Mãe sempre certa? Não mais
Quem será a mãe da criança? A que teve o óvulo fecundado ou a que deu o parto à
criança?
A fertilização assistida, conhecida como fecundação artificial, que é a inseminação
artificial realizada para casais que não conseguem engravidar através da conjunção
carnal, onde fecundação do sêmen no óvulo se dá em laboratório (in vitro), dando
origem ao embrião, o qual pode ser gerado por outra mulher, derrubou o princípio
de que a mãe é sempre certa. Na inseminação artificial homóloga, o embrião se
origina do sêmen e do óvulo do próprio casal. Mas, em virtude de problemas
orgânicos, a fecundação é fita artificialmente e é colocado no útero da própria
mulher. Não havendo, então, problemas. Na inseminação artificial heteróloga, em
razão da esterilidade do marido, este pode autorizar a utilização do sêmen de um
terceiro para fecundar, artificialmente, o óvulo de sua mulher e, formando o
embrião, o mesmo é colocado em seu útero para gerar a criança. Não havendo,
também, questionamentos jurídicos mais sérios.
A situação se complica quando a inseminação artificial é como a homóloga, mas
quem gera a criança não é a que forneceu o óvulo, mas sim, outra mulher, a mãe
sub-rogada ou barriga de aluguel. As inseminações homólogas e heterólogas vêm
regulamentadas no novo Código Civil que, apesar dos questionamentos, a solução
pode ser encontrada sem maiores dificuldades. Vários questionamentos jurídicos
surgirão por conta dessa nova técnica de procriação. Mas vou me ater àquela em
que a criança é gerada no útero de outra mulher. A conhecida barriga de aluguel.
A pergunta que se faz é: quem será a mãe da criança? A que teve o óvulo
fecundado ou a que deu o parto à criança? Bem, para a lei em vigor, quem deu o
parto é a mãe de Direito. Porém, a que teve o óvulo fecundado artificialmente é
que é a mãe de fato, a biológica. Então, registrar a criança em nome de quem se
tudo foi feito de comum acordo entre o casal e a mãe geratriz?
Alguns sugerem a adoção como solução, ou seja, a mãe geratriz registra a criança
normalmente e, depois, os pais biológicos, com a concordância daquela, adotamna. Realmente, no caso, a mãe biológica (a que teve o óvulo fecundado) não pode
registrar a criança em nome dela. Isso porque, a criança é oriunda de parto da mãe
geratriz, em nome de quem é emitida a Declaração de Nascidos Vivos e que servirá
para efetuar o registro de neonato, e o artigo 242 do Código Penal prevê como
crime dar parto alheio como próprio (reclusão de dois a seis anos). Contudo,
entendo que a adoção não reflete a realidade dos fatos. Ninguém pode adotar o
próprio filho. Isso é um subterfúgio inaceitável. A verdade e a transparência devem
prevalecer em todos os atos da vida civil, principalmente envolvendo direitos de
uma criança.
No caso, os fatos deverão ser tratados perante a Justiça como eles realmente os
são, ou seja, a mãe geratriz deverá registrar o nascimento da criança no Cartório
em nome dela e do pai biológico - com a presença deste, é lógico. Pois,
atualmente, a mãe é obrigada a dar o nome do suposto pai quando este não
comparece para o registro e a criança tem, naturalmente, um pai. Depois, em
petição conjunta, a mãe biológica, a mãe geratriz e pai devem pleitear perante a
Vara de Família a retificação do assento de nascimento da criança para que no
registro fique constando os nomes dos verdadeiros ais biológicos.
Para tanto, deverão relatar os fatos na petição inicial e instruí-la com a certidão de
nascimento da criança; declaração do médico que fez a inseminação artificial; o
exame de DNA - comprovando que são os pais biológicos; e outros que se fizer
necessário. Como não há previsão legal expressa, o Juiz poderá encontrar a solução
no artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, que diz: "quando a lei for omissa,
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais
de direito" e no artigo 109 e parágrafos da Lei de Registros Públicos (n. 6.015/73).
Até porque, toda pessoa tem direito de ação de investigação de paternidade ou
maternidade para saber a sua verdadeira origem (seu histórico) e, se for do seu
interesse, que os nomes de seus pais biológicos constem no registro de
nascimento, preservando, é lógico, o sigilo.
Autor: Cláudio Santos de Moraes é Promotor de Justiça em São José do Rio Preto.
Fonte: Arpen-SP
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