Sumário
resenha
• Economia solidária e cooperativismo: considerações acerca do trabalho
Introdução à economia solidária de Paul Singer..................................................... 3
Anne Caroline Moura Guimarães Cançado e Airton Cardoso Cançado
Artigos
TECNOLOGIA
• Previsão de Séries Temporais utilizando Lógica Fuzzy............................................... 5
Alexandre Tadeu Rossini da Silva
EDUCAÇÃO
• O ensino superior no Brasil: vontade política ou aspiração popular?........................... 15
Maria Cristina d´Almeida Moretz-Sohn
• Docência na educação superior: uma construção mediada por saberes pedagógicos....... 33
Marilda Piccolo
GESTÃO
• Ecoturismo no Brasil: uma proposta de desenvolvimento e sustentabilidade................ 43
Claudia Nolêto Maciel Luz
• Análise dos impactos de um sistema de avaliação de desempenho aos colaboradores
internos de uma organização.......................................................................... 55
Roseli Vieira Pires e Rubia Mara Martins Peixoto
• Competitividade no setor de análises clínicas: um estudo survey na cidade do
Natal/RN..................................................................................................... 67
Dany Geraldo Kramer Cavalcanti e Silva, Geraldo Barroso Cavalcanti Júnior, Bianca Caroline da Cunha
Germano, Walter Romero Ramos e Silva Júnior, Sérgio Marques Júnior e Aurean de Paula Carvalho
• Levantamento sócio-econômico e cultural do assentamento Pericatu localizado no
município de Pium-TO....................................................................................75
Glenda Feitosa da Silva, Alan Kardec Elias Martins e Iracy Coelho de Menezes Martins
• Remuneração: do tradicional ao estratégico........................................................... 83
Paulo César Romão Bomfim
• A importância da qualidade da informação para as organizações................................91
Suzana Gilioli da Costa Nunes
MEIO AMBIENTE
• Alternativa ambientalmente correta para o tratamento líquido percolado ou chorume
combinado com esgotos domésticos.....................................................................99
Francisco Ferreira Dantas Filho e Magna Sueli Barros Dantas
DIREITO
• O periodismo jurídico oitocentista na órbita das academias brasileiras...................... 105
Armando Soares de Castro Formiga
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Apresentação
Um periódico científico é sempre bem vindo no atual contexto de construção do conhecimento. A Revista Integração Universitária surge com o objetivo de estimular e difundir
a produção científica. Esta iniciativa da Faculdade Católica no Tocantins vem reforçar os
trabalhos de pesquisa que são realizados na instituição, bem como se constituir em um canal
aberto para a comunidade acadêmica apresentar seus trabalhos.
Foi de grande valia a colaboração de todos os professores e funcionários da instituição
para a finalização deste primeiro número da Revista Integralização Universitária - RIU. Cada
membro da equipe da Católica do Tocantins pode se sentir responsável por uma parte deste
trabalho.
Neste número iniciamos com uma resenha que trata de importante trabalho do Professor Paul Singer, Introdução à economia solidária. Na seqüência temos um trabalho na área
de tecnologia, que trata da previsão de séries temporais utilizando a Lógica Fuzzy. Na seção
de educação, os dois trabalhos são complementares, um trata da competência pedagógica
dos professores da graduação, enquanto o outro aborda a origem e evolução do ensino superior no país. A seção de gestão foi a que recebeu mais trabalhos. Entre os artigos publicados
nesta revista relacionados à esta questão, temos textos que tratam dos tipos de remuneração,
ecoturismo, avaliação de desempenho, qualidade da informação, competitividade no setor de
análises clínicas e um levantamento sócio-econômico-cultural em um assentamento. Na temática do meio ambiente, o trabalho apresentado mostra uma metodologia para o tratamento
de resíduos poluentes líquidos. Finalizando a Revista, na seção voltada para os estudos jurídicos, encontramos um trabalho que trata da origem e evolução dos periódicos brasileiros
de direito.
Dentro desta diversidade encontramos a unidade que é a pesquisa e a produção científica desenvolvida por estes autores. Boa leitura!
Airton Cardoso Cançado
Editor
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
RESENHA
Economia solidária e cooperativismo: considerações acerca do trabalho
Introdução à Economia Solidária de PAUL SINGER
Anne Caroline Moura Guimarães Cançado1
Airton Cardoso Cançado2
SINGER, Paul. Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2002, 124 p.
Este livro do Professor Paul Singer pode ser considerado como um dos
pioneiros a tratar da temática da economia
no Brasil. É um livro bastante conhecido e
usado como referência em quase todos os
trabalhos sobre o tema.
O autor divide o livro em quatro
capítulos, no primeiro faz-se uma comparação entre a sociedade capitalista e a
sociedade da economia solidária ou cooperativista, relacionando todos os pontos
fracos e fortes das duas sociedades. O autor critica o capitalismo e defende a economia solidária, porque para ele vivemos
“em uma sociedade em que a competição
domina todas as áreas da atuação humana”, produzindo assim, sociedades totalmente desiguais.
Segundo o autor, para existir uma
sociedade em que predominasse a igualdade entre a população, seria necessário
que a economia fosse solidária em vez de
competitiva, ou seja, que os participantes
na atividade econômica deveriam cooperar em vez de competir. “Não há competição entre os sócios: se a cooperativa progredir, acumular capital, todos ganham
por igual. Se ela for mal, acumula dívidas,
todos participam por igual nos prejuízos e
nos esforços para saldar os débitos assumidos”.
Para o autor, se a economia fosse
solidária, a sociedade seria menos desigual, porém, algumas cooperativas iriam
progredir mais que outras, em função do
acaso e das diferenças de habilidade e inclinação das pessoas que as compõem. O
mesmo defende que as pessoas deveriam
repartir por igual o resultado, independente do cargo em que atuam na organização. Mas devido ao capitalismo, apenas
Revista Integralização Universitária
algumas cooperativas aceitam repartir por
igual a sua retirada e a maioria divide de
acordo com a função exercida na cooperativa.
O capitalismo, para o autor, aplica
a heterogestão, ou melhor, a administração hierárquica formada por níveis sucessivos de autoridade. O objetivo constante
das organizações capitalistas é a procura
de novas fórmulas que lhe permitam extrair o máximo de trabalho e eficiência
das pessoas empregadas. Já a economia
solidária, pratica a autogestão, ou seja,
administra democraticamente. Todas as
decisões devem ser tomadas em assembléias realizadas na cooperativa, porque
todos os associados devem saber de tudo
que acontece.
No segundo capítulo o autor relata
a história da economia solidária, suas origens e evolução. Cabe ressaltar que Paul
Singer considera a economia solidária
quase como sinônimo de cooperativismo.
Nos relatos do autor, o cooperativismo nasceu logo após a Revolução Industrial, na Inglaterra, devido aos baixos
salários das pessoas e a grande carga de
horas de trabalho. A primeira pessoa a
manifestar idéias diferentes da sociedade
industrial foi o empresário Robert Owen
em New Lanark. Este empresário tinha
idéias avançadas para a época, os seus
empregados passaram a trabalhar menos
horas e a ganhar mais, mostrando assim,
um melhor rendimento nos serviços desempenhados.
Após a Revolução Francesa, Robert Owen apresentou ao governo britânico uma proposta para o combate à pobreza, baseado em ações estruturantes,
ao invés de o estado sustentar os pobres
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
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Pós-graduada da 1ª
Turma do MBA em Gestão de Cooperativas da
Universidade Católica
do Salvador – UCSAL,
Turismóloga pelo Centro
Universitário da Bahia e
Consultora do Instituto
de Economia Solidária
(Organização da Sociedade Civil de Interesse
Público).
2
Mestre
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em Administração pela Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia
– EAUFBA -, professor
da Faculdade Católica
do Tocantins – FACTO e da Universidade Federal do Tocantins - UFT.
1
(numa perspectiva assistencialista), proporcionaria condições de trabalho, comprando terras e construindo aldeias cooperativistas para que as pessoas trabalhassem na terra e na indústria, criando assim,
a sua própria subsistência. Mas o governo
não aceitou a sua proposta, então Owen
foi embora para os Estados Unidos ficando por lá alguns anos, depois voltou para
a Inglaterra e, quando chegou na sua terra
natal, descobriu que algumas pessoas estavam usando as suas idéias. A primeira
cooperativa owenista foi criada por George Mudie, que reuniu um grupo de jornalistas e gráficos, em Londres.
Na terceira parte do trabalho o autor trata de diversos tipos de cooperativas.
O cooperativismo de consumo foi o tipo
pioneiro, em Rochdale (Inglaterra), e seu
sucesso difundiu as idéias pela Europa.
Esta cooperativa, ao ser criada adotou oito
princípios, que depois foram apropriados
pelo movimento como os princípios do
cooperativismo.
O cooperativismo de crédito foi
desenvolvido na Alemanha, inicialmente
como uma caixa de crédito de caráter filantrópico. Posteriormente passou a funcionar como um fundo de crédito rotativo,
onde os cooperados entravam com recursos e na medida da necessidade faziam
empréstimos a juros módicos.
As Cooperativas de compras e
vendas, descritas neste capítulo pelo autor, “são associações de pequenos e médios produtores que procuram ganhos
de escalas mediante a unificação de suas
compras e/ou de suas vendas”. O tipo que
mais se destaca nesta categoria é a cooperativa agrícola.
O autor descreve neste livro, a
corporação cooperativa de Mondragón
(Espanha), que une cooperativa de produção industrial e de serviços comerciais
com um banco cooperativo, “uma cooperativa de seguro social, uma universidade
e diversas cooperativas dedicadas à realização de investigações tecnológicas”.
No quarto e último capítulo, Paul
Singer trata da reinvenção da economia
solidária no fim do século XX e as pers-
pectivas da economia solidária.
Ao final da segunda Guerra Mundial, uma grande parte da população da
Europa passou a desfrutar de boas condições de vida, assistidas pelo Estado de
Bem-estar Social (wellfare State). Com
isso, ocorreu um grande desinteresse pela
economia solidária e, também, a introdução de assalariados dentro das cooperativas. Esta situação foi modificada depois
dos anos 70 quando se iniciou a crise do
desemprego em massa, provocando a
desindustrialização em países centrais e
semi-industrializados. Com isso a economia solidária ressurgiu com toda a força,
aumentando assim, o número das cooperativas. Porém este novo cooperativismo
buscava a volta dos seus princípios e o
repúdio ao assalariamento.
Em síntese, Singer no primeiro capítulo faz uma crítica ao modo de sobrevivência do capitalismo e apóia a economia
solidária, pois se todas as pessoas vivessem com o modo de produção da economia solidária, haveria menos desigualdade
social no mundo. No segundo, ele relata a
história do cooperativismo, como e onde
surgiu. O capítulo seguinte é dedicado à
descrição dos tipos de cooperativa e suas
origens, com destaque para a cooperativa
de Rochdale. No quarto capítulo, o autor
fala do ressurgimento da economia solidária ou cooperativismo no mundo, pois
para ele, o cooperativismo e a economia
solidária são sinônimos.
Cabe ressaltar, ao fim deste trabalho, que considerar o cooperativismo,
mesmo apenas sua vertente denominada
cooperativismo popular como sinônimo
da economia solidária é uma proposta
discutível. O fenômeno da economia solidária também assume outras formas como
clubes de troca, associações, grupos produtivos etc. Todos centrados na questão
da autogestão e na valorização do trabalho em detrimento do capital, porém cada
tipo de organização tem suas características distintas que, mesmo apesar de muito
próximas não são idênticas entre si.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
TECNOLOGIA
Previsão de séries temporais utilizando Lógica Fuzzy
Alexandre Tadeu Rossini da Silva1
Resumo. Usando o processo de KDD
(Knowledge Discovery Database), um
sistema foi definido a fim de extrair automaticamente regras em bases de dados. O
método de aprendizado de máquina adotado foi a Lógica Fuzzy com o algoritmo Wang-Mendel. Testes e resultados são
apresentados para validar o modelo. Todo
o processo de extração e inferência está
descrito ao longo do trabalho.
Palavras-chave: Previsão de Séries Temporais; Lógica Fuzzy; Mineração de Dados; Wang-Mendel; KDD.
Abstract: Using the KDD (Knowledge
Discovery Database) process, a system
was defined to extract rules automatically
in databases. The method of machine learning was the fuzzy logic using the WangMendel algorithm. Tests and results are
presented to validate. The process of extration and inference is described in the
paper.
Key-words: Time Series Prediction; Fuzzy Logic; Data Mining; Wang-Mendel;
KDD.
1 Introdução
A evolução da computação possibilitou um aumento na capacidade de processamento e armazenamento de dados.
Nesse sentido, aplicativos essencialmente para consultas foram projetados para
gerar relatórios simplificados. Porém, os
relatórios necessitam ser interpretados.
O processo de Extração de Conhecimento de Bases de Dados tem o objetivo de encontrar conhecimento a partir de
um conjunto de dados para ser utilizado
em um processo decisório. A Mineração
de Dados é a principal etapa do processo
de Extração de Conhecimento.
A descrição completa de um sisRevista Integralização Universitária
tema real em muitos casos requer dados
extremamente detalhados e muito além
do que um ser humano poderia simultaneamente processar e entender. Uma nova
abordagem para a solução deste problema
pode ser encontrada no campo de Sistemas Inteligentes. O termo Inteligente significa buscar, identificar e emular a forma
de processamento da informação executada pelo cérebro humano em situações
complexas. Nestas situações não se usam
conceitos explicitados em equações matemáticas, mas a experiência adquirida mediante a um processo específico de aprendizagem. Dentre os métodos computacionais, a Lógica Fuzzy é capaz de aproximar complexos sistemas não lineares com
poucas regras em linguagem natural.
Uma série temporal é um conjunto
de observações de um fenômeno ordenado no tempo (Box e Jenkins, 1970).
A análise de uma série temporal é o processo de identificação das características,
padrões e propriedades importantes da série, utilizados para descrever em termos
gerais o seu fenômeno gerador (Morettin e Tolot, 1987). Na figura 1, é ilustrada uma série temporal, onde o eixo k
é a linha de tempo e [U-,U+] é a faixa de
valores possíveis da série. Repare que a
série tende a se repetir ao longo do tempo.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Mestre em Sistemas e
Computação, professor
da Faculdade Católica
do Tocantins.
1
Figura 1. Série temporal
Diante do exposto, este trabalho
tem o objetivo de construir um sistema
minerador que utilize Lógica Fuzzy para
extrair regras para previsão de séries temporais automaticamente em base de dados.
O trabalho está organizado da seguinte forma: inicialmente será introduzida a fundamentação teórica dos métodos utilizados no trabalho; em seguida a
descrição de todo o problema bem como
algumas considerações; posteriormente a
solução proposta é detalhada; para validar
a solução, os testes e resultados do sistema são apresentados em seguida; por fim
são feitas as considerações finais do trabalho.
2 Fundamentação Teórica
Nesta seção são descritos os métodos necessários para compreensão do trabalho.
2.1 KDD
O processo capaz de descobrir conhecimento em base de dados chama-se
Knowledge Discovery Database (KDD).
Este processo envolve encontrar e interpretar padrões nos dados, de modo iterativo e interativo, através da repetição dos
algoritmos e da análise de seus resultados.
As técnicas da Inteligência Computacional têm sido empregadas com sucesso no desenvolvimento de sistemas inteligentes de previsão, suporte à decisão,
controle, otimização, modelagem, classificação e reconhecimento de padrões
em geral, aplicados em diversos setores:
energia, industrial, econômico, financeiro, comercial, síntese de circuitos, meio
ambiente, entre outros.
Divide-se o processo de KDD em
três grandes etapas: pré-processamento,
mineração de dados e pós- processamento. Vide Figura 2. A etapa de pré-processamento tem como objetivo a preparação
dos dados para os algoritmos da etapa seguinte, a Mineração de Dados. Durante a
etapa de Mineração de Dados é realizada
a busca efetiva por informações úteis no
contexto da aplicação de KDD. A etapa de
pós-processamento abrange o tratamento
do conhecimento obtido na Mineração
de Dados (Goldschmidt e Passos,
2005). Mineração de dados ou Data Mining é a extração não-trivial de informação implícita (nova ou previamente desconhecida) e útil a partir de bases de dados. (Loh, 2006)
Figura 2. Divisão do processo de KDD
2.2. Lógica Fuzzy
Os conjuntos Fuzzy tentam aproximar o raciocínio humano ao da lógica executada matemática. Tradicionalmente, em
lógica bivalente, temos em um conjunto
convencional limites bruscos, onde a transição de conjuntos representa um corte
abrupto entre elementos vizinhos pertencentes a conjuntos diferentes. Em Lógica
Fuzzy, elementos podem ser reduzidos a
“meias verdades” ou “meias mentiras”,
através de uma lógica multivalorada, tornando gradual a transição de conjuntos.
Concisamente, pode-se definir Lógica Fuzzy como sendo uma técnica capaz de capturar informações vagas, em
geral descritas em uma linguagem natural
e convertê-las para um formato numérico,
de lógica.
Outra vantagem é que o conhecimento gerado pela Lógica Fuzzy está
explicitamente representado na forma de
regras em linguagem natural, o que dá
maior compreensão do processo ao especialista.
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- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
2.2.1 Algoritmo de Wang-Mendel
O algoritmo utilizado neste trabalho para a extração automática de regras
fuzzy é o Wang-Mendel. Esse algoritmo
utiliza o paradigma de aprendizado supervisionado. O primeiro passo do algoritmo
é a definição do domínio das variáveis,
intervalos onde provavelmente os valores
de cada variável estarão, onde x1,x2,...,xn
são entradas e y é a saída. Em seguida, dividir cada domínio em 2N+1 regiões, ou
seja, um número ímpar de conjuntos.
O segundo passo consiste em buscar os dados em uma base de dados e determinar os graus de pertinência dos dados nos conjuntos fuzzy obtidos no passo
1. Em seguida, é aproveitado somente o
conjunto com maior grau de pertinência
do elemento, os demais conjuntos são
descartados, obtendo-se assim as regras.
No próximo passo é necessário
atribuir um grau a cada regra a fim de eliminar regras conflitantes e redundantes. O
grau de pertinência de cada regra é definido pelo produto dos graus de pertinência
da regra. Para cada grupo de regras com
mesmo antecedente (conflitantes e redundantes), é selecionada a regra como o
maior grau e, as demais, são eliminadas.
O último passo é realizado somente nos casos em que se dispõe de regras
lingüísticas criadas por especialistas. Nesse sentido, elas serão consideradas, assumindo que também possuem um grau atribuído pelo especialista. Havendo regras
conflitantes, com antecedentes iguais e
conseqüentes diferentes, se deve selecionar aquela com maior grau e eliminar as
demais.
O algoritmo de Wang-Mendel
aplicado aos problemas de previsão de
séries temporais, difere apenas no fato de
que, agora, os n antecedentes (janela) formarão uma série temporal e o alvo é um
dado com k passos à frente a ser previsto
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(Figura 3).
Figura 3. Janela (x0,x1,x2,...,xn)
e alvo (y) de uma série temporal
3 Descrição do Problema
A análise em grande massa de dados realizada visualmente por especialistas humanos pode ser bastante confusa ou
ocorrer de informações importantes passarem despercebidas, acabando por gerar
dados imprecisos causados pela grande
quantidade de informações relacionadas.
Os especialistas passam horas analisando
os dados para extrair informações importantes para o processo de tomada de decisão.
Previsão, basicamente, é a antecipação, na base de suposições, do que
ainda não aconteceu. Assim, a previsão
de séries temporais tem sido aplicada em
diversos problemas do mundo real, auxiliando o planejamento e a tomada de decisões. Diversos modelos já foram desenvolvidos na literatura para prever séries
temporais e destacam-se a Lógica Fuzzy
e Redes Neurais, entre outras.
Em problemas desse tipo, como
já citado, a descrição completa de um sistema real requer, em muitos casos, dados
extremamente detalhados e muito além
do que um ser humano poderia simultaneamente processar e entender. Nesse contexto, é necessário minimizar a quantidade de regras sem perder o comportamento
do sistema. Dessa forma, é necessário
um sistema de aproximação. Um problema que pode aparecer na minimização é
o surgimento de uma nova série na qual
o sistema não possui regras, ou seja, essa
série temporal não existia no momento da
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
criação das regras do sistema. Há ainda
aplicações onde o universo não pode ser
limitado previamente, na qual o universo
varia por conseqüência de fatores não determinísticos, pelo acaso. Exemplos disso são a bolsa de valores e a quantidade
de acessos em um website. Como seria
possível prever, com um mínimo de erro
aceitável, o número de acessos do website
da rede de televisão estadunidense CNN
no dia 11 de setembro de 2001 (dia do
atentado terrorista ao World Trade Center,
em Nova Iorque)? Uma pergunta difícil e
que talvez não tenha resposta. O que se
pode, então, é tentar prever em condições
normais, esse exemplo da CNN seria um
desvio da normalidade.
4 Solução Proposta
Seguindo o processo de KDD, neste trabalho coube à etapa de Pré-processamento apenas a realização da normalização linear dos dados. A normalização é a
transformação dos valores para uma gama
fixa (eg 0 a 1), isto foi adotado para verificar o comportamento do sistema de inferência quando o universo é extrapolado.
É pré-requisito do sistema que a base de
dados contenha apenas dados numéricos e
não possua ruídos.
A mineração de dados, aqui realizada por método de aprendizado de máquina, é o processo de aquisição de conhecimento, é nele que as regras são descobertas a partir dos exemplos passados.
A Lógica Fuzzy foi escolhida por estar
mais próxima à forma do pensamento e da
linguagem natural humana, o que facilita
a análise e compreensão do conhecimento adquirido nesse processo. O algoritmo
utilizado para a extração das regras fuzzy
é o algoritmo de Wang-Mendel. (Wang
e Mendel, 1992)
A obtenção do conhecimento não
é o passo final do processo de KDD. O
pós-processamento é uma etapa que não é
automatizada, ainda dependendo do raciocínio humano (especialista). A principal
meta dessa fase é melhorar a compreensão
do conhecimento descoberto validando-o
através de medidas de qualidade da solução e da percepção de um especialista.
O intuito da implementação de um
sistema computacional é a realização automática de extração de regras e ser capaz
de realizar a inferência Fuzzy, através do
modelo de Mamdani. De acordo com o
sistema, o primeiro passo é a introdução
da base de dados a ser utilizada no sistema (Figura 4).
Figura 4. Tela do sistema: importação
da base de dados
Seguindo, já com a base de dados
no sistema, são apresentadas em tela as
variáveis da base de dados (Figura 5) que
devem ser escolhidas. No quadrado devem ser marcadas as variáveis que serão
utilizadas para extrair conhecimento e o
círculo representa a variável temporal.
Figura 5. Tela do sistema: seleção de variáveis
No próximo passo, é necessária,
por parte do especialista, a entrada da
quantidade de conjuntos fuzzy que serão
utilizados (Figura 6) em cada variável.
Atualmente no sistema a única opção de
formato do conjunto é triangular e simétricos entre si.
Figura 6. Tela do sistema:
definição dos conjuntos
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- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Caso o especialista deseje renomear os rótulos, que a priori são definidos numericamente por ordem crescente
partindo-se de zero, a próxima tela é para
isso (Figura 7).
Figura 7. Tela do sistema: renomear os rótulos
A Figura 8 é a tela seguinte do sistema, onde devem ser inseridas as configurações para o sistema de extração de regras. Nessa tela deve ser definido o tamanho da janela e o alvo (k passos à frente a
ser previsto), além do conjunto de dados
que será usado no treinamento.
Na implementação do sistema
de extração de regras fuzzy, o universo
pode ser indicado por um especialista ou
ainda a partir da base de dados, obtê-lo
automaticamente, a partir do maior e do
menor valor no conjunto de treinamento,
para então, realizar a normalização linear
dos dados a partir do universo. Depois de
realizada a normalização, todos os dados
estarão no intervalo, independentes do
domínio [0,1]. Há ainda uma opção de αcut para as regras.
Posteriormente, as regras extraídas são exibidas para o especialista que,
se desejar, pode aplicá-las utilizando a
mesma base de dados, em qualquer intervalo da base. O sistema de inferência
fuzzy implementado utiliza a composição
max-min e a defuzzificação é calculada
pelo método da altura Y=Σiyµ(yi)/ Σiµ(yi),
onde y é a altura de um conjunto e µ(yi) o
grau de pertinência ao conjunto.
Adicionalmente, sabendo que o
KDD é um processo interativo e iterativo,
onde através das interações com o especialista há iteração no processo inteiro a
fim de melhorar os resultados apresentados, modificações podem ocorrer durante
os testes.
5 Experimentos e Resultados
A base de dados utilizada nos testes
é uma base de dados de um website real,
onde contém a hora (variável temporal) e a
quantidade (série) de páginas visualizadas
(pageview) diariamente, observadas entre
outubro de 2003 e novembro de 2004.
Figura 8. Tela do sistema: configurações
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Em testes iniciais, utilizou-se
apenas o mês de outubro de 2003 com 7
conjuntos fuzzy para a extração de regras,
janela de 5 observações (dias úteis da semana), alvo igual a 1 e α-cut 0 (zero). O
universo é obtido pelos maiores e menores
valores desse mês. Dessa configuração,
foram extraídas 20 regras fuzzy (Figura
9).
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
10
Figura 9. Tela do sistema: regras extraídas
do mês de outubro de 2003
Para validar essas regras, aplicouas entre os dias 6 e 31 de outubro de 2003,
período incluído na extração das regras. A
média dos erros dos testes foi de 4.22618%
em relação ao universo. Vejamos agora
como o sistema se comporta para uma
quantidade maior de conjuntos. Utilizando 21 conjuntos e as mesmas configurações do teste anterior, foram extraídas 26
regras e aplicando-as no mesmo conjunto
do teste anterior a média de erros reduziu
para 1.01196% em relação ao universo.
Ainda utilizando as mesmas configurações, mas alterando para 39 conjuntos, o
erro caiu ainda mais. 0.4682% do universo. Assim pôde-se constatar que o aumento na quantidade conjuntos é diretamente
proporcional à acurácia do sistema, mas
deve ser observado que a complexidade
do sistema também aumenta e na proporcionalmente também aumenta o número
de conjuntos. A partir de agora os testes
serão realizados sempre com 21 conjuntos fuzzy para analisar o comportamento
das regras no sistema de inferência.
Agora faz-se necessário analisar a
janela. No teste a seguir, utilizou as mesmas configurações dos testes anteriores,
exceto a janela que passa a ser 7 (dias da
semana). As regras extraídas foram aplicadas para prever os dias entre 8 e 31 do
mesmo mês. O erro foi de 0.94007% em
relação ao universo, ou seja, menor que
os 1.01196% com janela igual a 5 (dias
úteis). Utilizando uma janela de 10 dias,
o erro resultante foi 0.95169% do valor
do universo para a previsão dos dias entre
11 e 31 de outubro de 2003. Isso mostra
claramente que o comportamento da série
na aplicação está intimamente ligada aos
dias da semana, assim decidiu-se utilizar
nos demais testes janela igual a 7. Entretanto, A complexidade do sistema também
cresce com o aumento da janela.
Continuando, a análise é feita na
aplicação das regras extraídas no mês de
outubro de 2003 aplicadas no mês de outubro de 2004. Nenhuma regra foi encontrada para ser aplicada ao mesmo mês do
ano seguinte, isso ocorre porque o número
de acessos diários no website aumentou e
o universo que estava definido de acordo
com o valor mínimo e máximo de um ano
antes não atende à realidade atual, mesmo atualizando o universo a cada dia, por
exemplo, para a previsão do dia 2, se o
dia 1 tiver fora do universo, o universo é
alterado com os dados do dia 1, tentando
melhorar a previsão para o dia 2, mas continua não encontrando regras para aplicar.
Uma solução seria tentar encontrar todas
as soluções possíveis, o que é inviável já
que queremos reduzir o número de regras e utilizar um sistema inteligente para
aproximar funções. Diante disso, decidiu-se tentar através de pesos nas regras
existentes prever um alvo onde não seja
encontrada uma regra, assim pelo princípio da localidade espacial (se um item
é referenciado, é provável que seus vizinhos também o sejam) cada antecedente
da regra recebe um peso que cresce à medida em que esteja mais próximo do alvo.
A fórmula utilizada para atribuir pesos às
regras é peso=(Y*d), onde Y é a altura do
conjunto e d é uma distância, quanto mais
próximo do conseqüente da regra ele aumenta.
Agora, com peso nas regras para
inferir apenas as séries na qual ainda não
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- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
11
possuam regras, o erro para o mês de outubro de 2004 foi de 9.57871% em relação ao universo, sendo que houve 8 alvos
sem previsão. Faz-se necessário analisar
o comportamento quando o treinamento
é realizado com mais dados. Utilizou-se
agora para o treinamento o período entre
os meses de abril de 2004 e setembro de
2004, foram 176 regras extraídas, o que
mostra ser uma aplicação onde as séries
não tendem a se repetir. Descobriu-se que
o número de páginas visualizadas está diretamente ligado a fatores externos e que
na maioria não são previsíveis, por exemplo, notícias. As regras extraídas foram
utilizadas para prever os acessos do website no mês de outubro de 2004 e somente
uma regra foi ativada completamente. Na
tentativa de encontrar regras pelo princípio da localidade espacial, conseguiu prever valores para todas as outras, demonstrando que um conjunto de dados maiores
no treinamento aumenta a capacidade de
aproximar mais séries. Entretanto, o erro
médio foi de 10.22% do universo, mas
houve resultados interessantes como, por
exemplo, o erro de apenas 23.55268 acessos em um dia, mas nesse mês havia um
desvio (dia 04) nos acessos, que é justamente 1 dia após as eleições, ou seja, o
dia em que todos os resultados de votação
foram divulgados amplamente, neste dia
o erro foi de 3846.73524 acessos. Utilizando um α-cut de 0.1 na relevância das
regras extraídas, o resultado na inferência
foi de 10.9% do universo, piorando o resultado.
Ao invés de apenas testar meses
escolhidos ao acaso, foi necessário conhecer melhor a base, note que isso é típico
do pós-processamento do KDD. É interessante observar que os dados que serão levados ao treinamento para a extração das
regras devem ser escolhidos pelo especialista para um melhor resultado. Assim, decidiu-se extrair regras utilizando os meses
de setembro e outubro de 2004 e prever o
mês de novembro de 2004. Como resultado, todos os alvos não possuíam regras,
Revista Integralização Universitária
lembrando que isso é provocado pela natureza dinâmica do universo de acessos.
Tentando aproximar as regras existentes,
o erro foi de 6.943157% do universo, observando melhora no resultado, isso ocorreu porque entre os meses de setembro e
novembro de 2004, houve algumas semelhanças nas séries, ficando evidente a necessidade de se conhecer a base de dados
para obtenção de melhores resultados.
Com um especialista definindo um
universo suficientemente grande para que
o período entre outubro de 2003 e novembro de 2004 seja coberto, utilizou para
treinamento extração de regras nos meses
entre outubro de 2003 e janeiro de 2004
e aplicando as regras para prever o mês
de setembro de 2004. Em 9 dias haviam
regras para prevê-los, nos outros dias restantes utilizou o princípio da localidade
espacial, o erro médio foi de 4.20484%
do universo, incluindo os dois métodos
de inferência. Portanto, o conhecimento
de um especialista definindo previamente
um universo suficientemente grande consegue melhorar os resultados. Contudo,
notou-se que a base de dados utilizada
nos testes não costuma repetir as séries
periodicamente o que dificulta a previsão.
Fica para trabalhos futuros a busca por um
método que consiga aproximar as regras
mais eficientemente, mas já em mente a
possibilidade da utilização de algoritmos
genéticos, onde o cromossomo seria uma
regra e o gene as variáveis da janela e do
alvo. Nessa estrutura, as regras evoluiriam
tentando encontrar uma regra que atenda
à série, sendo a comparação com a série a
função objetivo.
Por fim, no intuito de tentar reduzir a complexidade computacional do
sistema de inferência, ao invés de utilizar
todas as regras ativadas para fazer a defuzzificação, foi utilizada apenas a regra na
qual o seu conseqüente tenha o maior grau
de pertinência no conjunto alvo. No teste
foram utilizados 21 conjuntos, janela de 7
observações, alvo igual a 1, normalização
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
12
linear entre o maior e menor elementos
dos dados de treinamento e α-cut zero. A
extração das regras foi aplicada no mês
de outubro de 2003, assim como a previsão (entre dias 8 e 31). Na figura 10,
são apresentados parcialmente os resultados, onde o erro no método normal foi
de 0.86776% (figura 10a) enquanto utilizando apenas a regra mais ativada foi
(a)
de 0.8972% (Figura 10b) do em relação
ao universo. O tempo de processamento
reduziu consideravelmente e a acurácia
permaneceu semelhante, isto quer dizer
que em aplicações que essa diferença
seja tolerável, há a necessidade de respostas mais rápidas, talvez seja interessante a utilização de apenas a regra mais
ativada.
(b)
Figura 10. Tela do sistema: resultados de previsão de séries
6 Considerações Finais
Neste trabalho foram apresentadas
as etapas de KDD, bem como suas utilizações. A etapa de mineração de dados
é a fase mais importante, onde ocorre a
extração automática das regras fuzzy a
partir de uma base de dados. O método
de aprendizado de máquina utilizado na
mineração de dados foi a Lógica Fuzzy,
implementada com o algoritmo WangMendel.
Utilizou-se como base de dados de
teste, o acompanhamento diário de acessos em um website real. De acordo com os
testes, conclui-se que o sistema proposto
é capaz de gerar regras que consigam pre-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
13
ver séries temporais correspondentes no
futuro, ou seja, que tendam a se repetir.
Contudo, a base de dados analisada demonstrou forte tendência de não repetir
séries temporais, ocasionada por influência externa ao sistema e serviços disponíveis nos dias. Além disso, o universo do
número de páginas visualizadas tem natureza dinâmica, o que prova mudança de
comportamento (pageviews) em relação
às regras extraídas. Entretanto, em bases
de dados que apresentam séries temporais
com fortes tendências a se repetir e que o
universo tenda a ser estático, os resultados podem ser ainda mais interessantes.
7 Referências
Box, G. E. e Jenkins, G. M. Time Series Analysis: Forecasting and Control, Holden-Day, San
Francisco: 1970.
Goldschmidt, R. R, Passos, E. Data Mining: Um
Guia Prático, Campus, Rio de Janeiro: 2005.
Loh, S. Data Mining. Disponível em: http://atlas.
ucpel.tche.br/~loh/dm.htm. Acesso em: 15 set.
2006.
Morettin, P. A. e Tolot, C. M. Séries Temporais,
Métodos Quantitativos, Atual, São Paulo: 1987.
Wang, L. X. e Mendel, J. M. Generating fuzzy
rules by learning from examples. IEEE Transactions on Systems, Man, and Cybernetics: 1992.
Todavia, tentou-se implementar
um método de inferência na qual se pudesse, a partir das regras extraídas, prever
acessos quando não haviam regras para
a série. O método se mostrou com resultados inferiores aos de quando há regras
para o alvo e fica proposto para trabalhos
futuros a utilização de meta-heurísticas,
como os algoritmos genéticos.
É interessante acrescentar que a
base de dados dos testes possuía dados
com ruídos, ou seja, dias nos quais a medição de acessos estava com problemas, o
que prejudicou os resultados. Diante disso
e dos resultados apresentados, a figura de
um especialista para orientar o processo
é fundamental na obtenção de melhores
resultados.
Por fim, foram comparados os resultados do sistema proposto com duas
formas de inferência diferentes, uma na
qual é obedecida á fundamentações teóricas do sistema de inferência fuzzy proposto por Mamdani e outra na qual infere
apenas á regras mais ativadas, na qual os
resultados foram semelhantes, e podendo
ser adotada em aplicações na qual obedeça à tolerância. A principal vantagem
de se utilizar apenas a regra mais ativada
para inferir é que a complexidade computacional é reduzida.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Foto: Roberto Carlos
15
EDUCAÇÃO
O ensino superior no Brasil: vontade política ou aspiração popular?
Maria Cristina d’ Almeilda Moretz-Sohn1
Resumo: A primeira universidade brasileira foi oficialmente instituída em 1920
por força de um decreto, sem um projeto
acadêmico, sem uma estrutura realmente
sólida e madura que lhe servisse de sustentação. Desde então, o ensino superior
no Brasil passou por várias reformas, culminando com Lei de Diretrizes e Bases
09.394 de 20/12/1996, cujo texto genérico
abriu espaço para sucessivas mudanças,
deixando evidente a interferência política
na educação, reafirmando a velha vocação
brasileira de priorizar o poder e secundarizar o saber, o que distancia o ensino superior do referencial de reflexão e crítica,
pilar da sua existência.
Palavras-chave: ensino superior, reforma universitária, autonomia, flexibilidade, educação.
Abstract: The first Brazilian university
was instituted officially in 1920 by force of an ordinance, without an academic
project, without a structure really solid
and mature that served it as sustentação.
Ever since, the higher education in Brazil went by several reforms, culminating
with Law of Guidelines and Bases 09.394
of 20/12/1996, whose generic text opened
space for successive changes, leaving evident the political interference in the education, reaffirming the old Brazilian vocation of to prioritize the power and to work
the knowledge, what distances the higher
education of the reflection referencial and
critic, pillar of its existence.
Key-words: higher education, reforms
university, autonomy, flexibility, education.
Revista Integralização Universitária
1 Introdução
A universidade, nascida no século
XIII, surgiu espontaneamente nas escolas
catedralícias européias, formando professores e alunos uma única societas “e
representavam o novo mundo que surgia
a consciência de liberdade e a valorização do saber pelo que ele representa por
si mesmo”. Com o significativo apelido
de alma mater, a universidade recebia jovens das mais diversas camadas sociais,
acreditando que, “através do saber e do
diálogo, a verdade acabava por vir à luz”.
(Beltrão, 1997, p.68)
No Brasil, a universidade criada
como “terreno seguro para abrigar a vida
e o corpo social” revelou-se ao longo da
história uma ilha de indefinições, um retrato, quem sabe, do próprio Estado (de
estável, estabelecido) brasileiro, pródigo
em ajustes circunstanciais, sem profundidade e substância, que verdadeiramente
promovam a equidade e a justiça social
(Beltrão, 1997, p.70). Para Chauí, “a
vocação política teve prioridade na criação das universidades públicas e privadas no Brasil” (Chauí, 2001, p.115), ou
seja, os aspectos políticos da universidade
sobrepujaram em momentos históricos
diferentes o projeto acadêmico, secundarizando o saber em detrimento do poder,
distanciando-se do referencial de reflexão
e crítica, pilar da sua existência.
O presente artigo percorre os caminhos e descaminhos do ensino superior no
Brasil, desde a vinda da Corte Portuguesa
em 1808 até a Lei de Diretrizes e Bases
promulgada em 1996 sob o número 9.394,
desvelando a íntima relação, em momentos históricos diferentes, entre o saber e o
poder.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Mestre
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em Educação
Brasileira pela UFG.
1
16
2 A Educação superior no Brasil de
1808 a 1920
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Em 1772, o Marquês
de Pombal promoveu
uma reforma na Universidade de Coimbra, subdividindo o ensino entre
Ciências Teológicas (Faculdade de Ciências e de
Leis) e Ciências Naturais
e Filosóficas (Faculdade
de Medicina, de Matemática e de Filosofia).
Cuidando para que o
ensino estivesse voltado para a aplicação, as
novas faculdades foram
dotadas de observatório,
gabinete de física, laboratório químico e jardim botânico, contando
ainda com um grupo de
naturalistas de reconhecido prestígio na Europa.
(Paim, 1982, p.19)
2
A necessidade de formação das elites patriarcais e escravocratas despertada
com a vinda da Corte Portuguesa ao Brasil em 1808, fez com que surgissem escolas superiores profissionalizantes, de caráter estritamente utilitarista, conforme o
modelo pombalino2 de universidade, instituído em 1772 em Portugal, quando “a
universidade tradicional foi virtualmente
destruída, surgindo uma nova universidade, voltada para a ciência aplicada”. Com
referência à nova universidade, Paim
lembra que esta “é encarada como uma
peça essencial ao projeto de tornar Portugal uma nação rica e próspera. Escapa à
reforma a compreensão da ciência como
saber desinteressado e busca da verdade”.
(Paim, 1982, p.18)
O Brasil, sede da monarquia, foi
marcado indelevelmente pela Reforma
Pombalina da Universidade de Coimbra, já que “os homens que cercavam D.
João VI e tiveram a missão de implantar
as instituições de cultura, inexistentes na
Colônia, haviam sido formados na nova
mentalidade e prescindiam de todo da
universidade”. (Paim, 1982, p.18)
No Segundo Império, embora projetos para a reforma do ensino não tivessem
faltado, a universidade permaneceu como
um agregado de faculdades. Silveira observa que
A concepção de universidade se alargou
no Segundo Império; considerada ainda o
agregado de cursos ou faculdades, fugiu
– ou tentou fugir – ao velho modelo de Coimbra, sofrendo ora a influência francesa da
universidade napoleônica, ora a influência
germânica segundo as idéias de Humboldt.
No primeiro caso, através da direção estatal centralizadora, objetivava-se o preparo
dos profissionais necessários ao Estado;
no segundo proclamava-se a liberdade de
ensinar e aprender, a instituição dos cursos
livres e da livre-docência. E havia ainda a
concepção que considerava a universidade
inútil e obsoleta: a dos positivistas, que se
colocavam então contra a sua instituição no
Brasil. (Silveira, 1984, p.62)
A influência dos positivistas sobre
os órgãos decisórios foi fundamental
para o abandono sistemático da idéia de
implantar-se a universidade no país, nos
decênios iniciais da República. Sob o
argumento de que “a universidade não se
inclui entre os elementos requeridos pela
grandeza nacional” (Paim, 1982, p.25),
os positivistas rejeitavam a estruturação
de uma universidade; defendiam que a
grandeza nacional estaria diretamente
ligada à
Redução ao mínimo da massa de parasitas que exploram o trabalho proletário; da
redução ao indispensável dos indivíduos
úteis que, mantidos pelo proletariado, colaboram para o bem-estar deste; enfim, da
educação e moralização deste mesmo proletariado, para que possa possuir seu domicílio inviolável e uma verdadeira família, em
que a mulher não seja obrigada a descuidar
dos filhos para cuidar do sustento da casa.
(Paim, 1982, p.24)
No primeiro período da República
(1889-1930), a concepção de ensino superior no país expressa as determinações
socioeconômicas, políticas e cultural da
sociedade brasileira: a esta bastavam as
escolas isoladas profissionalizantes, pois
“uma concepção sofisticada de universidade exige da sociedade que a ela aspira
a consciência do papel a desempenhar na
História, a liberdade de pensamento e de
ação, a estimulação do espírito criador”.
(Silveira, 1984, p.76)
Cabe lembrar que a Proclamação da
República “foi um golpe militar que adquiriu o caráter revolucionário por causa
da queda do Império e da implantação da
República”, não ocorrendo concomitantemente uma revolução social, “liderada por
forças sociais e sujeitos rebeldes. Em conseqüência disso, o espaço público acabou
sendo monopólio dos que detém o poder,
e entre os privilégios deles, está o controle
do Estado”. (Fernandes, 1995, p.51)
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
17
3 A educação superior no Brasil na
dácada de 20
Nesse contexto de total alienação
do povo nas decisões políticas, surge a
primeira universidade brasileira: a Universidade do Rio de Janeiro, criada pelo
Decreto n° 14.343, de 07 de setembro de
1920, que de universidade só tinha o nome.
Na verdade, constituía-se de um agregado
de instituições de ensino profissional, com
autonomia didática e administrativa, tendo na qualidade de Reitor, o presidente do
Conselho Superior de Ensino, Ramiz Galvão, que exerceu cumulativamente os cargos até 1925 (Fávero, 2000, v.1, p.28).
A propósito, a inauguração da primeira
universidade brasileira deu-se às pressas,
por um motivo no mínimo bizarro: prestar homenagem ao rei Alberto da Bélgica,
em visita ao país, conferindo-lhe o título
de doutor honoris causa. (Trindade,
2000, p.28; Galvão, 1999)
A primeira universidade brasileira é o resultado da aglutinação de escolas independentes, com características
próprias, sem qualquer integração entre
elas (Favéro, 1999, p.17). Apesar de
sua existência ser apenas nominal, teve o
mérito de desencadear o processo de discussão “a respeito da estrutura e do papel
da universidade em relação à sociedade”.
(Silveira, 1987, p.20)
Em 16 de outubro de 1924, foi fundada a
Associação Brasileira de Educação (ABE),
que desempenhou papel renovador no
terreno da educação, com a proposta de
formar uma consciência acerca dos problemas educacionais brasileiros, apontando
soluções. Conferências, debates e cursos
de alta cultura e especialização eram promovidos por professores de renome, empunhando ainda a bandeira em prol da universidade, graças à qual formou-se entre
os educadores brasileiros uma acepção de
universidade que serviu, de um lado, para
unificá-los, e, de outro, para assegurar que
essa idéia se mantivesse e acabasse vingando no decênio subseqüente, em que pese o
desinteresse oficial”. (Paim, 1982, p.39)
Revista Integralização Universitária
4 A era Vargas e o ensino superior
A Revolução de 303, resultante do
descontentamento de forças heterogêneas
com a situação vigente no país, faz o Governo Provisório sob a égide de Getúlio
Vargas, desenvolver “mecanismos de cooptação” nos setores político, econômico
e educacional. Nas palavras de Vargas,
a revolução não fora obra de um partido,
mas sim um movimento geral de opinião;
não possuía para guiar-lhe, a ação reconstituidora, princípios orientadores nem
postulados ideológicos definidos e propagados. Dela participaram e surgiram várias
correntes de difícil aglutinação. (Vargas
apud Fávero, 1980, p.114)
Um exemplo claro desse “mecanismo de cooptação”, que visava garantir as
relações de compromisso com setores e
interesses diversos, foi a autorização de
Vargas ao Prefeito da Capital Pedro Ernesto, para assinar o decreto de criação da
Universidade do Distrito Federal (UDF)
em 1935, passando por cima do Ministro
Gustavo Capanema, que a ela se opunha
por razões mais político-ideológicas, do
que legais (Fávero, 1980, p.115). Essas
razões prendiam-se ao caráter inovador e
socializador do programa de instrução pública que o Secretário de Instrução Pública
da Capital, Anísio Teixeira4 vinha implementando no Rio de Janeiro, acusado de
defender “idéias comunistas”. A designação por Pedro Ernesto, para Teixeira tratar
do projeto de criação da UDF, encontrou
forte rejeição por parte do segmento conservador da sociedade, especialmente dos
cat ólicos, liderados por Alceu Amoroso
Lima, que viam em Anísio Teixeira, uma
ameaça aos verdadeiros ideais de uma sociedade sadia. Em carta ao Ministro Gustavo Capanema, Alceu Amoroso Lima,
defendendo “a estabilidade das instituições e a paz social”, argumenta que o governo devia “organizar a educação e entregar os postos de responsabilidade nesse
setor importantíssimo a homens de toda
a confiança moral e capacidade técnica, e
não a socialistas como o diretor do Depar-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Para
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Romanelli, o que
se convencionou chamar de “Revolução de
30” foi o ponto alto de
uma série de revoluções
e movimentos armados
que, desde 1920, se empenharam em promover vários rompimentos
políticos e econômicos
com a velha ordem social oligárquica. (Romanelli, 1996, p.47)
3
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Anísio Spíndola Teixeira (1900/1971), nasceu na Bahia. Formou-se
em Direito e em 1924,
foi convidado para ser
Secretário Estadual de
Educação e Saúde da
BA. Em 1931, assumiu
no DF a Diretoria de Instrução Pública. Ajudou a
criar a UnB junto com
Darcy Ribeiro. Ribeiro
foi seu primeiro Reitor,
mas logo passou o cargo
para Teixeira, afastado
pelo golpe militar de 64.
Publicou centenas de livros, artigos e trabalhos
científicos, entre eles,
Educação e Universidade, Educação é um Direito, Educação para a
Democracia, Educação
não é privilégio, Educação no Brasil, Educação no mundo moderno.
(Martino, 2000, p.
32)
4
18
tamento Municipal de Educação”. Mais
adiante, Alceu Amoroso Lima, indignado
com as realizações de Anísio Teixeira, em
especial a UDF, expõe que
A recente fundação de uma universidade
municipal, com a nomeação de certos diretores de faculdade que não escondem suas
idéias e pregação comunistas, foi a gota
d’água que fez transbordar a grande inquietação dos católicos. Para onde iremos
por esse caminho? Consentirá o governo
em que à sua revelia mas sob sua proteção,
se prepare uma geração inteiramente informada dos sentimentos mais contrários
à verdadeira tradição do Brasil e aos verdadeiros ideais de uma sociedade sadia?
(Fávero, 1996, p.70)
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Getúlio Vargas foi chefe
do governo provisório de
1930 a 1934, presidente
constitucionalmente
eleito de 1934 a 1937 e
ditador de 1937 a 1945.
(Cunha, 1983, p.49)
5
Etimologicamente,
oligarquia
significa
“governo de poucos”.
Ao referir-se à estrutura
oligárquica, a autora faz
menção a composição
social
do
Estado
brasileiro da época, com
“uma elite do minante
saída do patriarcalismo
rural, com mentalidade
arcaica, em relação à
educação, mas altamente
requintada, em relação
aos padrões de consumo”.
(Romanelli, 1996, p.
56)
6
O sentimento de repúdio dos conservadores ao projeto de integração de educação pública, mais a perseguição política
de que era vítima o prefeito Pedro Ernesto
resultaram na exoneração de Anísio Teixeira, em dezembro de 1935, sobrevivendo a UDF, entretanto, até 1939, quando
foi extinta e seus cursos transferidos para
a Universidade do Brasil, pelo Decreto n°
1.063, de 20 de janeiro do mesmo ano.
Para Fávero, a criação da Universidade
do Distrito Federal foi um grande marco
na educação brasileira, deixando vivas até
hoje “as marcas do seu espírito inovador”
(Fávero, 1996, p.69). Nas palavras de
Fávero,
Ao ser instalada, a Universidade do Distrito Federal surge como um divisor de
águas, em meio à agitação que marca o
País naquele momento e às disputas pelo
controle dos rumos da educação nacional.
Sua instalação é aclamada por segmentos
importantes da intelectualidade brasileira,
que vêem finalmente surgir na capital da
República uma instituição universitária,
“preocupada em não apenas difundir conhecimentos, preparar práticos ou profissionais de artes e ofício”, mas empenhada
em “manter uma atmosfera de saber pelo
saber para se preparar o homem que o serve
e o desenvolve”; preocupada em “conservar o saber vivo e não morto” e formular
intelectualmente a experiência humana
sempre renovada, para que a mesma se
torne consciente e progressista. (Fávero, 2000, v.1, p. 49)
Com a deposição do presidente
Washington Luís em 1930 por um
movimento armado iniciado no sul,
Getúlio Vargas5 assumiu provisoriamente
a presidência em 3 de novembro de
1930, na qualidade de chefe vitorioso da
revolução que derrubou a República Velha
(1889-1930).
Apesar do autoritarismo do Governo Provisório, diversas iniciativas em
matéria de educação superior fizeram-se
sentir, visando atender às pressões das camadas sociais que o capitalismo industrial
fez emergir, pois
Se antes, na estrutura oligárquica6, as necessidades de instrução não eram sentidas,
nem pela população, nem pelos poderes
constituídos (pelo menos em termos de
propósitos reais), a nova situação implantada na década de 30 veio modificar profundamente o quadro das aspirações sociais, em matéria de educação, e, em função
disso, a ação do próprio Estado. (Romanelli, 1996, p.59)
A Revolução Constitucionalista
de 1932 contribuiu para conscientização
pelas elites paulistas da falta de quadros
políticos com formação científica na sociedade, trazendo como conseqüência a
implementação da Escola Livre de Sociologia e Política em 1933 e, no ano seguinte, a Universidade de São Paulo. (Fávero, 2000, v.1, p.48)
A Escola Livre de Sociologia e
Política veio precedida de um manifesto
assinado por professores e profissionais
liberais no qual, de modo apaixonado,
é lembrado o malogro da “guerra civil
desencadeada em nosso Estado” e a falta percebida de uma “elite harmoniosa”,
que inspire confiança ao povo e o guie
“na luta para refazer-se dos efeitos dessa
guerra e das aflições que a antecederam”,
ensinando-lhe “passos firmes e seguros”.
O manifesto anunciava o preenchimento
dessa lacuna com a criação da Escola Livre de Sociologia e Política, que “oferecerá aos estudiosos um campo de cultura
e de preparo indispensável para eficiente
atuação na vida social”. (Fávero, 1980,
Anexo 3)
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
19
A Universidade de São Paulo (USP)
propunha-se a ser “um centro de renovação e de formação de elites culturais e
políticas”. No projeto de criação da USP,
além de incorporadas a Faculdade de Direito, a Escola Politécnica, a Escola Superior de Agronomia, o Instituto de Educação (elevado a categoria de escola superior), a Faculdade de Medicina e a Escola
de Veterinária já existente, foram criadas
a Escola de Belas Artes, o Instituto de Ciência Econômicas e Sociais e a Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras, constituindo-se esta última, na alma mater da USP,
oferecendo “todas as disciplinas em que
se subdividem as diferentes áreas do saber
humano”. Para essa idéia se tornar exeqüível, seus fundadores recorreram aos países europeus, em busca de especialistas.
Logo no primeiro ano, foram contratados
treze professores estrangeiros: seis franceses, quatro italianos e três alemães. A
ousadia da organização proposta encontrou resistência dentro do próprio Conselho Universitário, contribuindo para que a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,
após 1938, se voltasse para a formação de
professores de ensino secundário, como
as demais escolas existentes no país. (Fávero, 1980, p. 63-4; Cunha, 2000, p.
167-8)
O fim da primeira guerra mundial
despertou uma nova consciência de valores na população em geral, que ansiava por reformas educacionais que colocassem o Brasil na corrente de idéias de
democratização e socialização do ensino.
No Diário Oficial de 15 de abril de 1931,
foi publicada a etapa da Reforma Francisco Campos7 relativa ao ensino superior,
consubstanciada no Decreto nº 19.851 de
11 de abril do mesmo ano. Para Campos,
a Universidade tinha por objetivos “equiparar tecnicamente as elites profissionais
do país e de proporcionar ambiente propício às vocações especulativas e desinteressadas, cujo destino, imprescindível à
formação da cultura nacional, é o da investigação e da ciência pura” (Campos,
1980, p.129).
Revista Integralização Universitária
Segundo Campos, o projeto representava “um estado de equilíbrio entre
tendências opostas, de todas consubstanciando os elementos de possível assimilação pelo meio nacional, de maneira a não
determinar uma brusca ruptura com o presente”, preferindo a “orientação prudente
e segura da autonomia relativa”. A esse
respeito Campos, argumenta que
Autonomia requer prática, experiência e
critérios seguros de orientação. Ora, o regime universitário ainda se encontra entre nós na sua fase nascente, tentando os
primeiros passos e fazendo os ensaios de
adaptação. Seria de mau conselho que,
nesse período inicial e ainda embrionário
e rudimentar da organização universitária,
se tentasse, com risco de graves danos para
o ensino, o regime de autonomia integral
(...) com a experiência poderá o quadro
da autonomia ir se alargando de maneira
gradual e progressiva até que, finalmente,
com o desenvolvimento da capacidade e da
envergadura do espírito universitário, este
venha a reunir sob a sua autoridade todos
os poderes de governo do grande agrupamento administrativo, técnico e didático
que constitui a Universidade. (Campos,
1980, p.131)
Para Nosella (1998, p.173) a política populista que marcou a década de 30
fez “uma conciliação conservadora entre
as pobres escolas do faz-de-conta e as que
adotam modelos pedagógicos arrojados,
entre as instituições universitárias de beira
de estrada e universidades de excelência”.
Para Luiz Antônio Cunha, o Estatuto das
Universidades Brasileiras sancionado em
11 de abril de 1931 (Decreto n° 19.851),
constrangeu as universidades públicas,
compelindo-as a manterem suas estruturas, a fim de se enquadrarem em padrões
gerais determinados pelo governo federal; em parte devido à força dos interesses
políticos e burocráticos e em parte, pelo
“medo à liberdade”. (Cunha, 1999,
p.90)
Em julho de 1934, o governo constitucional de Vargas (1934-1937) separou a
Escola Politécnica e a Escola de Minas da
Universidade do Rio de Janeiro, agregan-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Primeiro
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Ministro do
Ministério da Educação
e Saúde, criado pelo
governo provisório que
se seguiu à desti tuição
de Washington Luiz. Foi
convidado por Getúlio
Vargas e empossado
em
18/11/1930.
(Silveira, 1984, p.65)
7
20
A Universidade do
Rio de Janeiro passou a
chamar-se Universidade
do Brasil em 1937,
o que perdurou até
1965, quando a Lei n°
4.759, decretou que
“As
Universidades
Federais sediadas nas
capitais dos estados
terão a denominação
do respectivo Estado”.
Assim, a Universidade do
Brasil passou a chamarse Universidade Federal
da Guanabara, o que
não ocorreu na prática.
Em 05 de novembro de
1965, a Lei n° 4.831,
decretou por fim, que
“A Universidade Federal
situada na cidade do Rio
de Janeiro passaria a
chamar-se Universidade
Federal do Rio de
Janeiro”.
(Fávero,
2000 v.2, p.221, 223,
227)
8
Com o estabelecimento
do
Estado
Novo
em 1937, as lutas
ideológicas em torno dos
problemas educacionais
entraram numa espécie
de
hibernação.
A
educação,
que
na
Constituição de 1934
era um dever do Estado,
na Constituição de 1937
passou a ser uma ação
meramente
supletiva.
Thomas Skimore via a
implantação do Estado
Novo como uma versão
brasileira do modelo
fascista
europeu.
(Romanelli, 1996, p.
51; p.153)
9
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Departamento Administrativo de Serviço
Público.
10
do a estas a Escola Nacional de Química,
mais oito institutos de pesquisa e criou
a Universidade Técnica Federal, através
do Decreto n° 24.738. A nova instituição
é conseqüência da preocupação técnicoprofissional que permeava o Parlamento,
tendo, porém vida curta: a Lei n° 452 de
05 de julho de 1937, que organizava a
Universidade do Brasil8, como passou a
chamar-se a Universidade do Rio de Janeiro, definiu que esta seria integrada, entre outras, pela Escola Politécnica, Escola
de Minas, Escola Nacional de Química,
então existentes. (Paim, 1982, p.66; Fávero, 2000, v.2, p.170)
A abertura suscitada pela Revolução de 1930 passou a ser vista a partir
de 1935, como “um erro a ser corrigido”,
o que abriu as portas para a implantação
do Estado Novo (Fávero, 1999, p.22).
Cabe lembrar que mesmo antes da decretação do Estado Novo, há evidências do
quanto o “Estado distinguia na escola,
um lugar capaz de formar os que os que a
freqüentavam, segundo a conveniência de
seus interesses e das classes que os representavam”. (Fávero, 1999, p.25)
Os anos de 19379 a 1945 foram
marcados pelo total esquecimento da autonomia universitária: em nome do princípio da autoridade e da disciplina, o poder
central chama a si, o controle sobre a vida
das instituições universitárias, tornandoas vítimas da organização monolítica do
Estado, ao qual é reservado o direito de
designar em comissão, os dirigentes universitários. (Fávero, 1999, p.26)
5 O ensino superior no Brasil pósestado novo
Em 17 de dezembro de 1945, durante o governo provisório que se seguiu
à queda do Estado Novo, foi sancionado o
Decreto-Lei nº 8.393, que dispunha sobre
a autonomia administrativa, financeira,
didática e disciplinar no ensino superior.
Autonomia esta não implementada, pois
independente das relações entre a universidade e os órgãos do governo, esbarrou
em lutas internas, dentro das Congregações, que criticavam as relações de poder na universidade, que se expressavam
desigualmente de cima para baixo. Para
Raul Bittencourt, catedrático da Universidade do Brasil (UB), que vivenciou esse
momento, a autonomia decretada, não
mudou o estado das coisas, sofrendo a
interferência do DASP10 “dia a mais dia,
na vida das universidades federais, com
aspereza e inciência”. (Bittencourt
apud Fávero, 1999, p.27)
A criação do Instituto Tecnológico
da Aeronáutica (ITA) em 1947 no Rio de
Janeiro e alocado definitivamente em São
José dos Campos (SP) em 1950 foi um
diferencial no ensino superior brasileiro.
Influenciado diretamente pelos padrões
americanos de organização universitária,
trazia inovações, tais como: ausência de
cátedras vitalícias, carreira do magistério,
organização departamental, residência de
professores e alunos no campo, flexibilidade curricular e estímulo à pesquisa,
principalmente nos cursos de pós-graduação. (Cunha, 1983, p.155; Cunha,
2000, p.173)
Em 28 de outubro de 1948, foi
encaminhado pelo ministro Clemente
Mariani ao Presidente da República Eurico Gaspar Dutra, um Projeto de Lei que
garantia, entre outros, o direito de todos à
educação. Discussões e controvérsias em
torno da liberdade e democratização do
ensino, autonomia administrativa e descentralização, colocaram em jogo interesses diversos, que prenderam o Projeto
durante treze anos no Congresso Nacional, o que dá mostras dos interesses em
jogo e, em especial, do temor dos “privatistas” com os possíveis desdobramentos
da legislação sobre as diretrizes e bases
da educação, sinalizados pela Constituição de 1946. A respeito do embate entre
os defensores da escola pública versus
escola privada, que marcou intensamente
toda a década de 50, Cunha ressalta que
os dirigentes das escolas particulares re-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
21
cusavam ao Estado o papel de principal
provedor das oportunidades escolares:
Defendiam o direito das famílias de escolherem a educação que desejassem dar aos
filhos e, em função disso, o Estado deveria
se restringir ao papel de assegurar meios às
escolas e às famílias de modo que pudessem se encontrar oferta e demanda num
mercado livre de interferências monopolistas e perturbadoras, admitindo a existência de estabelecimentos de ensino oficiais
apenas quando e onde a iniciativa privada
não fosse suficiente ou, então, para setores
muito especializados e de interesse exclusivo, como o de formação de pessoal militar. Para garantir igualdade de condições
entre escolas governamentais e particulares, os representantes destas deveriam ter
representação “adequada” nos conselhos
de ensino, assim como deveria haver distribuição dos recursos financeiros públicos
proporcionalmente ao número de alunos
matriculados nas escolas. (Cunha, 1983,
p.117)
Pinto lembra, que o foco era a escola
secundária que crescera mais do que
qualquer outra, devido ao seu prestígio de
caminho para o ensino superior, já que este
se constituía (...) um sistema de recrutamento do mandarinato brasileiro.
Com a urbanização, a industrialização e o fortalecimento da classe média
no país, o ensino secundário, até então
reservado aos filhos das classes economicamente privilegiadas, tornou-se alvo das
classes emergentes, para as quais era reservado o ensino profissionalizante. Sob
pressão popular, o governo começou a
criar escolas oficias, reduzindo o total de
matrículas nas escolas particulares, que
caiu de 78% em 1950, para 66% em 1959.
Segundo Pinto,
Este fato explica, em parte, a grande luta
que se travou contra a escola pública e em
favor da escola particular, na época da tramitação do projeto da Lei de Diretrizes e
Bases luta esta que se disfarçou sob a bandeira de oposição ao monopólio do Estado
e a favor da liberdade de ensino, defesa
do direito da família e outras coisas mais.
(Pinto, 1984, p.96)
Revista Integralização Universitária
Finalmente, em 20 de dezembro de
1961, foi sancionada a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional. Apesar das
substanciais modificações com relação ao
projeto original, no dizer de Anísio Teixeira, resultou em “uma meia vitória, mas
sempre uma vitória”. (Silveira, 1984,
p.68)
Há que se ressaltar o fato de que,
não obstante a polêmica ter saído do Congresso Nacional para os jornais, ela não
teve repercussão nas classes populares.
Para Romanelli,
Foi uma oportunidade com que contou a
sociedade brasileira para organizar seu
sistema de ensino, pelo menos em seu
aspecto formal, de acordo com o que reivindicava o momento, em termos de desenvolvimento. Foi a oportunidade que a
nação perdeu de criar um modelo de sistema educacional que pudesse inserir-se no
sistema geral de produção do país, em consonância com os progressos sociais já alcançados. Ocorreu, porém, que as heranças
não só cultural, como também a das formas
de atuação política foram suficientemente
fortes para impedir que se criasse o sistema
que carecíamos. O horizonte cultural do
nosso homem médio, sobretudo do nosso
político, ainda limitava muito a sua compreensão da educação, como um fator de
desenvolvimento e como requisito básico
para a vigência do regime democrático.
(Romanelli, 1997, p.183)
O espírito conciliador do texto final
da Lei nº 4024/61 é duramente criticado
por Leite, Morosini e Martini, para quem
Utilizando argumentos formalmente corretos e universais tais como “liberdade de
ensino” e “direito de ensinar”, os legisladores os associaram a contextos materiais
injustos, como o foram subvenções públicas a escolas privadas e igualdade de representação dos administradores do ensino
privado nos Conselhos Federal e Estadual
de Educação. Tudo isso foi feito porque
o instrumento legal, com texto equívoco,
foi colocado a serviço de interesses particularizantes. Os setores conservadores e a
burguesia liberal antidemocrática uniramse para consagrar por meio da lei algo que,
não sendo democrático, não era bom para
todos. (Leite, Morosini e Martini,
1991, p.207)
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
22
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Em 1947, o ITA iniciou o movimento de
modernização do ensino
superior no Brasil. Seu
modelo era visto como o
caminho necessário para
que o país adquirisse a
maioridade científica e
tecnológica, indispensável para viabilizar o
rompimento dos laços da
dependência externa. O
movimento de modernização alcançou seu ápice
na criação da Universidade de Brasília, uma
fundação de direito público definida pela Lei nº
3.998, de 15 de dezembro de 1991. (Cunha,
1983, p.171; Cunha,
2000, p.173)
11
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O ensino superior no
Brasil sempre foi pago
pelos estudantes, desde o
início do século XIX. A
Constituição de 1946 dizia ser o ensino superior
oficial (como o médio)
gratuito, “para os que
provarem falta ou insuficiência de recursos”.
(Cunha, 1983, p.89)
12
“Oligarquia não designa tanto esta ou aquela
instituição, não indica
uma forma específica de
governo, mas se limita
a chamar a nossa atenção para o fato puro e
simples de que o poder
supremo está nas mãos
de um restrito grupo de
pessoas propensamente
fechado, ligados entre si
por vínculos de sangue,
de interesse ou outros, e
que gozam de privilégios
particulares, servindo-se
de todos os meios que o
poder pôs a seu alcance
para os conservar”.
(Bobbio, Matteuci
e Pasquino, 1991, p.
835).
13
Se, por um lado, a LDB representou
um freio no processo de modernização11 do
ensino superior através de medidas como
a manutenção da cátedra vitalícia e da
formação de universidades pela agregação
de escolas isoladas; por outro lado,
contribuiu diretamente para significativos
avanços como o aumento da autonomia
das instituições e atribuição de poderes
para dirigir o processo de transformação
do ensino superior ao Conselho Federal
de Educação (CFE) (Cunha, 1983, p.
257).
Um fato que marcou os anos 50 foi
a “federalização” de estabelecimentos
de ensino superior estaduais, municipais
e particulares, “por força da deteriorização dos orçamentos, das reivindicações
estudantis pelo ensino gratuito12 e das
demandas de professores e funcionários
pelos privilégios do funcionalismo público federal”. Surgiu então a lei n° 1.254
de dezembro de 1950, fazendo crescer a
participação da União no financiamento das instituições de ensino superior. A
Lei n° 1.523 de dezembro de 1951, que
alocava recursos para as instituições de
ensino “federalizadas”, apresentou uma
lista de trinta e nove beneficiadas, entre
universidades e escolas isoladas. As “federalizações” sofreram um freio em 1962,
quando o Conselho Federal de Educação
(CFE), no uso das atribuições que a LDB
lhe conferia,
opôs forte resistência a esse expediente.
Justificando essa posição pela falta de recursos, sucessivos pareceres do CFE defendiam a prioridade de expansão de vagas das escolas superiores oficiais sobre a
“federalização” de escolas particulares, as
principais candidatas a essa mudança de
“status” jurídico-financeiro. Além do mais,
a jurisprudência firmada pelo conselho dizia que nenhuma nova “federalização” de
escola superior deveria ocorrer enquanto
as despesas do governo federal com esse
grau de ensino permanecessem acima das
dotações orçamentárias. (Cunha, 1983,
p.92)
Como no Plano de Educação entregue ao Ministro da Educação em setem-
bro de 1962, o CFE recomendava a não
criação de novas escolas ou universidades
federais, diante da insuficiência de recursos previstos para o Fundo Nacional do
Ensino Superior, incapazes até mesmo de
manter o sistema funcionando, a festa da
“federalização” acabou. (Cunha, 1983,
p.93)
A transferência da capital para
Brasília em 1960, uma capital cujo projeto urbanístico “negava a segregação urbana encontrada em todas as cidades brasileiras, procurando promover uma utópica
integração de classes”, repercutiu no plano para a criação de uma universidade no
Distrito federal, que negasse “a estrutura e
o funcionamento do ensino superior existente, almejando realizar uma utopia universitária”. O modelo fundacional instituído buscava desvencilhar-se das “amarras
do serviço público federal sem perder a
característica de uma entidade pública”.
A Universidade de Brasília (UnB) tinha
por missão “formar cidadãos empenhados
na busca de soluções democráticas para
os problemas com que se defronta o povo
brasileiro na luta por seu desenvolvimento econômico e social”. (Cunha, 1983,
p.171; Cunha, 2000, p.175).
6 O ensino superior no Brasil durante o
regime militar
Nos anos 50 e início dos anos 60, na
sociedade brasileira despontaram movimentos em prol de uma menor submissão
ao grande capital transnacional e às oligarquias13, abruptamente interrompidos
pelo golpe militar de 1964, cuja escalada
repressiva atingiu duramente a educação:
universidades foram objeto de intervenção militar, professores e estudantes foram presos, reitores pro tempore foram
nomeados em diversas instituições, entre outras arbitrariedades. (Germano,
1993, p.106).
O período que se seguiu ao golpe de
1964 assistiu a uma expansão do ensino
superior no país, notadamente no âmbito
privado, favorecido que foi pela política
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
23
de contenção de verbas e pela crescente
necessidade de expansão de vagas, propiciando “a emergência de um novo perfil
privado de ensino nitidamente empresarial” (Dourado, 2000, p.287). Para
Dourado,
tal política privatista apresenta-se, certamente, como uma opção adotada pelo
regime político implantado em 1964 que,
apoiado na ideologia do desenvolvimento
e segurança nacional, refletia as lutas desencadeadas até então pela sociedade civil
organizada, com destaque para os setores
médios que vislumbravam a escolarização
superior como mecanismo de ascensão social. (Dourado, 2001, p.15)
A expansão do ensino superior
privado atingiu o seu ápice, durante o
“milagre econômico” (1967/73), quando
os governantes necessitavam cooptar a
classe média brasileira em torno do projeto segurança - desenvolvimento - industrialização. Assim,
o apoio das camadas médias acoplava-se
aos anseios da ascensão social via ensino
superior, concretizado na esfera privatista, de baixo custo para o Estado e para
a própria iniciativa privada, uma vez que
o funcionamento de cursos superiores, via
de regra na área humana, não exigia maiores investimentos. (Leite, Morosini e
Martini, 1991, p.212)
Contraditoriamente, a mesma prática política autoritária, centralizadora e
excludente, tanto política quanto social da
maioria dos segmentos da sociedade, mantinha-a integrada no processo de modernização e de industrialização, com o apelo
desenvolvimentista, sob a influência da
teoria do capital humano14, que partia da
suposição de que o indivíduo na produção
era uma combinação de trabalho físico e
educação ou treinamento, sendo denominado de investimento humano, o fluxo de
despesas que o próprio indivíduo devia
efetuar em educação para aumentar a sua
produtividade (Oliveira, 2000, p.223).
A disseminação desta teoria nos países do
terceiro mundo foi promovida pelos organismos internacionais (BID, BIRD, OIT,
Revista Integralização Universitária
UNESCO, FMI, USAID, UNICEF)15 e regionais (CEPAL, CINTERFOR)16. Mário
Henrique Simonsen17, “pregava ao mundo
que o Brasil tinha encontrado seu caminho
para o desenvolvimento e eliminação das
desigualdades, não pelo incentivo ao conflito de classes, mas pela equalização do
acesso à escola e pelo alto investimento
em educação”. (Frigotto, 1999, p.42)
Em 1968, o Estado promoveu a
reforma universitária, numa tentativa de
suplantar a situação cada vez mais crítica em que se encontrava a universidade,
que ameaçava romper a unidade da instituição e minar sua legitimação. Fissuras internas, originadas pelo confronto
de posições entre docentes e discentes
agravavam a crise, tendo como fato culminante, a reivindicação pelos estudantes
por maior participação na estrutura de poder da universidade. Outro fator decisivo
para a reforma universitária foi a postura
denunciadora da exploração capitalista,
adotada por alguns docentes, em especial
aqueles ligados às faculdades de filosofia, na crença de que assim promoviam o
desvendamento da alienação da sociedade
brasileira e da universidade nela inserida.
(Cunha, 1983, p.259)
Um grupo de trabalho18 instituído
por decreto do presidente Arthur da Costa
e Silva em 02 de julho de 1968, foi encarregado de traçar as diretrizes da reforma
universitária, visando transformar a universidade em uma instituição eficiente,
moderna, administrativamente flexível e
produtiva, além de conciliar os objetivos
práticos e imediatos do ensino de massa
com a sua missão constitutiva como “centro criador da ciência e expressão mais
alta da cultura de um povo” (Silveira,
1984, p.73). Na verdade, a Reforma Universitária foi colocada na pauta do dia para
recuperar o controle sobre os movimentos
estudantis universitários, cuja bandeira
principal de mobilização era a reforma,
ou seja, a ótica do governo era “façamos
a reforma antes que outros a façam”. (Saviani, 2000, p.22)
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
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A “teoria do capital
humano” foi desenvolvida por um grupo de
estudos coordenados por
Theodor Schultz, nos
EUA, valendo-lhe o prêmio Nobel de Economia
em 1968. A idéia-chave
é de que um acréscimo
marginal de instrução,
treinamento e educação correspondam a um
acréscimo marginal de
capacidade de produção. (Frigotto, 1999,
p.41)
14
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BID: Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD: Banco Internacional de Reconstrução e
Desenvolvimento
OIT: Organização Internacional do Trabalho
UNESCO: Organização
das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e
a Cultura
FMI: Fundo Monetário
Internacional
USAID: United States
Aid International Development
UNICEF: Fundo das
Nações Unidas para a
Infância
15
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CEPAL: Comissão
Econômica das Nações
Unidas para América
Latina e Caribe
CINTERFOR: Centro
Interamericano de Pesquisa e Documentação
sobre Formação Profissional
16
Ministro
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da Fazenda no
regime militar. Professor
de Economia na Fundação Getúlio Vargas
17
O
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grupo de trabalho
teve 30 dias de prazo
para apresentar seus estudos e era constituído
por Newton Sucupira,
Valnir Chagas, Pe. Fernando Ávila, João Lira
Filho, Reis Velloso, Fernando do Val, Antônio
Couceiro, Roque S. de
Barros.. Posteriormente
contou com a participação do deputado Leon
Peres. Os estudantes
indicados para formar o
grupo, João Carlos Moreira e Paulo Bouças,
recusaram-se a participar. (Baldino, 1991,
p.104)
18
24
Na
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linguagem oficial,
dentre os “inimigos”
da nova ordem estão a
autonomia acadêmica,
a liberdade de cátedra,
os indivíduos ideologicamente adversos e os
estudantes militantes ou
com capacidade para
liderar grupos em confronto com o sistema.
(Rama, 1996, p.74)
19
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Sistema de organização do trabalho desenvolvido pelo engenheiro
norte-americano Frederick Taylor (1856-1915),
baseado na separação
das funções de concepção e planejamento das
funções de execução, na
fragmentação e na especialização das tarefas,
no controle de tempos e
movimentos e na remuneração por desempenho. (Cattani, 2000,
p.247)
20
Espaço
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contínuo, delimitado e exclusivo, onde
se reúnem os edifícios
de uma universidade,
podendo estar situado
dentro da cidade, na sua
periferia ou fora dela.
(Cunha, 2000, p.141)
21
Assim, em 28 de novembro de
1968, foi sancionada a lei n° 5.540/68, de
tendência tecnicista, enfatizando a quantidade em lugar da qualidade, os métodos
(técnicas) em detrimento dos fins (ideais),
a adaptação em oposição à autonomia e
priorizando a formação profissional no
lugar da cultura geral (Saviani, 2000,
p.32). A educação então “adquire o caráter
de agência de controle social de novos valores” com reformulações que restringiam
os campos do conhecimento considerados
ideológicos, tais como a sociologia e a
filosofia. Por conseguinte, a “definição
das idéias e valores admitidos na educação depende de que linha de separação
demarcará o âmbito nacional e antinacional”, linha esta imprecisa e que, a bem da
consolidação do projeto de reconstrução
nacional, requeria a eliminação dos “inimigos” 19 da nova ordem e controle de
todas as expressões de cultura. (Rama,
1996, p.74-5)
Referindo-se à reforma universitária, Cunha (1999, p.92) denuncia sua
concepção taylorista20 , expressa em duas
diretrizes principais:
1.“Na eliminação da duplicação de meios
para fins idênticos ou equivalentes”,
onde a adoção do regime de matrícula por disciplina (sistema de crédito), o
agrupamento dos professores de disciplinas afins em departamentos e a divisão dos cursos de graduação entre o ciclo básico e o profissional, compôs uma
tríade para a minimização dos custos,
com o uso racional dos recursos humanos e materiais.
2. “Na separação entre as atividades de
concepção e de execução”, isto é, aos
educadores era reservado o cumprimento das diretrizes e decisões tomadas pelo grupo militar- tecnoburocrático que havia assumido o poder.
Cabe destacar que entre os princípios da lei da reforma universitária (Lei
n° 5.540/68), encontra-se o da flexibilidade, no qual se procurava garantir a variedade de currículos, a utilização de meto-
dologias apropriadas a cada tipo e nível
de ensino, o aproveitamento dos estudos
realizados, a combinação do binômio
continuidade (formação geral) e terminalidade (formação especial) e a possibilidade de adoção do regime de matrícula
por disciplina no ensino do segundo grau.
(Saviani, 2000, p.27)
O princípio da flexibilidade, aparentemente incompatível com o regime
militar vigente, constituiu-se em um importante instrumento para preservação do
arbítrio no âmbito educacional, já que, na
ausência de definições legais mais precisas que limitassem suas ações, os programas educacionais que interessavam as
autoridades governamentais eram impostos à nação, com a vantagem de facilitar a
busca de adesão e apoio daqueles mesmos
sobre os quais eram impostos os referidos
programas. (Saviani, 2000, p.27)
De positivo no ensino superior dos
anos 60, podemos destacar a institucionalização da profissão docente mediante
ao regime de tempo integral e de dedicação exclusiva e o incremento das pesquisas, como conseqüência do aumento
de recursos destinados à pós-graduação.
(Cunha, 2000, p.179)
As mudanças também se estenderam ao espaço geográfico, com a construção dos campi21 nos arredores dos grandes
centros, o que reforçou a argumentação
contra a gratuidade do ensino superior,
dentro da lógica de que aqueles que podem
se deslocar representam uma clientela de
nível de renda elevado, que não precisam
trabalhar para manterem-se. Nas universidades privadas, que ocupavam as áreas
urbanas, estariam os estudantes que precisam dividir seu tempo entre o trabalho e o
estudo, ou seja, aqueles de mais baixo nível de renda. Cunha, referindo-se à hegemonia que o modelo dos campi alcançou,
atribui esta ao contexto político repressor
imposto pelo regime militar, quando o ato
institucional nº 5 e o decreto lei n° 477/69
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
25
“ameaçavam com a perda ou a limitação
de emprego futuro os professores, e com
a expulsão os estudantes que fossem acusados e julgados, em rito sumário, por
práticas de atividades consideradas subversivas”. Cunha acredita que, fosse outro
o contexto político, o argumento de que
a questão espacial era fundamental para
que os objetivos econômicos da reforma
universitária fossem alcançados, seria
amplamente questionado, diante dos custos decorrentes da transferência para um
campus suburbano ou extra-urbano, além
da caríssima manutenção das mega edificações e das áreas do entorno. (Cunha,
2000, p.141-3)
Marilena Chauí recorda, que nos
movimentos sociais, civis, estudantis,
guerrilheiros da América Latina e libertários do leste europeu em 68, “o ponto
de partida, se não foi a universidade como
instituição, foi a universidade como irradiadora de conhecimentos e de práticas
novas”, ressaltando ser esta a face luminosa da vocação política da universidade.
Entretanto, o movimento de 68, desvelou
sua face sombria, quando colocou “a realização da vocação política através da vocação científica”, com o incremento das
pesquisas nucleares, genéticas e o suprimento científico para o poder armamentista. Para Chauí,
essa face sombria, na verdade, não depende de boa ou má vontade da universidade, nem da boa ou má consciência dos
universitários, mas do modo de inserção da
universidade no social, isto é, do seu papel
de reprodutora dos sistemas econômicos e
políticos, através dos intelectuais orgânicos
da classe dominante que somos nós, queiramos ou não, para usarmos a expressão
gramsciana. (Chauí, 2001, p.18)
Quanto à articulação das duas
vocações (política e científica) da
universidade, Chauí defende que
quando feita a partir dela mesma e por iniciativa dela, tende a nos oferecer a face
Revista Integralização Universitária
luminosa das duas vocações, pois a universidade assume explícita e publicamente tal
articulação como algo que a define internamente. A articulação das duas vocações
da universidade, quando feita a partir do
prisma da reprodução sócio-política e da
formação de um grupo social específico o que chamo de intelectuais orgânicos da
classe dominante, tende a oferecer a face
sombria, pois a articulação é tácita, implícita e, muitas vezes, secreta e, freqüentemente, determinada pela via indireta do
modo de subvenção e financiamento das
pesquisas como se fossem “ciências puras”. (Chauí, 2001, p.118)
7 O ensino superior no Brasil dos anos
80 / 90
Uma nova ordem mundial marcou
os anos 80, centrada no desenvolvimento
da ciência e da tecnologia e na necessidade de preparar trabalhadores para atuarem
nas novas bases produtivas, subordinando
a educação em geral e o ensino superior
em particular, ao sistema produtivo. Concomitantemente, cresce a pressão popular
em favor de mais oportunidades educacionais, que passa a ser vista como um investimento, cujo retorno ideologicamente dar-se-ia por meio da ascensão social.
A pressão popular aliada aos interesses
eleitoreiros promove a implementação de
ações de provimento e/ou consolidação
de faculdades isoladas e universidades no
âmbito estadual, favorecendo também,
iniciativas de natureza pública, de caráter
privado, denominadas juridicamente de
fundações públicas municipais de ensino
superior, delegando aos municípios,
a responsabilidade pelo ensino superior
sem garantir, efetivamente, as condições
mínimas para o funcionamento do ensino básico, negligenciando, inclusive, o
cumprimento da premissa constitucional
de universalização desse nível de ensino.
(Dourado, 2001, p.57-8)
Cabe lembrar que já em 1967, o
Coronel Meira Matos, em depoimento à
Comissão Parlamentar de Inquérito sobre
o Ensino Superior, defendia a adoção de
um modelo fundacional nas universidades,
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
26
Assembléia
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Nacional
Constituinte
22
através da combinação dos dois sistemas,
o do ensino público e o da fundação, com
a participação da iniciativa privada. (Silva Jr. e Sguissardi, 2001, p.188)
Nos anos 80, reacende a interferência de agentes internacionais na agenda
educacional brasileira, destacando-se o
Banco Mundial (BM), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e
agências da Organização das Nações Unidas (ONU). Preocupado em assegurar o
pagamento da dívida externa dos países
do terceiro mundo, o BM, “guardião dos
interesses dos grandes credores internacionais” (Soares apud Dourado,
1999, p.123), volta seu olhar para a educação escolar básica, na certeza de que o
potencial produtivo da força de trabalho
reduz-se em função da falta de escolaridade da população, relacionando-a com a
eficiência econômica global. Para Dourado (1999, p.123), ao defender a realocação dos recursos públicos para a educação
básica, o Banco Mundial “busca construir
mecanismos ideológicos às políticas, sobretudo em países como o Brasil, que sequer garantiu a democratização do acesso
a esse nível de ensino e de permanência
nele”.
Paralelamente, é intensificado o
cerco à universidade pública, sendo-lhe
imputada a responsabilidade “pela precariedade da educação básica: a alegação
da carência de recursos para a melhoria
do ensino básico deve-se ao suposto alto
nível de despesas com o ensino superior”.
(Franco, 2000, p.90)
Ainda nos anos 80, foi promulgada
a Constituição Federal, em 05 de outubro
de 1988, que resguardou a gratuidade do
ensino público em todos os níveis, proclamou a indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão na educação universitária, sacramentou a autonomia universitária e, fundamentalmente, reafirmou a
educação como direito público subjetivo.
No entender de Braga, a euforia
dos dois maiores “lobbies” (os “privatistas” e os “publicistas”) que buscava in-
fluenciar os Congressistas com relação ao
texto final do capítulo sobre educação e
cultura da Constituição Federal,
significa que a ANC22 foi hábil o suficiente
para costurar um consenso feito de mútuas
concessões, cuja flexibilidade dá a expectativa a ambos os grupos de avançarem mais
alguns passos, quer na fase de regulamentação da Lei e nas Constituições Estaduais,
quer na prática interpretativa da vigência
constitucional (...) é o que estamos no momento presenciando, quando as frentes de
batalha se deslocam para as Constituintes
Estaduais e para as propostas de LDB dos
diversos grupos interessados. (Braga,
1989, p.31)
A mobilização da comunidade
educacional organizada em torno da elaboração das novas diretrizes e bases da
educação nacional foi ganhando forma,
contando com a contribuição dos embates
resultantes de inúmeras iniciativas governamentais, tais como: Programa de Avaliação da Reforma Universitária (PARU)
em 1983, Comissão Nacional para a Reformulação da Educação Superior em
1985 e o Grupo Executivo para a Reformulação da Educação Superior. (GERES)
(Dourado, 1999, p.124)
No mês de dezembro de 1988, o
deputado Octávio Elísio apresentou o
primeiro projeto de lei (n° 1.258-A/88)
fixando as diretrizes e bases da educação nacional. Até o parecer favorável da
Comissão de Constituição, Justiça e Redação em 28 de junho de 1989, o projeto
sofreu várias emendas na Comissão de
Educação, Cultura e Desporto, com base
em sugestões de caráter formal e informal
ao próprio autor (Saviani, 2000, p.195).
Para apreciação do material disponível, o
então presidente da Comissão de Educação, Cultura e Desporto, deputado Ubiratan Aguiar (PMDB – CE), constituiu um
grupo de trabalho, tendo como relator o
deputado Jorge Hage (PSDB – BA), dando
início, nas palavras do próprio relator, “o
que talvez tenha sido o mais democrático
e aberto método de elaboração de uma lei
de que se tem notícia no Congresso Na-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
27
cional”, tendo o mesmo percorrido o país,
ouvindo todos que, a seu juízo, podiam
contribuir para a formulação do projeto
– substitutivo. (Saviani, 2000, p.57)
As eleições realizadas em outubro de 1990 resultaram em um Congresso
Nacional de perfil bem mais conservador
para a legislatura que se iniciaria em 1991,
ano em que chegou ao plenário, o projeto
– substitutivo Jorge Hage da LDB. No entender de Saviani, “dir-se-ia que, de uma
concepção socialista que marcava a proposta inicial, as transformações operadas
ao longo da tramitação na Comissão de
Educação da Câmara deram ao texto aprovado o caráter de uma concepção socialdemocrata”. (Saviani, 2000, p.195)
Sob a presidência de Collor de
Mello, entra na pauta do dia a necessidade da reforma do Aparelho do Estado
visando redefini-lo “em decorrência do
processo de globalização, que teria reduzido a autonomia dos Estados na formulação e implemento de políticas” (Silva
Jr e Sguissardi, 2001, p.28). Enfrentando
muitas dificuldades para sua inclusão na
ordem do dia para que fosse apreciado, o
projeto-substitutivo recebeu 1.263 emendas, retornando às Comissões Técnicas
para exame das emendas e novo relato,
tarefa que coube à deputada Ângela Amin
(PDS-SC). Seu relatório, apreciado em
maio de 1992, incorporou várias emendas, em especial aquelas que atendiam aos
interesses dos grupos privados, dando um
caráter conservador a LDB. (Saviani,
2000, p.196)
No segundo semestre de 1992, o
impeachment por corrupção do presidente Collor ocupou todo o espaço político,
tendo o projeto da LDB retomado o andamento, somente após a posse de Itamar
Franco. Em novembro de 1992, iniciou-se
no Plenário da Câmara dos Deputados a
votação do projeto da LDB, acompanhado
dos relatórios das três Comissões, embora
não tivessem sido por elas aprovados: Comissão de Educação, Cultura e Desporto,
Comissão de Constituição, Justiça e RedaRevista Integralização Universitária
ção e Comissão de Finanças e Tributação.
Finalmente, em maio de 1993, chegou-se
à aprovação pela Câmara dos Deputados
do projeto-substitutivo da Lei de Diretrizes e Bases Nacional, seguindo o mesmo
para o Senado Federal, quando foi designado o senador Cid Sabóia (PMDB-CE)
como relator. O substitutivo apresentado
por Sabóia preservava a estrutura do projeto aprovado pela Câmara, incorporando
alguns aspectos do Projeto de LDB de
autoria de Darcy Ribeiro, que deu entrada na Comissão de Educação do Senado
em maio de 1992. O parecer de Sabóia foi
aprovado pela Comissão de Educação do
Senado em novembro de 1994 e encaminhado ao Plenário do Senado em dezembro do mesmo ano. (Saviani, 2000, p.
156)
No governo de Fernando Henrique
Cardoso, a Reforma do Estado foi intensificada. Nessa ótica o governo federal
transformou a Secretaria de Administração Federal em Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado
– MARE, sob o comando de Bresser Pereira. Para esse ministro, a reforma era
condição “de um lado, da consolidação
do ajuste fiscal do Estado brasileiro e, de
outro, da existência no país de um serviço público moderno, profissional, voltado
para o atendimento dos cidadãos”. (Pereira apud Silva Jr e Sguissardi,
2001, p.28)
Na concepção de Bresser Pereira, as universidades se enquadrariam no
núcleo de “serviços não-exclusivos do
Estado ou competitivos”, devendo transformar-se em “organizações sociais23 , ou
seja, em entidades que celebrem um contrato de gestão com o Poder Executivo e
contem com a autorização do parlamento
para participar do orçamento público”.
(Silva Jr e Sguissardi, 2001, p.312)
Para Marilena Chauí (2000, p.2156), posicionar a universidade no setor de
prestação de serviços,
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Entende-se
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por “organizações sociais”, as entidades de direito privado que, por iniciativa do
Poder Executivo, obtém
autorização legislativa
para celebrar contrato de
gestão com esse poder, e
assim ter direito à dotação orçamentária. (Silva Jr e Sguissardi,
2001, p.45)
23
28
indica uma eclipse da idéia de direito social e explica, por exemplo, por que volta à
baila a tese do ensino público pago com a
idéia de que assim justiça seja feita, pois os
ricos devem pagar pelos pobres,
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Desde o surgimento
(século XIII europeu), a
universidade sempre foi
uma instituição social,
isto é, uma ação social,
uma prática social fundada no reconhecimento
público de sua legitimidade e de suas atribuições, num princípio de
diferenciação, que lhe
confere autonomia perante outras instituições
sociais, e estruturada
por ordenamentos, regras, normas e valores
de reconhecimento e legitimidade internos a ela
(...)Com as lutas sociais
e políticas dos últimos
séculos, com a conquista
da educação e da cultura
como direitos, a universidade tornou-se também
uma instituição social
inseparável da idéia de
democracia e de democratização do saber: seja
para realizar essa idéia,
seja para opor-se a ela,
a instituição universitária não pôde furtar-se à
referência à democracia
como idéia reguladora,
nem pôde furtar-se a
responder, afirmativa ou
negativamente, ao ideal socialista. (Chauí,
2000, p.217)
24
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Assessor-chefe para
educação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)
25
La enseñanza superior
las lecciones derivadas
de la experiência (1995)
26
afastando-se da concepção da educação como um direito de todos, mas sim,
como “um direito dos ricos e uma benemerência para os pobres”. Ao transformar a universidade em uma prestadora de
serviços, “a universidade perde a idéia e
a prática da autonomia, pois esta, agora,
se reduz à gestão de receitas e despesas”,
além de transformar-se em um “órgão da
administração indireta, gerador de receitas e captador de recursos externos”, distanciando-se da sociedade, seu princípio
de ação e regulação.
Em suma, a reforma do Estado propõe passar a universidade da condição de
instituição social24, para a de organização
social, convertendo o seu “produto” (o saber) em mercadoria e passando a ser administrada segundo as mesmas “normas e
os mesmos critérios com que se administra uma montadora de automóveis ou uma
rede de supermercados” (Chauí, 2000,
p.218), ou seja,
da função clássica de socialização e de reprodução de conhecimentos e reprodução
cultural mais ampla, para o papel específico de formar capacidades e competências
produtivas”. (Frigotto, 1998, p.3)
Nessa lógica o governo federal busca claramente articular as finalidades da
universidade aos preceitos neoliberais, ao
conceber a Universidade como uma organização empresarial, subserviente à lógica
do mercado, além de induzir à falsa tese
de que “formação profissional que desenvolvem competências exigidas pelo mercado garantem empregabilidade” (Frigotto, 1998, p.4), termo que ganhou
espaço nos anos 90, transferindo as responsabilidades do campo privado, onde
se exercem as competências exclusivas
do capital, para o terreno público, como
se a educação fosse elemento definidor
do poder político e econômico. Segundo
Cláudio Moura Castro25 , a educação não
determina a política econômica, que tem
lógica própria para promover o desenvolvimento e criar empregos; “a educação
tem de se ajustar a isso. Se o mercado não
absorver determinado curso, este deve fechar. Deve haver total subserviência do
ensino profissional ao mercado de trabalho”. (Castro, 2000, p.35)
A posição de Moura Castro é consoante com a cartilha para a reestruturação da educação superior na América
Latina editada pelo BM26. Para Catani e
Oliveira o atual perfil da educação superior na América Latina revela “o alto grau
de subordinação dos países em relação às
orientações dos organismos multilaterais,
particularmente do Banco Mundial”, cujas
orientações são no sentido de estabelecer
vínculos efetivos entre o ensino superior
e os setores produtivos. (Catani e Oliveira, 1999, p.9; Catani e Oliveira,
2002, p.87)
No Brasil, a aliança centro-direita
que conduziu Fernando Henrique à presidência em 1994, favoreceu uma nova
ofensiva conservadora no texto da LDB,
expressa quando o senador Beni Veras
(PSDB-CE) apresentou requerimento solicitando o retorno do projeto de LDB à
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. O relator senador Darcy Ribeiro (PDT-RJ), em seu parecer datado de
março de 1995, alegou todo o tipo de inconstitucionalidade inviabilizando tanto o
projeto oriundo da Câmara, como o texto
de Cid Sabóia. Imediatamente, Darcy Ribeiro apresentou substitutivo próprio que
logrou fosse aprovado pela Comissão de
Constituição e Justiça do Senado. Uma vez
aprovado pelo Senado o projeto retornou
à Câmara dos Deputados em fevereiro de
1996, na forma de Substitutivo Darcy Ribeiro, já na sua versão final incorporadas
algumas emendas que visavam atenuar
o mal-estar que a “manobra regimental”
acarretara. Dez meses depois, o relator
designado deputado José Jorge (PFL-PE)
apresentou seu relatório, que, sem vetos,
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
29
foi à sanção presidencial. Assim, em 20
de dezembro de 1996 foi promulgada a
nova Lei de Diretrizes e Bases Nacional,
lei n° 9.394. (Silva Jr e Sguissardi,
2001, p.54)
8 Considerações finais
O Brasil ficou fora do processo civilizatório por mais de trezentos anos enquanto Colônia, constituído de um imenso
território formado por pessoas sem acesso
a escolas, jornais, livros e bibliotecas. A
independência não modificou de imediato
o modelo colonial ruralista de imensos latifúndios povoados de analfabetos, ficando difícil uma concepção de universidade
que alimentasse o espírito criativo e inovador do homem. Nesse contexto nasceu
a primeira universidade brasileira: um
agregado de institutos de ensino, sem uma
unidade, sem um projeto acadêmico.
Embora o capitalismo industrial
deflagrado na década de 30 tenha feito a
sociedade pressionar o poder público por
um sistema de educação superior, somente a tomada de consciência pela elite paulista da falta de quadros políticos com formação científica na sociedade, falta essa
deflagrada pelo fracasso da revolução
Constitucionalista, abriu as portas para a
instalação de instituições que oferecessem um campo de cultura e de preparo
indispensável para uma eficiente atuação
na vida social. Mais uma vez, a sociedade,
embora beneficiada, foi refém dos interesses dos mandatários.
Vários foram os momentos em que
a sociedade brasileira se deparou com
barreiras nos rumos a educação, ora por
questões ideológicas, ora por interesses
em cooptar aliados a um projeto políticoeconômico. Nesse último foco, podem ser
citados os governos autoritários de Vargas
e dos militares na década de 60, sem esquecer a reforma do estado promovida na
década de 90, que culminou com a Lei de
Diretrizes e Bases promulgada em 1996,
cujo texto genérico, abriu espaço para as
Revista Integralização Universitária
reformas que a sucederam via decretos
e portarias, constituindo-se na moldura
jurídica adequada para as propostas do
MARE e do MEC. (Silva Jr e Sguissardi, 2001, p.54)
Finalizando, cabe destacar que a
trajetória do projeto da lei nº 9.394 e seu
desfecho evidenciam a prevalência, no
âmbito educacional, da vontade política
sobre as necessidades e aspirações da população em geral e da comunidade ligada
à educação, em particular.
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- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Foto: Roberto Carlos
33
EDUCAÇÃO
Docência na educação superior: uma construção
mediada por saberes pedagógicos
Marilda Piccolo1
Resumo: O presente artigo discute a apropriação dos saberes pedagógicos pelos
docentes da educação superior ao tecer
a trama de seu percurso formativo como
professor. Nessa discussão aponta as dificuldades e as possíveis alternativas para
a construção da competência pedagógica
deste profissional – técnico e docente;
bem como levanta questões sobre os conceitos de competência e competência pedagógica. A metodologia de estudo para
a construção desta discussão foi a revisão
bibliográfica sobre o tema. Apresenta ainda considerações para que as Instituições
de Ensino Superior se apropriem dessa
necessidade de capacitar seus docentes,
construindo ou ampliando os saberes pedagógicos dos mesmos.
Palavras-Chave: Docência da Educação
Superior - Saberes Pedagógicos Competência Pedagógica Ensino Superior
Abstract: The present article discuss the
appropriation of the pedagogic knowledge by the superior education professor as
tissing the plot of their former route as a
professor. In this discuss points the difficulties and the possibles alternatives for
the construction of the pedagogic competence of this professional – technician
and professor; it raises questions about
the concepts of competence and pedagogic competence. The study metodologic
for the construction of this discuss was
the bibliographyc revision about the subject. It presents yet considerations for the
Superior Education Institutions to appropriate of this necessity of improving their
professors, building or broadening their
pedagogic knowledge.
Key-Words: Superior Education Teaching, Pedagogic Knowledges, Pedagogic Competence, Superior Education
Revista Integralização Universitária
1 Introdução
A Educação Superior passa hoje
por grandes mudanças acompanhando os
avanços tecnológicos globais. Em termos
docentes tem-se, atualmente, militando
em sala de aula das Instituições de Ensino
Superior (IES) profissionais competentes
em suas áreas de atuação profissionais,
com domínio pleno dos saberes científicos pertinentes. No entanto, esses docentes estão sendo desafiados a construíremse enquanto “profissionais docentes”. Isto
significa comprometerem-se com uma
(nova) profissão que tem teoria própria,
bem como características e procedimentos específicos.
As recentes reformas no ensino brasileiro, especialmente na Educação Superior, trazem inovações sobre as quais
a comunidade acadêmica tem discutido,
buscando compreendê-las, analisá-las e
avaliá-las com o objetivo de encontrar os
meios mais adequados para implementálas. Em linhas gerais, as discussões têm
ocorrido em torno de alguns conceitos
que ganham força e que, historicamente,
provocam polêmicas em razão das inúmeras tendências, correntes e visões que os
interpretam diversificadamente. No conjunto desses conceitos, merece ser problematizada a questão das competências.
Considerando que ainda não se
tem no Brasil um tradicional acúmulo de
pesquisa sobre os saberes docentes e que
vive-se um momento de hegemonia do
projeto neoliberal no campo educacional,
algumas questões colocam-se como desafiadoras, assim, a questão da docência
ultrapassa os processos de sala de aula.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Mestre em Educação Brasileira (UFG);
Pedagoga (UFG); Licenciada em História
(UCG). Professora da
Faculdade Católica
do Tocantins. Área de
Conhecimento: Formação de Professores
[email protected].
br
1
34
O presente artigo visa discutir a
construção da competência pedagógica
deste profissional – professor da educação
superior, técnico e docente – por meio de
uma breve revisão bibliográfica sobre o
tema, com especial atenção aos conceitos
de competência e competência pedagógica.
2 Docência na Educação Superior
Conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),
artigos 61 a 68 e Decreto
3.276, de 6 de dezembro
de 1999.
2
O docente da educação superior
vivencia, atualmente, uma dicotomia no
exercício de suas atividades, pois, se de
um lado lhe é cobrado uma competência científica que coincide com ser um
profissional renomado em sua área de
conhecimento, com relativo sucesso em
sua área profissional, que é buscado pelas
IES justamente no afã de que este ensine
aos acadêmicos a serem tão bons profissionais como ele; por outro lado cobra-se
deste profissional uma competência pedagógica, pois o paradigma “quem sabe, automaticamente sabe ensinar”, não é mais
válido nas IES que estão em busca da
qualidade do e no processo ensino aprendizagem. Todos esses fatores somam-se
à separação das atividades de ensino e
pesquisa e ao predomínio da lógica disciplinar em detrimento de uma prática interdisciplinar; bem como ao atual impacto
que a revolução tecnológica vem causando sobre a produção e socialização do
conhecimento na educação superior, aliado à globalização e à versão social-econômica neoliberal, afinal, é voz corrente
que as funções de produzir e socializar
conhecimentos não estão mais restritas
ao locus das instituições educativas, pois
conforme Pimenta e Anastasiou (2002) as
ações pedagógicas ocorrem na sociedade
em geral, ampliando-se o entendimento
de que estamos diante de uma sociedade
genuinamente pedagógica.
Ao utilizar o termo educação superior caracteriza-se um momento da vida
educacional que é mais amplo que apenas
ensino, pois ao transcender a busca pelo
desempenho e o rendimento, passa-se a
almejar significados mais vastos da formação acadêmico-profissional, ao mesmo
tempo coloca-se em questão a responsabilidade social das IES. Assim, o desafio
de exercer o magistério superior apresenta alguns determinantes, dentre eles a
construção de uma nova competência que
deve ser resultado de uma síntese possível
– mas ainda desejada – entre os saberes
científicos e os saberes pedagógicos.
Para iniciar a presente discussão
ressalta-se que, no Brasil, não existe uma
formação específica exigida para atuar
como docente na Educação Superior, não
estando o magistério deste nível regulamentado sob forma de um curso específico como nos demais níveis2. A Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) aponta:
Art. 65. A formação docente, exceto para
a educação superior, incluirá prática de
ensino de, no mínimo, trezentas horas.
Art. 66. A preparação para o exercício
do magistério superior far-se-á em nível
de pós-graduação, prioritariamente em
programas de mestrado e doutorado.
Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico.
A legislação, ao admitir que tal docente seja preparado em cursos de pósgraduação não especifica o caráter pedagógico dos mesmos. Por outro lado, há a
exigência legal (para autorização, credenciamento e reconhecimento de cursos e
instituições) que as IES tenham um mínimo de 30% de seus docentes titulados na
pós-graduação stricto sensu, apontando
para o fortalecimento desta como o locus
privilegiado de formação do docente da
educação superior.
Portanto, a realidade da educação
superior brasileira hoje é que a maioria
das IES, sejam essas Universidades, Centros de Ensino Superior, Faculdades ou demais instituições; possuem corpo docente
composto por um conjunto de profissionais de áreas diversas que, em sua imensa
Revista Integralização Universitária
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35
maioria, não tiveram formação inicial ou
continuada para o exercício da docência,
isto é, não possuem conhecimento científico para lidar com a complexidade do
processo de ensino e de aprendizagem,
pelo qual cada um é o único responsável a
partir do momento que ingressa na sala de
aula como docente.
A princípio, a formação inicial
(graduação ou tecnologia) deste profissional e mesmo a formação continuada
(especialização, mestrado e doutorado)
não funcionam como preparação docente
– mesmo as Licenciaturas abordam o magistério para crianças e adolescentes, sem
mencionar a andragogia3 – não proporcionando a este profissional oportunidade de
conhecer e discutir elementos teóricos e
práticos relativos à questão do ensino e da
aprendizagem de jovens e adultos, bem
como competência pedagógica e profissão docente.
Por falta deste referencial teórico e
prático que lhe forneça uma postura atualizada e pertinente da ação docente, o
professor da educação superior seleciona
de sua própria experiência como aluno, e
mesmo como professor, ações docentes
ou metodológicas que considera adequadas e passa a reproduzi-las em sala de
aula, assim, a prática cotidiana passa a ser
valorizada como lugar de construção de
saberes. Agindo assim, este docente acaba
por desconsiderar os elementos constitutivos da categoria profissional do magistério: ideais, metas, idiomas pedagógicos,
regulamentações profissionais, códigos,
entidades de classe... enfim, elementos essenciais para exercer com sucesso e competência uma profissão.
Assim sendo, mesmo trazendo para
a instituição excelência em conhecimento
científico das diversas áreas de conhecimento e atuação “... não há garantia de
que a mesma [excelência em conhecimento técnico e científico] tenha igual peso na
construção do significado, dos saberes,
das competências, dos compromissos e
das habilidades referentes à docência.”
Revista Integralização Universitária
(ANASTASIOU, 2002, p.174)
Pois esses profissionais devem ser
conscientes de que
... a partir do momento em que assumem
uma sala de aula, a docência passa a ser
uma profissão, uma nova profissão que
dependerá dos saberes da área (...) mas
também dos saberes próprios à profissão
de professor. Os estudos e pesquisas que
fazemos nas especializações, mestrados
e doutorados possibilitam o aprofundar
de nossas áreas de pesquisa, nem sempre
coincidentes com a área pedagógica...”
(ANASTASIOU, 2002, p.175) (grifos da
autora)
Pode-se afirmar, portanto, que o
processo de ser docente, bem como a efetivação de uma profissão ficam entregues
à própria sorte, especialmente se considerar a dificuldade do professor em se perceber como parte do problema, pois se ele
possui o conhecimento científico (conteúdo/saber) não lhe preocupa não possuir
o método (saber fazer) restando-lhe uma
técnica sem competência.
Não se está aqui defendendo a supremacia do pedagógico, ao contrário, é
necessário deixar claro a defesa do primado do conteúdo específico sobre o conteúdo pedagógico, pois, concordando com
Candau
A competência básica de todo e qualquer
professor é o domínio de conteúdo específico. Somente a partir deste ponto é possível construir a competência pedagógica.
Esta afirmação não implica a relação temporal de sucessão, e sim de uma articulação epistemológica. É a partir do conteúdo
específico, em íntima articulação com ele,
que o tratamento pedagógico deve ser trabalhado. (1997, p.46)
Ao pensar na lógica que articula
saberes: conteudista e pedagógico, devese visualizar o saber docente como proveniente de duas fontes – conhecimento
do conteúdo e conhecimento pedagógico.
(TARDIFF, LESSARD e LAHAYDE,
1991)
Efetivar uma profissão é caracterizar-se com a identidade profissional desta
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A partir de 1970 , Malcom Knowles trouxe a
tona as idéias plantadas
por Linderman. Publicou várias obras, entre
elas “The Adult Learner
- A Neglected Species”
(1973), introduzindo e
definindo o termo Andragogia - A Arte e
Ciência de Orientar
Adultos a Aprender. Daí
em diante, muitos educadores passaram a se
dedicar ao tema, surgindo ampla literatura sobre
o assunto. (http://www.
rau-tu.unicamp.br/nourau/ead/document/
?view=2)
A Andragogia significa,
portanto, “ensino para
adultos”. Um caminho
educacional que busca
compreender o adulto
desde todos os componentes humanos, e
decidir como um ente
psicológico, biológico e
social. Busca promover
o aprendizado através
da experiência, fazendo
com que a vivência estimule e transforme o
conteúdo,
impulsionando a assimilação.
(http://www.andragogia.
com.br).
3
36
e há saberes da profissão docente distintos
dos de outras profissões e que os processos de formação se concretizam em saberes profissionais.
A profissionalidade docente, de
acordo com Sacristán, é “... a afirmação
do que é específico na ação docente, isto
é, o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que
constituem a especificidade de ser professor” (1995, p.65). Afinal, são os traços, os
aspectos profissionais edificados em relação ao trabalho docente que identificam,
ou que caracterizam profissionalmente o
docente.
Muitos profissionais da educação
superior justificam sua pouca intimidade com as questões pedagógicas (ensino
e aprendizagem) pelo fato de serem pesquisadores, no entanto, ao ver-se as IES
como instituições sociais4 verifica-se que
ao exercer a pesquisa o professor deve
perceber que o produto desta ação deve
ser socializado no ensino, pois o compromisso docente vai além da reprodução de
saberes já instituídos, por mais técnicas e
atuais que essas informações possam ser.
Libâneo5 chama a atenção para o
conceito de “conteúdo”
CHAUÍ (2001) indica que a universidade
enquanto
instituição
social é aquela que se
caracteriza como ação
social e prática social,
pautando-se na idéia de
um conhecimento guiado por suas próprias
necessidades e lógica,
tanto no que se refere à
descoberta e invenção,
quanto à transmissão
desse
conhecimento.
5
Entrevista de Libâneo,
concedida por e-mail
a alunos do Programa de Pós-Graduação
em Educação Brasileira, em maio de 1999.
4
... conteúdos são os conhecimentos sistematizados, selecionados das bases das
ciências e dos modos de ação acumulados
pela experiência social da humanidade e
organizados para serem ensinados (...);
são habilidades e hábitos, vinculados aos
conhecimentos, incluindo métodos e procedimentos de aprendizagem e estudo; são
atitudes e convicções envolvendo modos
de agir, de sentir e de enfrentar o mundo.
(1999, s/p.)
Conclui-se, assim, que o saber (conteúdos/ciências), no processo de ensino e
aprendizagem, está diretamente relacionado ao método (saber fazer).
A ciência pós-moderna, ancorada na
teoria da complexidade aponta-nos que os
saberes científicos precedem novas fronteiras do pensar. Já os saberes pedagógicos indicam a necessária parceria com os
alunos na ação docente, partindo do senso
comum como elemento germinador de
análises possíveis, respeitando e identificando o pensamento do estudante como
ponto de partida, permitindo o avanço
dessa visão inicial e ainda não-elaborada.
Quando o aluno apreende – com a
colaboração do mediador – um novo paradigma de leitura da realidade, o mesmo
elabora ou amplia seu universo conceitual
e aceita-se como elemento do processo.
Faz-se necessário ir além, deixar o aluno
aprender autonomamente, garantindo-lhe
um processo de pensamento crítico, (re)
construtor de soluções para novos e velhos problemas.
Como fazer essa transição? Muitas
vezes, como professor não se associa a
responsabilidade do ensinar ao aprender
do aluno. Isto é, o professor executa a ação
de ensinar conforme ele acredita ser a maneira mais pertinente, no entanto não se
debruça a estudá-la cientificamente. “Da
mesma forma que é preciso a apropriação
dos saberes científicos para o crescente
domínio quanto em cada área, é necessário a apropriação dos saberes pedagógicos
para o exercício competente da docência.”
(ANASTASIOU, 2002, p.185)
3 Conceituando Competências
As competências surgem como um
dado novo no idioma pedagógico, razão
pela qual cabe uma aproximação maior a
esse conceito.
A educação superior é precedida dos
ensinos fundamental e médio, aos quais se
atribui a garantia de que o aluno adquira
uma formação comum para o exercício da
cidadania e a inserção no mundo do trabalho ou em estudos posteriores, podendo-se concluir que as competências deste
nível [superior] devem contar com, pelo
menos, uma base de conhecimentos gerais e de habilidades cognitivas que dêem
ao educando condições mínimas de compreender os processos produtivos e as relações sociais neles incluídas, para poder
obter êxito na sua vida profissional.
Revista Integralização Universitária
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37
Em um primeiro olhar essa lógica
parece perfeita, mas ao levar-se em conta
que a mesma foi produzida no contexto
dos anos 1990, caracterizado pela crise estrutural do capitalismo, pela globalização
e pela reordenação das profissões, entre
outras mudanças no mundo do trabalho,
cabe compreendê-la mais atentamente no
quadro das reformas educacionais marcadas pelas recomendações dos órgãos internacionais de financiamento da economia brasileira.
Na verdade, essa crise produziu o
que os sociólogos do trabalho chamam de
desemprego estrutural, resultado da entrada maciça da tecnologia nos processos
de trabalho, provocando uma tendência
crescente de transferir um número cada
vez maior de trabalhadores para uma reserva silenciosa, onde eles são protegidos,
mas ao mesmo tempo, colocados fora de
ação.
As reformas educacionais que sustentam a tese de valorização das competências parecem fortalecer e legitimar a
via da responsabilidade do aluno/cidadão
em desenvolver suas habilidades, suas
atitudes e seus saberes garantindo sua
autonomia e a flexibilidade entre outros
atributos. A adaptação a essa nova forma
de organização do mundo do trabalho e de
inserção laboral, acaba por formar trabalhadores que atendem à lógica de reprodução e de acumulação flexível do capital.
O uso do conceito de competência é
bastante familiar em nossa sociedade e seu
emprego sempre se deu em referência às
pessoas que têm uma qualidade especial
para resolver situações complexas e fazer
com perfeição determinada coisa, afinal,
quem não se recorda do famoso dito popular: “Quem não tem competência não
se estabelece...”. A discussão atual sobre
competências traz com ela significados
que, do ponto de vista da compreensão do
que seja uma pessoa competente, incluem
habilidades cognitivas bem desenvolvidas, capacidade para julgar, habilidades
motoras às quais podem ser agregadas
Revista Integralização Universitária
habilidades artísticas, literárias e mesmo
científicas, e assim por diante.
No entanto, no campo da educação
estabelece-se uma ampla discussão sobre o conceito, pois o mesmo encontra-se
mergulhado em diferentes tendências (tecnicista, comportamentalista, sociocrítica);
correntes (australiana, canadense, inglesa,
francesa); visões de mundo (positivista,
crítica); teorias de aprendizagem (condutivista, construtivista) e abordagens das
relações sociais de trabalho, questões relativas a conflitos e hierarquia de poder,
confirmando a polissemia que o cerca.
A questão central desse debate encontra-se nas novas relações de trabalho,
resultado dos avanços tecnológicos e das
rápidas alterações no mundo laboral, que
têm requerido formação adequada dos sujeitos sociais de modo que se ajustem às
exigências de inserção profissional.
Ao falar-se em competências profissionais trata-se de formar indivíduos
que desenvolvam suas potencialidades de
forma integral: com domínio de conhecimentos; com habilidades cognitivas para
reconverter sua qualificação em outra, dependendo da demanda de novas funções;
com capacidade para conviver em grupo,
sensível às diferenças interpessoais; com
capacidade para avaliar novas situações
enfrentando-as com criatividade. Portanto, o centro do debate está na relação trabalho-educação, na qual, segundo Ramos,
situa-se a competência como uma “nova
mediação” (2001, p.24) ou uma “mediação renovada”(RAMOS, 2001) pela acumulação flexível do capital.
Em outras palavras, na medida em
que o capital procura, de modo cada vez
mais rápido, encontrar novas formas de
acumulação, colocam-se para as IES desafios de formar sujeitos com competências
para “... assimilar informações e utilizálas em contextos adequados, interpretando códigos e linguagens e servindo-se dos
conhecimentos adquiridos para a tomada de decisões autônomas e socialmente
relevantes”. (MEC, 2000 apud LOPES,
2001, p.7)
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
38
Para Ramos (2001), as mudanças
no mundo do trabalho têm provocado a
requalificação dos trabalhadores inseridos no centro da produção capitalista, que
hoje está a exigir conhecimentos e atitudes diferentes das qualificações formais
do tipo taylor-fordista, resultando na desqualificação de alguns setores operários,
no aparecimento do trabalho temporário,
parcial e subcontratado e na superqualificação de outros setores. Aponta ainda que
as características tendenciais do mundo
produtivo podem ser definidas pela:
a) flexibilização da produção;
b) reestruturação das ocupações;
c) multifuncionalidade e polivalência dos trabalhadores;
d) valorização dos saberes dos trabalhadores para além das prescrições,
normas e formalizações.
Como conseqüências dessas características, surgem questões nos campos
acadêmico, socioempírico e teórico-filosófico. No campo acadêmico, são retomados os debates sobre a validade das teses
de desqualificação, polarização e requalificação dos trabalhadores. No campo socioempírico, cabe a pergunta se ainda vale
o conceito de qualificação como estruturante de relações, acesso e permanência
no trabalho. E, finalmente, no campo teórico-filosófico indaga-se como ficam as
subjetividades do trabalhador, “... motivado para resgatar sua autonomia nas novas
formas do trabalho...” (RAMOS, 2001, p.
38), ao mesmo tempo ainda “... aprisionado pelo conteúdo do trabalho parcelarizado e submetido às necessidades de reprodução do capital?”. (RAMOS, 2001)
O conceito de competência situa-se
nesse campo de indefinições, correspondendo a uma resposta possível a essas indagações e cumprindo diferentes papéis
segundo a ótica das diferentes correntes
que o interpretam e o utilizam como eixo
formador do novo cidadão. É, portanto, um conceito em construção, e como
tal encontra-se sob suspeita, até porque,
segundo Perrenoud, “... essa moda simultânea da mesma palavra em campos
variados esconde interesses parcialmente
diferentes”. (1999, p.13)
No campo das profissões, por exemplo, existem, segundo Oliveira (2000),
três tipos de competências:
a) competências para lidar com as pessoas;
b) competências para lidar com a informação;
c) competências para lidar com a tecnologia.
No campo da educação em geral, o
conceito forjado no campo do trabalho retorna ao espaço da formação, retraduzindo
perfis de empregos e normas de formação,
segundo Stroobants (1997), e sintetiza-se
no “trio” de saberes:
a) saber;
b) saber-fazer;
c) saber-ser.
Os saberes, referidos aos conhecimentos (gerais e profissionais) necessários à formação; o saber-fazer, relativo
às noções adquiridas na prática (tarefas,
regras, procedimentos etc.); o saber-ser,
englobando uma série de qualidades pessoais (ordem, método, precisão, rigor, polidez, autonomia, imaginação, iniciativa,
adaptabilidade etc.).
Entre autores brasileiros, que procuram articular as relações educativas com as
relações no mundo do trabalho, o conceito
de competência ganha força, em especial
no campo da formação profissional, tanto
para grupos que o defendem quanto para
grupos que a ela se contrapõem, afirmando que competência atualiza a noção de
qualificação ajustando-se às novas formas
de organização do capital para mais rapidamente valorizá-lo (FERRETTI, 1997);
ou ainda que ela seja o rejuvenescimento da teoria do capital humano, porque
imprime à qualificação uma conotação
produtivista (FRIGOTTO, 1995). E mais
aqueles que consideram que há um deslocamento conceitual, da qualificação para
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
39
as competências (RAMOS, 2001), uma
vez que a qualificação sempre ordenou as
relações sociais de trabalho e as educativas, em movimento permanente de atualização. A competência pode resgatar uma
compreensão essencialista do trabalho,
cujo centro, ao invés de ser o posto de trabalho, desloca-se para o sujeito abstraído
das relações sociais.
Na verdade, o que se quer demonstrar é que o conceito está referido, fundamentalmente, à formação profissional
e mesmo assim ainda traz controvérsias,
muitas delas aparentemente insuperáveis.
Por exemplo, Ropé e Tanguy (1997)
afirmam que a noção de competência,
muito associada às noções de desempenho e de eficiência na economia, no trabalho, na educação e na formação, tende
a substituir outras noções anteriormente
hegemônicas nas esferas da educação (os
saberes e o conhecimento) e do trabalho
(qualificação), mas defendem que, pelo
seu caráter extensivo e duradouro, recai
sobre ela o papel de testemunho de nossa
época. Na medida em que a esfera educativa é transpassada pela esfera do trabalho, a noção de competência, mantida a
autonomia das esferas citadas, faz o nexo
entre elas e torna-se referência para organizar a formação profissional.
É desse modo que as competências
chegam, segundo Kuenzer (2000), no Brasil à educação superior antes de se ter clareza suficiente sobre sua utilização, mais
para atender às formalidades legais do que
propriamente para instaurar uma pedagogia das competências. Essas observações
são úteis para que se possa compreender
o trajeto do significado de competência
desde sua origem no mundo do trabalho
até sua inserção no campo educativo, resultando no que hoje representa um dos
nós da educação.
Em uma outra linha de pensamento, mais voltada para a responsabilidade
da educação superior no desenvolvimento
de competências para enfrentar o mundo
de hoje e o de amanhã, encontra-se PerRevista Integralização Universitária
renoud (1999), no qual pode-se encontrar
uma proximidade com os conceitos da teoria da ação comunicativa, em uma perspectiva cultural.
Perrenoud (1999) considera que a
ascensão do conceito de competência nos
tempos atuais deve-se a uma espécie de
“contágio” de que a educação padece, resultado da apropriação dessa noção pelo
mundo do trabalho inserido “... na corrente dos valores da economia de mercado,
como gestão dos recursos humanos, busca
da qualidade total, valorização da excelência, exigência de uma maior mobilidade dos trabalhadores e da organização do
trabalho.” (1999, p.12)
Gonczi (1996) acrescenta que no
conceito de competência existe igualmente uma dimensão psicológica (destinatária da psicologia cognitivista) que se une
com alguns dos aspectos dessas dimensões filosóficas na formação do indivíduo
competente. Assim, a competência dos
indivíduos deriva da posse de uma série
de atributos (conhecimento, valores, habilidades e atitudes) que se utiliza em diversas combinações para executar tarefas
ocupacionais.
Uma possível síntese dessas abordagens, do ponto de vista das relações
pedagógicas, aponta que se deve situar
na vertente que trata as competências na
perspectiva da formação humana integral,
com absoluta clareza de que essa formação não se esgota nos domínios cognitivos, afetivos e psicomotores. Nela está
incluída a questão do poder, que não cabe
discutir neste espaço em razão dos objetivos previamente definidos e pela série de
questões que essa dimensão levanta. Assim, concebem-se competências dentro
de certos limites (RAMOS, 2001): nem
autonomia, nem adaptação.
4 Competência Pedagógica
A relação do docente da educação
superior não se reduz à transmissão de conhecimentos já constituídos, então, a prática passa a ser “... expressão de múltiplos
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40
saberes, incorporados em âmbitos, tempos, espaços de socialização diversos”.
(LELIS, 2001, p. 53)
A competência pedagógica é vislumbrada na “... demarcação de um novo
idioma pedagógico na consciência de que
a prática profissional está marcada por
uma trama de histórias, culturas que ultrapassam a dimensão pedagógica stricto
sensu”. (LELIS, 2001, p. 53)
Diante de todas as mudanças apontadas, o perfil do professor da educação
superior se altera de especialista para
mediador da aprendizagem, colocando
na pauta do dia as competências básicas
para se realizar a docência. Ao se falar em
competência pedagógica existem quatro
grandes eixos:
a) o processo ensino e aprendizagem;
b) concepção e gestão de currículo;
c) compreensão de relações interpessoais;
d) teoria e prática básica de tecnologia
educacional.
De acordo com Guimarães (2004) a
grande complexidade e os novos desafios
postos à atividade docente conduzem ao
entendimento de que esta não é uma atividade para amadores e diletantes.
Cabe aqui uma ressalva sobre a
apropriação dos termos Pedagogia e
Competência Pedagógica. Reconhece-se
hoje a presença do pedagógico na sociedade, havendo uma extrapolação da educação formal para âmbitos não formais.
No entanto, num movimento inverso, há
uma confusão em relação à Pedagogia.
A Pedagogia enquanto ciência tem como
objeto de estudo a educação enquanto
prática social, construindo uma teoria pedagógica.
Assim compreendida, a Pedagogia – enquanto campo teórico da prática educacional que não se restringe à didática da sala
de aula nos espaços escolares, mas está presente nas ações educativas da sociedade em
geral –, possibilita que as instituições e os
profissionais cuja atividade está permeada
de ações pedagógicas se apropriem criticamente da cultura pedagógica para compreender e alargar a sua visão das situações
concretas nas quais realizam seu trabalho,
para nelas imprimir a direção de sentido,
a orientação sociopolítica que valorizam,
a fim de transformar a realidade. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p.66)
Pode-se afirmar que tal apropriação
crítica é a aquisição da competência pedagógica. No entanto, a competência não
é um dado externo ao indivíduo e sim um
processo de construção situado histórica
e socialmente. Na edificação da competência pedagógica tem função relevante
o significado social que o docente atribui
a si mesmo e à educação como um todo.
Constitui-se também de
... um processo epistemológico que reconhece a docência como campo de conhecimentos específicos configurados em quatro
grandes conjuntos: os conteúdos das diversas áreas do saber (...) e do ensino; os conteúdos didático-pedagógicos, diretamente
relacionados ao campo da atividade profissional; os conteúdos relacionados a saberes
pedagógicos mais amplos do campo teórico
da prática educacional; os conteúdos ligados à explicitação no sentido da existência
humana individual, com sensibilidade pessoal e social. (PIMENTA; ANASTASIOU,
2002, p.78-9)
Para compreender-se como tal (docente da educação superior), o mesmo
deve proceder uma leitura crítica da prática social de ensinar confrontando a realidade existente, as iniciativas tomadas
perante o sucesso e perante o enfrentamento do fracasso, tomando a ação como
referência de onde se parte e para onde se
volta. É o que Nóvoa (1992) denomina de
reflexibilidade crítica sobre as práticas de
(re)construção permanente da identidade
docente.
Essa confrontação das ações diárias
de sala de aula com a produção teórica
pedagógica acaba por impor a revisão de
práticas e das teorias que as subsidiam
num “moto contínuo” de pesquisa da prática, busca de teoria e transformação.
Esse movimento amplia a consciência do professor sobre a prática de sala
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
41
de aula e a educação superior como um
todo.
5 Considerações Finais
No exercício cotidiano da docência,
o professor da educação superior deve
passar a agir como o faz enquanto pesquisador: observar-se como docente, levantar
e delimitar problemas, buscar referencial
teórico que o subsidie no avanço da solução dos problemas detectados, testar, buscar soluções... enfim: fundamentar-se.
A relação hoje necessária entre os saberes
científicos e pedagógicos passa pela análise
dos saberes das experiências vividas nas
instituições de ensino, nas salas de aula, tomando-as como ponto de partida e chegada da reflexão e da construção processual
como profissional docente. (ANASTASIOU, 2002, p.186)
É urgente que as IES que trazem para
seus quadros professores de áreas diversas
de conhecimento se dêem conta da complexidade da formação e da atuação conseqüentes deste profissional, necessitando
de um protagonismo da instituição quanto
à capacitação pedagógica docente, pois o
investimento na formação pedagógica do
professor da educação superior é um ponto de partida que apresenta possibilidades
de melhoria da profissionalidade e de um
significado diferente para a profissionalização e o profissionalismo docentes, bem
como possibilidade para a ressignificação
da sua identidade profissional especialmente nesse contexto recheado em mudanças de natureza variada.
Para tecer a trama do percurso formativo dos professores da educação superior é preciso que as IES valorizem o
trabalho docente, dotando-os de perspectivas de análise que acabem por ajudá-los
a compreender os contextos históricos,
sociais, culturais e organizacionais onde
se dá a atividade docente.
Vale lembrar que valorizar a atividade docente significa ainda rever e modificar socialmente a precariedade da carreira docente.
Revista Integralização Universitária
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Revista Integralização Universitária
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43
GESTÃO
Ecoturismo no Brasil: uma proposta de desenvolvimento e sustentabilidade
Claudia Nolêto Maciel Luz1
Resumo: O turismo é considerado o maior
dos movimentos migratórios da história
da humanidade e caracteriza-se por sua
taxa de crescimento constante. O Brasil
tem um excelente potencial turístico: algumas praias consideradas as melhores
do mundo, sol quase o ano inteiro, flora
e fauna esplêndidas, riquíssimo folclore e
um povo, por tradição, hospitaleiro. Mesmo diante de tal riqueza, participa apenas
de uma parcela no mercado turístico mundial e lentamente, o mercado interno ainda é necessário melhorar a infra-estrutura
específica e geral. A indústria do turismo,
atualmente, é a atividade que representa
os índices mais elevados da expansão no
contexto econômico mundial. O ecoturismo, na indústria de turismo e viagens,
apresenta-se no momento como uma importante alternativa de desenvolvimento
econômico sustentável, desde que, utilizando de forma racional os recursos naturais sem comprometer a sua capacidade
de renovação e a sua conservação. No
contexto global do turismo, o Ecoturismo
é o segmento que apresenta maiores índices de expansão, resultando no incremento gradativo de ofertas e demandas por
destinos ecoturísticos.
Palavras-chaves: ecoturismo, desenvolvimento, sustentabilidade, conservação,
qualidade de vida.
Abstract: The tourism is considered the
largest of the migratory movements of the
humanity’s history and it is characterized
by its growth rate constante.O Brazil he
has an excellent tourist potential: some
improve beaches of the world, sun almost
the whole year, flora and fauna splendid,
rich folklore and a people, for tradition,
hospitable. This position, just participates of a portion in the world tourist market
and slowly, it stimulates the internal maRevista Integralização Universitária
rket, of which is necessary to improve the
specific and general infrastructure. The
industry of the tourism, now, is the activity that represents the elevated indexes
of the expansion in the world economic
context. The ecoturism, in the industry of
tourism and trips, comes in the moment
as an important alternative of maintainable economic development, since, using
in a rational way the natural resources without committing its renewal capacity and
its conservation. In the global context of
the tourism, ecoturism is the segment that
presen ts larger expansion indexes, resulting in the increment gradative of offers
and demands for destinies ecoturism.
Key-words: ecoturism, development,
susteinability , conservation, life quality.
Ecoturismo, um neologismo “ecologicamente correto” criado por Hector
Ceballos no início da década de 80 e simpático às Ongs, segundo um grupo multidisciplinar formado por representantes de
entidades governamentais e não-governamentais, que, em agosto de 94, a convite
dos Ministérios do Meio Ambiente e da
Indústria, Comércio e Turismo, analisou
e estabeleceu bases para um decreto para
orientar a política e o programa brasileiro
de Ecoturismo, deve ser entendido como:
Ecoturismo é um segmento da atividade
turística que utiliza de forma sustentável o
patrimônio natural e cultural, incentiva sua
conservação e busca a formação de uma
consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bemestar das populações envolvidas.
Ecoturismo é também compreendido popularmente como turismo “natural”,
indo além da simples observação, propiciando ao viajante um entendimento ecológico do meio ambiente natural.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Graduada em Administração de Empresas pela Universidade
de Brasília – UnB,
Pós- graduada em
Administração Rural
e o Negócio Agrícola pela Fundação
Universidade do Tocantins – UNITINS
e Doutoranda em
Economia e Empresa
pela Universidade de
Ilhas Baleares – UIB.
1
44
O Ecoturismo deve:
•promover e desenvolver turismo
com bases cultural e ecologicamente sustentáveis;
•promover e incentivar investimentos em conservação dos recursos culturais
e naturais utilizados;
•fazer com que a conservação beneficie materialmente comunidades envolvidas, pois somente servindo de fonte
de renda alternativa estas se tornarão aliadas de ações conservacionistas;
•ser operado de acordo com critérios de mínimo impacto para ser uma ferramenta de proteção e conservação ambiental e cultural.
O ecoturismo é considerado como
sendo “um segmento da atividade turística que utiliza de forma sustentável o patrimônio natural e cultural, incentiva sua
conservação e busca a formação de uma
consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o
bem-estar das populações envolvidas”.
(Barros II e La Penha, 1994).
O conceito de ecoturismo deve envolver a viagem para áreas naturais relativamente tranqüilas e não contaminadas, com o objetivo de estudar, apreciar
e desfrutar o ambiente natural dessa área.
Trata-se de viagem responsável em que se
conservam os ambientes naturais e se sustenta o bem-estar da população local.
Conforme Brandon (1996), ecoturismo é um termo de uso bastante disseminado em nossos dias, mas que raramente é
definido. Muitas vezes é usado de maneira
intercambiável com outros termos como
turismo suave, turismo alternativo, turismo responsável e turismo da natureza.
Segundo o mesmo autor, ecoturismo significa simplesmente que a principal
motivação para a viagem é o desejo de ver
ecossistemas em seu estado natural, sua
vida selvagem assim como sua população
nativa.
O ecoturismo é um recente produto
de tangibilidade potencial econômico so-
cial e seu desenvolvimento poderá propiciar a divulgação do patrimônio ambiental à população brasileira e, também, de
outras nações que queiram conhecê-lo.
O impacto teórico do ecoturismo é bem
conhecido. Os custos potenciais são a degradação do meio ambiente, as injustiças
e instabilidades econômicas, as mudanças
socioculturais negativas. Os benefícios potenciais são a geração de emprego para as
pessoas que vivem próximas a essas áreas
e a promoção de educação ambiental e
de conscientização sobre a conservação.
(Lindberg e Hawkins, 1993, p.34).
A atividade do ecoturismo deve
abranger, em sua conceituação, a dimensão do conhecimento da natureza, a experiência educacional interpretativa, a valorização das culturas tradicionais locais e a
promoção do desenvolvimento sustentável.
O crescente envolvimento da sociedade nas questões ambientais, pressionando governos e instituições para o
estabelecimento de requisitos cada vez
mais rígidos quanto ao impacto ambiental
à implantação de empreendimentos, aliado a uma crescente busca do homem por
uma relação mais íntima e freqüente com
a natureza, recomenda a não restrição do
conceito de ecoturismo, de forma a acompanhar a dinâmica deste segmento. A atividade de ecoturismo passa, atualmente,
por uma transição de “produto turístico”
para um “conceito de viagem”, sendo que
os componentes da definição podem vir a
ser integralmente absorvidos por outros
segmentos ou atividades do turismo, que
talvez hoje não sejam considerados ecoturísticos, mas cuja evolução deve ser incentivada.
De acordo com o Mckercher (1997),
o gestor de projeto de ecoturismo deveria
ter conhecimento dos seguintes assuntos
que serão fundamentais para o desenvolvimento com sucesso de seu trabalho:
•Planejamento de negócio: muitas
pessoas envolvidas em temas de ecoturismo reclamam porque reconhecem que
quando começaram a trabalhar na área
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
45
não tinham conhecimento o bastante
como planejar e organizar um negócio. É
preciso conhecimento de administração
financeira, investigação de mercados e
uma grande dose de paciência para com a
burocracia;
•Marketing: muitos operadores de
turismo sabem criar um produto, mas não
sabem vendê-lo. Para desenvolver estratégias deste tipo, precisa-se de conhecimento de marketing em geral, desenvolvimento de um bom produto, estabelecimento de
um preço apropriado, como também saber
fazer a promoção nos lugares precisos;
•E também ter algumas qualidades
específicas para saber trabalhar com o público, tais como: procura de pessoal apropriado, bom tratamento aos clientes, entre
outros;
•Por último, aptidões pessoais para
desempenhar esse trabalho: paciência, coragem, habilidades para saber administrar
as pessoas, afinidade com as áreas naturais, etc.
Segundo Myers (1984), os ecoturistas preferem grupos pequenos e serviço
personalizado, tendem a ser entusiastas de
atividades ao ar livre, viajam muitas vezes em duplas ou sozinhos e são viajantes
freqüentes e experientes. Eles geralmente
aceitam condições diferentes das existentes em seus domicílios mais do que outros
tipos de turistas.
As acomodações de luxo, alimentação e a vida noturna são muito menos importantes para esse grupo do que vivenciar
as condições locais, provar os costumes e
os alimentos locais. (ABEL, 1992, p.12).
Desse modo, o ecoturismo é mais
do que uma simples atividade de lazer. É
um estilo de viagem, que reflete e promove uma determinada orientação não só em
relação à viagem, mas também a estilos
de vida, comportamentos e filosofias. (...)
O crescimento pessoal em termos emocionais, espirituais e intelectuais parece ser o
resultado esperado da viagem ecoturística
para a maioria desses viajantes. (RODRIGUES, 1997, p.84)
Revista Integralização Universitária
De acordo com o mesmo autor, tendo em conta que a problemática ambiental
coloca em destaque a questão do espaço,
do território, da paisagem, a atividade turística aparece como a que apenas "consome" paisagem/espaço/território, sem,
aparentemente, "destruir" esses lugares,
o que justificaria apontá-la como sustentável.
O desenvolvimento sustentável é aquele
que atende às necessidades do presente
sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias
necessidades” (Wced, 1987).
A proteção e a administração ambiental são essenciais para o desenvolvimento sustentável.
De acordo com Ruschmann (2000)
os princípios do Desenvolvimento Turístico Sustentável são:
•Sustentabilidade ecológica: assegura que o desenvolvimento é compatível
com a manutenção dos processos ecológicos essenciais, diversidade biológica e os
recursos biológicos;
•Sustentabilidade social e cultural: assegura que o desenvolvimento e o
controle das pessoas sobre suas próprias
vidas são compatíveis com a cultura e os
valores das pessoas atingidas pelo desenvolvimento, aumentando e fortalecendo a
identidade da comunidade;
•Sustentabilidade econômica: assegura que o desenvolvimento é economicamente eficiente e que os recursos são
geridos de forma que suportem gerações
futuras.
•O conceito de turismo sustentável foi desenvolvido para evitar os riscos
que a condução inadequada da atividade
pode provocar no meio ambiente. O turismo sustentável, segundo Krisppendor
(1988), é visto como a perfeita triangulação entre as destinações (seus hábitats e
habitantes), os turistas e os prestadores de
facilidades para os visitantes. (...) o turismo sustentável procura adequar aos interesses de cada um dos parceiros do triân-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
46
gulo, minimizando as tensões e buscando
um desenvolvimento a longo prazo, pelo
equilíbrio entre o crescimento econômico
e as necessidades de conservação do meio
ambiente.
•Apesar de alguns autores se mostrarem reservados, não há dúvidas de que
o ecoturismo apresente aspectos positivos
quanto à questão do turismo sustentável.
O ecoturismo:
•Traz benefícios econômicos para a
população local e pode ser fonte de renda
para projetos de preservação;
•Tende a se dar numa escala muito
pequena e cuidadosamente gerenciada;
•Envolvem turistas bastante conscientes dos riscos potenciais do turismo
e que, na pior das hipóteses, devem se
comportar de forma mais sensível do que
outros turistas;
•Aumenta a conscientização dos
problemas inerentes ao turismo devido à
sua experiência em primeira mão com as
questões relativas à sustentabilidade.
Segundo Harry e Spink citado por
Ruschmann (2000) o planejamento é uma
atividade que envolve a intenção de estabelecer condições favoráveis para alcançar objetivos propostos. Ele tem por
objetivo o aprovisionamento de facilidades e serviços para que uma comunidade
atenda seus desejos e necessidades ou, então o desenvolvimento de estratégias que
permitam a uma organização comercial
visualizar oportunidades de lucro em determinados segmentos de mercado.
O planejamento de uma organização comercial (privada) tem como objetivo principal o lucro, que pode ser medido
objetivamente, ao passo que os órgãos
públicos não visam a lucros, e seus resultados não podem ser medidos por indicadores quantitativos. Diante da amplitude e da variedade das ações de cada um
dos setores, a abordagem deste estudo se
concentra no planejamento turístico nas
organizações públicas que, para alcançar
seus objetivos, necessitam da colabora-
ção das empresas privadas, atuando direta ou indiretamente no desenvolvimento
da atividade. No turismo cabe ao Estado
zelar pelo planejamento e pela legislação
necessários ao desenvolvimento da infraestrutura básica que proporcionará o bemestar da população residente e dos turistas. Além disso, deve zelar pela proteção
e conservação do patrimônio ambiental
(natural, cultural e psicossocial) e criar
condições que facilitem e regulamentem
o funcionamento dos serviços e equipamentos nas destinações, necessários ao
atendimento das necessidades e dos desejos dos turistas, geralmente, a cargo de
empresas privadas.
Entende-se o planejamento como
um processo que consiste em determinar
os objetivos de trabalho, ordenar os recursos materiais e humanos disponíveis,
determinar os métodos e as técnicas aplicáveis, estabelecer as formas de organização e expor com precisão todas as especificações necessárias para que a conduta
da pessoa ou do grupo de pessoas que
atuarão na execução dos trabalhos seja racionalmente direcionada para alcançar os
resultados pretendidos.
No turismo, o plano de desenvolvimento constitui o instrumento fundamental na determinação e seleção das prioridades para a evolução harmoniosa da
atividade, determinando suas dimensões
ideais, para que, a partir daí, possa-se estimular ou restringir sua evolução.
O planejamento turístico não se refere apenas especificamente à divulgação
e ao desenvolvimento do setor, embora
estes sejam aspectos importantes. O turismo deve ser integrado a processos de
planejamento mais amplos a fim de promover determinadas metas de melhoria
ou maximização econômica, social e ambiental que possam ser atingidas por meio
do desenvolvimento turístico adequado.
É clara e evidente a crescente importância da área de serviços para o mundo. O aumento de populações urbanas, a
descoberta de novas tecnologias, a cons-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
47
cientização do consumidor diante de seus
direitos, a busca por melhor qualidade de
vida, são fatores que influenciam diretamente para que ocorra esse avanço.
Parte-se, atualmente, do pressuposto que o setor de serviços também necessita de direção, controle e, principalmente,
planejamento para que não ocorra a temida queda de produtividade, pois a competitividade neste setor é feroz.
A dificuldade maior em controlar
serviços decorre de sua intangibilidade.
Os serviços não são palpáveis ou mensuráveis, mas sim, sentidos, o que torna
complicada a padronização de seus resultados.
Dos serviços prestados por uma
empresa depende a sua imagem frente ao
consumidor e como não são passíveis de
serem patenteados, irão requerer do administrador estratégias criativas que garantam suas inovações.
Inovação, essa é a palavra-chave. O
mercado atual requer das empresas, principalmente diferenças, algo novo e surpreendente, que cause impacto, que chame atenção do cliente e o faça tornar-se
satisfeito.
O marketing é um dos ramos estratégicos de serviços mais importantes para
que ocorram inovações nessa área. Uma
das funções básicas do marketing em serviços é comunicação com o cliente, através da publicidade e propaganda. É esta
comunicação que irá criar expectativas
nos consumidores, que irá impulsionar
suas necessidades e desejos pelo serviço
prestado pela empresa.
Segundo o Conselho Mundial de
Viagens e Turismo, que congrega as maiores empresas multinacionais do setor, o
mercado turístico como um todo:
•Em 1991 empregou 183 milhões
de pessoas.
•Em 1994, com crescimento de
10,6% passou a oferecer 204 milhões de
empregos (um em cada nove trabalhadores do mundo).
Revista Integralização Universitária
•De 1985 a 1993, apesar da recessão mundial, o número de turistas que empreendeu viagens internacionais passou
de 380 para 500 milhões.
•A Organização Mundial de Turismo estimava que esse número atingisse
661 milhões no ano 2.000.
•Excetuando o setor de transportes, os ganhos financeiros provenientes do
turismo internacional, cresceram de US$
18 bilhões (1970) para US$ 324 bilhões
(1993).
•A indústria do turismo apresenta
elevados índices de crescimento econômico mundial. Movimenta cerca de US$
3,5 trilhões anualmente. Na última década, teve crescimento de 57%. Dentro deste contexto, o ecoturismo é o segmento
que mais cresce.
Verifica-se, assim, que o turismo se
impôs nos últimos anos como um recurso comercial de expressiva importância,
disputando com o petróleo a primazia do
mercado mundial.
Em 1995, o Brasil recebeu apenas
1,7 milhões de turistas que representaram
0,3% dos 534 milhões de turistas no mundo. Considerando-se que o ecoturismo representa 10% do mercado turístico, o ecoturismo brasileiro participa com 0,03%;
um número medíocre para um país de
mega diversidade e que possui a maior
biodiversidade do mundo e 5,7% de toda
a área terrestre do planeta.
A conscientização da sociedade relativamente às questões ambientais tem
contribuído para o crescimento da demanda por atividades ecoturísticas. De fato, a
forte percepção mundial acerca da necessidade urgente de proteção e recuperação
dos recursos naturais, disseminadas principalmente pelos meios de comunicação,
acaba por influenciar a escolha dos destinos e roteiros a serem programados.
A oferta de destinos ecoturísticos
depende, no entanto, da existência de áreas de elevado valor ecológico e cultural,
da maneira como estas áreas são geridas,
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
48
da existência de infra-estruturas adequadas e da disponibilidade de recursos humanos capacitados.“Países que oferecem
destinos ecoturísticos adequados, obtêm
valores significativos de divisas com seus
parques nacionais”. (OMT, 1993. p.6-7):
•O Quênia obteve em 1988 com o
turismo, que é a atividade que mais rende
divisas para o país, US$ 400 milhões.
•Em Ruanda, os turistas que desejam ver os gorilas do Parque Nacional dos
Volcans despendem, anualmente, US$ 1
milhão em ingressos e de US$ 2 a 3 milhões em outros gastos.
•Nos países desenvolvidos, o ecoturismo é uma atividade ainda mais vantajosa: o sistema de parques nacionais
dos Estados Unidos, considerado como a
maior rede de atração turística natural do
mundo, recebeu mais de 270 milhões de
visitantes em 1989; os parques estaduais
receberam 500 milhões de visitantes.
Para a América Latina, onde o ecoturismo começa a despontar, a atividade é
de extrema importância para os esforços
de promoção do desenvolvimento econômico e social. O adequado aproveitamento
dos variados ecossistemas existentes, ainda pouco explorados, propiciará a abertura de novas alternativas econômicas e a
conseqüente melhoria das condições de
vida das populações diretamente envolvidas, além de reduzir alguns dos impactos
negativos causados pelo turismo tradicional.
O Brasil tem um grande potencial,
representado pela própria natureza, por
sua geografia contrastante, pelo clima e
pela alegria de seu povo. Por isso, a EMBRATUR considera o ecoturismo como
o setor econômico com maiores perspectivas de desenvolvimento nos próximos
anos, razão pela qual preocupa-se com a
necessidade de implantação de novos mecanismos destinados a facilitar e estimular
o investimento privado.
No entanto, para que o ecoturismo
possa efetivamente constituir uma es-
trutura sólida, acessível e permanente, é
preciso que esteja alicerçado de forma a
acomodar adequadamente as peculiaridades de cada ecossistema e de cada traço
da cultura popular brasileira.
A tomada de consciência a respeito
da degradação do meio ambiente levou a
Organização das Nações Unidas (ONU)
a convocar uma grande conferência de
países - membros, com a colaboração de
cientistas no sentido de estudar o fenômeno; foi a Reunião de Estocolmo (Suécia),
realizada em 1972, também conhecida
como ECO-72. Nos primeiros anos da
década de 1970 se observou um esforço
internacional em defesa da ecologia.
A multiplicação de pesquisas, estudos, publicações sobre os temas da ecologia fixou diversos neologismos, marcando uma área de estudo que, além de
interdisciplinar e, portanto muito diversificada, procurava definir balizas para seu
desenvolvimento, com a urgência que a
situação parecia exigir. Agribusiness ou
Agriecologia, Área de Proteção ambiental (APA), Bem Livre, Biomassa, Chuva
Ácida, Chuva de Sementes, Desenvolvimento Sustentado ou Eco-desenvolvimento, Empate, Fumante Passivo, Povos da
Floresta, Reserva Extrativista, Relatório
de Impacto Ambiental (RIMA), derivado
do Estudo de Impacto Ambiental (EIA),
e outros são neo-significantes, cujo uso
foi divulgado a partir do movimento em
defesa do meio ambiente iniciado na década referida e que tomou grande impulso
na década de 1980. Além disso, outros
significantes passaram a freqüentar textos jornalísticos, conversas no dia-a-dia,
debates de todo tipo e também os meios
acadêmicos.
A procura de novas alternativas tem
marcado a segunda metade dos anos 80 e
o início da década de 1990: aspira-se por
uma tecnologia limpa, que não degrade o
meio ambiente e conserve as condições
ideais da casa de todos, para as futuras
gerações.
Embora os impactos do turismo so-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
49
bre o ambiente natural e artificial, construídos pelo homem, tenham sido reconhecidos há muito tempo, a ação real de sua
existência demorou bastante para chegar.
Parte do problema pode ter sido a falta de
conhecimento da relação complexa entre
turismo e o meio ambiente, assim como, a
falta de coordenação entre política de desenvolvimento e a ambiental.
A questão dos impactos do turismo sobre o meio ambiente começou a ser
pesquisada mais intensamente a partir do
início da década de 80, quando o turismo
intensificou-se. Apesar de ter ocorrido
razoável progresso, o conhecimento dos
complexos processos envolvidos deixou
muito a desejar.
A política ambiental foi fragmentada, dirigida para problemas específicos
como, entre outros, poluição da água e
qualidade do ar. Isso ocorreu devido não
só a fragmentação administrativa, mas
também ao período de tempo necessário
para a incorporação de abordagens integradas à gestão ambiental, relacionada
com ecossistemas totais e não com aspectos limitados da qualidade ambiental.
Adicionalmente, a conservação ambiental foi vista em oposição à política de
desenvolvimento. Assim, a qualidade ambiental foi considerada como algo à parte
do desenvolvimento econômico e social.
Recentemente, passou a prevalecer uma visão mais ampla e integrada da
política de desenvolvimento, associando
este conceito ao de proteção ambiental. A
conceituação de desenvolvimento sustentado (WCED, 1987) assinala essa mudança de perspectiva. Uma política global de
sustentabilidade, em que a conservação
do meio ambiente está estreitamente relacionada com a eficiência econômica e
a justiça social, ganhou ampla aceitação.
Esta visão engloba esforços para associar
a proteção ambiental às políticas de desenvolvimento do turismo.
A questão da sustentabilidade em
turismo tornou-se prioritária na Europa,
embora muitos dos problemas envolvidos
Revista Integralização Universitária
já tivessem sido bastante debatidos no
contexto do turismo mundial, principalmente sob as perspectivas social, cultural
e econômica. O quinto programa de ação
sobre o meio ambiente da União Européia, intitulado “Rumo à Sustentabilidade”, classificou o turismo como um dos
setores prioritários (CEC, 1993).
O turismo sustentável pode ser interpretado do ponto de vista setorial, de
acordo com a meta básica, como a viabilização da atividade turística, mais na linha
da sustentabilidade econômica do turismo. Como o foco de interesse é a atividade de turismo, a ênfase de tal estratégia
implicará o fortalecimento, a melhoria da
qualidade e mesmo o encontro do diferencial do produto turístico, com freqüência
dependente de soluções e inovações organizacionais e tecnológicas. Alguns dos
instrumentos de política utilizados nesse
contexto são: investimentos em infra-estrutura visando aumentar a capacidade e
melhorar os serviços; programas de modernização funcional e estética de complexos turísticos; provisão para novas
instalações, como salas para congressos,
parques aquáticos e outros. Destaca-se
aqui, enfaticamente, que todas as preocupações devem, na verdade, convergir
para a oferta de um produto turístico final
atrativo nos mercados regional, nacional
e internacional, representada por processo
de comercialização que tenha qualidade e
seja competitivo com relação às tarifas de
transporte, alojamento e serviços.
Outra linha de interpretação tem
por base a ecologia como visão socio-cultural e política, acentuando notavelmente
a necessidade do turismo ecologicamente
sustentável. Trata-se de abordagem preservacionista em que a prioridade é dada à
proteção dos recursos e dos ecossistemas
naturais. No contexto da gestão ambiental, algumas das atividades de turismo geralmente identificadas como “leves” são
aceitas como complementares e não-pertubadoras ao meio ambiente natural.
A questão pode ser abordada de
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
50
ângulo ligeiramente diferente como desenvolvimento sustentável do turismo, ou
seja, a necessidade de assegurar a viabilidade da atividade de turismo a longo prazo, reconhecendo a necessidade de proteger certos aspectos do meio ambiente.
Esta abordagem, essencialmente baseada
em perspectiva econômica, reconhece a
qualidade ambiental como importante fator de competitividade e que, como tal,
deverá ser protegida. A proteção estendese para além daqueles aspectos ou dimensões da qualidade ambiental diretamente
envolvida no desenvolvimento e no marketing do produto turístico, já que tal
produto deve apresentar sempre melhor
qualidade e maior competitividade para
satisfazer um mercado em contínua mudança e expansão.
Outra abordagem baseia-se no desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável. Nela o turismo integra uma
estratégia global do desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade é definida
considerando a totalidade do sistema- ser
humano/meio ambiente. Sob essa perspectiva, a conservação ambiental é meta
tão importante quanto à de eficiência econômica e a de justiça social para a geração
de empregos, a distribuição de renda e a
melhoria da qualidade de vida. As políticas de turismo estão integradas nas políticas sociais, econômicas e ambientais,
mas não as precedem. Esta constitui uma
abordagem mais equilibrada e integrada,
mais próxima do pensamento contemporâneo sobre o turismo, delimitados em
concentrações geográficas com diferencial interativo e completo e estruturados
com relação à sua comercialização global
para a concorrência final nos mercados
consumidores.
Uma profunda reflexão sobre o imperativo de compatibilizar desenvolvimento com preservação ambiental é, contudo, inadiável. Nesse sentido, a recessão
que se abateu sobre o Brasil oferece, pelo
menos, a vantagem de uma pausa de tempo para repensar o nosso modelo de de-
senvolvimento, em vez de simplesmente
retomá-lo sobre as bases tradicionais de
indiferença quanto ao impacto ambiental
do progresso.
Uma política de desenvolvimento
econômico socialmente justo e economicamente sustentável deveria, pois, basearse em:
•Profunda reorientação dos investimentos públicos na infraestrutura de transportes e de energia do país, privilegiando
as formas de energia menos poluentes e
mais eficazes em bases termodinâmicas e
os meios de transporte de massa e, entre
estes, os mais eficientes em termos de dispêndio de energia e de ocupação de ruas e
estradas;
•Política tributária e de tarifas de
energia que incentivem o consumo mais
racional de energia tanto na área industrial quanto na agrícola, e bem assim o
uso mais eficaz da infraestrutura de transportes;
•Prioridades na política de estímulo
à pesquisa tecnológica, aos trabalhos no
campo do desenvolvimento de materiais
e de processos produtivos poupadores de
energia e de matérias-primas;
•Recuperação da qualidade do ar e
das águas comprometidas por modelo de
desenvolvimento ecologicamente inadequado.
Uma política que, além de preservar
recursos naturais e o equilíbrio ecológico,
dentro de nossas fronteiras, tornar-nos-ia
ao mesmo tempo, mais competitivos nos
mercados internacionais. E que nos daria,
por acréscimo, condição de poder passar a
cobrar, como é de nosso fundamental interesse, o exercício, pelas demais nações
ricas ou pobres de suas respectivas responsabilidades econômicas.
O desenvolvimento sustentado
constitui um desafio especial para a região
amazônica na medida em que o Brasil nela
se defronta com um teste decisivo da sua
capacidade de exercer sua soberania sobre aquela imensa região de que constitui
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
51
a metade do nosso território. Não há como
aceitar a tese descabida de uma limitação
de nossa soberania, sob a alegação de que
os recursos florestais e da biodiversidade
na região constituiriam um “patrimônio
da humanidade”, e de teses não comprovadas sobre as conseqüências do esquentamento do clima tropical.
Considerando que o ecoturismo
é uma tendência em termos de turismo
mundial que aponta para o uso sustentável de atrativos no meio ambiente e nas
manifestações culturais, devemos ter em
conta que somente teremos condições
de sustentabilidade caso haja harmonia e
equilíbrio no “diálogo” entre os seguintes
fatores: resultado econômico, mínimos
impactos ambientais e culturais, satisfação do ecoturista (visitante, cliente, usuário) e da comunidade (visitada).
Analisando-se o maior atrativo ecoturístico brasileiro - a Amazônia, sabemos que os principais problemas sociais
que lá vêm ocorrendo, simultaneamente
a um acentuado processo de degradação
ambiental, são decorrentes do confronto
entre duas formas de uso: a “tradicional”
e a “moderna”. A forma “tradicional” na
qual os diferentes grupos sociais (povos
da floresta: seringueiros, caboclos, indígenas, etc) vivem em estreita relação com
a natureza, praticando o extrativismo da
borracha, a coleta da castanha, a caça e
a pesca artesanais de subsistência, revelou-se capaz de manter o equilíbrio ecológico. Já o “moderno”, adotado intensamente nos últimos 40 / 50 anos, difere do
“tradicional”, tanto na sua relação com o
uso do solo, onde prevalece a especulação
imobiliária, quanto ao processo produtivo
que tem na exploração maciça dos recursos naturais (madeira, garimpo, etc) seu
principal objetivo. O Ecoturismo para ser
sustentável deve buscar o modelo “tradicional” de extrativismo de nosso patrimônio natural e cultural.
A indústria do turismo e viagens é
líder mundial em movimentação de recursos e geração de empregos e isto depende
Revista Integralização Universitária
de uma gestão sustentada dos patrimônios
natural e cultural.
Como um segmento do turismo surge o ecoturismo, sendo este considerado
um dos mais inteligentes instrumentos
de viabilização econômica para o gerenciamento correto dos recursos naturais,
oferecendo uma alternativa digna de conquistar seu sustento e uma vida melhor,
ao mesmo tempo em que assegura às gerações futuras o acesso aos legados da natureza.
O ecoturismo configura-se no momento como uma importante alternativa
de desenvolvimento econômico sustentável, utilizando racionalmente os recursos
naturais sem comprometer a sua capacidade de renovação e sua conservação. Neste segmento, diversos nichos de mercado
são identificados, como por exemplo, a
observação de aves, safari fotográfico, a
observação da flora, dentre outras atividades.
Se por um lado ainda pairam muitas reticências e hesitações sobre o ecoturismo, novos segmentos e oportunidades
têm sido detectados a partir do uso mais
freqüente da internet como via de acesso às informações e ao intercâmbio entre
produtores e consumidores.
Uma tendência começou a se firmar
nos últimos anos da década de 90, com
os turistas procurando reunir dados sobre
locais para onde viajar, estabelecimentos
para hospedagem e alimentação, além de
opções de entretenimento. Percebendo
esse direcionamento do mercado, é necessária a adaptação desse modo operacional
incorporando a internet como meio de
comunicação e comercialização, até sob
pena de ameaça da continuidade dessa
atividade, porque a tendência é que o ecoturista chegue cada vez mais próximo a
fonte, ou seja, contatando-se com pessoas
e instituições cada vez mais próximas do
destino que deseja visitar.
Outra oportunidade adveio da queda de disponibilidade financeira decorren-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
52
te dos problemas enfrentados pelo sistema
monetário brasileiro, com a desvantagem
da moeda frente ao dólar. Os turistas passaram a procurar opções mais econômicas
de turismo, através de pacotes de menor
duração.
Não há diferenciação legal entre o
turismo tradicional e o ecoturismo. Este
caracteriza-se pela postura ética dos empresários, profissionais e turistas, valorizando os patrimônios natural e cultural
como foco de interesse pela adequada
interpretação ambiental desse patrimônio,
respeitando as comunidades locais, envolvendo economicamente essas comunidades, respeitando as condições naturais
(conservação do ambiente) e promovendo
a interação educacional. Proporcionar ao
turista que ele incorpore para sua vida o
que aprende em sua visita, gera consciência para a preservação da natureza e do
patrimônio histórico-cultural.
A rapidez do avanço tecnológico,
a evolução dos transportes e o progresso
das comunicações possibilitam a redução
das distâncias de maneira notável, permitindo que mais pessoas se desloquem para
qualquer parte do mundo em questão de
horas.
Existem cada vez mais turistas
procurando novas atividades, querendo
aprender, desejando participar de novos
entretenimentos e práticas esportivas,
buscando conhecer o modo de vida nas
áreas que visitam.
O ecoturismo se caracteriza pela
valorização do patrimônio natural e cultural como foco de interesse do visitante
e pela adequada interpretação ambiental
desse patrimônio.
O ecoturismo exige uma postura
diferenciada do turista. Existem algumas
condições básicas a serem analisadas para
que a atividade possa se desenvolver com
êxito: respeito às comunidades locais;
envolvimento econômico efetivo das comunidades locais; respeito às condições
naturais, levando-se em consideração a
conservação do meio ambiente; intera-
ção educacional, a garantia que o turista
incorpore para sua vida o que aprende
em sua visita, gerando consciência para a
preservação da natureza e do patrimônio
histórico/cultural/étnico.
De acordo com informações fornecidas pelo IEB o mercado ecoturístico no
Brasil corresponde a mais de meio milhão
de pessoas que praticam o ecoturismo.
Mesmo como atividade econômica recente, o ecoturismo deve empregar no Brasil, diretamente, mais de 30 mil pessoas,
através de pelo menos 5 mil empresas e
instituições privadas.
Para a Organização Mundial do Turismo, enquanto o turismo cresce 7,5% ao
ano, o ecoturismo cresce mais de 20%.
Estima-se que o ecoturismo represente
5% do turismo mundial, devendo na próxima década alcançar 10%.
No Brasil, o ecoturismo é discutido
desde 1985. No entanto, nem os esforços
governamentais, nem os privados foram
suficientes para ultrapassar as barreiras
entre a teoria e a prática do ecoturismo.
Pontificam-se entre essas barreiras
a ausência de consenso sobre a conceituação do segmento, a falta de critérios, regulamentações e incentivos que orientem
empresários, investidores e o Governo, no
estímulo e na exploração do potencial das
belezas naturais e valores culturais disponíveis, ao mesmo tempo em que promova
a sua conservação.
Em conseqüência, o ecoturismo
praticado no Brasil é uma atividade ainda
desordenada, impulsionada pela oportunidade mercadológica, deixando de gerar os
benefícios sócio-econômicos e ambientais
esperados e comprometendo o conceito e
a imagem do produto ecoturístico brasileiro nos mercados interno e externo.
É o mercado que definirá questões
aparentemente simples nas decisões para
elaboração de roteiros, por exemplo, o
tempo de duração da viagem e dos passeios, a abordagem e o enfoque dado a
determinado atrativo.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
53
De acordo com a EMBRATUR
(1991), no Brasil não existem roteiros
ecoturísticos que ofereçam saídas regulares com mais de oito dias de duração para
o mesmo Estado. Tal fato é conseqüência
do tempo médio de férias do ecoturista,
uma semana para usufruir um pacote turístico. Destaca-se que mesmo destinos
muito ricos em atrativos, e que possuem
capacidade para roteiros mais longos,
apresentam produtos diferenciados em
módulos de sete ou oito dias.
Em contrapartida, o ecoturista estrangeiro não vai se deslocar de grandes
distâncias e com elevados custos de transporte aéreo para permanecer um tempo
reduzido no país escolhido. Ao consultar
os catálogos de empresas internacionais
de oferta de produtos ecoturísticos, descobre-se que nos mercados externos usualmente são utilizados roteiros de duas ou
três semanas de duração.
Os impactos negativos e positivos
que poderão advir da atividade de ecoturismo estão, a princípio, relacionados
a danos potenciais ao meio ambiente e à
comunidade e, por outro lado, aos benefícios sócio-econômicos e ambientais, esperados a nível regional e nacional.
Com efeito, a fragilidade dos ecossistemas naturais, muitas vezes, não comporta um número elevado de visitantes e,
menos ainda, suporta o tráfego excessivo
de veículos pesados. Por outro lado, a infra-estrutura necessária, se não atendidas
normas pré-estabelecidas, pode comprometer de maneira acentuada o meio ambiente, com alterações na paisagem, na
topografia, no sistema hídrico e na conservação dos recursos naturais florísticos
e faunísticos.
A falta de guias turísticos especializados já é tida como uma das maiores
carências do mercado. Um guia de ecoturismo precisa ser muito bem preparado. O
visitante quer aprender a história do lugar,
o tipo de fauna e flora e conhecer as lendas da região.
Revista Integralização Universitária
O alojamento das populações locais
se configura, também, como outro risco,
pois a presença de operadores, quase sempre sem nenhuma relação orgânica com a
região, pode gerar novos valores incompatíveis com os comportamentos locais,
ocasionando conflitos de ordem cultural e
de outras ordens.
O turismo envolve um número muito grande de pessoas. A renda que provém
e circula com o turismo beneficia as populações e movimenta, consideravelmente,
a economia da região de onde ele é desenvolvido.
As comunidades muito mais do que
meros beneficiários desta atividade são
na verdade atores importantíssimos do
processo, como elementos que podem ser
integrados ao desenvolvimento do ecoturismo, começando pelo estágio preliminar
de planejamento até a sua implementação
e operação, ficando sempre atentos para
superar o desafio de envolverem-se integralmente num sério compromisso com a
natureza e com a responsabilidade social.
Sendo assim, a questão central a
ser tratada diz respeito à capacitação e
inserção das comunidades no processo
de desenvolvimento ecoturístico. Devese dedicar muita atenção à solução desse problema que, por envolver elementos
humanos e culturais não depende exclusivamente de recursos financeiros. A capacitação se faz necessária, tanto nas esferas
governamentais dos municípios e do Estado, quanto para os moradores das cidades receptivas.
O planejamento em todos os níveis
é fundamental para a implantação do ecoturismo como elemento impulsionador do
desenvolvimento regional e na melhoria
da qualidade de vida dos moradores da
localidade envolvida. Identificou-se que
a maioria dos municípios estudados apresenta problemas econômicos devido à
inexistência de atividades produtivas consolidadas. Acredita-se que o ecoturismo
poderá promover o incremento dos processos sociais e agregar valores aos pro-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
54
dutos regionais, disponibilizando novas
oportunidades às comunidades. Porém,
para se consolidarem, exigirão mudanças
de mentalidade, de métodos organizacionais e de visão econômica.
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Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
55
GESTÃO
Análise dos impactos de um sistema de avaliação de desempenho aos
colaboradores internos de uma organização
Roseli Vieira Pires1
Rubia Mara Martins Peixoto2
Resumo: O objetivo do presente trabalho consiste em analisar os impactos que
a avaliação de desempenho adotado em
uma organização causa nos colaboradores internos. Para isso, foi elaborada,
primeiramente, a evolução histórica da
avaliação, evidenciando conceitos e necessidades que as empresas sentiram de
avaliar seus colaboradores. Em seguida, é
apresentada a avaliação dentro da organização pesquisada, é o sistema de avaliação. Após, discorremos sobre a avaliação,
vimos nesse momento, os aspectos ligados à prática de feedback. Procuramos
demonstrar neste trabalho, que no sistema
de avaliação de 360 graus é importante ter
um grande entendimento por parte dos colaboradores, enfim, que os impactos são
grandes e o papel da empresa é de grande
importância, pois é dela a responsabilidade de estabelecer parâmetros para que o
processo de avaliação tenha sucesso junto
aos colaboradores da empresa.
Palavras-Chaves: Desempenho. Avaliação. Competitividade. Produtividade. Organizações.
Abstract: The objective of the present
work consists of analyzing the impacts
that the evaluation of performance adopted in an organization, they cause in the
internal collaborators. For this, it was elaborated, first, the historical evolution of
the evaluation, evidencing concepts and
necessities that the companies had felt
to evaluate its collaborators. After that,
the evaluation inside of the searched organization is presented, is the evaluation
system. After, we discourse on the evaluation, we demonstrate at this moment, on
Revista Integralização Universitária
aspects to the practical one of feedback.
We look for to demonstrate in this work,
that in the system of evaluation of 360 degrees is important, to have a great agreement on the part of the collaborators,
at last, that the impacts are great and the
paper of the company is of great importance, therefore is of it the responsibility
to establish parameters for the evaluation
process has success next to the collaborators of the company.
Key - Words: Performance; Evaluation;
Competitiveness; Productivity; Organizations.
1 Introdução
A avaliação de desempenho assume
um papel fundamental nas organizações
nos dias de hoje. Diante das mudanças
dos ambientes empresariais, exigências
dos clientes, concorrência agressiva e
margem de lucros reduzidos, as empresas
devem atuar de forma pró-ativa buscando
um melhor posicionamento no mercado.
Isso se dá através de uma valorização dos
colaboradores internos.
A empresa objeto deste estudo atua
em um mercado, que nos últimos anos,
tornou-se altamente competitivo. No
passado, possuía uma situação estável e
dominante, enquanto que no presente trabalha com a instabilidade e fortes concorrentes.
Diante disso, a empresa vem adotando uma gestão mais orgânica, buscando capacitar seus colaboradores internos,
e principalmente avaliando seus desempenhos, possibilitando assim, um aumen-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Roseli Vieira Pires
– Mestre em Desenvolvimento Organizacional – FACECAMG, Coordenadora e
Professora do Curso
de Administração –
Instituto Aphonsiano
de Ensino Superior.
Email:roselipires@
brturbo.com.br
Fone-(62) 3505-1913
1
Rúbia Mara M. Peixoto – Graduada em
Administração pelo
Instituto Aphonsiano
de Ensino Superior.
Email: [email protected]
2
56
to na produtividade e maior competitividade.
2 Avaliação de desempenho
Em todas as circunstâncias e momentos será avaliado tudo o que acontece
ao nosso redor. A avaliação do desempenho é também fato corriqueiro nas organizações. É por intermédio da avaliação do
que ela produz que a organização consegue reciclar-se, oxigenar-se e sobreviver
em ambientes turbulentos e mutáveis.
As várias práticas de avaliação do
desempenho não são novas. Desde que
uma pessoa deu emprego à outra, seu trabalho passou a ser avaliado em termos de
relação entre custo e benefício. Mas as
organizações sempre se defrontam com
a necessidade avaliar os mais diferentes
desempenhos: financeiros, operacionais,
técnicos, vendas e marketing. Como está
a qualidade dos produtos, a produtividade da empresa, o atendimento ao cliente.
E principalmente, como está o desempenho humano. Afinal são as pessoas que
dão vida à organização. Elas constituem a
mola-mestra da dinâmica organizacional.
Na moderna organização não há
mais tempo para remediar um desempenho humano, precisa ser excelente em todos os momentos para que a organização
tenha competitividade para atuar e sair-se
bem no mundo globalizado de hoje, mas
para isso é preciso muito empenho. A
Avaliação de Desempenho certamente é a
que apresenta maior eficiência e eficácia
para a organização, mas desde que adequadamente adaptadas às particularidades
e cultura das pessoas e das organizações.
2.1 O SURGIMENTO DA NECESSIDADE DE AVALIAR
Existia uma preocupação que estava em obter aumento na produtividade
por meio da eficiência da máquina. Nesta
abordagem as organizações tiveram grande sucesso, conseguiram resolver as questões relacionadas à máquina, mas referen-
te às questões relacionadas ao homem no
trabalho nada foi feito, pois com o sucesso que estavam tendo no momento com o
desenvolvimento das máquinas, achavam
que era o suficiente. Acreditava-se que o
homem era parte integrante da máquina
motivado somente por incentivos financeiros, esquecendo seu lado motivacional.
Segundo Silva,
O objetivo básico da administração científica era incrementar a produtividade do trabalhador por meio de uma análise científica
sistemática do trabalho do empregado...Na
primeira metade do século XX, surgiu o
movimento das relações humanas que foi
um esforço combinado do teórico e prático,
para fazer os gerentes mais sensíveis ás necessidades dos empregados. (2000, p.121 e
199)
A valorização do ser humano passa a ser um novo enfoque à escola das
relações humanas, onde a forma de ver
o colaborador, de obter resultados e a
preocupação passou da máquina para o
homem e se verificou que o aumento da
produção estava condicionado com a satisfação do colaborador que passou a ser
tratado como um ser integrante da organização. A partir dessa abordagem começou
a haver mudanças na forma de tratar os
colaboradores, surgiram vários estudos
sobre como conhecer e medir o potencial
das pessoas. Este enfoque está embasado
em aspectos motivacionais, psicológicos
e comportamentais dos indivíduos, com
isso as organizações com visão no futuro
compreenderam a grande importância dos
recursos humanos no desenvolvimento
organizacional.
2.2 CONCEITO DE AVALIAÇÃO DE
DESEMPENHO
A avaliação tem como principal objetivo analisar o desenvolvimento do colaborador, promovendo um melhor crescimento pessoal e profissional. Avaliar o
desempenho de um colaborador não está
ligado somente ao estímulo salarial, mas
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
57
ao desenvolvimento individual e organizacional possibilitando através da mensuração do desempenho tomar decisões
quanto a promoções, ajustes salariais e
treinamentos para o alcance dos resultados.
Para Chiavenato,
A avaliação ou administração de desempenho é um método que, visa, continuamente, estabelecer um contrato com os
colaboradores referente aos resultados desejados pela organização, acompanhar os
desafios propostos, corrigindo os rumos,
quando necessário, e avaliar os resultados
conseguidos. (1997, p.337)
Para avaliar o desempenho do colaborador é necessário analisar vários indicadores, tais indicadores de desempenho
estão relacionados com o esforço individual. É um instrumento que visa medir a
competência do colaborador.
A avaliação é um processo que se
inicia com o planejamento e termina com
a comparação entre o executado e o planejado. Deve ser considerada como uma
função estratégica pelas organizações e o
ponto de partida para o progresso, buscando melhoria para o desempenho dos colaborados e crescimento organizacional.
O homem é um ser que possui necessidades, desejos e sentimentos que precisam ser considerados e analisados, pois
influenciam o comportamento e o desempenho dos colaboradores da organização.
O colaborador no processo de
avaliação de seu potencial terá a oportunidade de conhecer seus pontos fortes e
fracos, e de tomar ações para melhorar o
seu desempenho se necessário. O “feedback” irá proporcionar o retorno sobre o
trabalho desenvolvido e funcionará como
guia para ações futuras.
2.3 MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DE
DESEMPENHO
Segundo chiavenato (2004), a avaliação de desempenho, é um meio, um
método, uma ferramenta, e não um fim
Revista Integralização Universitária
em si mesmo. É um meio para obter dados
e informações que possam ser registrados,
processados e canalizados para a melhoria do desempenho humano nas organizações. Muitas vezes, pode servir de base às
políticas de promoção das organizações.
O processo é efetuado periodicamente,
normalmente com caráter anual, e consiste na análise objetiva do comportamento
do avaliado no seu trabalho e posterior na
comunicação dos resultados. Tradicionalmente compete aos superiores avaliarem
os seus subordinados, estando à avaliação
sujeita ao desempenho atual, formas de
melhorar o desempenho no futuro e metas
de carreira em um longo prazo. Existem
alguns métodos tradicionais que poderão
ser utilizados para avaliar desempenho,
esses métodos variam de uma organização
para outra, pois cada organização tende a
construir seu próprio sistema para avaliar. Os principais métodos tradicionais de
avaliação do desempenho são:
Métodos da Escala Gráfica; Método
de incidentes críticos; Método de escolha
forçada; Método de Pesquisa de Campo;
Método de Comparativo; Método de Frases Descritivas e o Método de 360 graus.
Existem diversos métodos de avaliar o desempenho, tanto nos aspectos relacionados com a própria avaliação e com
as prioridades envolvidas, quanto na sua
mecânica de funcionamento, pois há uma
tendência de cada organização ajustar os
métodos as suas peculiaridades e necessidades.
As novas tendências em avaliação
do desempenho, segundo Chiavenato
(2004), é que, a era da informação trouxe
dinamismo, mudança e competitividade.
A única alternativa de sobrevivência das
organizações nesse contesto é buscar a
excelência sustentada, pois a excelência
é a base da lucratividade, muitas organizações têm como objetivo estar sempre
em busca, mas para isso acontecer muitas empresas vem utilizando a redução de
níveis hierárquicos, onde traz a aproximação dos chefes com os subordinados,
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
58
com isso vem trazendo novas tendências
na avaliação do desempenho humano. É
de grande importância que o colaborador
precise estar motivado para apresentar
planos, propor correções e sugerir novas
idéias.
2.3.1 Desvantagens dos sistemas tradicionais
Muitas das metodologias de avaliação apresentam vícios de julgamento
que evidenciam sua precária objetividade,
provocando efeitos negativos. A subjetividade do processo pode ser atribuída a
várias causas: julgamento, avaliadores,
processo, política da organização e inflexibilidade do método.
Para Chiavenato,
Os métodos tradicionais de avaliação do
desempenho apresentam certas características ultrapassadas e negativas...A preocupação atual é desenvolver métodos capazes
de dirigir os esforços das pessoas para objetivos e metas que sirvam ao negócio da
empresa e aos interesses individuais das
pessoas na melhor forma possível de integrar objetivos organizacionais e objetivos
Individuais... (1999, p.200).
Existe também o erro de julgamento, que é uma das causas freqüentes da
subjetividade da avaliação. Pode existir
um erro constante, em que o avaliador
tende a avaliar exageradamente alto ou
exageradamente baixo, ou ainda a classificar todos os colaboradores de igual forma. Pode dar-se um erro de viés, em que
uma característica do colaborador, por ser
avaliada demasiado alta, influencia a apreciação global. O julgamento não meditado por parte do avaliador, provocado por
pressa, aversão à discriminação, ou outros
motivos, penaliza os colaboradores injustamente avaliados. E pode ocorrer o erro
de prestígio, em que o avaliador tende a
dar importância a determinadas características, fugindo ao peso dos parâmetros
estabelecidos.
Nem sempre o avaliador está presen-
te para observar o comportamento dos colaboradores, fato que pode provocar uma
desigualdade injusta de avaliações. Um
dos pontos fortes que vem apresentando
grande efeito nas avaliações é a política
da organização, em muitas organizações
a avaliação de desempenho é apenas um
mero ritual, sendo considerada uma perda
de tempo. Muitas avaliações ocorrem desigualdades e injustiças, pois um pequeno
fato que ocorre com um colaborador, tira
a credibilidade de todo o processo e gera
desmotivação.
Existem também os efeitos negativos quanto a questão da periodicidade da
avaliação de desempenho. Poderá ajustá-la também em casos de promoções,
adequação do indivíduo ao cargo, ajuste
salarial ao bom desempenho e outros, ou
seja, a avaliação deve ser um processo
contínuo na vida da organização.
Na realidade atual caracterizadas
pelas contínuas mudanças de padrões de
comportamento pessoal, profissional, cultural e organizacional, para manter sua
competitividade as organizações necessitam reformular seus modelos e práticas de
gerenciamento de desempenho.
2.4 A AVALIAÇÃO POR COMPETÊNCIAS
Esta avaliação por competências
é a primeira etapa para mudança, onde
consiste na reformulação do papel dos
colaboradores no sistema de avaliação. O
colaborador irá fazer uma auto-avaliação,
onde será identificado não apenas seus
pontos fracos, mas seus pontos fortes e
seus potenciais.
As organizações nestes últimos
tempos vêm buscando talentos humanos
que antes nunca foram tão assediados e
valorizados quanto nesta década. Afinal
o que é mais vantajoso? Investir naqueles que já estão engajados na cultura e nos
empreendimentos em andamento, que
têm potencial para ir mais além? Ou contratar mais pessoas para ocupar as funções
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
59
novas e cargos vagos? É evidente que em
algumas ocasiões, injetar “sangue novo”
pode ser tão saudável quanto estratégico
para a efetivação de mudanças. Porém,
torna-se cada vez mais comum reconhecer os méritos dos colaboradores que se
destacam no dia-a-dia de trabalho e darlhes a oportunidades para ampliar seu
campo de desafios. O resultado vem com
a motivação das pessoas e no aumento do
nível de competitividade da organização
que valoriza o potencial de suas equipes.
A idéia chave para a avaliação por
competência é a de que o colaborador
sabe ou pode aprender a identificar suas
próprias competências, necessidades,
pontos fortes, pontos fracos e metas. Desta forma, ele é a pessoa mais capaz de determinar o que é melhor para si. O papel
dos superiores e da área de RH passa a ser
o de ajudar o colaborador a relacionar seu
desempenho às necessidades e à realidade
da organização.
As organizações e pessoas, lado a
lado, têm um processo contínuo de troca
de competências. De um lado a empresa
transfere seu patrimônio para as pessoas, enriquecendo-as e preparando para
enfrentar novas situações profissionais e
pessoais, dentro ou fora da organização, e
dando continuidade às pessoas ao desenvolver sua capacidade individual, transferem para a organização seu aprendizado,
dando um potencial para o mercado.
No ponto de vista de Graminia
(2002), é possível pensar na avaliação de
desempenho por competências como um
poderoso meio de identificar os potenciais
dos colaboradores, melhorar o desempenho da equipe e a qualidade das relações
dos colaboradores e superiores, assim
como estimular os colaboradores a assumir a responsabilidade pela excelência
dos resultados pessoais e empresariais,
pois, são as pessoas que ao colocarem
em prática suas qualidades junto ao patrimônio de conhecimentos da organização,
concretizam as competências organizacionais com grande sucesso.
Revista Integralização Universitária
A Gestão por Competências é uma
ferramenta que identifica as competências
essenciais, as habilidades e conhecimentos determinantes da eficácia profissional
e também as lacunas de qualificação do
colaborador para tarefas específicas e fornece recursos para aperfeiçoar suas capacidades.
Para implantar o sistema de gestão por competências, o primeiro passo
é definir as competências técnicas, conceituais e as interpessoais, dentro de cada
função. É importante salientar que definir
competência não é definir tudo aquilo que
o colaborador faz, mas determinar quais
capacitações devem ser fomentadas, protegidas ou diminuídas.
A implantação desta avaliação toma
por base as competências pessoais, é imprescindível que tenhamos consciência da
agilidade, mobilidade e inovação que as
organizações precisam para lidar com as
mudanças constantes, ameaças e oportunidades emergentes que são um fator real,
ou seja, um risco que toda organização
passa a ter quando entra no mercado competitivo, onde as organizações deverão
competir não mais apenas mediante aos
produtos, mas por meio de competências,
buscando atrair e desenvolver pessoas.
2.5 FALHAS MAIS COMUNS EXISTENTES NOS SISTEMAS DE AVALIAÇÕES
Para Lucena (1992), o ambiente organizacional está repleto de contradições,
paradoxos e ambigüidades, que acabam
prejudicando qualquer que seja o sistema
que venha a ser implantado para a avaliação de desempenho, pois, falhas existem
em qualquer lugar. Estas falhas podem ser
ajustadas de acordo com a visão crítica
que deverá vir desde o método implantado na organização, a gerência e o funcionário que estarão sendo avaliados, como
exemplos citados abaixo:
•Não comprometimento da Alta
Administração
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
60
•Despreparo gerencial para administrar pessoas
•Retorno dos Resultados da Avaliação de Desempenho
•Desempenho e Mérito.
2.6 A AVALIAÇÃO COMO FENÔMENO NATURAL
A valorização e o estudo da percepção humana em seu estágio inicial valorizaram o mundo exterior do indivíduo
como foco do processo perceptivo. Esta
é uma tendência humanística embasada
em princípios que se preocupam com os
aspectos motivacionais, psicológicos e
comportamentais dos indivíduos.
Em estudos realizados com o ser
humano, foi percebido que a influência
do repertório psicológico, ou seja, das
experiências vividas, emoções, condições
intelectuais e motivações sobre a sua
percepção do mundo, o homem tem um
caráter eminentemente individual, apesar
de algumas de suas características serem
passíveis de generalização para todo ser
humano.
Para Bergamini e Beraldo,
Entender como o homem conhece o mundo, como organiza esse conhecimento e
como o utiliza, tem sido uma preocupação
que tanto os filósofos como os psicólogos
têm tentado, ao longo do tempo, resolver.
(1988, p.14).
Então pode-se dizer que, o ciclo
do processo perceptual entre as pessoas
se fecha com a elaboração de uma teoria
sobre a personalidade do outro. Isso, na
verdade, é nada mais, nada menos que
atribuir-lhe um valor. Avaliar o outro em
função dos nossos padrões é, portanto, um
comportamento natural e típico do ser humano. Trata-se de uma realização que precisa ser vivida com muita arte. Trata-se da
construção pelo indivíduo de sua própria
escala de valores. Trata-se do desenho específico que cada um vai fazendo, durante
sua existência, a partir do modelo de sua
matriz de identidade.
2.7 AVALIANDO O DESEMPENHO
HUMANO NO TRABALHO
O valor humano do colaborador na
organização deve envolver uma qualidade
de vida que traga alguns fatores que possa
vir a ter um resultado onde, satisfaça tanto
o colaborador quanto a organização. Esses
fatores podem ser: condições de trabalho
com segurança; remuneração e benefícios
adequados; supervisão competente; feedback quanto ao desempenho no trabalho;
oportunidades para aprender e crescer no
emprego; possibilidade de promoção etc.,
todos esses fatores geram satisfação ao
colaborador e o mesmo produzindo com
satisfação o crescimento organizacional é
sem dúvida surpreendente.
Segundo, Bergamini e Beraldo,
A organização pode ser entendida como
uma realidade social, integrada por diferentes pessoas, que se comportam realizando atividades, isto é, trabalham, no sentido
de produzir um resultado final comum, ou
seja, atingir os objetivos do empreendimento. (1988, p.31)
Para a organização e o colaborador
o produto dessa relação custo x benefício para ser satisfatório, só é possível fazer uma analise, mediante a utilização de
instrumentos que permitam avaliar, com
razoável precisão, o quanto, organização
e colaborador, estão obtendo de gratificação, ou seja, será um método de avaliação
que possa trazer resultados para ambas as
partes.
Avaliar o desempenho das pessoas
no trabalho implica conseqüentemente,
conhecer a dinâmica comportamental própria de cada um, o trabalho a ser realizado
e o ambiente organizacional em que essas
ações se passam, ou seja, o ponto central
desse processo é o desempenho profissional do avaliado naquela função ou tarefa
que lhe foi atribuída.
2.8 ESTIMATIVAS DE DESEMPENHO
A Avaliação de Desempenho nas
organizações é um processo que busca au-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
61
xiliar na estruturação de uma visão mais
objetiva do potencial de cada colaborador,
com isso buscando a estimativa de aproveitamento do potencial individual das
pessoas no trabalho e, por isso, do potencial humano de toda a empresa.
Para Bergamini e Beraldo,
Raramente, no entanto, se conseguirá tirar
todo o proveito que a avaliação de desempenho pode oferecer a uma empresa, se não
examinarmos com cuidado o levantamento
do potencial das pessoas, feito através dos
testes e inventários psicológicos. (1988, p.
34).
Um dos momentos principais para
dar início ao conhecimento do potencial
do colaborador é no momento do processo
de admissão ao trabalho, é como se fosse
a matéria-prima para a fabricação de um
produto com qualidade, onde deverão ser
analisados os fatores que mais se agregam
ao cargo pré destinado.
O levantamento do potencial das
pessoas se verifica não só em termos
quantitativos, ou seja, o quanto o indivíduo pode render no trabalho, mas também
em termos qualitativos. O que o comportamento do individuo poderá trazer futuramente a empresa como bom resultado,
seja ele quanto à qualidade do serviço e
o rendimento que proporcionará a empresa, pois, quando se tem um colaborador
qualificado, sucessivamente seu produto
será de qualidade. Tudo isso poderá ser
analisado no momento da admissão, através de testes avaliativos, psicotécnicos e
entrevistas, onde se torna um processo de
admissão que visa alcançar os objetivos
pretendidos conforme a necessidade da
organização e também trazendo ao colaborador um plano de carreira satisfatório
ao desempenho que venha adquirir.
2.9 A EFICIÊNCIA E EFICÁCIA DE
DESEMPENHO Para a organização, os fatores que
definem a eficiência e a eficácia estão sendo o fator chave para a mudança de seus
Revista Integralização Universitária
resultados, pois, não basta apenas ser eficiente, deve ser eficaz também. Sendo a
eficiência produto do grau de adequação e
qualidade com que uma pessoa realiza determinada atividade ou tarefa, e a eficácia
está relacionada ao fato de a pessoa fazer
o que tem que ser feito, apresentando conseqüentemente o resultado esperado.
Para Bergamini e Beraldo,
O desempenho eficiente é, portanto, aquele
que atende em alto grau às manifestações
dos traços de personalidade, utilizados adequadamente na realização de uma tarefa...
surgiu a possibilidade de atentar para que
as pessoas produziam, ou seja, para o resultado em si, e não mais a forma com que
atingiam o resultado em questão. (1988, p.
37)
A Avaliação de Desempenho, enquanto processo de julgamento sistemático de pessoas, pode-se dizer, utilizouse predominantemente desse enfoque ao
longo do tempo, trazendo a melhoria da
qualidade, onde supõe que as pessoas devam ser melhoradas continuamente, tanto
o seu lado profissional como pessoal, isto
é, dar continuidade ao que o colaborador
tem de eficiente e eficaz.
Para que um sistema de avaliação
de desempenho tenha sucesso em uma
organização, é preciso que se recoloque a
questão da valorização humana no centro
da organização, pois nenhuma organização poderá oferecer produtos/serviços de
qualidade se seus colaboradores não tiverem um nível de qualidade de vida, ou
ambiente de trabalho adequado.
2.10 BENEFÍCIOS DA AVALIAÇÃO
DE DESEMPENHO
A avaliação de desempenho traz
muitos benefícios à organização, deve ser
vista como um instrumento valioso, mas é
preciso para isso fazer romper as amarras,
superar os desafios e tirar o máximo de
proveito desta ferramenta.
A avaliação de desempenho é uma
das ferramentas primordiais que ajuda a
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
62
melhorar os resultados dos recursos humanos dentro da organização tornando-se
essencial e necessário para o planejamento estratégico de uma organização. Ao planejar a organização precisa é necessária a
visão generalista e comprometida com o
indivíduo.
Para Chiavenato,
Um programa de avaliação do desempenho, quando bem planejada, coordenado e
desenvolvido, normalmente traz benefícios
a curto, médio e longo prazo. Os principais
benefícios são geralmente: o indivíduo, o
gerente, a organização e a comunidade.
(2004, p.264).
A organização ao implantar um
programa de avaliação de desempenho
deve estar pronta para receber várias mudanças, e muitas dessas são benéficas, em
que cada um ganha ao ser avaliado e avaliador, pois é um grande desafio à organização, e dependerá de muitas para que
tudo ocorra dentro do planejado, pois sob
condições adequadas, a avaliação de desempenho é um caminho para a busca da
excelência nas organizações.
3 Método de avaliação utilizado na
organização pesquisada
3.1 A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO
NA ORGANIZAÇÃO
A organização pesquisada adota
atualmente para avaliação de desempenho, onde entende que a avaliação de desempenho deva seguir alguns conceitos e
objetivos através do sistema de avaliação
de 360º.
3.1.1 Avaliação de 360º
Por conta das pressões advindas da
competitividade após os anos 90, várias
empresas têm buscado alternativas ou modelos de avaliação de desempenho mais
condizentes com as atuais necessidades
organizacionais e do público interno.
Percebe-se, claramente, a necessi-
dade de propiciar um ambiente de trabalho mais desafiador e estimulador, descentralizando e delegando responsabilidades,
melhorando os sistemas de remuneração e
propiciando benefícios flexíveis.
Para fazer frente às expectativas
organizacionais, procuram-se, assim, pessoas com certo grau de autoconhecimento
pessoal e profissional e que possuam competência interpessoal, atuando de maneira
assertiva em suas relações de trabalho.
É bem pouco provável que uma
pessoa consiga obter autoconhecimento
pessoal e profissional, bem como a habilidade da assertividade, se não receber feedback a respeito de seu comportamento na
empresa, ou seja, sobre o que faz de correto e sobre os pontos em que necessita de
ajustes. Nesse contexto, faz-se necessário
criar instrumento para auxiliar a pessoa
a se reposicionar, e a organização optou
como método de avaliar seus colaborados
a Avaliação 360º que poderá servir para
atingir este objetivo.
Entende-se por Avaliação de Desempenho 360º aquela que pressupõe uma
comparação entre a percepção dos pares
no trabalho, do superior imediato, dos subordinados diretos, clientes, fornecedores
e a percepção que o ocupante do cargo tem
de si mesmo no exercício das atividades,
fechando, assim, um círculo de 360º.
A Avaliação 360º é um processo no
qual um indivíduo é avaliado por seu superior, pelos pares, por si próprio (autoavaliação) e algumas vezes até por clientes. Após o desenho da pesquisa, que é
feito baseado nos valores e cultura da organização, ela será aplicada tanto ao avaliado quanto aos outros colaboradores da
equipe selecionada (para cada avaliado),
e deve ser respondida dentro de critérios
de muita honestidade e respeito. Após a
análise pelo profissional responsável pela
compilação de dados, inicia-se a sessão
de feedback, onde cada participante tomará conhecimento da sua avaliação, que
consiste na auto-avaliação, o resultado
apurado nos questionários e um relatório
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
63
individual, que demonstra os resultados
da sua auto-percepção e a percepção externa.
3.1.2 Abordagem metodológica
A avaliação de desempenho atualmente aplicada aos colaboradores tem
como objetivo adicionar valor para todos
os membros da organização. Portanto, um
método de avaliação e desempenho bem
aplicado deve identificar e dar prioridade
a todas as atividades importantes destinadas a atingir objetivos da organização.
A pesquisa metodológica é o estudo
que se refere a instrumentos de captação
ou de manipulação da realidade. Está,
portanto, associada a caminhos, formas,
maneiras, procedimentos para atingir determinado fim. Construir um instrumento
para avaliar o grau de descentralização
decisória de uma organização é exemplo
de pesquisa metodológica.
A aplicação do questionário segundo Roesch (1999) é como a técnica de investigação composta por um número mais
ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses, expectativas,
situações vivenciadas etc., Onde deverá
ser objetivo limitado em extensão e estar
acompanhado de instruções esclarecendo
a sua finalidade e facilitando o seu preenchimento, podendo ser perguntas abertas,
fechadas ou de múltiplas escolhas. A escolha pelo formato do preenchimento será
de acordo com o campo de pesquisa a ser
avaliado, onde irá perceber qual o modelo
poderá lhe trazer resultados reais e mais
concretos.
3.1.3 Coleta de dados
Como instrumento de coleta de dados utilizou-se um questionário fechado
com 12 questões, sendo, o procedimento
mais utilizado para se obter informações
e garantindo o anonimato dos entrevistados, deixando-os à vontade para responRevista Integralização Universitária
derem as indagações. Pois o questionário
é um dos métodos de coletas mais livre
para exprimirem suas opiniões sobre o
que vem ocorrendo no dia a dia da organização e que muitos temem ser rejeitados
ou que poderiam colocá-las em situações
desagradáveis, caso apresente de forma
direta.
Quanto ao pré-teste, sua aplicação
teve como objetivo evidenciar possíveis
falhas na redação do questionário, tais
como: complexidade das questões, imprecisão na redação, desnecessidade das
questões, constrangimentos ao informante e exaustão, assegurando assim a validade do instrumento de coleta de dados na
pesquisa aplicada.
4 Diagnóstico do estudo realizado na
organização do processo de avaliação
O sistema de avaliação de desempenho sempre esteve presente no processo evolutivo da humanidade, é o que
a empresa vem também buscando desde
sua criação. O ser humano está constantemente sendo avaliado pelos membros da
sociedade. Na organização, é um processo
presente e de grande importância para a
vida dos colaboradores e do futuro da organização, é uma preocupação que a empresa vem demonstrando.
O principal objetivo da avaliação
é promover ao colaborador um melhor
crescimento pessoal e profissional, isto
não está ligado somente a estímulo salarial, mas ao desenvolvimento individual
e organizacional. Percebe-se que a empresa tem a preocupação em estar sempre
buscando a melhoria para a satisfação do
colaborador, apesar de que nos últimos
semestres, vem deixando a desejar esta
qualidade que antes era vista de outra forma pelos colaboradores, ou seja, existe a
desmotivação dos colaboradores em se
tratando de avaliação de desempenho.
A avaliação de desempenho que a
empresa, atualmente utiliza é o método
360º, está sendo aplicada uma vez ao ano,
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
64
onde muitas vezes deixa a desejar, o ideal
seria que as avaliações ocorressem ao final de cada semestre para que o desempenho dos membros pudesse ser constantemente melhorado, acarretando, com isso,
progresso e melhoria de desempenho.
Ao pesquisar sobre o grau de satisfação do sistema de avaliação e desempenho aplicado na empresa, percebe-se
que é necessário realizar um maior preparo e conscientização dos colaboradores. É
necessário deixar de forma clara que, toda
avaliação é um processo para estimular ou
julgar o valor, a excelência, as qualidades
de algumas pessoas. Com isso o objetivo
de avaliar cada membro da empresa de
modo que possam ser vistos defeitos e
virtudes em seu trabalho e, desta forma,
o avaliado poderá melhorar seu desempenho para o período seguinte ao da Avaliação. No que diz respeito às condutas
com pior avaliação, o avaliado deve concentrar-se num ou dois dos itens com pontuação mais baixa e neles focar o seu plano de ação. A partir daí, a empresa deve
facilitar os recursos para a formação e desenvolvimento necessários.
Para referir aos objetivos da melhoria devem-se considerar três aspectos:
•Objetivos de desenvolvimento
(por exemplo, resolução de problemas);
•Critérios de sucesso (por exemplo,
reconhecimento do meu chefe da melhoria da qualidade das decisões);
•Estratégias de desenvolvimento
(acompanhamento, leitura,...).
A empresa vem buscando com a
avaliação 360º um maior desenvolvimento individual dos colaboradores, e através
dos resultados obtidos das avaliações individuais propõe através do próprio colaborador e seus pares planos de ação para
que seja alcançado o desenvolvimento do
colaborador.
Percebe-se que o recurso humano
precisa estar mais presente na aplicação
da avaliação, pois, este é um fator chave
para que a avaliação seja um produto de
qualidade no resultado final para a organização, é necessário fazer cumprir as
regras da avaliação, seja no cumprimento de prazos da entrega de resultados, na
aplicação da avaliação, deve buscar a motivação para a realização da avaliação. O
envolvimento de todos os colaboradores é
um dos fatores principais para desenvolvimento da organização e também um dos
mais complexos.
Pela análise do questionário aplicado notou-se que existem planos de ação
claros e objetivos que colaboram com o
desenvolvimento do potencial do colaborador, mas que precisa ser melhorada a
forma de ser aplicado.
A avaliação de Desempenho pressupõe crescimento e crescimento pressupõe entendimento entre as pessoas, a
responsabilidade pela avaliação, ainda
que formalmente assumida pelo gerente,
na verdade, é de todos na organização. É
um ponto a ser desenvolvido na empresa,
pois esta avaliação dos desempenhos após
o plano de ação lançado fica na maioria
das vezes sem uma gestão para acompanhá-lo.
Isso significa que tanto o avaliador
como o avaliado deve estar habilitado
para se responsabilizarem de receber e dar
feedback um ao outro sobre seu desempenho. Só assim haverá desenvolvimento e
emergência da potencialidade individual
das pessoas.
A seleção dos avaliadores na empresa é muito importante porque a aceitação
da informação depende da credibilidade
das fontes. Por isso, os avaliadores são
no geral pessoas que exercem o mesmo
cargo e conhecem suficientemente bem
o trabalho do avaliado e as condições em
que ele as desempenha. E todos que participam do dia a dia do avaliado são seus
avaliadores
As respostas obtidas no questionário aplicado nos mostram que a maioria
dos entrevistados se sente mais à vontade
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
65
em ser avaliado do que avaliar. Isso demonstra uma fragilidade no que diz respeito ao crescimento da equipe e sim um
crescimento mais individual, nos mostra
ainda que as pessoas não estão totalmente
inseridas no processo de feedback, talvez
por receio de estarem “prejudicando” um
colega de trabalho. Isso seria mais facilitado se o feedback fosse transmitido no
cotidiano.
Conhecendo o avaliado a importância de seus pontos fortes e as dificuldades
que ocasionam seus pontos a desenvolver;
sabendo que pode contar com o supervisor
e a empresa no sentido de melhor aproveitar os primeiros e suprimir os segundos,
sentirá maior segurança e ânimo para uma
vida de trabalho orientada à auto-realização e à utilização tão integral quanto possível de suas potencialidades.
Tendo em vista o resultado do questionário aplicado podemos assegurar que
os entrevistados em sua maioria reconhece que adquire uma melhoria com o feedback, um dos pontos fracos que vem apresentando na empresa é a falta de feedback,
os colaboradores se sentem mais seguros
ao receber o feedback.
Com a pesquisa realizada percebese que a avaliação de desempenho que
está sendo aplicada na empresa, não vem
tendo o valor de importância que deveria,
pois um ponto a desenvolver é a questão
da periodicidade da avaliação, apesar de
ser tradicionalmente anual, não existe um
período para avaliar como estão sendo
praticados e alcançados os planos de ações
estabelecidos, ou seja, se estão cumprindo
de acordo com o que ficou estabelecido,
ficando esta analise somente para a próxima avaliação, onde muitas vezes o colaborador já nem lembra mais o que ficou
para ser desenvolvido e melhorado.
É necessário realizar treinamento
que irá proporcionar o crescimento pessoal do colaborador, também deixa maior
avanço na organização, pois o colaborador necessita de desejos e sentimentos
que precisam servir de estímulos para
Revista Integralização Universitária
produzir o esperado e ter uma evolução
profissional.
Percebe-se que a organização tem
forte tendência na valorização do ser humano, pois envolve uma qualidade de
vida que lhes proporciona alguns fatores
que trazem também benefícios/resultados
onde ambas as partes ficam satisfeitas,
onde os fatores apresentados são remuneração e benefícios adequados, condições
de trabalho com segurança e oportunidades para aprender, mas que, no entanto
precisa colocar em prática essas tendências.
O investimento no ambiente de
trabalho e no indivíduo torna-se fator
primordial para o desenvolvimento organizacional, é o que o recurso humano da
empresa vem buscando desenvolver. Há
pouco tempo atrás foi realizada uma pesquisa de Clima Organizacional, onde foi
enviada a todos os colaboradores para responderem a um questionário com perguntas fechadas, onde citavam vários fatores.
Com essa iniciativa a empresa
identifica o nível de satisfação de toda sua
população interna com relação a vários
fatores de impacto no dia-a-dia da empresa. Isto é o inicio da percepção coletiva
das pessoas a respeito das dimensões que
impactam a satisfação da empresa.
5 Considerações Finais
Esta pesquisa limitou-se à coleta de
dados do sistema de avaliação de desempenho adotado na organização pesquisada, onde a análise do relacionamento da
avaliação 360º com prática de feedback
apresentam limitações.
É importante mencionar que a coleta de dados baseou-se nas de 30 funcionários da empresa, na área de operações da
empresa objeto deste estudo.
A organização é vista perante o mercado como uma organização séria, cheia
de qualidades e valores. Mas nos últimos
tempos vem percebendo que a motivação
está em baixo nível, seus valores huma-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
66
nos não vêm se aplicando como deveria.
Mas também houve uma mudança de presidência e vários diretores, foi onde ocorreram várias mudanças que vieram a causar esta desmotivação, ou seja, as pessoas
na maioria das vezes não estão totalmente
preparadas para mudanças.
Pode-se afirmar que o elemento humano é o recurso que exige um grande investimento, mas que também quando bem
aplicado, tem maior retorno em termos de
produção qualificada no trabalho. Investir
no valor humano é investir em um bem
durável.
6 Referências
BERGAMINI. Cecília Whitaker. BERALDO, Deobel Garcia Ramos. Avaliação desempenho humano na empresa. 4ª Edição, São Paulo: Editora
Atlas, 1988.
CARVALHO, Antonio Vieira de; NASCIMENTO, Luiz Paulo do. Administração de Recursos
Humanos. V.1. São Paulo: Pioneira, 1998.
CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à Teoria
Geral da Administração. 6ª.edição. São Paulo:
Makron Books, 1993.
____________. Recursos Humanos. Edição
Compacta. 4ª.edição São Paulo: Atlas, 1997.
____________. Teoria Geral da Administração.
Edição Compacta. São Paulo: Atlas, 1999.
____________. Recursos Humanos 8ª Edição.
São Paulo, Editora Atlas, 2004.
GRAMINA, M.R. Modelo de Competências e
Gestão dos Talentos. São Paulo: Editora Pearson
Education, 2002.
LUCENA, Maria Diva da Salete. Avaliação de
Desempenho. São Paulo: Editora Atlas, 1992.
ROESCH, Sylvia Maria Azevedo. Projeto de estágio e de pesquisa em Administração. 2º Edição. São Paulo: Atlas, 1999.
SILVA, Reinaldo Oliveira da. Teorias da Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2000.
VERGARA, Sylvia Constant. Projeto e relatórios de Pesquisa em administração. São Paulo:
Atlas, 2000.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
67
GESTÃO
Competitividade no setor de análises clínicas: um estudo
Survey na cidade de Natal-RN
Dany Geraldo Kramer Cavalcanti e Silva1
Geraldo Barroso Cavalcanti Júnior2
Bianca Caroline da Cunha Germano3
RESUMO: Este estudo objetiva identificar e caracterizar itens de competitividade
no setor de análises clínicas da cidade do
Natal. Uma pesquisa tipo survey, exploratória e descritiva foi realizada utilizandose um questionário como principal fonte
de coleta de dados, aplicado a 82 laboratórios de análises clínicas, com instrução
para o responsável técnico responder, obtendo-se uma taxa de retorno de 53,65%,
ou seja, 44 questionários respondidos. Os
resultados mostraram que os principais
itens de competitividade apontados pelos
entrevistados foram o preço, qualidade
no serviço, localização do laboratório e
ações sociais. As ações ambientais apresentaram-se como promissoras no intuito
de melhoria da competitividade dos laboratórios.
Palavras-chaves: Laboratórios; competitividade; estudo survey, Natal/RN; análises clínicas.
Abstract: This study aims to identify and
to characterize items of competitiveness
in the clinical analyses sector of the Natal
City. A research type survey, exploratory
and descriptive, was accomplished, being
used a questionnaire as main source of
data collection, applied to 82 laboratories of clinical analyses, with instruction
for the technical responsible to answer,
being obtained a return rate 53,65%, in
other words, 44 answered questionnaires. The results showed that the principal
items of competitiveness pointed for the
interviewees were the price, service quality, laboratory location and social actions.
The environmental actions came as proRevista Integralização Universitária
Walter Romero Ramos e Silva Júnior4
Sérgio Marques Júnior5
Aurean de Paula Carvalho 6
mising in the intention of improvement of
the laboratories competitiveness.
Key words: laboratories; competitiveness; survey study, Natal/RN; clinica
analyses.
1 Introdução
Os laboratórios de análises clínicas podem ser definidos como instituições
da área de saúde de apoio ao diagnóstico, baseando suas atividades em técnicas
científicas, cobrindo todos os aspectos de
investigação, inclusive a interpretação de
resultados e conselhos adicionais (PLEBANI, 2002). Eles podem prestar serviços a níveis nacionais, regionais ou locais
de forma diversificada, seja associada a
outras instituições de saúde ou isoladamente. Entre os ramos de atividades citam-se a hematologia, microbiologia, histopatologia, bioquímica, parasitologia e
imunologia com o manuseio de diferentes
materiais biológicos e químicos. Itens que
contribuem para a geração de resíduos perigosos de variada composição, natureza
(química, física e infecciosa) e volume.
(WHO, 1997; SILVA e outros, 2003)
Semelhante a outros setores de serviços o ramo de análises clínicas enfrenta
uma crescente competitividade, como citado por Silva e outros (2003, p.1) e Beebe (2006), principalmente nas cidades de
maior porte nas quais existem uma maior
concentração destes estabelecimentos.
Para Kupfer (2002), a competitividade
pode ser definida como a capacidade de
a empresa formular e implementar estra-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Universidade Federal
do Maranhão – Centro
de Ciências Sociais,
Saúde e Tecnologia
– Imperatriz – MA. [email protected].
2
Departamento de
Análises Clínicas e Toxicológicas – Faculdade de
Ciências Farmacêuticas
– Universidade Federal
do Rio Grande do Norte
– UFRN, Natal, Brasil.
3
Instituto Nacional de
Seguridade Social INSS.
4
Programa de PósGraduação de Ciências
da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte
–UFRN.
5
Programa de Pós-Graduação de Engenharia de
Produção – Universidade Federal do Rio
Grande do Norte –RN.
6
Mestrando do Programa de Pós – Graduação em Engenharia
Agrícola – UFCG.
1
68
tégias de concorrências que lhe permitam
ampliar ou conservar, de forma duradoura, uma posição sustentável no mercado.
Visando contornar esta problemática os administradores dos laboratórios
de análises clínicas podem desenvolver
diversas estratégias e ações, como exemplificado por alguns autores a seguir.
Oliveira e Proença (2002) citam a
adoção de contratos de comodato para
equipamentos, no sentido de aumentar
a produtividade, reduzindo o tempo de
prestação do serviço e associação às clínicas médicas, parcerias que aumentam a
eficiência da organização reduzem custos
nestes estabelecimentos. Beep (2006) faz
referências semelhantes, citando a necessidade de melhorias gerenciais otimizando processos e reduzindo custos, melhorando desta forma, o desempenho operacional do laboratório.
Karkotli (2002), por sua vez,
mostra a importância do gerenciamento
voltado para o marketing social, onde as
empresas devem estar atentas às exigências dos consumidores e às mudanças no
mercado, de forma a adotar ações e processos socialmente seguros e de credibilidade, tornando esta política um grande
fator competitivo para empresas.
Pasquali (2002) relaciona a importância de um sistema de qualidade para os
laboratórios de análises clínicas e defende
que o escopo da organização juntamente
com todas as pessoas envolvidas na prestação do serviço conheça o seu processo,
identifique as necessidades de seus clientes e promova o alinhamento dos processos a fim de atender estas necessidades e
garantir o atendimento contínuo dos mesmos. O autor cita ainda que a qualidade do
serviço seja um item essencial, pois dele
dependem a competitividade, a confiança
e o sucesso das estratégias de marketing.
Cuadrado e outros (2006) citam a
automação laboratorial como itens importantes para as atividades laboratoriais,
contribuindo para redução de erros nas
análises e maior credibilidade dos resultados.
Geffen e Judd (2005) citam que as
instituições devem ter ações pró-ativas na
formulação de novas idéias e ações, buscando maior eficiência de seus sistemas e
conseqüente ganho de competitividade.
Devendo para tanto desenvolver as seguintes ações prévias:
•monitorar e entender a ciência e
tecnologias de seu setor de atuação;
•monitorar e entender seu mercado
de atuação, necessidades dos consumidores, incluindo-se mudanças no setor (desafios sócio-políticos, mudanças na legislação, etc);
•Identificar novas idéias implantadas;
•Rever conceitos, baseado na avaliação integral de seu potencial.
Ricos e outros (2004) citam três
fazes crucias para o desempenho dos laboratórios de análises clinicas; a pré-analítica que incluem a coleta, o transporte e
o manuseio adequado da amostra; a fase
analítica, que envolve o processo de investigação da amostra e a fase pós-analítica que inclui auto-avaliação laboratorial,
processamento e liberação dos resultados.
Durante todo o processo a não observação de itens básicos de gerenciamento do
processo pode determinar o bom ou mau
desempenho do laboratório de análises
clínicas.
Os itens citados anteriormente podem influenciar não apenas na competitividade da organização, mas permite a redução de acidentes de trabalho bem como
a redução de riscos ao meio ambiente uma
vez que, falhas e desperdícios podem ser
reduzidos, minimizando processos trabalhistas, ambientais e civis, além da melhoria da relação entre instituição, comunidade e funcionários.
Tendo-se em vista a variedade de
itens que podem influenciar na competitividade no setor de análises clínicas,
buscou-se através deste estudo identificá-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
69
los e caracterizá-los no setor da cidade do
Natal-RN, sob a ótica dos responsáveis
técnicos de nível superior destes laboratórios.
2 Metodologia da pesquisa de campo
2.1 Delineamento da pesquisa
A pesquisa pode ser caracterizada
como exploratória e descritiva do tipo
survey, pois este tipo de estudo visa à obtenção de dados ou informações sobre as
características, ações ou opiniões de determinado grupo de pessoas, indicado como
representante de uma população alvo por
meio de instrumento de pesquisa, normalmente um questionário. (FREITAS e outros, 2000; GIL, 1991; SILVA e outros)
2.2 População e amostra
Para se atingir o objetivo desta pesquisa optou-se por estudar os Laboratórios de Análises Clínicas da
Cidade do Natal, Estado do
Rio Grande do Norte - Brasil,
onde existem 108 laboratórios de análises clínicas registrados no Conselho Regional
de Farmácia do RN, variando
quanto à complexidade, localização e atividades desenvolvidas, tamanho e categoria de
gestão.
de escala do tipo Likert, onde são aplicadas questões de onze pontos, cuja qualificação das respostas possíveis era variável
em função de cada questionamento aplicado. (CHIAMENTI, 2003)
As variáveis deste estudo somaram
21 no total, sendo separadas por grupos
de forma a facilitar a pesquisa, sendo estes: gestão estratégica (GE) e perfil (PERFIL). A Tabela 01 apresenta as variáveis,
as descrições das variáveis e os grupos a
que pertencem. Após recolhimento dos
questionários, os dados foram tabulados
seguidos da análise descritiva e exploratória dos valores absolutos e dos percentuais obtidos, objetivando apresentar a
percepção dos entrevistados sobre os fatores de competitividade no setor estudado,
abordando na forma de tabelas e gráficos
baseados em dados da amostra coletada,
considerando os vários atributos e suas
dimensões.
Tabela 1: Variáveis utilizadas no estudo
2.3 Instrumento de
coleta de dados
O principal instrumento
de coleta de dados utilizado
foi um questionário constituído de perguntas do tipo “fechada” (uma única resposta
entre várias opções possíveis)
formuladas em um modelo do
tipo “escala”, ou seja, aquelas que devem ser analisadas
dentro de um tipo de escala de mensuração, pois as prioridades variam de acordo
com o posicionamento do entrevistado.
Nesta proposta, foram utilizadas questões
Revista Integralização Universitária
2.4 Etapas da pesquisa
O trabalho foi desenvolvido em
duas etapas, a primeira com levantamento
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
70
e confirmação dos dados, a segunda com
um teste piloto em cinco laboratórios de
análises clínicas escolhidos aleatoriamente, seguida da distribuição e posterior coleta dos questionários junto à população
estudada.
3 Resultados e discussões
Dentre os 108 laboratórios que
correspondem ao universo da pesquisa,
foram encontrados aptos a responderem
os questionários 68 unidades, sendo os
demais, 40 laboratórios, desconsiderados por apresentarem o mesmo técnico
responsável ou com dados incondizentes
com a lista inicial. Contudo, foram encontrados durante a pesquisa de campo 14 laboratórios aptos a serem pesquisados que
não se encontravam na lista do CRF/RN,
totalizando amostra de 82 laboratórios.
Destes, 44 responderam o questionário,
com posterior recolhimento, e obtenção
de uma taxa de retorno de 53,65%.
Os laboratórios de análises clínicas
foram caracterizados quanto ao número de
exames/mês que realizam, sendo em sua
maioria, realizando não mais que 2000
exames/mês como ilustra a Figura 1.
Figura 1: Freqüência dos entrevistados referente
ao número de exames/mês realizados nos laboratórios em que trabalham.
Os entrevistados foram caracterizados quanto à faixa etária, sexo, profissão,
tempo de formado e de atuação na empresa, renda salarial e números de exames/
mês realizados em seus laboratórios.
A maioria dos entrevistados foram
do sexo feminino (61,4%) e com faixa
etária acima dos 40 anos (46,5%). Quanto
à profissão, 43 deles foram farmacêuticos
bioquímicos e apenas um com outra profissão. Embora, os entrevistados apresentem uma faixa etária acima dos 40 anos, a
maioria trabalha em seus Laboratórios de
Análises Clínicas a menos de 05 anos e
têm menos de 10 anos de formado.
As variáveis pertencentes ao grupo
de gestão estratégica somaram 11, tendose questionados os entrevistados, a princípio, referente ao grau de competição
no setor de análises clínicas natalense,
seguidas de avaliação de itens pertencentes aos laboratórios (preço, propaganda,
credibilidade, qualidade do serviço, ações
de proteção ambiental, nome, estabilidade financeira, localização, ações sociais
e imagem) quanto a sua importância em
influenciar a decisão de um cliente em escolher um laboratório para realizar seus
exames médicos.
Quando questionados sobre o grau
de competição no setor de análises clínicas de Natal, 49,9% dos entrevistados
consideraram-no como de competição
agressiva ou muito agressiva, caracterizando este ramo de atividade como bastante competitivo (Figura 2).
Figura 2: Freqüência dos entrevistados com relação ao grau de competição no setor de análises
clínicas.
Entre os itens que apresentam importância em influenciar os clientes na escolha de um laboratório, a qualidade do
serviço e a credibilidade do laboratório
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
71
foram apontadas como os principais, seguidos dos itens ações sociais, localização
do laboratório e preço, conforme ilustra a
Figura 3.
Figura 3: Freqüência dos entrevistados com relação ao item preço, localização do laboratório,
credibilidade, qualidade do serviço e ações sociais em influenciar clientes.
Os itens qualidade e credibilidade
foram tratados de forma conjunta, mostrando comportamentos similares, uma
vez que a qualidade no serviço tende a
minimizar os erros e falhas contribuindo
para o aumento da credibilidade do laboratório e conseqüentes satisfações do
cliente. Já a localização do laboratório,
foi citada como de extrema importância,
mostrando que a comodidade e facilidade
de acesso ao serviço são importantes para
atrair clientes no setor, do ponto de vista dos entrevistados, aspecto semelhante
apontado por Ricos e outros (2004).
Entre outros aspectos importantes
para influenciar clientes estão as ações
sociais dos desenvolvidas pelos laboratórios. Item apontado por Silva e outros
(2003) como importante para melhoria da
imagem da instituição que foi observado
neste estudo.
em influenciar escolha de clientes 46,6%
apontaram-no como importante, como
ilustrado na figura 4.
Figura 4: Freqüência dos entrevistados com relação aos itens nome do laboratório e facilidade de
pagamento em influenciar clientes.
Relativo ao item propaganda, apenas
25,6% dos entrevistados opinaram como
item importante, podendo influenciar o
cliente na hora de realizar seus exames
médicos. As ações de proteção ambiental
tiveram percentual de importância próximo ao item propaganda, sendo apontada
por 27,3% destes, embora não tendo uma
grande relevância quanto o item qualidade no serviço, mostrou-se importante para
estratégias dos laboratórios, e capaz de se
tornar um dos principais itens de competitividade do setor, uma vez que permite
complacência com legislações e normas,
exigências de fornecedores e clientes (Figura 5), conforme citado por Silva e outros (2003).
Relativo à estabilidade financeira
do laboratório, a maioria dos entrevistados não a considera item importante para
influenciar clientes. Referente à imagem
do laboratório, os entrevistados opinaram
sobre este item de forma heterogênea,
sendo para um pequeno percentual deles
um item importante (Figura 5).
Relativo ao nome do laboratório,
apenas 38% dos entrevistados, citou-o
como importante para influenciar escolhas
de clientes. Quando questionados sobre a
importância da facilidade de pagamentos
de exames oferecidos pelos laboratórios
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
72
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Rio Grande do Norte. 120p. 2003.
CRF/RN – Conselho Regional de Farmácia do Rio
Grande do Norte. Base de dados sobre Laboratórios de Análises Clínicas, 2003.
Figura 5 Freqüência dos entrevistados com relação aos itens imagem do laboratório, propaganda,
ação de proteção ambiental e estabilidade financeira do laboratório em influenciar clientes.
4 Conclusões
Pôde-se constatar que o preço,
qualidade do serviço, ações sociais e localização do laboratório foram apontados
como itens mais importantes para influenciar clientes na hora de escolher uma instituição do setor para realizar seus exames
médicos. Mostrou ainda que a questão sócio-econômica tem grande influência sobre o cliente na cidade do Natal.
Estratégias voltadas a estes itens
podem ser exploradas visando ganho de
mercado, entretanto, pode-se investir em
outros itens, como citado por Geffen e
Judd (2005), observando novas tendências,
como as práticas de proteção ambiental de
forma a melhorar a imagem da instituição
junto ao setor em que atua, buscando-se
eficiência ambiental, gerencial e econômica passiveis de serem alcançadas com
estas práticas. Portanto, conclui-se que os
fatores qualidade e preço citado pelos entrevistados estão condizentes com o apontado por outros estudos para o setor, embora demais itens possam ser explorados
para melhoria da imagem da empresa e da
competitividade com conseqüente benefício sócio-econômico e ambiental.
5 Referências
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Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Foto: Roberto Carlos
75
GESTÃO
Levantamento sócio-econômico e cultural do assentamento
Pericatu localizado no município de Pium-To
Glenda Feitosa da Silva 1
Alan Kardec Elias Martins 2
Iracy Coelho de Menezes Martins 3
Resumo: Diante dos problemas gerados
pela implantação de assentamentos rurais
sem que se tenha realizado estudos sobre
as características da área e sua adequação
para fins agropecuários, entende-se que
além de efetuar mudanças na política de
reforma agrária que implemente a formação de novas unidades é ainda de suma
importância o estudo dos assentamentos
já existentes. Assim foi realizado neste
trabalho o levantamento sócio-econômico
e cultural do assentamento Pericatu, município de Pium, Tocantins, com posterior
análise da sua atual situação, almejando
que tais resultados possam ser usados para
subsidiar políticas que visem melhorar a
vida dos produtores assentados.
Palavras chave: assentamento rural, planejamento, meio ambiente e Pericatu.
Abstract: Before of the problems generated for the implantation of small farm
without if it has carried through studies
on the characteristics of the area and its
adequacy for farming ends, one understands that beyond effecting changes in
the politics of agrarian reform that implements the formation of new units it
is still of utmost importance the study of
the existing nestings already. Thus it was
carried through in this work the partnereconomic and cultural survey of the Pericatu nesting, city of Pium, Tocantins, with
posterior analysis of its current situation,
longing for that such results can be used
to subsidize politics that they aim at to improve the life of the seated producers. Key-words: small farm, planning, environment end Pericatu.
Revista Integralização Universitária
1 Introdução
A extrema importância de se concretizar a reforma agrária é fartamente
evidenciada pelos resultados que propiciou, em todos os países onde ocorreu, ao
longo da história. Embora conduzidas de
diferentes maneiras, nas diferentes épocas e nos diferentes ambientes, todas as
reformas agrárias levaram à expansão no
número de ocupações produtivas no meio
rural, à consolidação de tecidos sociais
articulados, à melhoria das condições de
vida, à ampliação dos investimentos públicos nas áreas sociais, à modernização
das legislações, ao fortalecimento dos
direitos do cidadão comum, à autonomia
cultural e à dinamização econômica das
regiões onde ocorreram (MELGAREJO,
2001).
O desenvolvimento da política
agrária no Brasil é ainda caracterizado
como lento e burocrático. Até que todo o
processo de apropriação seja realizado legalmente, é concedido aos trabalhadores
rurais o direito de habitar e usar para fins
agropecuários áreas que já foram desapropriadas. Formam-se então conjuntos de
lotes pré-demarcados pelo INCRA (Instituto de Colonização e Reforma Agrária),
para onde são remanejados agricultores
que reivindicaram uma porção de terra
para trabalhar. Na maioria dos casos esse
é o procedimento para o estabelecimento
dos chamados assentamentos rurais que
se tornam ponto de partida de demandas,
levando à afirmação de novas identidades
e interesses ao surgimento de formas organizativas internas e externas.
Devido à maneira pelas quais são
formadas, grande parte dessas unidades
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
¹ Graduanda do curso de
Engenharia Ambiental
da Universidade Federal
do Tocantins – UFT
² Professor Doutor da
Faculdade Católica do
Tocantins – FACTO
³ Professora Doutora da
Universidade Federal do
Tocantins - UFT
76
enfrentam inúmeras dificuldades. Segundo Carvalho e Callado (2000) as principais são: a sustentabilidade financeira da
reforma agrária, pois ela depende, exclusivamente, dos recursos públicos orçamentários e a inexistência de infra-estrutura mínima nos assentamentos, embora
haja previsão que o INCRA deveria proporcionar, nos projetos, pelo menos estrada de acesso, abastecimento de água para
consumo humano e eletrificação. Assim a
falta de recursos para que essas medidas
sejam aplicadas é uma calamidade que
atinge assentamentos em todo o Brasil.
Segundo o SIPRA – Sistema de Informação de Projetos de Reforma Agrária
(2006) o estado do Tocantins possui cerca
de 300 (trezentos) unidades, e o município
de Pium localizado ao oeste do estado tem
em seus limites sete desses assentamentos, entre eles o Assentamento Pericatu,
objeto de estudo deste trabalho, onde foi
definido o perfil sócio econômico e cultural dos assentados com objetivo de que o
mesmo possa ser usado para implementação de demais projetos que almejem de
maneira local e estratégica a melhoria da
qualidade de vida dos assentados.
2 Material e métodos
2.1 Localização Geográfica
da área de estudo
O Projeto de Assentamento Pericatu (P.A.P.) foi criado por meio da portaria INCRA SR-26 n° 031/98, está situado entre as coordenadas 49°15’54,40”e
49°29’6,19” de longitude oeste e entre
10°6’33,01” e 10°17’27,86” de latitude sul, no município de Pium, na região
Centro-Oeste do Estado do Tocantins, a
43 km da sede da área urbana, sendo interligado pela TO-354 (Transjavaés) e,
posteriormente, por 10 km de estrada vicinal não pavimentada. Está distante 166
km da capital Palmas. Com uma área de
aproximadamente 6.742.0013 ha, fazendo
parte do campo de abrangência da APA do
Cantão.
2.2 Obtenção de dados e informações
O assentamento Pericatu está localizado a cerca de 40 km do centro urbano
da cidade de Pium. Devido essa proximidade julgou-se necessário obter informações também sobre este município, por
corresponder a área de influência da unidade de pesquisa. E para a obtenção de informações de aspectos sócio-econômicos
do município, realizou-se visita a Prefeitura Municipal de Pium nas Secretarias de
Agricultura e Educação e Cultura, onde
foram entrevistadas a Secretária de Agricultura e a Coordenadora da Secretaria de
Cultura. Além de levantamentos de dados
junto a outros órgãos como o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
e secretarias estaduais.
E para o levantamento de dados
relativos ao assentamento visitou-se o
INCRA – TO, onde foi disponibilizada
a Planta da área de estudo, a unidade de
Palmas do Instituto de Desenvolvimento
Rural do Tocantins - RURALTINS, a qual
possibilitou o acesso ao Projeto de Desenvolvimento do Assentamento (PDA),
e a unidade do RURALTINS de Pium,
responsável pela assistência ao assentamento, além de entrevistas no local de
pesquisa com o Presidente da Associação
dos Assentados, Lúcio Sousa Andrade.
3 Resultados e discussão
3.1 Perfil sócio-econômico e
cultural da área de influência
A área de influência do Assentamento Pericatu é a cidade de Pium, com
uma superfície de 10.017 km², que está
localizado na Mesorregião Ocidental Geográfica do Tocantins e Microrregião do
Rio Formoso. Limita-se, ao norte, com
os municípios de Caseara e Marianópolis
do Tocantins; a leste, com os municípios
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
77
de Chapada da Areia, Pugmil e Nova Rosalândia; ao sul, com os municípios de Lagoa da Confusão e Cristalândia; e a oeste,
com os Estados do Mato Grosso e Pará
(Ilha do Bananal).
A sede do município está situada
na latitude de 10º44’25” N e longitude de
49°18’22” W, a uma altitude de 249m em
relação ao nível médio do mar, distando
119 km de Palmas, capital do Estado do
Tocantins.
Segundo o Censo Demográfico do
IBGE de 2000, Pium conta com uma população de 5.539 habitantes, dos quais 3.193
vivem na área urbana e 2.346, na rural,
sua densidade demográfica é de 0,55 hab/
km². O município tem perdido população,
provavelmente em função dos sucessivos
desmembramentos de seu território, registrando uma taxa de crescimento no período 1991/2000 de 21% na zona urbana e de
(-)164,87% na zona rural.
A renda nominal, média mensal
das pessoas com rendimento, responsáveis pelos domicílios particulares é R$
425,55(quatrocentos vinte e cinco reais
e cinqüenta cinco centavos), o Índice de
Desenvolvimento Social – IDS1 é 0,52.
Sua economia é fundamentada na
agropecuária, o Município de Pium detém 73,% (362.762 ha) da área produtiva utilizada por pastagens, sendo 27%
(34.405 ha) plantadas e 73% (228.357
ha) constituídas por pastagens naturais.
Aproximadamente 20% da área produtiva do município (99.630 ha) é composta de matas nativas. De acordo com um
levantamento realizado recentemente
pela Secretaria Municipal de Agricultura
o município possui: 170.683 cabeças de
gado; 538 produtores com rebanho; 552
propriedades rurais; 295 pequenos produtores; 129 médios produtores; 51 grandes
produtores; 7 assentamentos agrícolas e 1
comunidade rural.
O último registro do IBGE, quanto
a produção agrícola e as culturas exisRevista Integralização Universitária
tentes, no município foi o fechamento da
safra 2004/2005. Seus números estão demonstrados na tabela abaixo:
Tabela 1: Produção agrícola do município de
Pium – TO, safra 2004/2005.
Quanto aos aspectos culturais a
cidade de Pium tem tradição cultural de
fabricar peças artesanais, com destaque
para a lapidação de quartzo, o crochê, o
bordado à mão, a pintura em tecidos, a
tapeçaria e a cestaria com a utilização de
jornais também são freqüentes.
Dentre as festas mais tradicionais
está a do aniversário da cidade, celebrado
com uma semana de festejos até o dia 23
de julho, dia da emancipação do município, junto a esse evento realiza-se também
a Feira Agropecuária, onde em sua abertura ocorre a Cavalgada, muito apreciada
pelos moradores. Acontecem ainda as festas do Divino e a da Padroeira da cidade Nossa Senhora do Carmo, em 16 de julho,
precedida de novena e quermesses até o
dia da festa e o sábado cultural evento realizado uma vez ao mês no centro antigo da
cidade (centro cultural), Praça do Garimpeiro, com shows regionais e exposição
de artesanatos.
3.2 Perfil sócio-econômico e
cultural do Assentamento
Pericatu
Há no projeto de assentamento Pericatu, aproximadamente 90 famílias, a mé-
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78
dia de membros por família é 4 (quatro)
pessoas, chegando sua população a um
total de aproximadamente 360 habitantes,
que residem em casas de alvenaria localizadas na agrovila do assentamento.
As formas de organização local
são em torno da igreja evangélica e da
Associação dos Pequenos Produtores do
Projeto de Assentamento Pericatu. A associação foi criada em outubro de 1998,
seu primeiro presidente foi o Sr. Bento
Batista da Silva. Atualmente o Presidente
é o morador Lúcio Sousa Andrade.
A estrutura de apoio do assentamento é constituída por: um galpão onde estão
algumas máquinas usadas por eles no beneficiamento dos produtos ali cultivados;
a casa da antiga sede (Figura 1), local que
atualmente é utilizado para realização das
aulas da escola de 1° grau; a casa de farinha construída recentemente com forno,
prensa, triturador, descaroçador e peneira.
São também de propriedade do assentamento dois tratores e um caminhão, que
em função do prolongado tempo de uso
encontram-se em situação precária.
Figura 1: casa da antiga sede da Fazenda Pericatu, atualmente funciona a escola do assentamento
Pericatu, município de Pium – TO.
A rede elétrica é um bem que atende a praticamente todos os moradores da
agrovila, existindo ainda alguns postes
que fazem a iluminação de poucas ruas.
A água para consumo é proveniente de
poços artesianos e ainda da caixa d’água
instalada a pouco tempo, entretanto na
época de estiagem é comum sua escassez,
faltando água até mesmo para realização
das tarefas diárias. Na extensão da agrovila que é de 84,6880 ha, existe apenas um
orelhão.
Como citado anteriormente o assentamento possui apenas escola de 1°
grau, assim a prefeitura oferece transporte
(ônibus) para as crianças que freqüentam
aulas na cidade. Esse veículo é também
utilizado como meio de transporte pelos
moradores e a prefeitura ainda disponibiliza outros carros ou caminhões para transporte da produção com a condição de que
o combustível seja pago pelo usuário.
Os moradores do assentamento
Pericatu tem acesso à saúde por meio da
Unidade Móvel de Saúde com uma equipe composta por médico e dentista que
realizam visita uma vez por mês.
A área na qual está inserido o assentamento é classificada segundo o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) do
estado, como Área de uso de média intensidade para produção, recomendada para
pecuária semi-intensiva e/ou silvicultura.
Esta classificação relaciona entre outras
características o tipo de solo da área, concrecionário de baixa fertilidade, pluviosidade, longo período de estiagem (seca),
que inicia no mês de maio e se estende até
inicio do mês de setembro e recursos hidrológicos que estão diretamente ligados
ao regime de chuvas.
Diante disso para que o solo seja
utilizado com fins agrícolas é necessário
adotar uma forma de produção buscando
práticas tecnológicas, havendo a necessidade de aplicação de corretivos agrícolas
para a melhoria da fertilidade do solo.
Quanto à pecuária é recomendada que
seja observada a condição das pastagens,
colocando um número de cabeças por
hectare que não venha comprometer seu
uso adiante, em função da degradação,
que pode ocorrer devido à fragilidade do
solo.
Entretanto a falta de estrutura financeira não permite o manejo adequado do
solo, dificultando o desenvolvimento eco-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
79
nômico da unidade limitando suas atividades a pecuária extensiva e a agricultura,
cultivando principalmente mandioca, milho, abacaxi e arroz, sendo que esse último
é apenas de subsistência. No sistema de
cultivo são utilizadas máquinas agrárias
somente no gradeamento da terra, as outras etapas como, por exemplo, o plantio
é realizado manualmente, assim como a
adubação necessária, visto o tipo de solo.
É importante ressaltar que eles não fazem
uso da prática do fogo, e foi reconhecida
uma preocupação quanto a esse aspecto,
já que a associação também não recomenda este tipo de ação.
A água utilizada na agricultura é
oriunda de pequenas represas construídas
pelos produtores em seus lotes, algumas
delas em consórcio, sendo as duas maiores de uso coletivo.
Com a instalação da Casa de Farinha
realizada pelo RURALTINS em convênio
com outras organizações, incentivou-se
a produção da mandioca (Figura 2) que
hoje é exercida por cerca de 30 famílias,
as quais são associadas na produção da farinha. Esse produto possui atualmente um
preço de mercado equivalente à R$ 50,00
(cinqüenta reais) a quarta, que corresponde à aproximadamente 35 quilos, vendida
na região. Porém segundo informações da
unidade do RURALTINS de Pium, a produção da mandioca está abaixo da média
estadual, colhendo cerca de apenas oito
toneladas por hectare, em função do tipo
de solo, do curto espaçamento entre as fileiras e da presença de cupins.
Figura 2: Aspectos do plantio de mandioca
em um dos lotes do assentamento Pericatu,
município de Pium – TO.
Revista Integralização Universitária
De acordo com relato do presidente
da associação, em segundo lugar no quesito de produção aparece o abacaxi com
valor variando de R$ 0,25 (vinte e cinco
centavos) a R$0,60 (sessenta centavos),
o mercado para esse produto se estende
além dos municípios vizinhos, pois por
meio de intermediários o abacaxi é vendido até mesmo para os estados de Minas
Gerais e São Paulo. A produção do milho é
relativamente pequena se comparado com
a mandioca e o abacaxi, ainda assim é tido
como produto comercial e é vendido aos
moradores das cidades próximas, por um
preço que varia de R$15,00 (quinze reis)
a R$25,00 (vinte e cinco reais) sacas de
60 quilos.
A criação de gado é uma atividade
econômica adotada recentemente por alguns donos de lotes, em sistema extensivo, seu mercado é principalmente o de
venda pra recria.
A mão-de-obra utilizada no assentamento é de seus proprietários, porém
alguns prestam serviços em fazendas da
região. Ainda que exista um empenho da
maioria dos produtores em produzir e fazer uso da terra, o assentamento tem seu
fluxo migratório marcado pela rotação de
proprietários em 10 dos 90 lotes, o que
atrapalha o desenvolvimento de atividades de cooperação e desencadeia conflitos
internos. Essa variação ocorre por causa
da repassagem de terras, o que é intransigente e deveria ser fiscalizado pelo órgão
público responsável.
Atualmente a assistência técnica
ao assentamento é de responsabilidade
da unidade da RURALTINS – unidade
de Pium, porém segundo o presidente da
associação, o atendimento não é freqüente. Quando da elaboração do PDA foram
identificadas pelo menos 5 organizações
de cunho público, privado e não – governamental, que de alguma forma desempenhavam projetos envolvendo o assentamento, contudo com a conclusão das atividades hoje a unidade recebe apoio principalmente da prefeitura, que entre outros
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80
subsídios fornece veículos e recentemente
realizou a recuperação de parte das vias
de acesso.
Considerando a devida importância
para qualquer comunidade, de se ter atividades culturais e/ou recreativas as quais
colaboram para a promoção da qualidade
de vida dos moradores, o assentamento
Pericatu dispõe de opções de lazer comum
a uma pequena organização rural, com a
realização da festa junina que acontece
anualmente, eventuais festas em um bar
da agrovila, jogos de futebol, e utilização
da represa para recreação e pesca. Assim
muitos dos assentados freqüentam as festas que ocorrem no município de Pium,
por sua vez é notória por parte da população piunense uma boa aceitação quanto a
esse compartilhamento.
4 Conclusão
O Assentamento Pericatu, com quase 10 anos de implantação enfrenta problemas que impedem seu desenvolvimento econômico e social. Considerando estudos realizados anteriormente percebe-se
que os impedimentos de ordem econômica
ainda permanecem como a falta de recurso para correção do solo, falta de estradas
e a distância dos centros consumidores,
entretanto viu-se entre os proprietários de
lotes o despertar para atividade pecuária
que se mostre como uma outra alternativa
de uso da terra.
Dentre as principais causas dos problemas acima relacionados, está a predominância de solos do tipo concrecionário
na área do assentamento, relatada pelo
Incra, 2002. Esta categoria de solo não é
recomendada para agricultura em função
da sua baixa fertilidade e do seu elevado
teor de acidez, exigindo altos investimentos em práticas de correções que supram
essa deficiência.
As condições precárias de manejo
se agravam nos lotes que estão localizados
no noroeste do assentamento, já que não
possuem estradas que cheguem até eles,
e na época de chuva os mesmos alagam,
ficando indisponíveis para qualquer uso.
Portanto além dos problemas decorrentes
da falta de recurso financeiro e assistência
técnica por parte do órgão responsável, o
assentamento ainda se depara com fatores
ambientais não favoráveis.
No âmbito social ocorreram algumas melhorias, como a implantação de
rede elétrica e o funcionamento da escola
de 1ºgrau, porém a assistência à saúde ainda é considerada insuficiente já que acontece apenas mensalmente e o assentamento não dispõe de uma unidade permanente
e nem de pessoas que possam auxiliar em
casos de emergência. Existem ainda problemas relacionados ao fornecimento de
água em função da indisponibilidade de
rede de distribuição.
Se a análise de alguns aspectos dos
assentamentos revela dimensões promissoras, no que se refere à melhora da infraestrutura, ficou evidente a precariedade
da sua situação, indicando, por um lado,
uma insuficiente intervenção do Estado
no processo de transformação fundiária e,
por outro, forte continuidade em relação à
precariedade material que marca o meio
rural brasileiro.
Dessa forma espera-se que este
estudo possa subsidiar outros projetos engajados no propósito nobre de promover
melhorias para essa unidade rural. E para
que problemas dessa ordem não continuem
acontecendo é evidente a necessidade de
que o estabelecimento de assentamentos
como o Pericatu seja efetuado de forma
estruturada, demarcando as áreas de preservação ambiental e garantindo o suprimento de material básico para o estabelecimento das residências e infra-estrutura,
recomenda-se ainda o monitoramento das
áreas onde foram realizados, para que alguns erros por ventura cometidos possam
ser corrigidos a tempo de não prejudicar
as famílias ali instaladas.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
81
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Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Foto: Roberto Carlos
82
Revista Integralização Universitária
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83
GESTÃO
“Remuneração: do tradicional ao estratégico”
Paulo César Romão Bomfim1
Resumo: O presente artigo tem como
objetivo abordar as mudanças ocorridas
referente ao processo de remuneração, salientando os seguintes assuntos: Sistemas
Tradicionais de Remuneração, Remuneração Estratégica, Sistema de Remuneração
Estratégica e Participação nos Lucros ou
Resultados à Luz da Legislação. Foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica, apresentando a contribuição de alguns renomados autores que enfatizam a
importância da evolução desse processo;
para tanto, contribuindo com suas idéias e
conceitos em consonância com um cenário voltado para a inovação e conseqüentes
mudanças; ressalta também as características e necessidades de aperfeiçoamento
dos Sistemas Tradicionais de Remuneração, reforçando a idéia do acompanhamento desses sistemas junto às transformações ocorridas nas empresas quanto
ao contexto e a estratégia organizacional.
Observa-se que o grande segredo no que
diz respeito ao sistema de remuneração é
peculiar a cada empresa, havendo necessidade de se avaliar a cultura, o negócio e
a estratégia, apontando para qual tipo de
pessoa está se referindo, para então adotar
programas de remuneração dinâmicos e
que evoluem à medida que o empregado
ou colaborador progride.
Palavras-chave: remuneração, estratégia,
organização, recursos humanos.
Abstract: The present article has as objective to approach the changes happened
regarding the remuneration process, pointing out the following subjects: Traditional systems of Remuneration, Strategic
Remuneration, System of Strategic remuneration and Participation in the Profits or
Results to the Light of the Legislation. It
was developed through he/she researches
bibliographical, presenting the contribuRevista Integralização Universitária
tion of some renowned authors that emphasize the importance of the evolution
of that process; for so much, contributing
with yours ideas and concepts in consonance with a returned scenery for the innovation and consequent changes; it also
stands out the characteristics and needs of
improvement of the Traditional systems
of Remuneration, reinforcing the idea of
the accompaniment of those systems close to the transformations happened in the
companies with relationship to the context
and the strategy organization. It is observed that the great secret in what says
I respect to the remuneration system it is
peculiar to each company, having need to
evaluate the culture, the business and the
strategy, pointing for which person type
he/she is referring, for then to adopt programs of dynamic remuneration and that
develop as the employee or collaborator
progresses.
Key-words: remuneration, strategy, organization, human resources.
1 Introdução
Nos últimos anos, diante de pressões competitivas crescentes, os administradores foram procurando modernizar suas empresas. Administrar passou a
ser parecido com surfar, aproveitando ao
máximo cada onda de inovação gerencial
para atingir patamares superiores de desempenho.
Alguns olham com restrições para
essa sucessão de novidades; porém, a verdade é que o momento de transformação
que as empresas estão vivendo tem exigido dos administradores soluções rápidas e
criativas e se, em muitos casos, o remédio
pode provocar amargos efeitos colaterais,
não há como negar que, de um jeito ou
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Graduado em
Administração de
Empresas (Universidade Estácio
de Sá – UNESARJ),
Pós-graduando em Gestão
e Planejamento
de Recursos Humanos
(Faculdade Católica do
Tocantins), Fiscal
de Aviação Civil
– DAC.
1
84
de outro, as empresas têm evoluído para
modelos mais eficazes de gestão. Segundo Coopers e Lybrand (1997, p.81), “basta olhar ao redor para ver que as pesadas
estruturas hierárquicas estão desaparecendo. Em seu lugar estão surgindo estruturas
mais enxutas e flexíveis, nas quais cresce
a autonomia dos grupos e dos indivíduos”. Dentro desse contexto de evolução e
mudança, um dos mais importantes sistemas de apoio, o sistema de remuneração,
parece não estar acompanhando o ritmo
das transformações. A maioria das empresas, entre elas aquelas mais inovadoras,
continua utilizando sistemas tradicionais
de remuneração, baseado em cargos e
funções.
Vale ressaltar que não é apenas
a remuneração que deve mudar, é claro.
Em muitas empresas há uma crescente
consciência da necessidade de repensar
totalmente as formas tradicionais de fazer as coisas, uma revolução no local de
trabalho. O enxugamento e as demissões,
que são características tão proeminentes
da paisagem corporativa, não podem mais
ser vistos como soluções para problemas
econômicos de curto prazo; pelo contrário, apelam para uma transformação fundamental na forma de pensar sobre trabalho e remuneração.
De acordo com Flannery (1997,
p.23), “dentre esses conceitos tradicionais
que começam a ser abandonados, está a
visão do trabalho de uma perspectiva gerencial científica, que o divide em suas
respectivas partes e depois divide essas
partes em especialidades e subespecialidades”. Isto quer dizer na prática que o
departamento de recursos humanos tradicional continua a ser utilizado em muitas
empresas. Dentro desse departamento há
geralmente um departamento de benefícios e dentro do departamento de benefícios há subespecialistas, que lidam com
benefícios de saúde, de aposentadoria e
remuneração.
Na pressa de mudar, muitas empresas desprezaram ou utilizaram mal o
que poderia ser uma de suas mais eficazes ferramentas: a remuneração. Não importa que a remuneração possa ser uma
força essencial no apoio à mudanças. O
fato subsiste e, em muitas empresas, a remuneração tem sido largamente ignorada.
Essa negligência, em grande parte, pode
ser considerada culpada por não se compreender a mudança do papel dos salários
e de seu impacto sobre as pessoas. Em
face disso a remuneração não é apenas negligenciada, é também mal compreendida
e freqüentemente mal aplicada; completamente fora de sincronia com os demais
valores e processos da empresa. O motivo
é claro: embora as empresas tenham sofrido mudanças drásticas, as estratégias
para atribuir, administrar e implementar a
remuneração estiveram, até recentemente,
congeladas no tempo. Como resultado, a
remuneração não está mais alinhada com
a estrutura organizacional da empresa,
sua cultura de trabalho, seus valores e sua
estratégia de negócio, todas em evolução.
Somente agora as pessoas estão começando a perceber que o salário no atual cenário de mudanças organizacionais deve
Ter um papel muito mais significativo que
no passado. O salário não pode mais ser
visto como mera despesa e custo de fazer
negócios, mas como um investimento intimamente ligado ao sucesso de um longo
prazo da empresa.
Uma estratégia de remuneração
eficientemente projetada e cuidadosamente alinhada com certeza não tornará todos
os funcionários felizes e satisfeitos, nem
eliminará todos os problemas comportamentais de uma empresa. Essa estratégia,
no entanto, auxiliará muito na melhora de
desempenho e dos resultados.
2 Metodologia
A metodologia utilizada para o
desenvolvimento deste artigo consistiu na
adoção do método descritivo e a técnica
utilizada foi de pesquisa bibliográfica em
livros e internet como fontes de consulta
sobre o tema. A natureza da pesquisa foi
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
85
qualitativa, tendo em vista a intenção de
mostrar a evolução e mudança no contexto do sistema de remuneração, uma vez
que se faz necessário o acompanhamento
do ritmo das transformações ocorridas no
cenário empresarial. A análise dos dados
se deu em torno da interpretação de dados, onde foram observadas características relevantes através da comparação das
informações obtidas, tendo sido elaborado relatório final de forma descritiva.
3 Desenvolvimento conceitual
3.1 Sistemas Tradicionais de
Remuneração
A maioria das empresas ainda aplica exclusivamente sistemas tradicionais
de remuneração, baseados nas descrições
de atividades e responsabilidades de cada
função.
Segundo Coopers e Lybrand
(1997, p.83),
A utilização de instrumentos como descrições de cargos organizacionais e planos
de cargos e salários permite a muitas dessas
empresas atingir a um patamar mínimo de
estruturação na gestão de seus recursos humanos. Entretanto, quando aplicados a essa
condição com a exclusão de outras formas,
esses sistemas podem tornar-se destoante
em relação às novas formas de organização
do trabalho e ao próprio direcionamento
estratégico da empresa.
De acordo com Coopers e Lybrand
(1997, p.8), os sistemas tradicionais de remuneração possuem as seguintes características: inflexibilidade, conservadorismo
e divergência.
1 – Inflexibilidade: os sistemas tradicionais de remuneração tendem a tratar
coisas diferentes de forma homogênea.
Eles não consideram comumentemente
as peculiaridades de empresas ou funções.
2 - Conservadorismo: os sistemas tradicionais reforçam a estrutura burocrática,
privilegiando as ligações hierárquicas
em detrimento do foco nos processos
críticos e no cliente.
Revista Integralização Universitária
3 - Divergência: os sistemas tradicionais
não consideram a visão de futuro e a
orientação estratégica da organização,
dificultando a convergência de esforços para objetivos comuns.
Apesar de todos os problemas aqui
apontados, os sistemas tradicionais de remuneração podem ser aperfeiçoados.
Muitas das desvantagens e dificuldades apontadas podem ser contornadas.
Uma abordagem moderna da remuneração
tradicional deve procurar: alinhamento do
esforço individual com as diretrizes organizacionais; a orientação para o processo
e para resultado; e o desenvolvimento
contínuo do indivíduo.
Conforme ressalta Flannery (1996,
p.22), “não que as estratégias salariais
tradicionais – programas que funcionaram tão bem por tanto tempo – tenham
subitamente se virado contra nós. O que
mudou foram os valores organizacionais,
as culturas de trabalho e as estratégias de
negócio”.
Embora tenham sido largamente
desprezados, mudanças drásticas nas regras empresariais tornaram ineficazes as
estratégias tradicionais de remuneração.
Atualmente espera-se que os empregados
trabalhem em equipes e não individualmente. Espera-se que continuem aprendendo novas habilidades e assim papéis
mais amplos, que corram mais riscos e
assumam mais responsabilidades pelos
resultados.
Considerando que cada empresa
e setor se encontrem passando por um
conjunto específico de mudanças, Flannery (1996, p.24) destaca pelo menos
seis que são comuns a quase todas as empresas. São elas: “tecnologias em rápida
expansão, concorrência global crescente,
demanda crescente por competências e
capacidades individuais e empresariais,
maiores expectativas dos clientes, ciclos
cada vez mais curtos e mudanças nos requisitos pessoais”, entretanto, a forma
como as empresas reagem a essas grandes
mudanças varia de acordo com suas metas
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
86
e estratégias de negócio e com as mudanças que estão exercendo a maior “pressão”
dentro de seu ambiente. Mas examinando
cuidadosamente as estruturas, culturas e
valores verá que de modo geral há quatro
áreas primárias que as empresas focalizam
com o objetivo de alcançar os resultados
desejados. Essas quatro áreas de foco ou
ênfase são: tecnologia, foco no cliente,
flexibilidade e confiabilidade.
A remuneração funcional, em sua
forma tradicional, é reflexo de certa maneira de pensar a gestão dos negócios e
dos recursos humanos. Essa maneira é
adequada para determinado contexto estratégico e para alguns modelos de estrutura. Em um mundo com mudanças aceleradas, porém, talvez seja um risco alto
demais manter um sistema desse tipo que
apresenta uma série de contradições com
as práticas gerenciais emergentes.
3.2 Sistemas de Remuneração
Estratégica
Como já mencionado, as profundas
transformações que as empresas vêm sofrendo exigem novos sistemas de remuneração. Em ambientes caracterizados por
formas modernas de organização de trabalho – como multifuncionalidade e poucos níveis hierárquicos – não faz sentido
recompensar a contribuição individual ou
coletiva apenas com base em descrições
de atividades e definição de responsabilidades.
Interessante resposta foi dada pelo
Sr. Carlos Monnerat Rocha, presidente do
Grupo de Permuta e Informações Salariais
(GRUPISA/Rio), alguns dias antes da 9ª
edição do Congresso Nacional de Remuneração. Ao ser indagado sobre o porquê
da área de remuneração ter que passar por
constantes mudanças, o Sr. Carlos afirmou
que “o atual contexto empresarial, após a
globalização, está e estará em constante
mudanças, essa é a única certeza que temos. E isso reflete nos sistemas de gestão
de pessoas e principalmente em remune-
ração, pois trata-se da contra-partida que
é sagrado na vida das pessoas”.
Conforme afirma Coopers e Lybrand (1997, p.89), “a questão central é
transformar a visão usual da remuneração
como fator de custo em visão da remuneração como fator de aperfeiçoamento da
organização, como impulsionador de processos de melhoria e aumento de competitividade”.
A remuneração estratégica se torna
uma ponte entre indivíduos e a nova realidade das organizações e ocorre de duas
maneiras:
1 – No sentido de considerar todo o
contexto organizacional, ou seja, de levar
em conta as grandes categorias que dão
forma e conteúdo à empresa, que são: a
estratégia, a estrutura e o estilo gerencial.
Além disso, a concepção de um sistema
de remuneração estratégica parte não somente do que a empresa é hoje, mas também considera o que ela deseja ser amanhã (sua visão de futuro), e;
2 – À medida que os indivíduos passam a ser remunerados de acordo
com o conjunto de fatores que afeta sua
contribuição para o sucesso do negócio:
características pessoais, características do
cargo e vínculo com a organização. Além
das atividades e responsabilidades, o projeto de um sistema de remuneração estratégica também considera: conhecimentos,
habilidades, competências, desempenho e
resultados.
A remuneração estratégica é também um catalisador para a convergência
de energias na organização. Segundo Coopers e Lybrand (1997, p.90) “à medida
que o sistema de remuneração é alinhado ao contexto e à estratégia da empresa,
constitui fator de harmonização de interesses, ajudando a gerar consenso e atuando como alavanca de resultados”.
O Sistema de Remuneração é
uma combinação equilibrada de diferentes
formas de remuneração. Conforme afirmam Coopers e Lybrand (1997, p.90-1)
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
87
“a multiplicidade de formas de remuneração tem crescido devido à necessidade de
encontrar maneiras criativas para aumentar o vínculo entre as empresas e seus funcionários”. As formas básicas, entretanto,
mantém-se as mesmas, podendo ser classificadas em alguns grupos:
1 – Salário indireto: compreende benefícios e outras vantagens. A grande tendência neste caso é a flexibilização dos
benefícios. Na forma mais tradicional,
os benefícios variam de acordo com o
nível hierárquico. Na forma mais flexibilizada, cada colaborador escolhe o
“pacote” de benefícios de acordo com
suas necessidades e preferências, com
base nas alternativas disponíveis. A flexibilização minimiza o investimento da
empresa em benefícios, proporcionando alocação mais racional de recursos
em aumento de valor percebido pelo
colaborador.
2 – Remuneração por habilidades ou por
competências: é determinada pela formação e capacitação dos funcionários.
Essas formas deslocam o foco do cargo
ou função para o indivíduo. Os blocos
de habilidades ou competências passam a determinar a base da remuneração. Essas formas também se aplicam
preferencialmente a organizações que
passaram por grandes processos de
mudanças e adotam estruturas baseadas em grupos multifuncionais.
Segundo SILVA (1996, p. 71), “engessar as pessoas nos cargos se torna inadequado, pois se o nível de contribuição é diferente de pessoa para pessoa,
diferente também deveria ser a remuneração”.
3 – Remuneração variável: é vinculada
a metas de desempenho dos indivíduos,
das equipes ou da organização. Inclui a
participação nos lucros e a remuneração por resultados.
Conforme afirma Resende (1991,
p.67), “há necessidade de melhorar o
padrão dos salários, mas a única saída
Revista Integralização Universitária
que se apresenta não só como viável,
mas também como oportuna, é a da
remuneração variável baseada em ganhos de produtividade”. Tal fato justifica-se tendo em vista as limitações,
dificuldades e peculiaridades da solução via salário nominal, distribuição de
lucros imposto por lei e expansão dos
benefícios. Havendo retomada do desenvolvimento dos negócios e empreendimentos, parte do problema deverá
ser resolvido naturalmente, mas de maneira lenta. Cabe aos administradores
de recursos humanos e de remuneração fazerem a sua parte, encontrando
formas ou fórmulas de intensificar a
prática da remuneração variável nas
organizações.
Vive-se a era da descontinuidade e, por
isso, impõe-se adequar a remuneração
aos ciclos da economia e aos custos e
resultados das empresas. Os programas
de remuneração variável propiciam
mais justiça em relação à contribuição
das pessoas e incentivam maior comprometimento e envolvimento delas
com resultados da empresa.
4 – Participação acionária: é vinculada a
objetivos de lucratividade da empresa
e utilizada para reforçar o compromisso de longo prazo entre empresa e colaboradores. É algumas vezes utilizada
como alternativa à participação nos lucros e a remuneração por resultados.
5 - Alternativas Criativas: incluem
prêmios, gratificações e outras formas
especiais de reconhecimento. Essas
formas têm sido utilizadas com grande
freqüência como apoio no esforço de
construir um ambiente organizacional
caracterizado pela convergência de esforços e energias voltadas para o atendimento de objetivos estratégicos.
3.2.1 Participação nos Lucros ou
Resultados a Luz da Lei
Com relação à participação nos lucros ou resultados que podem também
ser incluídos no tópico que trata sobre
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
88
remuneração variável, segundo Corrêa
(1999, p.23), “em nosso ordenamento jurídico, vem sendo previsto na Lei maior a
Constituição Federal de 1946. Figurando
também na Lei maior de 1967; a questão
da participação nos lucros ou resultados
encontra-se no atual texto da Constituição
Federal de 1988, no art. 7º, inciso XI”.
Corrêa (1999, p.23) descreve, “a
Constituição Federal de 1988 trouxe importante alteração em relação aos textos
anteriores, ao desvincular da remuneração
dos empregados o benefício proporcionado pela participação nos lucros ou resultados”.
No que tange à participação nos
lucros ou resultados, essa matéria foi regulamentada por medida provisória, vale
ressaltar que a medida tem força de lei e
dessa forma elenca alguns tópicos importantes:
1 - Obrigatoriedade: em seu artigo 2º,
obriga todas as empresas a convencionar com seus empregados, por meio de
comissão por eles escolhida, integrada
ainda por um representante indireto
pelo sindicato dos trabalhadores, da
respectiva categoria, a forma de participação daqueles em seus lucros ou
resultados.
2 – Encargos e Tributos: em seu art 3º,
explicita a não incidência de nenhum
encargo social e trabalhista sobre os valores recebidos a título de participação,
por este não complementar a remuneração ou salário devido a qualquer empregado, não constituindo, assim, base
de incidência de encargo trabalhista
ou previdenciário, nem se aplicando o
princípio da habitualidade.
3 - Periodicidade: a periodicidade mínima permitida para a formação do
montante a distribuir, a título de participação nos lucros ou resultados, é de
seis meses, sendo vedado o pagamento
de qualquer antecipação ou distribuição de valores, em periodicidade inferior a um semestre.
4 – Critérios e Condições de Pagamento: os instrumentos resultantes
da negociação deverão conter regras
claras e objetivas quanto à forma de
distribuição, sua participação, período
de vigência, prazos para revisão, mecanismos de aferição do cumprimento
do que foi acordado, sugerindo como
critério e condição para a apuração da
participação que se utilizem índices de
produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa, bem como programa
de metas, resultados e prazos, pactuados previamente.
5 – Comissão de Trabalhadores e Negociação: tudo tem que ser negociado.
Na mesa de discussão, sentam-se de
um lado os empresários e do outro a
comissão de trabalhadores, constituída
pelos representantes dos empregados e
ainda um representante indicado pela
entidade sindical representativa dos
trabalhadores.
4 Conclusão
Não há dúvida de que a remuneração deveria ter um papel importante no
apoio aos valores organizacionais, estratégias de negócio e culturas de trabalho,
todos em mutação. Uma estratégia de
remuneração eficaz, embora freqüentemente desprezada, pode ser crucial para
utilizar satisfatoriamente as forças da mudança e fazer a empresa avançar. No entanto, o segredo não é descobrir a mais recente, a mais inovadora ou mesmo a mais
mecanicamente eficiente dessas soluções
salariais. O segredo é primeiro avaliar a
cultura da empresa e então alinhá-la com
suas metas estratégicas: que tipos de pessoas ela quer? O que a empresa quer que
eles façam? Somente após a empresa selecionar essas pessoas e identificar as metas
e responsabilidades que delas se espera,
poderá delinear programas de recompensas que proporcionem apoio e estímulo –
não tendências ou modas - nos programas
salariais dinâmicos, capazes de evoluir e
mudar à medida que a empresa progride e
se transforma.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
89
Acredita-se firmemente que a solução para a remuneração não reside em
abandonar a antiga abordagem padronizada em favor de uma nova. Para serem
vitoriosas, as empresas devem ter abordagens dinâmicas que misturem o conhecimento de remuneração desenvolvidos nos
últimos 50 anos com as abordagens de
ataque mais recentes. Mas antes, é preciso ajustar os programas de remuneração
com suas necessidades, metas e culturas
em transformação.
A maioria dos empresários já reconheceram que, com a implantação do
Plano Real e a abertura econômica trazendo a globalização da economia, a concorrência aumentou drasticamente e só tende
a sobreviver quem realmente puder oferecer produtos ou serviços com qualidade
e os preços competitivos. Esses objetivos
não são alcançados num passo de mágica.
É de extrema importância, sobretudo, motivar os funcionários, transformando cada
empregado em cúmplice, na luta pela sobrevivência.
A participação nos lucros ou resultados surge como modelo mais evoluído
de relacionamento entre capital e trabalho.
Pois, além de incentivar os funcionários a
entrar na luta por maior eficiência, qualidade, corte de desperdícios e obtenção
de melhorias de curto, médio e longo prazo, tornando-os parceiros do crescimento
continuado da empresa; também os consumidores finais têm a ganhar com a entrega de melhores produtos e serviços.
RESENDE, Ênio J. Cargos, Salários e Carreira: Novos Paradigmas Conceituais e Práticos. São
Paulo: Summus, 1991.
SALÁRIOS E BENEFÍCIOS, Congresso enfoca
remuneração, Boletim RH Maio 2005, disponível em< http//www.rh.com.br.> Acesso realizado
em 06 mai. 2005.
SILVA, Fernando Antônio, Administrando Pessoas: reflexões do cotidiano de um executivo de
recursos humanos. São Paulo: Negócios, 1996.
5 Referências
CORRÊA, Waldir Evangelista. Participação nos
lucros ou resultados: uma metodologia Inteligente Aplicável. São Paulo: Atlas, 1999.
COOPERS & LYBRAND, Equipe. Coordenador:
Vicente Picarelli Filho. Remuneração por Habilidades e Competências. São Paulo: Atlas, 1997.
FLANNERY, Thomas P. Pessoas, Desempenhos
e Salários: as mudanças na forma de remuneração
nas empresas. Tradução Bazán Tecnologia e Lingüística. São Paulo: Futura, 1997.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Foto: Kleiber Arantes
90
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
91
GESTÃO
A importância da qualidade da informação para as organizações
Suzana Gilioli da Costa Nunes1
Resumo: a Revolução da Qualidade em
produtos e serviços já está consolidada e
bastante difundida em todos os tipos de
empresas. Mas, muito se tem ainda para
conquistar no campo das informações.
Perdas incalculáveis ocorrem o tempo
todo devido à má qualidade da informação
que é utilizada pelas empresas. Considerando-se a importância da qualidade para
a empresa em todas as suas áreas e atividades, e a preocupação, cada vez maior,
em satisfazer o cliente, é necessário que
as empresas comecem a dar maior importância às informações que fluem dentro da
empresa e que são utilizadas no seu dia-adia. O artigo discute a preocupação atual
das empresas em relação à Qualidade da
Informação.
Palavras-Chaves: Produtos e Serviços;
Cliente; Qualidade da Informação.
Abstract: the Quality Revolution at products and services is consolidated and
enough publish at all kind of companies
. but, there are a lot to conquest at information area. Incalculables loss are present
all the time due to the bad quality of information utilized by the companies. If the
importance of the quality for the company
is considered at all areas an activities, and
the increasing preoccupation to satisfy
the client, it is necessary that the companies start to give more importance to the
information that runs in the company and
are used day by day. The article discuss
the present trouble of the companies about
the information quality.
Key-Words: Products and Services; Client; Information Quality.
1 Introdução
O movimento da qualidade no Brasil cresceu nos últimos anos com a adesão
de empresas de todos os setores, indepenRevista Integralização Universitária
dentemente do seu tamanho e da origem
do seu capital. Hoje, qualidade é um conceito importante para todos os segmentos da sociedade, os quais a definem de
diversas maneiras. Temos números que
demonstram a busca pela Gestão da Qualidade pelas Empresas. Por outro lado, a
informação é uma ferramenta de gestão,
imprescindível para a rotina e tomada de
decisões na empresa. Sem informações
não é possível se ter uma gestão eficiente.
Mas será que as organizações estão preparadas para lidar com um volume cada
vez mais significativo de informações?
Esta preocupação com a Qualidade se estende também às informações? A união
desses dois conceitos será o tema desse
estudo. Na busca dessas respostas, fez-se
uma Revisão Bibliográfica dos conceitos
envolvidos e buscou-se analisar o estado
atual de estudos sobre o assunto.
2 Conceito de qualidade
Para início do estudo, é necessário
conceituar o termo “qualidade”. Não se
conhece nenhuma definição curta que mereça a aprovação de todos os especialistas
sobre o que significa qualidade. A palavra
qualidade tem então, vários significados.
Tecnicamente, qualidade é definida
na norma NBR ISO 8402:1994 como “a
totalidade de características de uma entidade que lhe confere a capacidade de
satisfazer as necessidades explícitas e implícitas”.
Paladini (1990, p.26) comenta que
o fato de existirem diversas abordagens e,
por decorrência, muitos conceitos de qualidade, não se constitui entrave à sua compreensão, embora cause alguns conflitos
quando de sua aplicação prática. Na maioria dos casos, isso ocorre porque as áreas
da empresa têm visão parcial da questão.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Mestre em Gestão
da Qualidade Total
– UNICAMP, Coordenadora e Professora
da Católica do Tocantins e da Universidade
Federal do Tocantins.
1
92
Já Juran (1990, p.16) diz que
3 Conceito de informação
chegar a um acordo sobre o que se entende
por qualidade não é simples. (O dicionário
traz cerca de uma dúzia de definições).
Para os gerentes, nenhuma definição sucinta é realmente precisa, mas uma dessas
definições obteve larga aceitação: qualidade é adequação ao uso.
A globalização revolucionou o
mundo e os padrões, e a informação passou a ser considerada um capital poderoso, equiparando-se aos recursos de produção, materiais e financeiros. O que tem
sido relevante é a mudança fundamental
no significado que a informação assume
na nova realidade mundial de uma sociedade globalizada: agora a informação não
é apenas um recurso, mas o recurso.
A aceitação desta idéia a coloca
como recurso-chave de competitividade
efetiva, de diferencial de mercado e de
lucratividade nessa nova sociedade. A importância da informação para as organizações é universalmente aceita, constituindo,
senão o mais importante, pelo menos um
dos recursos cuja gestão e aproveitamento estão diretamente relacionados com o
sucesso desejado. A informação também
é considerada e utilizada em muitas organizações como um fator estruturante e um
instrumento de gestão.
Portanto, a gestão efetiva de uma
organização requer a percepção objetiva
e precisa dos valores da informação e do
sistema de informação. É importante tratar com grande rapidez as informações.
Oferecer informações agrupadas de maneira inteligente e em tempo hábil pode
significar a diferença entre o ganho e a
perda de cliente e mercado.
Basicamente, a informação tem
duas finalidades: para conhecimento dos
ambientes interno e externo de uma organização e para atuação nestes ambientes
(CHAUMIER, 1986). Saracevic (1999)
ressalta que informação tem uma variedade de conotações em diferentes campos.
Em alguns campos, incluindo a ciência da
informação, a noção de informação está
geralmente associada a mensagens. Nesse
sentido, existe um grande número de interpretações que são assumidas em diferentes abordagens teóricas e práticas para
o tratamento da informação.
Barreto (1996) define o termo informação da seguinte maneira: estruturas
Sobre esta definição de qualidade
dada por Juran, Paladini (1997, p.16) comenta:
Provavelmente, não se conseguirá definir
qualidade com tanta propriedade e com tão
poucas palavras. Deste conceito surge um
fato concreto: apesar da variedade muito
ampla de conceitos com a qual é definida,
entendida ou praticada, a qualidade deve
ser sempre definida de forma a orientar-se
para seu alvo específico: o consumidor.
Para se definir qualidade de modo
que seja útil na administração, reconhecese a necessidade de incluir na avaliação as
verdadeiras exigências do “cliente” - suas
necessidades e expectativas. Qualidade
então, é simplesmente o atendimento das
exigências do cliente e isso tem sido expresso de muitas maneiras por outros autores:
a) “adequação à finalidade ou uso”
(JURAN, 1990);
b) “a totalidade dos aspectos e características de um produto ou serviço,
importantes para que ele possa satisfazer
as necessidades exigidas ou implícitas” BS – 4778, 1987 (ISO 8402, 1994) – Vocabulários da Qualidade: Parte I – Termos
Internacionais;
c) “a qualidade deve ter como objetivo as necessidades do usuário, presentes
e futuras” (DEMING, 1990);
d) “o total das características de um
produto e de um serviço referentes a marketing, engenharia, manufatura e manutenção, pelas quais o produto ou serviço,
quando em uso, atenderá às expectativas
do cliente” (FEIGENBAUM, 1994);
e) “conformidade com as exigências”. (CROSBY, 1992)
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
93
significantes com a competência de gerar conhecimento no indivíduo, em seu
grupo, ou na sociedade. Trata-se de um
conceito muito interessante, devido à profundidade e abrangência alcançadas. O
objetivo principal da informação é informar. Muitas empresas hoje se esquecem
disso, preocupando-se muito mais com a
tecnologia que com a informação em si.
Informação são dados dotados de relevância e propósito. Para que seja entendido
esse conceito, recorre-se à distinção entre
dados, informação e conhecimento, que
leva a compreensão da informação como
parte da evolução de um processo, como
mostra a Tabela:
Quadro 1 – Comparação entre dados, informação e
conhecimento.
Algumas definições foram dadas
também por Karl Albrecht (1999, p.108)
em seu artigo “A 3ª Revolução da qualidade”:
a) Dados: átomos de matéria-prima
a ser trabalhada pelo homem. É o nível
simbólico irredutível, no qual a codificação alfanumérica permite transportar
a matéria-prima de um lado para outro,
como tantos grãos ou sacos de arroz. Os
dados são inertes. São granulares. Podem
ser armazenados e transportados a despeito de seu significado.
b) Informação: disposição dos dados de modo que faça sentido, criando padrões e ativando significados na mente das
pessoas. São as palavras, as ilustrações e
os sons, em lugar de grãos de dados. As
Revista Integralização Universitária
informações são dinâmicas. Existem no
nível da percepção humana.
c) Conhecimento: conteúdo de valor agregado do pensamento humano, derivado da percepção e manipulação inteligente das informações. Os conhecimentos
são transcendentes. Existem apenas na
mente do pensador. São a base de ações
inteligentes.
A administração informacional envolveu quatro “fluxos” de informação em
uma organização moderna:
a) informação não-estruturada;
b) capital intelectual ou conhecimento;
c) informação estruturada em papel;
d) informação estruturada em computadores.
A mais utilizada
pelas empresas e a estudada neste trabalho é a
“informação estruturada em computadores”.
Conforme Davenport
(1998), a importância do envolvimento
humano aumenta à medida que se evolui por esse processo dados-informaçãoconhecimento. A informação só será útil
para a empresa se for bem administrada. A
informação e o conhecimento das pessoas
da organização são as fontes mais valiosas
para gerar uma vantagem competitiva no
mercado globalizado. O gerenciamento
informacional é um conjunto estruturado
de atividades que incluem o modo como
as empresas obtêm, distribuem e usam a
informação e o conhecimento. Davenport
(1998) descreve o processo de gerenciamento da informação da seguinte forma:
Figura 1 – Processo de Gerenciamento da informação.
Fonte: adaptado de Davenport (1998).
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
94
Eduardo Amadeu (2000), em seu
artigo, diz que o ponto principal é perceber a informação pertencendo a dois domínios. No primeiro deles, ela deve atender às necessidades de uma pessoa ou de
um grupo. Nesse caso, a disponibilização
da informação deve satisfazer os seguintes requisitos:
a) ser enviada à pessoa ou ao grupo
certo;
b) na hora certa e no local exato;
c) na forma correta.
O segundo domínio é o da organização, que introduz questões a respeito
da determinação do valor da informação.
Nesse contexto, o valor da informação
está relacionado ao seu papel no processo
decisório.
custos, rapidez no processo de tomada de
decisão.
O uso de recursos computacionais
ainda deve assegurar que:
a) os dados primários são corretamente coletados e armazenados;
b) o processamento dos dados está
adequado às necessidades da organização;
c) os resultados fornecidos colaboram com o crescimento da organização.
d) os resultados fornecidos estão
aptos a formarem a base necessária para
apoiar o processo decisório;
e) acrescenta melhorias nos controles administrativos e organizacionais.
4 Sistemas de informação
Dentro dos estudos da Ciência da
Informação, a Qualidade já é ponto importante há algum tempo. Prova disso foi
a realização de um seminário em Copenhagem-Dinamarca, em 1989, promovido
pelo Nordic Concil for Scientific Information and Research Libraries (Nordinfo),
no qual destacou-se sua importância para
os praticantes da ciência da informação.
Diante da necessidade de pesquisa para
este artigo, foi verificada grande escassez de bibliografia para este tema. Foi de
grande contribuição a leitura de um artigo publicado por Nehmy e Paim (1998),
com título “A desconstrução do conceito
de ‘qualidade da informação’”. Neste artigo os autores fazem um estudo bastante
aprofundado sobre esse conceito, relatando dificuldades encontradas, vagueza
da noção, salientando a importância de
maiores estudos sobre o tema. No artigo
vários autores manifestam-se em relação
à dificuldade de conceituação do tema:
a) Ginman (1990, p.18) ratifica essa
percepção quando diz: “Não há definição
geralmente aceita sobre qualidade da informação. Para muitas pessoas o conceito
tem aspectos vagos e subjetivos”.
b) Wagner (1900, p.69), propõe-se
Por Sistema da informação (SI)
considera-se o sistema de organização
responsável pela recolha, tratamento, armazenamento e distribuição da informação relevante para a organização, com o
propósito de facilitar o planejamento, o
controle, a coordenação, a análise e a tomada de decisão ou ação em qualquer tipo
de organização. É um determinado tipo de
sistema que possui um processo de captação de dados que são submetidos a um
processamento que resultam em uma série
de informações de saídas. Um Sistema de
Informações não está, necessariamente,
relacionado com o uso de computadores.
Para Djalma de Pinho (2002), Sistemas de Informações Gerenciais (SIG) é
o processo de transformação de dados em
informações que são utilizadas na estrutura decisória da empresa, proporcionando,
ainda, a sustentação administrativa para
otimizar os resultados esperados. Podese ter um SI eficiente utilizando meios
manuais. O uso de tecnologias e recursos
computacionais poderão proporcionar as
seguintes vantagens: confiabilidade das
informações, vantagens competitivas,
aumento da produtividade, redução de
5 Qualidade da informação
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
95
a realizar um balanço dos estudos teóricos
sobre qualidade da informação e faz a seguinte declaração:
Há um problema de terminologia. O valor
da informação e não a qualidade é o conceito preferido como se vê em valor de uso
da informação, valor agregado da informação e valor de troca da informação. De
outro lado, o uso do termo ‘qualidade da
informação’ é escasso na literatura.
Nehmy e Paim (1998) reuniram comentários e impressões de alguns autores,
conceituando o termo, citados a seguir.
Marchand (1990) identifica cinco tendências de definição do conceito na literatura:
abordagem ‘transcendente’; abordagens
baseadas ‘no usuário’, ‘no produto’, e
na ‘produção’; abordagem da ‘qualidade
como um dos aspectos do valor’. As duas
grandes linhas de pensamento dominantes
na ciência da informação são: vertente que
enfatiza o produto (informação enquanto
coisa) e a centrada no usuário (abordagem
subjetiva).
Detalhando os conceitos propostos
por Marchand, tem-se:
a) Abordagem ‘transcendente’: tende a perceber o valor da informação como
absoluta e universalmente reconhecido.
b) Abordagem ‘baseada no produto’: é compreendida pelo autor como a
abordagem que tende a ver a qualidade da
informação em termos precisos e identificáveis, sendo seus atributos passíveis de
serem mensurados e quantificados.
c) Abordagem ‘baseada no usuário’:
entram em jogo, no julgamento da excelência, as particularidades individuais.
Assim, os tipos e fontes de informação
que mais satisfizessem o usuário seriam
as consideradas de melhor qualidade.
d) Abordagem ‘baseada na produção’: tende a ver quase sempre a qualidade como adequação a padrões estabelecidos de necessidade de informação do
consumidor. Desvios em relação aos padrões significariam redução da qualidade
da informação.
Revista Integralização Universitária
e) Abordagem da ‘qualidade como
um dos aspectos do valor’: toma a qualidade enquanto um dos atributos do valor.
Conforme Marchand, as cinco abordagens da qualidade da informação oferecem somente uma visão parcial e por vezes vaga dos elementos básicos da qualidade da informação. Em uma tentativa de
superar as limitações destas abordagens,
sugere uma tipologia da qualidade da informação, desagregando o conceito em
oito dimensões inter-relacionadas: valor
real, características suplementares, confiança, significado do tempo, relevância,
validade, estética e valor percebido. Em
todos os modelos propostos, foram verificados problemas teórico-metodológicos a
permear a questão da qualidade da informação. Dilermando Piva (1998), em seu
artigo, cita a grande importância da boa
qualidade das informações no mundo empresarial. Salienta ainda, que quanto mais
dependente de informação uma empresa
se torna, maior deve ser a garantia de uma
boa qualidade dessas informações. Com
isso, as empresas precisam avaliar as informações periodicamente. De acordo
com Bio (1996) as informações gerenciais
de qualidade caracterizam-se por ser:
a) Comparativas: especialmente
quando as informações refletem a comparação dos planos com a execução. No
entanto, quando não é viável tal tipo de
comparação (planejado x real), é melhor
alguma forma de comparação que possa
ao menos refletir tendências: por exemplo, comparações com períodos anteriores (mês, ano etc.).
b) Confiáveis: informações completamente distorcidas podem ser mais
prejudiciais do que a falta completa de
informações. O usuário precisa acreditar
na informação para se sentir seguro ao decidir.
c) Geradas em tempo hábil: Uma
informação, especialmente, se voltada
para o controle, deve estar tão próxima do
acontecimento quanto for possível, para
que haja tempo para efetuar as correções
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
96
cabíveis no planejamento ou na execução.
d) De nível de detalhe adequado: As
informações devem aparecer num nível
de pormenores adequado ao nível do usuário, sem apresentar nada de irrelevante e
tampouco um grau de síntese excessivo
com relação ao seu interesse.
e) Por exceção: ressaltar o que é relevante, destacar as exceções.
Karl Albrecht (1999), em seu artigo, salienta a importância da qualidade
da informação. Mais que isso, diz que já
se passou ou passando pela revolução da
qualidade de produtos e serviços. Esta
continuará acontecendo, mas outra que
está a caminho é a revolução da qualidade da informação. Destaca a importância
de se unir forças para melhorar essa qualidade. Um dos pontos bastante destacados por Albrecht é em relação aos custos
elevadíssimos resultantes dos defeitos ou
erros de manipulação das informações. A
redução de custos relativos à informação
poderia apresentar uma grande oportunidade de aumento no retorno do investimento de várias empresas. O autor cita
ainda diversos exemplos que ilustram as
conseqüências da má qualidade da informação:
a) 120 mil americanos morrem todos os anos por erro de diagnóstico, tratamento ou medicamento. Quem sabe o
custo real desse problema de qualidade da
informação?
b) Scanners instalados em pontosde-vendas em milhares de supermercados,
lojas de departamento e várias outras lojas
registram preços incorretos com uma freqüência que varia de 1% a 3%, em virtude
de erros na base de dados ou defeitos do
scanner. Isto significa milhões de registros de preços errados e outros tantos milhões de dólares perdidos.
c) 25% dos contribuintes norte-americanos que telefonam para a Receita Federal do EUA (IRS) pedindo informações,
recebem informações erradas a respeito
das regras da declaração de impostos e,
possivelmente, fazem sua declaração de
acordo com as instruções que lhe são dadas. O custo dessa falha de informação é
incalculável.
O descaso com as informações muitas vezes fazem parte de nosso dia-a-dia.
Recebem-se e passam-se informações incorretas todos os dias. O quanto se perde
com isso?
É necessário que sejam reduzidas a
produção indisciplinada e duplicação de
informações.
Karl Albrecht (1999) propõe um
processo de quatro fases para empresas
que queiram se comprometer seriamente
com a Garantia da Qualidade da Informação:
a) Avaliação: identificação dos problemas críticos e oportunidades relativas
à qualidade da informação. Envolve uma
revisão sistemática e uma análise de todos
os principais processos do negócio, incluindo o comportamento do funcionário
com relação à informação, à identificação
de atividades de alto custo ou alto volume
e à estimativa do custo da qualidade da
informação.
b) Priorização da mudança: Seleção
dos problemas e oportunidades relativos à
qualidade da informação que darão maior
retorno aos recursos investidos para abordá-los. Incluem-se aí sistemas de computação, fluxos de processo, práticas de trabalho e desenvolvimento de habilidades
necessárias dos funcionários.
c) Redesenho e “retreinamento”:
alteração de sistemas, processos e práticas, bem como auxílio às pessoas que os
usam para aprender e capitalizar as melhorias. Esse estágio pode também propiciar benefícios e redução de tempo do
ciclo. Muitas intervenções envolverão a
participação de funcionários, bem como
treinamento e convencimento para apoiar
novos padrões de comportamento com re-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
97
lação à informação.
d) Reintegração: tornar menos perceptíveis as ligações e os limites entre os
vários processos de negócio. Esse é processo sem fim, que abrange o enxugamento, a simplificação e a integração dos processos e comportamentos para alinhá-los
cada vez mais com a meta do negócio.
Termina seu artigo exaltando que
“os prejuízos reais causados à economia
de todos os países por causa de informações errôneas ou falhas nos processos são,
em última análise, imponderáveis”.
6 Considerações finais
No presente artigo foi apresentado
um fator de extrema importância para a
determinação do sucesso ou fracasso de
uma empresa: a informação. Nos tempos
atuais, a quantidade de informações está
aumentando rapidamente. Mas, muitas
vezes, em muitas empresas, a qualidade
dessa informação não é preocupação
primordial.
A utilização de informações
sem qualidade traz para as empresas
inúmeros problemas, dos mais simples
aos mais catastróficos. Uma das principais
conseqüências é em relação à imagem e à
confiabilidade da empresa no mercado em
que atua. É necessário que as empresas se
preocupem com as informações que fluem
de dentro de seus departamentos, pois são
instrumentos de trabalho e devem também
passar por uma Revolução da Qualidade.
Pelo estudo feito, pode-se
considerar que pouco se tem estudado
sobre Qualidade da Informação. Muito se
tem falado sobre Qualidade de Produtos
e Serviços, porém a Qualidade da
Informação, devido à sua importância, é
um campo aberto para um estudo mais
detalhado e abrangente. Ainda tem-se
uma grande carência, tanto em relação
a empresas que se preocupam com esse
campo, tanto em relação a estudos que
aprofundem melhor esse tema.
Revista Integralização Universitária
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- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
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Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
99
MEIO AMBIENTE
Alternativa ambientalmente correta para o tratamento líquido percolado
ou chorume combinado com esgotos domésticos.
Francisco Ferreira Dantas Filho1
Magna Sueli Barros Dantas2
Resumo: Neste trabalho foi estudado
o desempenho de um reator anaeróbio
de fluxo ascendente com manta de lodo
(UASB) no tratamento de líquido lixiviado advindo de processos de bioestabilização de resíduos sólidos de origem vegetal,
conjuntamente com esgotos domésticos,
ambos os substratos, provenientes da cidade de Campina Grande - PB. O experimento foi instalado e monitorado nas
dependências da Estação Experimental de
Tratamento Biológico de Esgotos Sanitários (EXTRABES) da Universidade Federal da Paraíba, localizado no bairro do
Tambor, na cidade de Campina Grande. O
reator UASB com capacidade de 600 L,
vazão de 1440 L/dia e TDH de 10 horas
se manteve em operação por um período
de 170 dias proporcionando uma carga orgânica volumétrica específica variando de
2,3 a 4,62 kg /m3.dia. O experimento foi
realizado em três fases. Verificou-se, durante o experimento, a eficiência de remoção de matéria orgânica (DQO) de 70, 73
e 72% durante as três fases. Os resultados
mostraram que a alcalinidade a bicarbonato da mistura (esgotos mais lixiviado)
é suficiente para manter o sistema tamponado, não ocorrendo, portanto, colapso
do reator, e o pH manteve-se próximo de
7. Portanto, tratar líquido lixiviado com
esgotos domésticos utilizando reator tipo
UASB é uma prática, técnica e economicamente viável, podendo contribuir para
a redução dos impactos sociais e ambientais, originados da disposição inadequada
de resíduos sólidos e líquidos.
Palavras-chave: Esgoto doméstico, líquido percolado, reator UASB.
Abstract: In this work it was studied the
Revista Integralização Universitária
performance of a upflow anaerobic sludge blanket in the treatment of liquid happening percolate of processes of bio-stabilization of solid residues typically vegetables jointly with domestic sewers, both
substrata, coming of the city of Campina
Grande - PB. The experimental system
was installed and monitored at the Experimental Station for Biological Treatment
of Sanitary Sewages (EXTRABES) of
Federal University of Paraíba, located at
Tambor, Campina Grande. The reactor
UASB with capacity of 600 L, flow of
1440 lite rs / day and hydraulic retention
time of 10 hours stayed in operation for
a period of 170 days with a specific organic volumetric loading varying from
2,3 to 4,62 kg /m3.dia. The experiment
was accomplished in three phases. During the experiment, the efficiency of
removal of organic matter (COD) of 70,
72 and 73 % during the three phases, as
well as the other parameters. The results
showed that the alkalinity to bicarbonate
of the mixture (sewers more percolate) it
is enough to maintain the system stable,
not happening, therefore, collapse of the
reactor, and the pH stayed close of 7. Therefore, to treat liquid percolate with domestic sewers using reactor type UASB
is a practice, technical and economically
viable, could contribute to the reduction
of the social and environmental impacts,
happening of the inadequate disposition
of solid and liquid residues.
Key Words: Domestic sewers, liquid percolate, reactor UASB.
1 Introdução
O crescente processo de urbaniza-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Doutorando em Química - UnB. Mestre em Desenvolvimento e Meio
Ambiente - PRODEMA
UFPB/UEPB(2003),
Pós graduação em estudo político e estratégico
(ADESG), Graduado em
Química –UEPB.
1
Magna Sueli Barros
Dantas. Mestranda em
contabilidade Ambiental, Especialista em gestão de custo, Bacharel
em Ciências Contábeis,.
Professora da Faculdade
Católica -TO
2
100
ção nas cidades brasileiras, as mudanças
de hábitos da sociedade contemporânea e
o desenvolvimento tecnológico, entre outros, têm contribuído sobremaneira para
o crescente consumo de bens e produtos,
conseguindo aumentar assustadoramente,
nesses últimos trinta anos, a taxa de geração dos resíduos sólidos urbanos nas
pequenas, médias e grandes cidades brasileiras.
Esses resíduos gerados vêm causando impactos negativos ao meio ambiente,
destacando-se a poluição das águas superficiais e subterrâneas, devido à produção
de percolado advindo dos lixões e aterros
sanitários.
O líquido percolado, gerado do processo de bioestabilização anaeróbia dos
resíduos sólidos contém, geralmente, produtos da decomposição do material orgânico, tais como: ácidos voláteis, material
amoniacal, sólidos dissolvidos, além de
metais pesados e outros constituintes tóxicos.
A cidade de Campina Grande, localizada no Planalto da Borborema no Estado da Paraíba, com uma população de 360
mil habitantes, produz diariamente cerca
de 200 toneladas de resíduos sólidos urbanos. Desse total, uma fração é coletada
regularmente e disposta em lixões (assim
denominado por falta de condições sanitárias mínimas exigidas pela NBR 84/9 da
ABNT, 1984). A outra fração não coletada é disposta em terrenos baldios, canais e
vazadouros, proporcionando assim a contaminação dos solos e, sobretudo dos recursos hídricos, constituindo uma ameaça
à saúde pública. (Lopes, 2000)
Numa cidade média do nordeste do
Brasil, um habitante produz diariamente
cerca de 500 gramas de resíduos sólidos
urbanos e 100 litros de esgotos. Uma prática ecologicamente sustentável será tratar
conjuntamente os resíduos sólidos e líquidos numa mesma estação de tratamento.
Dos 500 gramas de resíduos urba-
nos produzidos, um quarto se apresenta
na forma de matéria orgânica (125g), desta fração 30% corresponde à DQO. Teoricamente esta DQO (40g) submetida a tratamento anaeróbio produziria cerca de 10
gramas de metano e cinco litros de líquido
percolado gerados do próprio processo de
bioestabilização.
Assim sendo, faz-se necessário buscar alternativas tecnológicas de baixo custo para o tratamento do líquido percolado
produzido na bioestabilização anaeróbia
da fração orgânica dos resíduos sólidos
urbanos, que geram produtos indesejáveis. Portanto, o presente trabalho tem
como objetivo tratar o líquido percolado
gerado na degradação dos resíduos orgânicos, juntamente com esgotos sanitários.
2 Material e métodos
O sistema de tratamento constituise de duas unidades: a primeira compreende de um reator anaeróbio de Batelada,
que trata a fração orgânica putrescível
dos resíduos sólidos urbanos, gerando
percolado. A Tabela 1 apresenta as características deste reator.
Tabela 1 : Características físicas e operacionais
do reator de batelada.
Já para a segunda unidade tem-se
um reator tipo UASB, com capacidade
unitária de 600 litros, fabricado totalmente em resina de poliéster, reforçado com
fibra de vidro com espessura mínima de
1,5mm e equipado com aletas para o separador de fases, e suporte metálico, conforme mostra a Figura 1. As principais características físicas e operacionais do reator
UASB estão apresentadas na Tabela 2.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
101
Tabela 2: Características físicas do reator UASB
Para a alimentação do reator UASB
utilizou-se líquido percolado advindo da
primeira unidade (reator anaeróbio em
batelada que trata o material orgânico putrescível). O efluente produzido era encaminhado para um tanque de equalização
que recebia esgotos sanitários e líquido
percolado. A mistura era bombeada para o
reator UASB, através de bomba peristáltica. A vazão aplicada foi de 1440 litros por
dia para todas as fases do trabalho.
Para o controle operacional do
processo de digestão anaeróbia, durante
o período de monitoramento do reator,
acompanharam-se os seguintes parâmetros: alcalinidade total e a bicarbonato,
ácidos voláteis, temperatura e carga aplicada (Formas de nitrogênio e DQO). As
duas determinações iniciais foram efetuadas pelo método de Kapp (1998), os demais parâmetros foram determinados pelo
APHA (1995).
Figura 1: Representação esquemática
do reator UASB
Revista Integralização Universitária
O reator UASB foi inoculado com
200 L de lodo anaeróbio advindo do reator UASB que tratava esgotos sanitários. O lodo apresentava concentração de
60mg/L de ST com 65% de Sólidos Voláteis Totais. O reator foi monitorado por
um período de 170 dias, dividido em três
fases distintas. Como o reator UASB dependia da produção de percolado do primeiro reator, as fases foram determinadas
em função do reator de batelada. Na partida do reator UASB a carga aplicada foi de
2,3 Kg DQO / m³. dia.
Como a carga dependia da produção do percolado, à medida que o tempo
passava diminuía a concentração do líquido percolado, chegando aos setenta dias a
uma carga de apenas 0,62 kg DQO / m³,
caracterizando assim a primeira fase. Similarmente foram determinadas as fases
seguintes, conforme especificado na Tabela 3.
Tabela 3: Fases, períodos de operação
e carga aplicada.
3 Resultados
Na Tabela 03 são apresentados os
valores médios e o desvio padrão dos parâmetros: alcalinidade total e a bicarbonato, ácidos voláteis, DQO, DBO5, sólidos
voláteis e sólidos sedimentáveis de vinte,
dezoito e dez determinações da primeira,
segunda e terceira fases, respectivamente,
de operação do reator UASB, durante 170
dias monitorado à temperatura variando
de 25 a 34 ºC .
Os sólidos voláteis totais (SVT)
afluentes, nas três fases de operação, mantiveram-se na média 720, 890 e 930 mg.
L-1, respectivamente (Tabela 3). Estes valores são de duas a três vezes maiores do
que a concentração dos sólidos voláteis de
esgoto forte apresentados por Metcalf &
Eddy, 1997.
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
102
Já com relação aos sólidos voláteis
efluente, estes permaneceram na média de
270, 290 e 286 mg. L-1. Valores similares
foram encontrados por Sousa (2000) tratando esgotos sanitários em reator UASB
com tempo de detenção hidráulica de 6
horas..
_
Tabela 03 - Valores médios ( x ) desvio médio (
) de 20, 18 e 10 determinações de parâmetros
durante as três fases de operação do reator.
AT: alcalinidade total; AB: alcalinidade a
bicarbonato
4 Estabilidade Operacional do reator
UASB
Os parâmetros que foram monitorados durante o período de operação do
reator UASB foram: pH , temperatura, alcalinidade total e a bicarbonato e concentração de ácidos graxos voláteis, sendo
estes parâmetros indicativos da estabilidade operacional. Já com relação à carga
orgânica foram determinados: demanda
química de oxigênio e demanda bioquímica. Na digestão anaeróbia, durante o
catabolismo fermentativo, alguns requisitos são necessários para que o processo
ocorra adequadamente. Nesse sentido, no
experimento usou-se esgoto sanitário para
que se mantivesse um pH próximo do
neutro, que é um requisito fundamental,
pois o pH interfere na taxa de crescimento
das bactérias que participam na digestão
anaeróbia.
Figura 2: Comportamento do pH afluente e
efluente, durante o período de operação do reator.
A Figura 2 apresenta o valor médio
do pH afluente e efluente a cada dez dias
de operação do reator UASB. Observa-se
que durante a primeira fase de operação o
pH manteve-se em torno de 7,0 e o efluente produzido apresenta pH variando de 7,2
a 7,7. Já no início da segunda fase, com
carga de 3,07 kg.m-3.dia-1 , o pH afluente se manteve próximo a 6,5 e o efluente
um pouco abaixo de 7,0. Finalmente na
última fase, quando o reator UASB foi
operado com maior carga, o pH afluente
decresceu nos primeiros dias mantendo-se
durante quase toda a fase com pH maior
que 7,0.
De uma forma geral, durante as três
fases nas proporções de 1, 5 e 10% do líquido percolado na mistura com esgotos,
o pH se manteve próximo de 7, valor este
considerado favorável para as bactérias
acetogênicas e metanogênicas. (Gujer e
Zehnder, 1983)
A grande quantidade de esgotos
sanitários usados na mistura garante um
pH ideal para evitar um colapso do reator.
As populações de bactérias presentes no
reator devem ser mantidas no sistema de
forma que, à medida que ocorre a geração
de ácidos voláteis na mesma velocidade,
esses produtos formados sejam utilizados
pelas bactérias metanogênicas hidrogenotróficas e acetotróficas (Moosbrugger e outros, 1993; van Haandel
e Lettinga, 1994; Chernicharo,
1970).
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
103
Uma outra vantagem da presença
de esgotos na mistura utilizada é a capacidade de tamponamento, os esgotos
sanitários mantêm os sistemas carbônico
(CO2-HCO3--CO3-2), amônia, fosfato, sulfato e ácidos graxos voláteis, resistentes à
variação de pH.
A Figura 03 apresenta o comportamento da concentração afluente e efluente de alcalinidade a bicarbonato durante
as três fases de monitoramento do reator
UASB. Observa-se que a alcalinidade a
bicarbonato afluente se manteve na média
de 323 e 311 mg CaCO3 /L na primeira
e segunda fases, respectivamente, passando a 393 mg CaCO3 /L na terceira fase. A
concentração de bicarbonato mantém um
pH muito favorável para digestão anaeróbia. O sistema carbônico apresenta uma
alta capacidade de tamponamento.
Nestas condições, num reator anaeróbio, as espécies carbonato, hidróxido
e próton hidrogênio aparecem em menor
concentração do que o íon bicarbonato.
Por outro lado, ocorre um aumento de alcalinidade no efluente produzido.
deve-se à alcalinidade produzida no próprio reator, bem como àquela contida na
água de abastecimento da cidade de Campina Grande, que se mantém geralmente
em torno de 250 mg CaCO3 /L.
Com relação aos ácidos graxos voláteis, observa-se na Tabela 3 que a concentração efluente manteve-se na média
de 76, 102 e 60 mg HAc / L , na primeira,
segunda e terceira fases, respectivamente.
No início de cada fase, ocorreu um
aumento na concentração efluente de ácidos, provavelmente devido ao aumento
da carga volumétrica aplicada. No entanto, cerca de vinte dias após, ocorria decaimento tornando-se assim uma concentração baixa de ácidos voláteis (60 a 102
Hac/L), significa dizer que a atividade
metanogênica era garantida não havendo
acúmulo de ácidos. Esse comportamento,
indica uma boa eficiência do processo de
digestão, pois o reator apresentava uma
alta capacidade de transformar o acetato,
gás hidrogênio e gás carbônico em metano.
5 Remoção de Matéria Orgânica
Figura 3: Alcalinidade a bicarbonato afluente
e efluente, durante as três fases de operação do
reator UASB
Para a eficiência de remoção da
matéria orgânica, utilizou-se a DQO
como parâmetro, determinando-se o valor
afluente e efluente. Observa-se na Figura
4 que na primeira fase de operação do reator a eficiência manteve-se na média de
70% , mantendo-se 73 e 72% nas segunda e terceira fases, respectivamente.
Observa-se na Figura 03 que durante a primeira fase de operação a concentração de bicarbonato efluente se manteve
na média de 460 mg CaCO3 /L crescendo
na segunda para 506 e para 625 mg CaCO3
/L na terceira fase (Tabela 3). A alta alcalinidade efluente apresentada (Figura 3)
Pessin e outros (2000) operando reator tipo UASB obtiveram eficiência de
remoção um tanto similar, no entanto, a
carga orgânica aplicada foi bem menor
(0,48 kg/m 3 dia).Segundo os autores, a
taxa de carregamento orgânico no caso
do percolado pode variar de 0,8 a 10 kg/
m 3 dia.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
104
CHERNICHARO, C. A. L. Reatores anaeróbios:
princípios de tratamento biológico de águas residuárias. Belo
������������������������������
Horizonte: Ed. UFMG, s/d.
GUJER, W. e ZEHNDER, A. J. B. �����������
Conversion
processes in anaerobic digestion. Wat. Sci.
Tech., v.15, p..127-167,�����
1983
Figura 4: Comportamento da DQO afluente e
efluente, durante o período de operação do reator
UASB
6 Conclusões
Tratar conjuntamente líquido percolado com esgotos domésticos em reator
anaeróbio de fluxo ascendente com manta
de lodo pode se tornar uma promissora alternativa tecnológica.
A eficiência de remoção de matéria orgânica expressa na forma de DQO
manteve-se, na média de 70% na primeira
fase, 73 e 73% nas segunda e terceira fases, respectivamente.
A alcalinidade a bicarbonato no
afluente durante todo o período de operação do reator UASB variou de 311 a 393
mg CaCO3 /L, mantendo-se na média de
342 mg CaCO3 /L, indicando que a mistura (líquido percolado e esgotos sanitário)
apresenta boa capacidade de tamponamento.
Durante todo o período de monitoramento não ocorreu colapso do sistema,
o valor do pH sempre se manteve na faixa
ideal para a digestão anaeróbia.
7 Agradecimentos
LOPES, W. S Biodigestão Anaeróbia de Resíduos Sólidos Urbanos Inoculados com Rúmen
Bovino. 103f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – PRODEMA:
Universidade Federal da Paraíba /Universidade
Estadual da Paraíba, 2000.
MOOSBRUGGER, R. E; WENTZEL, M. C;
loewenthal, r. e; EKAMA, G. A and MARAIS,
G. V. R._ Alkalinity measurement part 3 – a 5
point titration method to determine the carbonate and SCFA weak acid/bases in aqueous
solution containing also known concentration
of other weak acid/bases. ���������������������
Water SA, Cape Town,
South Africa. v.19, n 1, p.29–40, 1993..
OLIVA, L. C. H._ Tratamento de esgotos sanitários com reator anaeróbio de manta de lodo
(UASB) protótipo, desempenho e respostas dinâmicas às sobrecargas hidráulicas.. 218f. Tese
(Doutorado) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, 1997.
PESSIN, N; BRUSTOLIN; FIUKLER. Determinação da eficiência de tratabilidade de reatores
biológicos para atenuação de carga orgânica presente no chorume proveniente de aterros sanitários
In: Simpósio Luso-brasileiro de Engenharia
Sanitária e Ambiental, Porto Seguro, Ba, 200p.
1496-1503, ABES, Rio de Janeiro.
SOUSA, F. P. de_ Influencia da relação entre a
área e a profundidade sobre o desempenho de
reatores anaeróbios de fluxo ascendente com
manta de lodo (UASB).. 103f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Centro de Ciências
e Tecnologia, Universidade Federal da Paraíba,
1999.
Os autores deste trabalho agradecem o apoio financeiro concedido pela
FINEP/PROSAB para a realização deste
trabalho e do CNPq pela concessão das
bolsas de pesquisas.
8 Referências
APHA, AWWA, WPCF – Standard Methods for
the Examination of Water and Wastewater. ���
18
ed. Washington, 1995.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
105
DIREITO
O período jurídico oitocentista na órbita das academias Brasileiras
Armando Soares de Castro Formiga1
Resumo: O artigo aborda, sob a perspectiva da Historiografia do Direito, a formação do Periodismo Jurídico no Brasil, que
emergiu a partir de 1843 e atuou como importante elo no florescer da cultura jurídica oitocentista. Os jornais e revistas jurídicos se desenvolveram de diversas formas,
em especial, na órbita das Academias de
Direito. Primeiro em São Paulo e Recife;
mais tardiamente no Rio de Janeiro, Ouro
Preto, Belo Horizonte e Salvador.
Palavras-chave: História do Direito; Periodismo Jurídico; Ensino Jurídico no século XIX.
Abstract: This paper shows, under the
historiographical perspective of the Law,
aspects of the periodic scientific jurisprudential movement that emerged in Brazil
in 1843. These publications really supported the early Brazilian juridical culture
and allowed it to expand. Newspapers and
magazines had several editorial lines, but
specifically here, it will be identified the
academic production a priori in Sao Paulo and Recife; and later in Rio de Janeiro,
Ouro Preto, Belo Horizonte and Salvador.
Key-Words: - Law Historiography;
Scientific Judicial Periodic; Brazilian
Law Schools in 19th Century.
1 Introdução
A incursão da Católica do Tocantins,
ao apostar na elaboração de uma publicação científica medrada do seio acadêmico,
induz-nos imediatamente a rememorar a
marcante trajetória do florescer do periodismo jurídico oitocentista.
Neste artigo encontram-se catalogados os periódicos que nasceram nas
entranhas das Faculdades de Direito (ou
orbitaram esse universo letrado) nas cinRevista Integralização Universitária
co últimas décadas do século XIX. Antevendo o futuro, as empoeiradas páginas
de nossa Revista poderão embevecer o
curioso investigador duma época vindoura. Aqui, ele aferirá a produção científica
incentivada pela Instituição neste início
de milênio.
Nos últimos anos, o interesse pelo
periodismo jurídico arrebatou novos pesquisadores. No mofo, nas traças e na poeira dos velhos jornais e revistas, investigadores buscam o fluido para azeitar novas
perspectivas nos estudos jus-historiográficos. O italiano Paolo Grossi (1997), pioneiro e grande incentivador das investigações posteriores realizadas sobre o tema,
afirmara que a história das revistas restitui a complexidade do Direito Moderno; a
complexidade do cultural; a complexidade da substância.
Ao dissertar sobre as publicações
científicas dirigidas ao Direito, na centenária Universidade de Coimbra, Portugal,
Armando Formiga (2005) catalogou os
periódicos jurídicos editados no Brasil
do século XIX e que foram lançados por
associações, pela iniciativa privada, pelas
Faculdades, pelos acadêmicos e pelos Tribunais2.
O autor brasileiro, antes de redigir
a dissertação sobre o periodismo jurídico
no Brasil do século XIX, procurou o escritor Luís Bigotte Chorão (2002), jurista
que esmiuçou o movimento jus-periodista
oitocentista em Portugal. O então mestre
lisboeta cordialmente ajudou a traçar o
curso que deveria ser percorrido; em especial o cariz metodológico. Para satisfazer os objetivos da investigação, Chorão
insistiu que não bastaria a mera individualização dos títulos da imprensa jurídica
– seguida da narrativa das histórias par-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
É Mestre em Ciências
Jurídico-Históricas pela
Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, Portugal; Professor
da disciplina de História
do Pensamento Jurídico,
no Curso de Direito da
Faculdade Católica do
Tocantins; Consultor da
Assembléia Legislativa
do Estado do Tocantins;
Advogado; Administrador de Empresas; Jornalista.
1
As pesquisas foram efetuadas com base nos seguintes acervos: Biblioteca
Nacional, Rio de Janeiro;
Biblioteca da Fundação
Joaquim Nabuco, Recife;
Biblioteca da Faculdade
de Direito de São Paulo,
São Paulo; Biblioteca do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre; Biblioteca
da Faculdade de Direito de
Coimbra, Coimbra, Portugal; Biblioteca Nacional,
Lisboa, Portugal.
2
106
Inicialmente, um Congresso Constituinte foi instaurado e depois dissolvido
pelo Imperador. Pedro I
terminou por impor uma
Constituição que retratava
suas idéias.
3
ticulares de cada periódico. Esta opinião
ele já havia consignado em sua obra: “A
finalidade que temos em vista é a de apurar as diferentes expressões da influência
exercida na cultura jurídica [...] pelo movimento periodístico analisado” (CHORÃO, 2002). Seria necessário construir
um imprescindível vetor do estudo que
considerasse a biografia ou bio-bibliografia dos protagonistas ligados aos diversos
projetos editoriais analisados.
Antes de encarar o teclado e o ecrã
do computador, a missão do investigador tupiniquim incluiria o levantamento
de todos os periódicos que circularam no
século XIX, distinguindo as publicações
originariamente jurídicas das que mesclavam outros segmentos do jornalismo,
como o material tipicamente processual
da Justiça. Em seguida, era preciso enxergar todos os atores e personagens envolvidos diretamente na produção periódica, identificando o contributo de cada
personagem no processo de formação da
emergente tradição jurídica brasileira. De
fato, a história dos periódicos jurídicos
associa-se significativamente à infância
jurídico-cultural brasileira.
O Brasil oitocentista foi alinhavado
por inúmeras mudanças, em especial, no
quadro jurídico nacional. Neste terreno
fértil, o jurisperito brasileiro afirmou-se
pela escrita e pela cultura, ao deitar às páginas das revistas especializadas escritos
que espelhavam a inquietude daqueles
tempos. O pensamento como “balão de
ensaio”, que via nos periódicos o laboratório perfeito para experimentar idéias,
testar fórmulas doutrinais inéditas, polemizar fatos e, principalmente, revelar
novos atores; personagens heterogêneos
da nascente classe dos intelectuais brasileiros, integrada por magistrados, advogados, burocratas, lentes, acadêmicos, políticos, escritores e até poetas.
Como fonte jus-historiográfica,
o abundante campo de trabalho estava
pronto a despertar. Das páginas dessas
publicações, projetou-se o extraordinário
desempenho coadjuvante exercido pela
produção periodista no medrar jurídicocultural brasileiro.
Alguns aspectos históricos precisam
ser amarrados. A elaboração da primeira Constituição sinalizou o desabrochar
duma cultura jurídica verdadeiramente
brasileira. Com a instalação da Constituinte, o imperador foi alertado para a necessidade de estimular a instrução pública, mormente a superior3. Mesmo com a
intenção programática consignada na primeira carta política brasileira, três anos se
passariam entre a promulgação do texto
constitucional imposto por Pedro I (1824)
e a edição da Lei que instituiu os Cursos
de Ciências Sociais e Jurídicas de Olinda
e São Paulo (1827).
Outra pilastra importante na formação jurídico-cultural remete ao estabelecimento do Instituto dos Advogados
Brasileiros (1843), “um desdobramento
quase natural, por assim dizer, dos cursos
de Direito. É inquestionável que os fundadores desta entidade, desde há primeira
hora, aspiravam à autonomia corporativa,
inspirados na cultura jurídico-francesa,
em especial na da Ordre des Avocats”.
(GUIMARÃES, 2003)
Curiosamente, as primeiras ações
tomadas pela entidade estavam umbilicalmente ligadas ao nascimento do periodismo jurídico brasileiro. A proposta formal
para a criação do IAB partiu do conselheiro Francisco Alberto Teixeira de Aragão,
ministro do STJ, que fez publicar na Gazeta dos Tribunaes (1843) – primeiro periódico jurídico nacional – um manifesto
que propunha a fundação de uma Associação de Advogados. A partir de então, a
Gazeta passou a divulgar com freqüência
os fatos e as obras do recém-instaurado
Instituto dos Advogados.
Ao longo do século XIX, a imprensa jurídica adolesceu paralemente ao
fortalecimento institucional da máquina
burocrático-estatal, na medida em que
surgiam e desapareciam inúmeras novas
publicações.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
107
2 O periodismo jurídico
O século XIX reuniu todos os fatores favoráveis ao crescimento do periodismo no mundo – quer generalista,
quer especializado. Economicamente, foi
no oitocentos que a tecnologia aplicada
à fabricação do papel e à manufatura de
impressoras (cada vez mais rápidas) permitiu às tipografias desenvolverem uma
linha de produção mais eficaz. Com o
liberalismo, a censura prévia diminuira,
dando espaço à liberdade de expressão;
um princípio já consignado em algumas
Constituições políticas. Em França e nos
Estados Unidos, o jornalismo obteve um
crescimento vertiginoso. No Brasil, o regente João autoriza a implantação da Imprensa Régia (1808).
O aparecimento do periodismo especializado – nomeadamente nas áreas
das ciências sociais, medicina e engenharia – impulsionou a disseminação da
produção intelectual, cultural e científica,
num fluxo desvairadamente dinâmico, polêmico, instantâneo e quase-imediato.
O pensamento jus-filosófico do século XIX consolidou o império das leis e
dos códigos, contrapondo à Escola Histórica do Direito, liderada por Savigny. Com
o aparecimento dos primeiros periódicos
jurídicos, os jurisconsultos passaram a
pulverizar seus escritos, impregnados pelo
frescor do atual, afruntando o fértil caleidoscópio doutrinário dessa época. Além
do doutrinal, era preciso dar publicidade
aos julgados; divulgar as leis; comentar
os códigos; enfim, expor-criticar-apoiar
novas teorias.
Na nova óptica do jurista, o tempo passou
a medir-se em termos mais curtos e exigentes. Defronte de um legislador tomado
de vertigem empreendedora, o jurista tornou-se ansioso e sôfrego de informações
precisas e actuais [e] quanto menor fosse
o intervalo de periodicidade, maior seria a
garantia de actualidade. (MARCOS, 2002)
É impossível desassociar a evolução das Ciências Jurídicas do papel importante exercido pelo periodismo juríRevista Integralização Universitária
dico, em especial, no Brasil oitocentista,
que procurava estabelecer uma identidade
cultural no campo do Direito.
Segundo Chorão (2002), a história dos periódicos jurídicos constitui a
história da cultura de um povo: “Milhares de páginas impressas permitem-nos
a descoberta de valores e ideais, projectos, influências e leituras, teoria e prática,
personalidades e itinerários individuais e
institucionais, intelectuais e cívicos”. Por
sua vez, o italiano Paolo Grossi (1997)
observa que os periódicos jurídicos vivem no tempo, refletindo com a límpida
nitidez o sentido de um itinerário, o qual,
precisamente com a longitude de uma linha ininterrupta, evidencia com clareza a
estabilidade, as variações e as revoluções
desse mesmo itinerário.
O estudo das revistas e jornais jurídicos atende objetivamente a dois planos:
(a) contrariar os prejuízos de visões monoliticamente dogmáticas; (b) fundamentar sínteses futuras que permitirão traçar
novos entendimentos do Direito e da realidade histórica, à luz das revelações que
este estudo proporciona, em função do
carácter notadamente analítico, atento aos
detalhes, às particularidades e a considerar fatores extrajurídicos.
Na Europa, o fenômeno do periodístico brota no final do século XVIII, precisamente na França. Servem de referência
Journal des Causes Célèbres (1773), Gazette des Tribunaux (1786) e Jurisprudence de la Cour de Cassation (1791).
No entanto, a grande influência inicial foi
marcada pelas publicações jurídicas germânicas: Friedrich Carl Von Savigny iniciou a edição do periódico Zeitschrift für
geschichtliche Rechtwissenschaft (1815),
juntamente com K. F. Eichhorn e T. F. L.
Goschen. Em 1820, é lançado o Archiv
der Gesellschaft für aeltere deutsche Geschichtskunde, seguido por Zeitschrift für
deutsche Recht (1820).
Paralelamente aos lançamentos germânicos, o italiano Bartolomeo Belli deu
ao prelo a Raccolta delle più importanti
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
108
decisioni dei Suprimi Tribunali de contenziosa (1816), seguido do Repertorio
generale di giurisprudenza dei Tribunali
Romano (1817), publicado até 1861. Fundado por Giuseppe Maria Regis, o Diario
Forense Universale circulou pela primeira
vez em 1823; já Annali di giurisprudenza
(1839) foi editado pela Sociedade Toscana
de Jurisconsultos. Dos
����������������������
primórdios do jusperiodismo hispânico, podemos anotar as
iniciativas da Gaceta de los Tribunales
(1834); Anales Administrativos (1834);
Boletín de Jurisprudencia y Legislación,
Crónica Jurídica (1839); La Universidad
y El Foro (1843/1845); El Foro Nacional;
e Revista General de Legislación y Jurisprudencia.
Em Portugal, a vitória liberal permitiu algumas condições favoráveis ao
surgimento de iniciativas com este cariz.
Em Lisboa, Porto e Braga, os profissionais do Direito se organizam em associações de classe. No seio da Sociedade
Jurídica de Lisboa surgiu o primeiro periódico do gênero (CRUZ, 1975). A codificação chegara a Portugal de forma
marcante e as revistas jurídicas se atrelaram ao imediatismo do fato atual; o leitor
passava a consumir informação e exigir
uma periodicidade maior. Esta demanda
somente começaria a ser suprida com o
aparecimento de importantes publicações
– distintas pela longevidade das iniciativas – como a Revista de Legislação e de
Jurisprudência (1868), O Direito (1868)
e – anos depois – a Revista dos Tribunaes
(1882). Estes periódicos experimentaram
uma organização sólida, a qual os transportou pelo tempo adiante.
3 O movimento periodista no Brasil
No começo do Segundo Reinado
foi lançado, no Rio de Janeiro, o primeiro periódico jurídico brasileiro: A Gazeta
dos Tribunaes (1843), porta-voz do conselheiro Francisco Alberto Teixeira de
Aragão no projeto que ele capitaneou de
criação do Instituto dos Advogados Brasileiros (1843).
Nas páginas da Gazeta, Aragão sugeriu a criação de uma entidade que facilitasse, quando fosse oportuno, o advento
da Ordem dos Advogados. A Gazeta dos
Tribunaes, lançada em janeiro, atuaria
verdadeiramente como “abre alas” no
processo de criação do IAB (1843).
Foi nesta fase, estigmatizada pelos
Gabinetes liberais, que se registra o aparecimento dos primeiros jornais jurídicos.
Foi também nesta época que começou a
articulação em prol de uma codificação
civil brasileira, com a contratação do jusrisconsulto Augusto Teixeira de Freitas.
Os periódicos editados nas duas décadas seguintes ao número inaugural da
Gazeta dos Tribunaes, do ponto de vista editorial, apresentavam um conteúdo
acanhado, típico das gazetas. Respeitáveis revistas de caráter doutrinal somente apareceriam nos idos de 1862, com o
lançamento dos primeiros números da Revista do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão oficial do Instituto
dos Advogados Brasileiros (semente da
OAB), e da Revista Jurídica, de José da
Silva Costa e José Carlos Rodrigues.
No quadro político do Alto Segundo Reinado, jovens idealistas lançaram o
Manifesto Republicano e cobravam mais
intensamente o fim da escravidão. Nesta
época, importantes publicações começaram a circular. Traziam, além da doutrina,
comentários às decisões jurisprudenciais
e inseriam os diplomas legislativos mais
relevantes. Destacaram-se Gazeta Jurídica (1873) e O Direito (1873). Ao todo,
Formiga (2005) catalogou 52 periódicos
jurídicos, editados entre 1843 e 1900.
Destes, 23 originam na órbita das Academias de Direito.
Com o advento da República, o regime promoveu imediatamente significativas reformas na estrutura do Poder Judiciário, criando os Tribunais Superiores
Estaduais – com sede nas capitais dos Estados – e a Justiça Federal. No plano educacional, uma nova legislação permitiu a
implantação de Faculdades Livres, dando
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
109
novos rumos ao Ensino Superior. Como
reflexo das mudanças, dois novos formatos editoriais se consolidaram: (a) as revistas científicas acadêmicas e (b) as revistas
de cunho exclusivamente jurisprudencial;
segmento aberto com a implantação dos
Tribunais Superiores nos Estados.
A reforma do Ensino Superior de Benjamin Constant obrigou as Congregações das
Academias de Direito a produzirem revistas científicas. Assim surgiram, na década
de noventa, dentre outras, a Revista da
Faculdade de Direito de São Paulo, Revista Acadêmica da Faculdade de Direito
do Recife, Revista da Faculdade Livre de
Direito de Minas Gerais, Revista da Faculdade Livre de Direito da Cidade do Rio
de Janeiro. Nomes como Clóvis Beviláqua
e Sylvio Rodrigues abraçaram os projetos
das publicações acadêmicas.
Na evolução periodismo jurídico
brasileiro destaca-se ainda a produção
originada nos corredores das Faculdades.
As publicações estudantis que orbitaram
inicialmente os Cursos de Recife e de São
Paulo apresentavam-se como verdadeiros
laboratórios e exercitavam o pensamento
dos pretensos jurisconsultos; nomes que
se estampariam daí por diante na literatura, nos Tribunais e nos palanques políticos.
4 Títulos originados nas academias
Eis os títulos catalogados. Dentre
os 23 periódicos jurídicos acadêmicos
relacionados com base na pesquisa de
Formiga (2005), é possivel identificar as
publicações (a) que nascerram do fervor
estudantil; (b) que resultaram da iniciativa programática das Faculdades; (c) que
surgiram por força das reformulações de
Benjamin Constant.
a) Ensaio Philosophico Pernambucano Periódico Scientifico e Litterario
(Recife, 1857) - No cerne do academismo pernambucano, três anos depois da
transferência da Faculdade de Olinda para
o Recife, surgiu o Ensaio Philosophico
Pernambucano – Periódico Scientifico e
Litterario. Circulou, embora sem consRevista Integralização Universitária
tante periodicidade (entre 1857 e 1859),
impregnado pelo debate que seguia uma
tónica assumidamente filosófica; aliás,
como aparecia anunciado na primeira edição: “Não faltam escriptores conteporaneos que reconheçam no tempo em que
vivemos a mais profunda e irresistível
tendência para o materialismo. O Ensaio
Philosophico Pernambucano [...] é um
franco, porêm solemne protesto contra a
materialidade da epocha”. A publicação
tinha como redatores Laurentino Moreira
de Carvalho e Pergentino Saraiva Araújo
Galvão.
b) Revista Acadêmica – Jornal de
Sciencias e de Litteratura (Recife, 1858)
- Publicada quinzenalmente e “dirigida por uma Associação de Acadêmicos”
matriculados na Faculdade de Direito do
Recife, circulou – no ano de 1858 – a Revista Acadêmica: Jornal de Sciencias e de
Litteratura4. A produção editorial foi capitaneada por José Joaquim Tavares Belfort, com a colaboração de José Júlio de
Albuquerque Barros e Francisco Franco
de Sá.
É inquestionável a função experimental (até mesmo laboratorial) que este
gênero de publicação exercia na atividade
acadêmica. Este exercício intelectivo estudantil refletiria sensivelmente na futura
produção jurídico-literária de cada integrante do corpo redatorial, a exemplo do
que aconteceu com Tavares Belfort.
c) Revista da Academia de São Paulo – Jornal Scientifico, Jurídico e Histórico (São Paulo, 1859) – Dentre os periódicos editados pelos acadêmicos do Largo
de São Francisco, inclui-se a Revista da
Academia de São Paulo – Jornal Scientifico, Jurídico e Histórico, que circulou
de forma meteórica entre abril e agosto de
1859. Na segunda edição, sobressai o artigo escrito pelo então estudante José Vieira Couto de Magalhães, “Apontamentos
sobre o methodo dos Allemaes no estudo
da jurisprudência”.
d) Annaes do Ensaio Acadêmico (São Paulo, 1862) – “O vasto mundo
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Dizia o texto de apresentação: “Legar, aos
vindouros, provas irrefragáveis do estado dos
povos passados, insinuar-lhes os progressos da
sciencia, apresentar-lhes
quadro, onde possam elles ver pintados em todo
o brilho os grandes feitos dos heroes, as maravilhas da arte, fazer-lhes
finalmente a narração do
que a intelligencia ha
concebido e a mão do
homem executado: tal é
em resumo o grande fim
que a imprensa se impõe
e que chega a completar
satisfatoriamente.
A Revista Acadêmica
é o symbolo de nossa
adhesão ao progresso;
e ainda que as nossas
producções sejam na
actualidade destituídas
de mérito, temos todavia a fundada esperança
de que [...] poderão um
dia ser lidas e merecer
louvores a nossa infadigável perseverança.”
4
110
O ilustre Ruy Barbosa terminou a graduação na Academia de São Paulo.
5
Disse
Sacramento
Blake: “Desde sua entrada para o collegio em
que estudara os primeiros
rudimentos da língua pátria, revelou a mais bella
e robusta intelligencia, e
mais tarde um verdadeiro génio para a poesia,
em que não seria inferior
a Gonçalves Dias, nem
ao que mais alto subisse
nesse ramo da litteratura, si não morresse tão
joven”. Estudou Humanidades na Baía; iniciou
o bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais
na Faculdade do Recife,
mudando para São Paulo
depois, “mas não chegou
a formar–se por fallecer
no quarto anno do dito
curso. (BLAKE, 1893).
“O número avultado de
caixotes no vapor Santa
Maria chamou a atenção
do estudante Adriano
Fortes Bustamante, que
aportou em Santos a 12
de março de 1868. Ali
mesmo, a bordo, outro
tripulante, o acadêmico
Sancho de Barros Pimentel, informava-lhe
tratar-se de Ruy Barbosa, grande estudante que
vinha de Pernambuco,
para cursar o terceiro
ano da Academia de
São Paulo; assim como
Castro Alves, passageiro
do mesmo vapor. Inscreveram-se juntos Castro
Alves e Ruy Barbosa no
curso jurídico, aquele
sob Nº. 25 e este Nº. 26”.
(MARTINS; BARBUY,
1999)
6
da verdade não conhece as columnas de
Hércules. Os Annaes hoje se apresentam
pedindo lugar ao lado dos seus irmãos de
Imprensa acadêmica. Quer as luctas das
palavras unir os exercícios de Imprensa”.
Assim estava escrito no texto de apresentação dos Annaes do Ensino Acadêmico,
periódico que brotou nos corredores da
Faculdade de Direito de São Paulo, entre
os anos de 1862 e 1863.
Naquele ano, a Associação Estudantil Ensaio Acadêmico resolveu lançar
seu órgão oficial. A opção dos redatores
não seria outra: enveredar pelo abundante
caminho da doutrina. Esta iniciativa acadêmica, assumidamente doutrinal, teve
vida efémera, no entanto, marcante pela
qualidade dos textos depositados em suas
páginas.
e) Revista Mensal do Ensaio Jurídico – Jornal Acadêmico (Recife, 1863)
– Apareceria, em 1863, a Revista Mensal
do Ensaio Jurídico, “orgam da Associação Acadêmica Ensaio Jurídico”, que na
primeira edição apresentou seu programa:
“Intimamente compenetrados da grande
importância dessas considerações, alguns
alumnos desta Faculdade, verdadeiros
amantes da sciencia que cultivam, veneradores sinceros da grave missão que os
aguarda, determinaram-se a fundar, com
o nome de Ensaio Jurídico, uma associação cujo único e exclusivo fim é da discussão de questões jurídicas, pela tribuna
e pela Imprensa, e mais particularmente,
no exercício da prática do processo criminal”. O quadro de redatores incluía os então acadêmicos Fellipe Franco de Sá, José
Augusto Galvão Pires, Milciades Ferreira
da Silva, Frederico Martinho de Araújo,
João Alves Mergulhão (no futuro, um brilhante criminalista) e Antônio Martiniano
Lapemberg (maranhense que se destacou
como causídico).
f) Faculdade do Recife – Jornal
Acadêmico (Recife, 1863) – Mais uma
publicação recifense que foi criada e dirigida pelo estudante José Fiel de Jesus
Leite: Faculdade do Recife – Jornal Aca-
dêmico. O periódico, editado entre maio
e agosto de 1863 pelos alunos quintanistas Faculdade de Direito, não passou do
oitavo número. Coube ao doutor Pedro
Autran da Matta Albuquerque, lente da
Academia pernambucana, minutar o texto
de apresentação do tablóide.
Curiosamente, o periódico relacionou o nome de todos os formados
pela Faculdade pernambucana, de 1832
a 1862. Em destaque os ilustres Eusébio
de Queirós Coutinho Mattoso da Câmara,
Ruy Barbosa5, Clóvis Beviláqua, Augusto Teixeira de Freitas, Francisco Tavares
Benevides, Benedicto Marques da Silva,
Francisco Xavier Pereira de Brito Júnior e
Francisco de Mello Coutinho de Vilhena.
O jornal também listou os alunos matriculados na Academia em 1863.
g) O Futuro – Periódico Scientifico e Litterario (Recife, 1864) – Mais uma
publicação acadêmica que teve vida efêmera: O Futuro – Periódico Scientifico e
Litterario, porta-voz dos anseios da mocidade que reunia estudantes brilhantes
como Antonio Castro Alves6, Luiz Ferreira Maciel Pinheiro, Aristides Augusto Milton e António Alves de Carvalhal.
Apareceu em 1864 nos corredores da Faculdade do Recife.
Dentre os textos analisados, encontra-se o “Manifesto Abolicionista”,
de autoria do então acadêmico paraibano
Maciel Pinheiro. Na área jurídica, destacam-se escritos doutrinais como “Direito
Público: Soberania e Poder”, cuja autoria
não é identificada. Estrapolando o jus-periodismo, vale a pena considerar a resenha “Impressões da leitura das poesias de
A. A. de Mendonça”, assinada por Castro
Alves.
h) Jornal do Ensaio Literário (Recife, 1864) – Outro exercício do periodismo
jurídico emanado da inquietude estudantil
dos pernambucanos que, apesar do título,
dedicava-se à publicação de artigos jurídico-doutrinais, em especial, relacionados ao Direito Constitucional. O tablóide
teve como redatores Antônio dos Passos
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
111
Miranda, José Nicolao Tolentino de Carvalho e José Elysio de Carvalho Couto.
Circulou meteóricamente, entre 1864 e
1865.
i) Revista Acadêmica de Sciencias
e Lettras (Recife, 1876) – A revista salélite da Faculdade de Direito do Recife
foi publicava mensalmente em cadernetas
de 56 páginas, formando no final de cada
ano lectivo um “bello volume de 400 páginas”, com título e índice.
Ao folhear o tablóide estudantil, avista-se artigos exclusivamente de
cunho doutrinal, a exemplo de “Os princípios da Economia Política”, do quintanista Jeronymo Muniz Ferrão de Aragão;
“Centralisação administrativa”, assinado
por Augusto Borburema; “Fica revogado
o reconhecimento do filho natural, feito
em testamento roto, quer pela agnação
do posthermo preterido, quer por outro
testamento solemnimente feito?”, de José
Joaquim Seabra Júnior; “A mulher autorisada pelo marido a commerciar, pode
independente de autorisação especial,
contractar uma sociedade? 7”, por Pedro
Leão Velloso Filho, aluno do quarto ano;
“O Direito Público moderno reconhece
aos Estados um Direito de propriedade
sobre os mares? Quaes os limites d’esse
Direito?”, de autoria do acadêmico João
Henrique Vieira da Silva; “A Lei Falcidia
e o senatusconsulto trebelliano vigoram
entre nós?8”, do quintanista; e, por último,
“Da escravidão entre os romanos”, por
Antônio Amazonas d’Almeida.
No boletim de atualidades, Pedro
Paulo Amaral relatou o movimento acadêmico na Faculdade de São Paulo, fazendo
referências à Álvares de Azevedo, Castro
Alves, Fagundes Varela e Martins Cabral,
“glórias de nossas lettras”. Ele escreve
também sob o efervescente jornalismo na
Academia do Recife, nos idos de 1876.
j) A Estrea – Revista Scientífica e
Litterária dos Acadêmicos do 1º Anno
(Recife, 1876) – A publicação estudantil
distribuiu-se a 1º de junho de 1876 e tinha o corpo redatorial formado por Júlio
Revista Integralização Universitária
Cezar Leal, José Maria de Albuquerque
Mello, Manoel do Nascimento Castro e
Silva, Manoel Antero de Medeiros Furtado e Manoel do Remo Melo.
“Pelo princípio moral de confraternização e particularmente pelos estreitos
laços de consócios na sciencia do Direito,
os estudantes do primeiro anno procuram
exprimir, por estas breves palavras, a estima e a consideração que tributam aos
companheiros escolares”, anunciava o
texto introdutório do periódico quinzenal.
Os artigos apresentados pelo tablóide acadêmico mostravam a verdura típica dos
alunos do primeiro ano.
l) Ensaio Jurídico e Litterário (Recife, 1878) - “Surgindo hoje à luz da publicidade, o Ensaio Jurídico e Litterario
não pode esquivar-se aos estylos jornalísticos”. Assim apresentou-se o periódico, impresso quinzenalmente a partir de
1o de maio de 1878. Tratava-se de mais
uma tentativa jornalística capitaneada pelos intrépidos acadêmicos recifenses; um
exercício passageiro que encerraria velozmente. De fato, não passou da terceira
edição. Desse “ensaio jurídico-literário”,
listamos os integrantes do corpo editorial:
Tarquinio de Souza Filho, Pedro de Queiros, António Augusto de Vasconcelos,
Virgílio Brígido, J. Augusto de Souza e
Gil Amora. Ao folhear as páginas do Ensaio, os artigos enveredam pela Filosofia
do Direito (“Considerações sobre a lei”,
texto de Tarquinio de Souza Filho), Direito Civil (“Os actos praticados contra
a determinação da lei, envolvem nullidade, ainda quando esta não venha expressa?”, por Pedro Queirós) e Direito Natural
(“Propriedade Litteraria”, de autoria de
Augusto de Vasconcelos).
m) Direito e Lettras – Revista Acadêmica do Atheneu Jurídico Litterario
(São Paulo, 1878) – Por iniciativa dos
alunos da Faculdade de Direito de São
Paulo, foi distribuída, em agosto de 1878,
Direito e Lettras – Revista Acadêmica do
Atheneu Jurídico Litterario. O periódico
dividia-se em duas partes: a jurídica, sob
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
7 w
Lembrava o autor: “É
um princípio geral de Direito Civil, que a mulher
casada, mesmo maior, não
pode, qualquer que seja
o regimen do casamento,
contractar sem que preceda
autorisação do marido”.
8
Afirma o articulista: “Na
falta de legislação expressa, devemos recorrer ao Direito Romano, e admittir as
suas prescripções, enquanto de accordo com a bôa
razão, como declara a Lei
de 18 de agosto de 1769”.
112
“A bella reforma, que
há de ficar como vestígio
luminoso da passagem de
Benjamin Constant pelo
Governo, quaesquer que
sejam os pontos fracos e as
lacunas que possam descobrir nella a crítica philosofica, há de ser fecunda em
bons resultados, principalmente, porque fará diffundirem-se noções exactas sobre o conjunto das
sciencias que nos fornecem
os elementos da synthese
objectiva do mundo, e por
que despertará estímulos
mentaes para as investigações scientificas. Não queremos fazer, agora, crítica
nem apologia à reforma;
queremos
simplismente
dizer que ella encerra elementos poderosos para o
levantamento da mentalidade brazileira e que, entre
esses elementos, occupa
logar saliente a creação de
uma revista acadêmica em
cada uma das escholas federaes de ensino superior.
A Revista Acadêmica é essencialmente jurídica, ou se
preferirem, jurídico-social.
Seu campo, no entanto, é
assas vasto, porque não só
o Direito está intimamente
relacionado com muitas
sciencias, como depende
de outras, além de que o
quadro das que se ensinam
na Faculdade já é bastante
largo, e de que as questões
fundamentaes se apoiam,
em regra, nas generalidades da sciencia propedêutica do Direito, como sejam
a Psychologia que elle é
um ramo”.
9
Diz o professor: “Um dos
pontos em que a reforma
de Benjamin Constant demonstra um espírito liberal
e adiantado, é sem dúvida,
o que se refere à creação da
cadeira de Medicina Legal,
lacuna sensível e que por si
só conserva na retaguarda
dos programmas da Faculdade de Direito do Recife”.
10
responsabilidade de Tristão da Fonseca; a
literária, capitaneada por Affonso Celso
Júnior.
De todos os artigos publicados na
revista, um texto desperta especial atenção: o acadêmico Tristão da Fonseca relacionou os autores e os compêndios adotados pela Faculdade naqueles anos. Assim,
é saber que, no primeiro ano, os estudantes assistiam às aulas de Direito Natural
(cadeira leccionada por dois lentes; um
preferia seguir a “Theoria Transcendental
do Direito”, o outro o “Eccletismo Catholico”), Direito das Gentes (Teoria de
Fiore) e Direito Romano (Compêndio de
Warnkænig, considerado “notável” pelos
alunos).
No segundo ano, os alunos tinham
contato com o Direito Constitucional (debruçavam-se na obra de Pimenta Bueno,
“predominantemente a eschola conservadora”) e Direito Eclesiástico (o Compêndio de Vilella Tavares, “que seguia
em regra o autor, excepto a Theoria Ultramontana não adoptada pelo lente, que
professa[va] a eschola gallicana”).
Ao chegar ao terceiro ano, era a vez
de estudar o Direito Civil (que incluía
uma recapitulação do Direito Romano,
“Theoria das Pessoas”, a Lei do Elemento
Servil, a Locação de Serviços e o Direito de Família – “com base na obra do Dr.
Lafayette”) e Direito Criminal (a doutrina
era voltada à Escola de Bhenthan; o código estudado com base na obra de Braz
Florentino, cujo “o mérito do nosso legislador é tão conhecido, que inútil torna-se
declaral-o”).
No quarto ano, os acadêmicos estudavam o Direito Comercial (as explicações apareciam de acordo com o Código Comercial; a doutrina de Vidari era
aplicada para compreensão do instituto
das Letras de Câmbio) e o Direito Civil
(o programa incluía: Direito das Coisas;
Posse, com base nas Escolas de Savigny
e Ihering; Testamentos, de acordo com
Gouvêa Pinto; e o Compêndio do doutor
Tiago de Loureiro).
Quando quintanistas, eles aprendiam Direito Administrativo (com base
no Compêndio do conselheiro Furtado),
Prática (Compêndio do conselheiro Ramalho) e Economia Política (Compêndio
do senhor Pedro Autran, “professando-se
a Escola Moderna de Macleod”).
n) Gazeta Acadêmica de Sciencias e Lettras (Recife, 1879) – Em maio
de 1879, surge a Gazeta Acadêmica de
Sciencias e Lettras. Acadêmicos de todos
os anos integravam o corpo redatorial.
Do primeiro ano, Costa Maia; do segundo ano, Alfredo Raposo Barradas, Domingos Felippe de Souza Leão e Urbano
Santos da Costa Araújo; do terceiro ano,
J. M. C. Muniz Freire, J. Homem de Siqueira Cavalcanti e Virgílio Gordinho; do
quarto ano, Artur Leal Ferreira e Manoel
do Nascimento Castro e Silva; dentre os
quintanistas, António Ibyapina e João B.
de Mello Peixoto.
o) Ihering – Folha Jurídica e Philosophica (São Paulo, 1882) - Coube ao
então acadêmico Washington Badaró, na
qualidade de redator-chefe, simultaneamente com outros alunos da Faculdade
paulistana (Lamounier Godofredo, Braz
Arruda, Constantino Paletta e Nogueira Jaguaribe), lançar o periódico Ihering
– Folha Jurídica e Philosophica.
p) Revista Acadêmica da Faculdade
de Direito do Recife (Recife, 1891) – Recaiu sobre professores Clóvis Beviláqua,
José Izidoro Martins Júnior, Adelino Luna
Freira Filho, António de Siqueira Carneiro da Cunha e José Joaquim de Oliveira
Fonseca a responsabilidade pela edição
do primeiro volume da Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife,
distribuída em 1891. As palavras iniciais
de Beviláqua delinearam os objetivos do
periódico oficial da Academia recifense9.
Verdadeiramente, o jurisconsulto aparece
como o timoneiro da Revista Acadêmica,
cuja presença assegurou a qualidade do
conteúdo. Foram dele os textos de destaque, reunidos no primeiro volume, como
“Contribuições para a História do Direi-
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
113
to” e “Applicação do methodo comparativo ao estudo do Direito”.
O segundo número da Revista Acadêmica (1892) publicou o Parecer emitido
pela Congregação, sobre os bens patrimoniais das ex-princesas (Isabel e Leopoldina), em resposta ao pedido do Ministério
do Interior. Em artigo, o doutor Adelino
Filho externou sua opinião sobre a demanda: “Julguei que a questão não era de
puro domínio do Direito Civil, por não se
tratar de um caso commum da vida social,
garantido pelo Direito; mas antes de um
instituto público-jurídico, que tinha como
causa occasional um daqueles casos – o
casamento”.
A seção de Doutrina reunia textos
de Beviláqua (“Algumas observações sobre o Direito Autoral”, “Breves noções de
legislação comparada sobre o divórcio”,
“Apontamentos sobre a evolução de alguns regimens de bens entre cônjuges” e
“Sobre a nova theoria da responsabilidade”); de José Joaquim de Oliveira Fonseca
(“Recurso à pronúncia, em crime inafiançável, estando o reo solto”); de Adelino
Filho (“A medicina legal na Faculdade de
Direito do Recife10”); e de Phaelante da
Câmara (“Tobias Barreto de Menezes: seu
carácter, seu talento, seus escriptos e principalmente os seus estudos jurídicos”). A
resenha biográfica foi dedicada ao livro
de Tobias Barreto, Estudos de Direito
(1892), publicação esta dirigida originalmente por Sylvio Romero.
Em 1993, a Revista trazia o projeto de Código Penal, que se encontrava na
Câmara dos Deputados, detalhado pela
exposição de motivos; um primoroso trabalho que analisou cada título da pretensa
Lei.
Um texto de Vieira de Araújo, em
1894, questionava a sucessão dos bens
vagos (questionando se pertenceriam aos
Estados ou à União), tomando como base
a Constituição e a Legislação comparada.
Com a implantação do federalismo republicano, e na falta de uma codificação
atualizada, o Brasil viveu uma fase marRevista Integralização Universitária
cada pelo conflito de competências entre
a União e as unidades federativas11.
“Agora que de novo se agita no parlamento nacional a idéa de se dotar finalmente o Brazil com um Código Civil, é
natural que todos os que estremecem a pátria brazileira e os que se interessam pelo
desenvolvimento do Direito façam votos
pela crystallisação dessa idéa em realidade”. Assim, Beviláqua abriu a edição de
1896. Do número editado no ano seguinte, destaca-se a doutrina de Tito Rosas ao
abordar a Teoria da Evolução em “Applicações do Darwinismo no Direito12”.
O último número da Revista Acadêmica
editado no século XIX foi o de 1898. Nos
anos seguintes (1899, 1900), a preciosa
publicação que fluía da inesgotável fonte
de conhecimento dos lentes pernambucanos não foi ao prelo; retornaria somente
em 1901 (“Ano IX”), sem fazer qualquer
referência à interrupção. No século XX,
circulou até 1995, quando foi descontinuada pela Faculdade.
q) Revista da Academia de Direito
da Bahia (Salvador, 1892) – Na vaga dos
periódicos acadêmicos oficiais que surgiram nas Faculdades brasileiras, foi editada
a Revista da Academia de Direito da Bahia
(1892), oriunda dos lentes da Faculdade
baiana, cuja instalação se deu um ano antes. O professor doutor José Augusto de
Freitas capitaneou a Comissão Redatora,
constituída também por Sebastião Pinto
de Carvalho, Manoel Joaquim Saraiva,
Affonso Castro Rabello e Firmino Lopes
de Castro. No primeiro volume, merece
destaque o artigo do doutor Affonso Rabello (“Esboço da Evolução Conceptual
do Direito”), que criticava com grande
elevação a teoria metafísica e a teologia
do Direito.
r) Revista Acadêmica da Faculdade
Livre de Direito do Rio de Janeiro (Rio de
Janeiro, 1892) – Eis o texto introdutório
da Revista Acadêmica da Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro, lançada
em 1892; um ano após a implantação da
Academia:
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Escreveu Vieira de Araújo: ����������������������
“A República exige imperiosa e urgentemente que
o Congresso Nacional vote
o projecto de Código Civil
de Coelho Rodrigues; [...]
não temos jurisprudência
nacional em ramo algum
do Direito para transformar
pelo Direito Costumeiro
moderno as antiqualhas do
Direito Civil portuguez e
nem a tarefa é fácil, tanto
que até os últimos dias da
monarchia abolida, revivião na opinião de nossos
institutos de governo da
metrópole, incompatíveis
com as insti-tuições constitucionaes representativas.
Antes das obras de Teixeira
de Freitas, pouco se animavão a atacal-os de frente”.
11
No texto, ele observou:
“Em nome da sciencia, não
se ergue hoje o venábulo
da crítica para ferir directamente a Theoria da Evolução. A sciencia ainda não
se illuminou convenientemente”.
12
114
A Revista Acadêmica representa um punhado de esforços de estudantes da Faculdade Livre de Direito, que pensam que a
fundação de um jornal em uma Academia
é de grande necessidade para que os alumnos possam se exercitar, quer dissertando
sobre theses da matéria cujo estudo se dedicam, quer dando publicidade aos trabalhos litterarios, preparando-se assim para
melhor desempenhar a posição social que
procuram alcançar.
As 16 páginas do tablóide reuniam
artigos doutrinais assinados pelos lentes
Fausto Cardoso (“O regímen parlamentar
no Brazil”) e Paula Ramos (“O final de
uma Lição de Direito Penal: Theoria de
Lombroso, Ferri, De Garafolo e Sergi”).
s) Revista da Faculdade de Direito
de São Paulo (São Paulo, 1893) – Na linha do periodismo jurídico academicista,
a Revista da Faculdade de Direito de São
Paulo iniciou as atividades na última década do século XIX. “Em sua sessão de
26 de abril do corrente anno, deliberou a
Congregação dos Lentes da Faculdade de
Direito de São Paulo iniciar a publicação
de sua revista official”. Foi assim que, em
1893, o primeiro número da Revista saiu
do prelo. O êxito do periódico assegurou
fosse editado até hoje, 113 anos depois.
Integravam a primeira “Commissão de
Redacção” os doutores Brazilio Augusto
Machado de Oliveira, João Mendes de
Almeida Júnior, Manoel Pedro Villaboim,
Alfredo Moreira de Barros Oliveira Lima
e o desembargador Aureliano de Souza e
Oliveira Coutinho.
Já nos primeiros anos, a Revista
cumpria os objetivos estatutários propostos e expostos na resolução que a criou,
trazendo impressos textos de Brazilio
Machado (“Regímen Hypothecario: Casos de renúncia tácita”), Frederico Abranches (sobre o “Litis contestatio” a luz da
romanística), Manoel Pedro Villaboim (a
dissertar sobre o Direito Administrativo),
Alfredo Lima (“Constituição ou Carta
Constitucional”), e Almeida Júnior (“Estudos da Prática Forense”).
t) Imprensa Acadêmica (Ouro Pre-
to, Minas Gerais, 1893) – De Ouro Preto,
então capital de Minas Gerais, apareceu
Imprensa Acadêmica, periódico quinzenal que tinha no corpo redatorial Gomes
Lima, Carvalho Britto e Alfredo Guimarães. “Muito grato ficamos aos collegas
pelo modo lisonjeiro com que nos têm
recebido, o que é realmente um poderoso
incentivo que nos anima a superar as difficuldades na sustentação de nossa empresa”, comentou o redator, ao abrir a quarta
edição. O jornal voltava-se aos artigos
doutrinais e aos boletins informativos do
dia-a-dia dos acadêmicos na Faculdade
Livre de Direito do Estado de Minas Gerais.
u) Revista da Faculdade Livre de
Direito do Estado de Minas Geraes (Ouro
Preto, 1894) – Proclamada a República,
a antiga capital mineira, Ouro Preto, ganhou a Faculdade Livre de Direito (1892).
Na aplicação do Decreto que regulou o
Ensino Superior, foi editada a Revista da
Faculdade Livre de Direito do Estado de
Minas Geraes, periódico jurídico-científico impresso a partir de 1894.
O primeiro número da Revista trazia um editorial assinado pelo doutor
Affonso Pena. Em seguida, a parte doutrinal consignava os artigos “Antiguidades Romanas”, de Raymundo Correia,
insigne poeta que demonstrou um lado
multifacetado nesse escrito jurídico; “Legislação de Minas”, de Bernardino de
Lima; “Hygiene nas Sciencias Sociaes”,
do doutor A. Catão; “Liberdade”, texto
do doutor Sabino Barroso Mello Franco; e o “Esboço do Código de Processo
Criminal”, produzido pelo lente Levino
Ferreira Lopes.“É incontestável o valioso
repositório de estudos jurídicos traçados
com alta maestria, esta Revista da Faculdade jurídica de Minas Geraes; o número
de 1895 não discrepa do anterior, quanto
à importância do trabalho, excedendo-se,
porém, vantajosamente quanto ao lavor
typographico”, elogiou copiosamente
Clóvis Beviláqua, ao comentar a publicação mineira, em nota divulgada no órgão
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
115
oficial da Academia pernambucana. Com
a transferência da capital, a Revista foi
continuada em Belo Horizonte e perdurou
no século XX.
v) Revista Acadêmica (Rio de Janeiro, 1894) – Os acadêmicos que integravam o Grêmio dos Estudantes da Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro lançaram um órgão oficial, a Revista
Acadêmica, em junho de 1894. O inquestionável teor jurídico era assegurado pela
atenta Comissão de Redação, formada
por Raul Pederneiras, Paranho da Silva
e Ernani Torres. Coube a Sylvio Romero
assinar o texto introdutório (“A Nova concepção do Direito no Brasil13”). O ilustre
professor iniciou o escrito lembrando que
foi ele o primeiro a pregar no Brasil a
nova concepção do Direito no Brasil, teorizada magnanimamente por Rudolf Von
Ihering. No editorial que abria a edição de
junho de 1895, Franca Carvalho defendeu
a estrutura das Faculdades Livres: “Felizmente Benjamin Constant, [...] uma das
mais puras e brilhantes personalidades da
República, suspendeu e [...] assegurou,
em sua maior plenitude, a liberdade do
ensino e a freqüência facultativa nos Cursos Superiores”.
x) Revista Jurídica (Rio de Janeiro,
1895) – Órgão dos estudantes da Faculdade de Sciencias Jurídicas e Sociais do
Rio de Janeiro, a Revista Jurídica foi distribuída a partir de maio de 1895. O texto
introdutório da Revista Jurídica relatava
as atividades de comemoração do aniversário da Faculdade, implantada em maio
de 1882. A estrutura editorial reunia artigos de doutrina e um boletim informativo.
Na parte doutrinal, apareciam artigos de
grandes jurisconsultos, ao lado dos textos
dos estudantes. Enaltecemos os trabalhos
de Sylvio Romero (“Philosophia do Direito”), de J. C. de Souza Bandeira (“O Estado: suas funções e órgãos”), de James
F. Darcy (“O Divórcio”), e de Bandeira
de Melo (“A inviolabilidade do Ministro
Estrangeiro e suas immunidades de jurisdicção”). O terceiro ano da Revista (1897)
Revista Integralização Universitária
marcou uma nova fase da publicação. A
nova Comissão Redatora era integrada
pelos acadêmicos Prudente de Moraes
Filho, Octávio Monteiro da Silva, Carlos
Naylor Júnior, Fausto Augusto dos Santos
e Cândido de Oliveira Filho.
z) Revista da Faculdade Livre de
Direito da Cidade do Rio de Janeiro (Rio
de Janeiro, 1899) - A Faculdade Livre de
Direito da Cidade do Rio de Janeiro foi
fundada em 1891. Sem obedecer, de imediato, às exigências do mesmo diploma
legal que permitiu sua criação, o periódico científico da academia somente foi editado oito anos depois. A Revista da Faculdade Livre de Direito da Cidade do Rio
de Janeiro foi impressa pela primeira vez
em setembro de 1899, apresentando o seguinte texto preambular: “É este o primeiro número. Difficuldades várias andavam
a obstar o seu apparecimento. Seu alvo
é publicar [...] contribuições quaesquer
com que os senhores lentes [...] entendam
de discutir e elucidar os pontos do vasto
programma [...] com a máxima liberdade de espírito. A arena aí está”. Em 1900,
Sylvio Romero ganhou definitivamente
espaço na redação (ao lado de Frederico
Augusto Borges e Nilo Peçanha) e passou
a comandar o periódico. O nome de Romero ficou diretamente ligado à Revista,
numa interação que rendeu bons frutos no
conteúdo editorial. A Revista circulou ainda em 1901; depois de 1908 a 1916.
5 Considerações Finais
À luz da História do Direito, fica
cada vez mais reconhecida a importância desempenhada pelas revistas e pelos
jornais jurídicos editados no século XIX.
Além de constituir uma maneira discursiva tão viva no oitocentos, esses periódicos representam uma fonte privilegiada
na compreensão das instituições, da jurisprudência, da doutrina e da legislação
daqueles tempos.
O estudo dos periódicos como fonte
histórica do Direito é relativamente recente. Brota a partir dos trabalhos desenvolvi-
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
Consigna Romero:
“É uma prioridade que
ouso reivindicar, por ter
sido facto publicamente
acontecido numa defesa
de these, que se tornou
célebre perante a Faculdade jurídica do Recife
[...] O absoluto chamava-se, às vezes, natural.
O bello absoluto, o bem
absoluto, a verdade absoluta, a justiça absoluta, o Direito Natural,
a religião natural eram
as expressões correntes
para significar a idéa typica, a essência do bello,
da verdade, do Direito e
da religião”.
13
116
dos por Paolo Grossi (na Itália) e AndréJean Arnaud (na França). Em Portugal,
o assunto foi abordado nos anos sessenta
do século XX por Guilherme Braga da
Cruz14, mas obteve um refino destacável
na investigação de Luís Bigotte Chorão.
O assunto permanecia inédito no
Brasil. Coube a Armando Formiga (1995)
identificar, catalogar e revirar todas as publicações jurídico-científicas oitocentista.
O pesquisador constatou a curiosa relação
entre o movimento periodista brasileiro
e a emergência da cultura jurídica nacional.
A dinâmica produção legislativa no
florescer da jovem nação luso-americana contou com o papel singular do movimento periodista jurídico, que – além
de revelar nomes e difundir idéias – pulverizou no país-continente as bases para
consolidação da justiça e de um Direito
caracteristicamente brasileiro. No Direito,
a capacidade laboral dos juristas brasileiros esteve também estampada nas páginas
dos periódicos. Gazetas, jornais e revistas
jurídicas que, verdadeiramente, atuaram
como coadjuvantes nesse processo de formação da cultura brasileira, inclusive na
atmosfera acadêmica.
GROSSI, Paolo. ANZOATEGUI, Victor Tau
(Org). La Revista Jurídica en la Cultura Contemporanea. Buenos Aires: Ediciones Ciudad Argentina,389 p. , 1997.
GUIMARÃES, Lúcia Maria Paschoal. A Casa de
Montezuma. In: BAETA, Herman Assis (Org.).
História da Ordem dos Advogados do Brasil.
O IAB e os Advogados do Império. Volume 1.
Brasília: OAB Conselho Federal, 2003. 242 p.
MARCOS, Rui de Figueiredo. A Fundação do
Boletim da Faculdade de Direito e o Periodismo
Jurídico em Coimbra. Boletim da Faculdade de
Direito de Coimbra. Coimbra. Volume Comemorativo. p. 11 – 43 , 2002.
MARTINS, Ana Luiza; Barbuy, Heloisa. Arcadas: História da Faculdade de Direito do Largo de
São Francisco: 1827–1997. São Paulo: Melhoramentos/Alternativa,341 p. , 1999.
6 Referências
BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento.
Diccionario Bibliographico Brazileiro. 7 volumes. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 18931902.
CHORÃO, Luís Bicotte. O periodismo jurídico
português do século XIX, páginas de história
da cultura nacional oitocentista. Lisboa: Imprensa Nacional, 401 p. , 2002.
Diz o pesquisador: “É
este também o modo melhor de os vivos avivarem
na memória a lição que devem a quem os precedeu e
tomarem nova consciência
da responsabilidade que
lhes cabe na prossecução
duma obra que receberam
como herança sagrada e
que lhes cumpre transmitir
aos que vierem depois de
si”. (�����������
CRUZ, 1975)
14
CRUZ, Guilherme Braga da. A Revista de Legislação e Jurisprudência, Esboço de sua História.
Volume 1. Coimbra: Coimbra Editora, 882 p.,
1975.
FORMIGA, Armando Soares de Castro. O periodismo jurídico no Brasil do século XIX: a importância do movimento periodista no florescer da
cultura jurídica nacional. Dissertação (Mestrado
em Ciências Jurídico-Históricas) – Universidade
de Coimbra, Coimbra,242 p. , 2005.
Revista Integralização Universitária
- v.1, n.1 - Abril/Setembro de 2007
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