ou “bombas de hidrogênio”.
O tratado para a não proliferação de armas nucleares foi assinado por diversos países, ainda na
década de 60; mas isso não impediu que, ainda hoje, haja acusações de enriquecimento de
urânio para fins bélicos, entre países de blocos políticos diferentes, que se defendem, dizendo ser
para fins pacíficos. Os atuais confrontos e ameaças mútuas entre o Irã e os EUA são um exemplo
típico disso.
Além das usinas de energia, outro uso positivo da energia nuclear se deu no campo da medicina,
setor em que a radioatividade passou a ser usada para a cura, como a radioterapia do câncer, e
para diagnósticos, como a radiografia e a tomografia. As primeiras radiografias foram tiradas por
Marie Curie, que montou seu equipamento em uma carroça para atender aos feridos, nas frentes
de batalha, ainda na I Guerra Mundial.
Marie Curie, a primeira mulher a ganhar um
prêmio Nobel de física, junto com o marido, Pierre
Curie, em 1903; e a primeira pessoa a ganhar um
segundo prêmio Nobel, de química, em 1911.
Disponível em:
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Marie_Curie_
%28Nobel-Chem%29.png Acesso:11.11.2013
Ao longo das décadas seguintes, alguns acidentes
nucleares agravaram as preocupações mundiais quanto
ao aproveitamento do átomo: Three Mile Island, na
Pensilvânia, EUA, em março de 1979; Chernobyl, em
Kiev, Rússia, em abril de 1986; Fukushima, no Japão,
em março de 2011. No Brasil, um simples equipamento
médico contendo césio-137 fez dezenas de vítimas, em
Goiânia, em setembro de 1987. Foram acidentes com
causas diferentes e de intensidade e gravidade também
diferentes. Apesar de raros, os acidentes nucleares
costumam ser devastadores.
Assim, a energia do núcleo do átomo vem sendo
defendida por uns, inclusive por ambientalistas, sob o
argumento de que as usinas não emitem gases do efeito
estufa. Outros, como o famoso Greenpeace, são contrários à energia nuclear, por conta dos
riscos de acidentes.
Tanta controvérsia apenas tem sustentado uma certeza: ainda não sabemos muito bem o que
fazer com a energia nuclear.
Sugestões:
Einstein e a energia nuclear
https://www.youtube.com/watch?v=JJbxgAE9Exk
Disney – Nosso amigo o átomo – versão em português
https://www.youtube.com/watch?v=TW1HTyTissw
Hiroshima, o dia seguinte
https://www.youtube.com/watch?v=kreMfHRwjig
Cesio 137 – documentário Linha Direta
http://www.youtube.com/watch?v=MfshO3PvlYs
A saga do prêmio nobel – o clã Curie – parte 1/3
http://www.youtube.com/watch?v=nqXguKTFa0c
Instabilidade nuclear
Os átomos radioativos são aqueles que possuem o núcleo instável, pois possuem números de
prótons e de nêutrons “desequilibrados”. Os nêutrons participam diretamente de uma força
chamada “força nuclear forte”, que mantém o núcleo atômico unido. Os prótons são positivos e,
por isso, se repelem; essa repulsão pode desintegrar o núcleo. Mas, se os nêutrons estiverem em
número suficiente, essa repulsão é compensada pela força nuclear forte, mantendo o núcleo
atômico estável.
Compare a massa e o número atômico (prótons) dos elementos, na tabela e no gráfico abaixo:
quanto mais prótons, muito mais nêutrons são necessários.
Tabela de estabilidade nuclear
Observe que, para os átomos pequenos, o número Z pode ser igual a N, ou seja, o número atômico ou de prótons pode ser igual ao de
nêutrons. Aumentando progressivamente o número atômico, o número de nêutrons precisa estar em proporções cada vez maiores, em
relação a Z.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Tabela_estabilidade.png - Acesso:11.11.2013
Isótopo
Hidrogênio-1
Carbono-12
Ferro-56
Chumbo-207
Rádio-226
Urânio-235*
Urânio-238
Prótons
1
6
26
82
88
92
92
Nêutrons
0
6
30
125
138
143
146
*O urânio-235 tem número menor de nêutrons que seu isótopo 238,
o que torna seu núcleo “físsil”, ou seja, capaz de sofrer “fissão” ou divisão.
Quando um material qualquer é radioativo, isto significa que os núcleos dos seus átomos
“expelem” energia e partículas para o ambiente, que é a radioatividade. Isso continua até o
momento em que esses elementos “transmutam” para outros elementos, cujo número de prótons
e nêutrons estejam em proporção ideal; ou seja, deixam de ser radioativos.
Uma amostra radioativa qualquer pode demorar alguns segundos ou até milhões de anos para
deixar de ser radioativa, pois mesmo poucas gramas contêm um número da ordem sextilhões de
átomos (1 “mol” equivale a 602 sextilhões ou 6,02 x 10 23)! Esse tempo depende da frequência de
“decaimento” de cada elemento químico, denominado “meia-vida”.
Principais tipos de radioatividade
Radiação alfa ou partículas alfa (α): formadas por dois prótons e dois nêutrons ligados, o que
equivale a um núcleo de hélio (24He2+).
Radiação beta negativa (β-): elétrons (0e-) irradiados pela desintegração de um nêutron. Isso
mesmo: elétrons expulsos do núcleo atômico!
Radiação beta positiva ou pósitrons (β+): pósitrons ou “elétrons positivos” (0e+) irradiados pela
desintegração de um próton.
Nêutron (nº): emissão direta de um nêutron pelo núcleo. O exemplo mais famoso é a emissão de
nêutrons pelo carbono-14, que se transforma em carbono-12. Como a meia-vida do carbono-14 é
muito longa, saber quanto de carbono-14 ainda há em um fóssil permite calcular a idade do fóssil
Raios gama (γ): ondas eletromagnéticas de alta energia, de comprimento de onda muito curto;
ou seja, uma energia da mesma natureza da luz, mas muito mais perigosa, mesmo quando
comparada à ultravioleta. Elas têm alto poder de penetração na matéria, modificando a ligação
entre os átomos, causando danos às células e aos tecidos vivos, pois é uma radiação ionizante;
ou seja, retira elétrons dos átomos neutros, transformando-os em íons. O átomo que libera
radiação gama não sofre alteração de seus números de prótons e de nêutrons e, portanto, não
altera significativamente sua massa.
Raios X: ondas eletromagnéticas curtas, mas não tão curtas quanto os raios gama. São emitidas
pela incidência de elétrons acelerados sobre um metal qualquer. Possuem grande poder de
penetração, sendo usados para imagens diagnósticas em radiografias, principalmente de ossos.
Raios gama, ondas eletromagnéticas emitidas do núcleo.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Gamma_Decay.svg - Acesso:
11.11.2013
Os três primeiros tipos de radioatividade a serem descobertos foram as radiações alfa, beta
negativa (chamada originalmente apenas de “radiação beta”) e gama, em um experimento de
Rutherford e Soddy, em 1911, no qual a radiação emitida pelo metal rádio (88Ra) foi submetida a
campos elétricos opostos, colocados lateralmente à trajetória da radiação.
Comportamento dos principais tipos de radioatividade, sob a
influência de campos elétricos positivos e negativos.
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Deflection_of_nuclear_radiation_in_a_magnetic_field_en.svg - Acesso em 11.11.2013.
Pela ilustração acima, percebe-se que as partículas mais pesadas, como a alfa (α), sofrem uma
“deflexão” menor, ou seja, se curvam menos, sob a influência da carga elétrica oposta; enquanto
as mais leves, como os elétrons (β-) e pósitrons (β+), fazem uma curvatura mais acentuada em
suas trajetórias. Isto acontece por causa da inércia de cada tipo de partícula. Os nêutrons e a
radiação alfa não sofrem deflexão, pois não possuem carga positiva nem negativa.
Poder de penetração das radiações alfa, beta e gama. O papel
bloqueia a radiação alfa. O metal fino bloqueia a radiação beta. O
chumbo bloqueia os raios gama, dependendo da espessura.
O chumbo, o concreto e a água são os materiais mais usados para
reter a radiação. Coletes e biombos de chumbo são muito usados
para proteger os pacientes e os funcionários que lidam com
radiografias e abreugrafias. Nas usinas nucleares, além de
concreto, aço e chumbo, são usados reservatórios de água para
armazenar reatores.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Alfa_beta_gamma_radiation_penetration.svg – Acesso em 11.11.2013.
Decaimento alfa (α)
A partícula alfa possui dois prótons ligados a dois nêutrons, o que equivale a um núcleo de hélio.
Por isso, quando um núcleo atômico emite uma partícula alfa, ele perde quatro unidades de
massa, ficando mais “leve”. A perda dos dois prótons significa que aquele átomo já não é mais do
mesmo elemento, “decaindo” dois números atômicos.
Decaimento alfa: dois prótons e dois neutros emitidos pelo
núcleo, o que equivale a um núcleo de hélio.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Alpha_Decay.svg - Acesso:
11.11.2013
Dois exemplos típicos são os decaimentos do urânio (92U) se transformando em tório (90Th); e o
do rádio (88Ra), se transmutando em radônio (86Rn).
238
92U
88Ra
226
→
90Th
→
86Rn
234
+
2α
4
222
+
2α
4
Pode-se representar os decaimentos alfa com a equação geral abaixo, sendo “P” o elemento
original ou “pai”; e “F”, o elemento produzido ou “filho”:
ZP
A
→
A-4
z-2F
4
2α
+
Decaimento beta negativo (β-)
Quando um núcleo atômico emite radiação beta, significa que um elétron foi projetado do núcleo
atômico para o ambiente. Isso mesmo! No núcleo, não existem elétrons, mas a desintegração de
um nêutron produz um próton que permanece no núcleo; e um elétron é projetado para fora do
átomo. Isto significa que o número atômico do elemento “sobe” em uma unidade. Além disso, são
emitidos para o ambiente um antineutrino e uma certa quantidade de radiação gama,
correspondente ao ganho de estabilidade do núcleo.
Decaimento beta negativo
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Beta-minus_Decay.svg – Acesso em 11.11.2013.
15
32
P →
16
32
S
+
B-
+
ṽ
Um exemplo de decaimento beta negativo é o da transmutação de fósforo-32 em enxofre-32: um
nêutron é convertido em próton, aumentando o número atômico em uma unidade, eliminando um
elétron (beta negativo) e um antineutrino (ṽ); o número de massa (32) permanece o mesmo.
Decaimento beta positivo (β+)
Da forma inversa, um próton pode ser convertido em um nêutron, com a emissão de um pósitron
(“elétron positivo” ou partícula beta positiva), ou até mesmo pela captura de um elétron da
eletrosfera pelo núcleo. Isto acontece, quando o número de cargas positivas no núcleo atômico
está em excesso. Neste caso, o número atômico cai em uma unidade, já que um próton deixa de
existir. São liberados, no processo, um neutrino e também certa quantidade de radiação gama.
Na equação abaixo, o flúor-18 decai para oxigênio-18, a partir da emissão de um pósitron (beta
positivo ou antielétron), fazendo um de seus prótons se transformar em nêutron. Também é
emitido um neutrino (v) e certa quantidade de raios gama.
9
18
F →
8
18
O
+
B-
+
v
Tipos de decaimento e a consequente variação de número de nêutrons (N) e do
número atômico (Z).
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Tryby_rozpadu_promieniotworczego.svg - Acesso:
11.11.2013
Decaimento radioativo e “meia-vida”
Como já foi dito, um átomo radioativo sofre decaimentos sucessivos, até se tornar estável e não
radioativo. Mas uma amostra qualquer contém uma quantidade imensa de átomos, que não
decaem ao mesmo tempo. Além disso, não há como prever o momento exato em que um núcleo
atômico irá emitir radiação. Por isso, a atividade radioativa de uma amostra pode demorar alguns
segundos ou até bilhões de anos para encerrar, dependendo da frequência com que os átomos
decaem.
Para medir o tempo de desintegração radioativa de uma amostra é usada a sua “meia-vida”, que
é o tempo gasto para que a metade de seus átomos se transforme em outro elemento. Este
tempo não depende do tamanho da amostra, pois a meia-vida é calculada como uma equação
estatística de probabilidade. Em outras palavras, a quantidade de átomos de uma amostra
qualquer é sempre tão absurdamente alta que - para efeito de cálculos - não há diferença
significativa, se a amostra for de uma tonelada ou de uma grama. O importante é se a proporção
de átomos radioativos ainda é significativa na amostra, após uma certa quantidade de meiasvidas.
Exemplo de meia-vida
Em exames de tireoide, um paciente deve ingerir uma dose de iodo-131, cuja “meia-vida” é de
oito dias. Decorrido este prazo, a atividade da amostra ingerida pelo paciente estará reduzida à
metade. Passados mais 8 dias, cairá a 1⁄4 da atividade inicial e assim por diante. Após 10 meiasvidas ou 80 dias, a radiação será cerca de 1000 vezes menor. Como o organismo humano elimina
rapidamente as substâncias ingeridas pelas fezes, urina e suor, o paciente pode ir para casa,
algumas horas depois do exame; mas sua urina ficará armazenada no depósito de rejeito
hospitalar, até que possa ser liberado para o esgoto comum.
Decaimento do sódio para neônio.
A cada meia-vida, 2,6 anos, a atividade radioativa é reduzida à metade do período anterior.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Decay.png - Acesso: 11.11.2013
Contador Gieger
Um aparelho muito usado para medir essa frequência é o contador Gieger, que detecta a radiação
a partir da corrente elétrica criada pela ionização dos gases contidos em um tubo coletor. Como a
radioatividade é sempre ionizante, os gases ionizados dentro do tubo tornam-se condutores e a
corrente elétrica produzida é transformada em impulsos sonoros, criando um ruído a cada
partícula radioativa detectada. A frequência radioativa pode ser medida em Bq (Becquerel), que
corresponde a uma desintegração por segundo; ou em Ci (Curie), que são 3,7 x 10 10 Bq.
Contador Geiger
Esquema do funcionamento do contador Gieger
Disponível:http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Geiger_counte Disponível: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Geiger.png
r.jpg Acesso: 11.11.2013
Acesso: 11.11.2013
Assista ao vídeo de um contador Geiger em funcionamento, no link abaixo.
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/74/FiestaWare_Velleman-K2645_GeigerCounter.ogv
Séries de decaimento naturais
No diagrama e na tabela abaixo estão as séries de decaimento naturais do urânio 235 e 238 e do
tório. Observe que, quando há radiação beta, o número atômico aumenta uma unidade,
mantendo a massa; mas, quando há radiação alfa, o número atômico decresce duas unidades e a
massa decresce quatro.
Séries radioativas naturais.
A subida de número atômico corresponde a uma emissão beta.
A descida de duas unidades corresponde ao decaimento alfa.
Disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Radioactive_decay_chains_diagram.svg - Acesso: 11.11.2013.
SÉRIES RADIOATIVAS NATURAIS
SÉRIE DO URÂNIO
SÉRIE DO ACTÍNIO
SÉRIE DO TÓRIO
Urânio-238
Urânio-235
Tório-232
4,5 bilhões de anos
713 milhões de anos
13,9 bilhões de anos
Tório-234
Tório-231
Rádio-228
24,6 dias
24,6 horas
5,7 anos
Protactínio-234
Protactínio-231
Actínio-228
1,4 minutos
32.000 anos
6,13 horas
Urânio-234
Actínio-227
Tório-228
270.000 anos
13,5 anos
13,5 anos
1,9 anos
Tório-230
Frâncio-223
Tório-227
Rádio-224
83.000 anos
21 min
18,9 dias
3,6 dias
Rádio-226
Rádio-223
1.600 anos
11,4 dias
Radônio-222
Radônio-219
3,8 dias
3,9 segundos
54,5 segundos
...
...
...
Polônio-210
Polônio-211
Polônio-212
140 dias
0,005 segundos
0,0000003 segundos
Chumbo-206
Chumbo-207
Chumbo-208
Azul: radiação alfa
Verde: radiação beta
Radônio-220
Rosa: isótopos estáveis não radioativos
Datação Radioativa com Carbono-14
O planeta Terra recebe nêutrons do espaço, constantemente, nos raios cósmicos. Esses nêutrons
atingem o nitrogênio do ar (gás N2), sendo que um nitrogênio se converte em carbono-14.
1
n
+
14
7N
→
14
6C
+
1
p
O carbono, então, facilmente reage, formando CO2; que, nos processos biológicos da
fotossíntese, passa a fazer parte das substâncias orgânicas, dos organismos vegetais e dos
animais, através da cadeia alimentar.
Quando os organismos morrem, a absorção de carbono-14, na forma de CO2 , é interrompida,
pois cessa a fotossíntese ou a alimentação. A partir daí, a proporção de carbono-14, que é
inicialmente da ordem de 1/1012, igual à da atmosfera, vai diminuindo. Como a meia-vida do
carbono-14 é de 5730 anos, quando um fóssil é encontrado, compara-se esta taxa `a dos
organismos vivos e pode-se determinar a idade do fóssil.
Medicina nuclear
A atividade radioativa de vários elementos químicos pode ser usada na medicina, tanto para fins
de diagnósticos e descoberta de distúrbios e doenças, como para tratamentos. Isto é possível
porque o nosso corpo seleciona e envia elementos químicos específicos para diferentes áreas,
órgãos e funções do corpo.
Por exemplo, o elemento iodo é captado pela glândula tireoide para síntese de hormônios. Outras
vezes, o elemento radioativo é ligado a um outro grupo químico, formando um “radiofármaco” com
afinidade por determinados tecidos, como no caso dos compostos a base de fosfato (fósforo),
ligados ao tecnécio-99m, que são captados pelos ossos.
Usando certa quantidade de isótopos radioativos desses
elementos específicos, imagens bidimensionais (planas)
ou tomográficas “Single Fóton Emission Computer
Tomography” (SPECT) podem ser geradas em um
equipamento denominado câmara cintilográfica. A
vantagem é que não só a forma anatômica dos órgãos
pode ser avaliada, mas também as suas condições de
funcionamento, anormalidades, patologias etc.
Além de não invasivos, esses métodos usam
radioisótopos cuja radioatividade cai para a metade
(“meia vida”), em questão de horas ou dias, e a radiação
emitida é do tipo gama, similar aos raios X.
Imagem obtida por cintilografia ou “tomografia
computadorizada por fóton único” (SPECT).
Disponível
em:
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Scintirezoscan.jpg
Acesso: 20.11.2013.
Alguns radioisótopos emitem radiação beta, com muito
maior poder de ionização dos tecidos que a radiação
gama. Quando administrados em altas atividades, estes
isótopos podem ser empregados com finalidade
terapêutica, atacando e eliminando as células de tecidos
cancerosos. O iodo-131 permite a redução do
parênquima glandular, em casos de hipertireoidismo ou
mesmo no tratamento de metástases do carcinoma
(câncer) da tireóide.
Imagens diagnósticas também podem ser obtidas pelo
método de Positron Emission Tomography (PET) ou
Tomografia por Emissão de Posítrons, cujo principal
radiofármaco usado é o FDG, ou glicose marcada com
flúor-18). Pósitron é o “elétron positivo”.
Imagem obtida pelo método PET.
Disponível em (acesso 20.11.2013):
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Combined_PE
T_CT_image.jpg
Principais radioisótopos da medicina nuclear
Tecnécio-99-metaestável: isótopo artificial, com meia-vida de 6 horas. Emite raios gama, com
energia de 140.511keV (140 mil elétronvolts), ideal para a “Câmara Gama”. É muito reativo
quimicamente, reagindo com muitos tipos de moléculas orgânicas. Esta grande versatilidade
química permite a grande maioria dos estudos em Medicina Nuclear.
Iodo-123 ou Iodo-131: importantes no estudo da tireoide. Têm emissão de radiação gama e beta,
respectivamente. Meia-vida de 8 dias para o iodo-131 e 13 horas para o iodo-123.
Tálio-201: tem propriedades químicas semelhantes às do potássio, tendo sido utilizado durante
muitos anos para imagiologia cardíaca (integrava a bomba de sódio-potássio). Os seus fótons
gama têm energias baixas, mas as imagens eram menos nítidas e a sua interpretação, mais
complexa. Meia-vida de 3 dias. Atualmente o tálio-201 tem caído em desuso, face ao
aparecimento de novos radiofármacos marcados com Tc-99m.
Gálio-67: tem propriedades semelhantes às do íon ferro. É um emissor gama de média energia e
apresenta meia-vida de 3 dias. É utilizado em estudos de infecção e em oncologia (câncer).
Índio-111: meia-vida 3 dias. É um emissor de radiação gama de média energia.
Xenônio-133 e Criptônio-81: gases nobres radioactivos que podem ser usados na cintigrafia de
ventilação pulmonar. No entanto a maior parte dos estudos de ventilação pulmonar são feitos com
um aerossol marcado com Tc-99m.
Flúor-18: emite pósitrons. É usado no exame PET.
Radioterapia
É a aplicação de radiações ionizantes capazes de criar íons e radicais livres nas células
focalizadas, ou seja, atuam de forma seletiva, diretamente sobre o tumor. Como a capacidade de
reparo das células tumorais é menor, os íons formados e os radicais livres danificam o DNA da
célula neoplásica, levando-a à morte.
As radiações ionizantes empregadas na radioterapia podem ser raios X ou raios gama emitidos,
por exemplo, por uma cápsula de cobalto.
A radioterapia é usada em praticamente todos os tipos de tumores cancerosos, sendo geralmente
associada com a quimioterapia.
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Energia Nuclear – os superpoderes do átomo – parte 1