CO 43: O Movimento de Matemática Moderna em Minas Gerais:
construindo uma história
Marger da conceição Ventura Viana
Universidade Federal de Ouro Preto
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RESUMO
Este artigo condensa resultados de uma pesquisa iniciada pela autora em meados da década de
oitenta do século XX que atualmente faz parte de um projeto sobre o Movimento da Matemática
Moderna (MMM) em Minas Gerais (MG). O primeiro estudo foi baseado principalmente no texto:
A evolução do ensino da Matemática no Brasil (MONTEJUNAS, 1980). Na sequência, o trabalho foi
apresentado na UFMG para alunos de um curso de especialização, a convite da professora do
Departamento de Matemática Maria da Penha Lopes. Compila estudos concluídos ou em
andamento realizados com a participação de bolsistas de iniciação científica. Em vista da raridade
de resultados sobre o MMM em MG, constatada a partir de consulta ao Banco de Teses da CAPES,
objetiva contribuir para esclarecimentos sobre a ocorrência do movimento neste estado. Em
decorrência, o objeto de estudo, nas pesquisas em foco, é a passagem do MMM, quer seja em
livros didáticos, conteúdos específicos, escolas, professores, alunos e cidades que ao mesmo
tempo serviram como instrumentos de coleta de dados. Como a pesquisa se insere na História da
Educação Matemática fundamenta-se principalmente em Alain Choppin, André Chervel, Wagner
Valente e Vicente Garnica utilizando a análise documental e a pesquisa em história oral. Os
resultados se referem ao fato de o MMM não ter sucedido da mesma forma que no estado de São
Paulo; sofreu forte influência dos manuais de autores paulistas capitaneado por Osvaldo Sangiorgi
considerado o grande divulgador do MMM no Brasil principalmente por meio dos cursos para
professores e de seus livros didáticos de Matemática; a geometria de transformações
compareceu em livros dos autores mineiros ao contrário de outros e o MMM não conseguiu
alcançar profundamente as escolas de Ouro Preto. A partir da pesquisa do MMM em Minas
Gerais, contou-se com a ajuda da FAPEMIG e CAPES com bolsas de iniciação científica.
Palavras-chave: Movimento da Matemática Moderna. História da Educação Matemática.
Disciplina Matemática
Introdução
Antecedentes
Nosso contato com o chamado Movimento da Matemática Moderna ocorreu na
elaboração de um trabalho para a disciplina Teoria do Conhecimento lecionada pelo professor
Hugo Assmann na UNIMEP, em meados da década de oitenta do século XX. Na sequência, o
trabalho foi apresentado na UFMG para alunos de um curso de especialização, a convite da
professora do Departamento de Matemática Maria da Penha Lopes.
Mais tarde soube que foram escritas dissertações e teses sobre o MMM. Assim, concluí
que o tema era importante para a Educação Matemática, e atrevi a submeter meu antigo trabalho
ao V SNHM, em 2003. Tive a agradável notícia de sua aprovação, porém com sugestões de
aperfeiçoamento. A princípio pensei não ser possível pela falta de bibliografia na Universidade
Federal de Ouro Preto (UFOP), meu local de trabalho. Mas um fato novo e feliz aconteceu:
consegui o livro de Angel Ruiz e Hugo Barrantes: Historia del Comité Interamericano de Educación
Matemática (RUIZ e Barrantes, 1997) que continha o material de que eu necessitava.
No V SNHM entre meu público estavam as professoras Martha de Sousa Dantas e Lourdes
Onuchic, protagonistas do MMM, que aprovaram e incentivaram-me a publicar o trabalho
apresentado. Assim, submeti um artigo à revista Escritos sobre Educação que foi aceito e
publicado (VIANA, 2004).
A partir daí, encorajei-me e parti para pesquisar o MMM em Minas Gerais.
Procedimentos
O primeiro estudo foi feito a partir de escritos encontrados em livros, artigos de
periódicos e de uma entrevista. Nos demais, devido ainda não ser encontrados documentos
oficiais sobre o MMM os fundamentos na história oral foram decisivos. Foram adquiridos manuais
escolares, isto é, livros didáticos de Matemática para o antigo curso ginasial (atualmente ensino
basico, 6º ao 9º ano) para serem analisados. Muitas entrevistas foram realizadas com
protagonistas do MMM, autores de livros, professores de Matemática, professores de outras
disciplinas e alunos. A análise dos dados foi realizada numa perspectiva mais qualitativa que
quantitativa para responder à pergunta: Como foi e o que restou da passagem do Movimento da
Matemática Moderna por Minas Gerais?
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O Movimento da Matemática Moderna
As origens do MMM podem se reportar a Félix Klein no início do século XX, em seu
Programa de Erlanger. Klein se preocupou com o ensino da Matemática e o conteúdo a ser
ensinado aos jovens. Julgava necessário que o desenvolvimento da tecnologia fosse
acompanhado de um ensino que expusesse a Matemática como impulsionadora desse progresso,
a partir de seus avanços alcançados até aquela época. Ai estava o embrião de uma reforma
curricular que aconteceria a partir da metade do século XX.
O grupo conhecido por Nicolas Bourbaki (um grupo de matemáticos franceses reunidos na
França na cidade de Nancy), que nas décadas de 30 e 40 do século XX, buscou a unificação da
Matemática em estruturas gigantescas, a algébrica e a topológica, unidas pela estrutura de
espaço vetorial estruturas que desejavam incluir no ensino pré-universitário, muito influenciou e
provocou mudanças curriculares.
Por outro lado, nos EUA, Richardson, antes da década de 50 do século XX, já introduzira
conteúdos novos de Matemática no ensino pré-universitário. Mas a atualização do currículo de
Matemática começou a ser feita em 1952, pela Comissão de Matemática Escolar da Universidade
de Illinois, presidida pelo professor Max Beberman. Em 1955, Allendoerfer e Oakley, antes de ser
cunhado o termo Matemática Moderna (MM), haviam escrito um livro cujo conteúdo já era MM
(conjuntos, relações, funções, lógica, grupos, etc.).
Segundo Viana (2004) e Matos (2006), a Organização de Cooperação Econômica
Européia (OCEE) reuniu, em 1958, na França representantes de 20 países e realizou, em
1959, o Seminário de Royaumont com 60 professores de 20 países, quando se
prescreveram linhas centrais da Reforma pré-universitária e políticas de implementação,
tendo como objetivo unificar esforços que vinham sendo desenvolvidos em diversos países
como a Bélgica, Estados Unidos, França e outros.
E se seguiram outras reuniões para a Reforma pré-universitária. No ano de 1960 em Arhus
na Dinamarca, sob os auspícios do ICMI, e outras duas em Zagrev e Dubrovnik na antiga
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Yugoslávia; em 1961 na Colômbia ocasião em que foi fundado o Comitê Interamericano de
Educação Matemática (CIAEM) e reuniões continuam até a atualidade, porém não mais com o
intuito reformista.
Quanto à reforma do ensino de Matemática, de acordo com o saudoso professor Luis
Santaló (1979), ela poderia ser considerada em três períodos: 1º - da Conferência de Royaumont,
em 1959, ao Congresso de Lyon, em 1969, quando predominou a preocupação com os conteúdos;
o 2º- do Congresso de Lyon ao Congresso de Exeter, em 1972, em que a atenção foi direcionada
para aplicações e o 3º- do Congresso de Exeter a Karlsrue, em 1976, à época em que este artigo (o
de Santaló) foi escrito, ou seja, 1979, período em que se deu ênfase à Didática (VIANA, 2004).
Para Ruiz e Barrantes (1997) apud Viana (2004) as causas do MMM, se devem à ação dos
matemáticos das universidades, à ideologia e à filosofia da Matemática, e ao contexto político e
histórico do pós-guerra. Para o autor português José Matos (2006) as ideias da reforma tiveram
origem na Europa. Ele afirma o seguinte:
A origem das idéias é essencialmente européia (francófona, espanhola
ou italiana) e apenas Gonçalves refere materiais anglo-saxónicos como
uma via alternativa. Contrariamente ao que é por vezes referido,
nenhum destes autores menciona a rivalidade com os países de Leste ou
o lançamento do Sputnik como motivação para os seus trabalhos. Todos
procuram melhorar o ensino da matemática como condição essencial de
progresso do país, quer de aproximação a outros países europeus, quer
como fator de desenvolvimento econômico, social e cultural (MATOS,
2006, s/p).
De fato, Viana (2004, p.30) escreveu o seguinte:
A tradição diz que o movimento de Matemática moderna teve origem
com o lançamento do 1o SPUTNIK, pela URSS, em 1957. O fato
convenceu os americanos de que estavam atrás dos soviéticos em
ciência e tecnologia e de que os russos poderiam dominar o mundo. Por
isso, deviam somar esforços no sentido de aumentar o número de
cientistas que formavam. Era a época da “Guerra Fria”. Os EUA, como
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sempre, investiam muito no esforço bélico e certamente, para desviar a
opinião pública, aproveitaram a onda reformista dos matemáticos para
investir na reforma escolar, fazendo muita propaganda e justificando os
gastos, enquanto ficavam despercebidos maiores aportes que eram
destinados à corrida armamentista.
Assim, foram criadas as Conferências Interamericanas de Educação Matemática
(CIAEM) objetivando a reforma do ensino de Matemática na América. A 1ª CIAEM foi realizada
em1961, na Colômbia quando foi criado o Comitê Interamericano de Educação Matemática
(CIAEM), com apoio do International Comittee of Mathematical Instruction (ICMI),
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO),
Organização dos Estados Americanos (OEA), Fundação Ford, Fundação Rockefeller,
Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos, e outros.
Segundo Ruiz e Barrantes (1997) apud Viana (2004, p.30 “o comitê era formado
principalmente por matemáticos de prestígio internacional, como Marshall Harvey Stone,
seu principal idealizador e presidente até o ano de 1972”. O professor Stone foi um dos
responsáveis pelo Teorema de Stone-Weierstrass e da Compatificação de Stone-Cech,
tendo sofrido influência das idéias do grupo Bourbaki acerca de pesquisa e ensino. A
confirmação disso está na presença de André Weil (figura dominante do grupo Bourbaki
por vários anos) na Universidade de Chicago, entre 1947 e 1958. Stone era diretor do
Departamento de Matemática da Universidade, líder naquela época no país e talvez no
mundo (VIANA, 2004).
O Movimento da Matemática Moderna no Brasil
Certamente, matemáticos brasileiros foram influenciados pelas ideias do MMM, pois
importantes componentes do grupo Boubarki como André Weil e Jean Dieudonné estiveram na
Universidade de São Paulo participando da formação de pesquisadores a exemplo de Luiz
Henrique Jacy Monteiro autor de vários livros entre eles o “Álgebra Moderna” utilizado nos
Cursos de Matemática de universidades.
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Segundo Viana (2004), o Brasil recebeu várias influências. As mais marcantes foram: do
grupo francês que preconizou Álgebra Linear desde o antigo curso ginasial; dos EUA o School
Mathematics Study Group (SMSG) com conteúdos tradicionais acrescidos de conjunto, mudança
de base, congruências, desigualdades, matrizes, lógica simbólica, Álgebra de Boole, grupo, anel,
corpo; de Georges Papy (no PREMEM) e de Zoltan Paul Dienes (falecido recentemente) suas seis
etapas do processo de ensino aprendizagem com material concreto (seus blocos lógicos),
transformações em planos finitos e estruturas algébricas.
Ainda segundo Viana (2004), no Brasil exemplos de influências nos conteúdos para o
curso ginasial foram: introdução de numeração com bases não-decimais (ênfase em algoritmos de
mudança de base); teoria dos conjuntos, propriedades dos conjuntos numéricos, funções e
coordenadas cartesianas; inequações e o trinômio do 2º. grau como função quadrática.
Houve supervalorização de sentenças matemáticas na resolução de problemas e
valorização da Álgebra em detrimento da Geometria. Muitos professores, não dominando os
novos conteúdos, repetiam o que continham os livros-texto.
Segundo Onuchic (1999) apud Viana (2004, p.37),
nesta reforma o professor falava, porém muitas vezes não seguro daquilo que
dizia. O aluno não percebia a ligação que todas aquelas propriedades enunciadas
tinham a ver com a Matemática dos problemas e, principalmente, com a
matemática usada fora da escola. Embora procurasse usá-las em exercícios de
aplicação, repetindo o que havia sido feito em classe e dizendo o nome daqueles
novos símbolos matemáticos que lhes eram apresentados, com freqüência não
conseguia lhes dar significados (ONUCHIC, 1999, p. 203)
Além disso, em geral, a Geometria de Transformações não foi abordada, e abandonaram
a euclidiana. No entanto, como sabemos o ensino da Geometria não pode ser deixado a um plano
inferior, pois localizar-se no espaço, raciocinar, analisar, concluir, todos precisam, embora
usualmente a maioria jamais utilizará o Teorema de Pitágoras.
Viana (2004) concluiu seu primeiro estudo considerando que, de fato, no Brasil a Matemática
Moderna não foi de todo implementada não podendo, portanto, ser responsabilizada pelo estado
atual da educação matemática do cidadão. O baixo rendimento escolar é um problema de
variáveis multidimensionais e não apenas do ensino da Matemática.
Considerou que, no Brasil, o MMM abriu possibilidades para o fortalecimento da
área de Educação Matemática, propiciando financiamento de projetos, bolsas de estudo,
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realização de encontros e seminários e, fortalecimento da pós-graduação. Que a visão de
ensino da Matemática foi alargada, o processo evoluiu de repasse de informações a uma
conceituação ampla considerando a utilização da Matemática como ferramenta a serviço da
educação, que oferece possibilidades a todo estudante para o exercício da cidadania.
O Movimento de Matemática Moderna na Região Metropolitana de Belo Horizonte - MG
Como a Educação Matemática no Brasil concentra pesquisas com diferentes focos o
objetivo desta pesquisa foi analisar o MMM em Minas Gerais (MG), com recorte na Região
Metropolitana de Belo Horizonte para identificar a influência que tal movimento exerceu/exerce
sobre a Matemática Escolar praticada na atualidade. O tema é inovador, pois ainda não foi
explorado na região. Pela escassez de documentos localizados, esta pesquisa foi cunhada pela
história oral, identificados atores, que de fato, puderam auxiliar no esclarecimento da ocorrência
do MMM naquela região.
Foram realizadas entrevistas com três educadores matemáticos que protagonizaram o
MMM em MG, e analisados livros textos de Matemática escritos e utilizados no Ensino
Fundamental e no Médio à época do MMM em MG, entre as décadas de 60 e 80 do século XX.
Obteve-se o seguinte: a região metropolitana de Belo Horizonte teve contato com o
MMM por meio do PREMEM e também com os treinamentos oferecidos aos professores,
realizados pelo Centro de Ensino de Ciências de Minas Gerais (CECIMIG), localizado na UFMG.
Foi possível constatar que o MMM superou, em partes, a Matemática tradicional que o
professor ensinava em sala de aula. Não porque esta fosse ruim, mas porque havia alguma coisa
errada com o ensino tradicionalista, de modo que o MMM contribuiu positivamente, posto que
redirecionou a metodologia de ensino, focando em processos diferenciados e modernos, que
destacaram a necessidade de mudanças.Trouxe temas novos para o ensino da Matemática, assim
como estatística e probabilidade e outros temas que hoje são ensinados (VASCONCELLOS; VIANA,
2009).
O conteúdo de Matemática ensinado foi modificado, pois, havia necessidade e vontade
de unificar as áreas de Aritmética, Álgebra e Geometria, assim como questionar e modificar o
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ensino baseado na pura memorização de conteúdos, que diminuiu tornando as aulas mais
dinâmicas. Os livros tornaram-se mais atraentes e fáceis de estudar, professores passaram por
cursos de aperfeiçoamento. Isto era necessário, pela evolução da ciência, novas tecnologias e da
sociedade em geral (VIANA; CARVALHO, 2009).
Na região metropolitana de Belo Horizonte, o MMM ajudou bastante com relação ao
ensino e aprendizagem da Matemática, aperfeiçoamento dos livros didáticos, e influência nos
professores. Em geral, o movimento foi positivo no aspecto de publicar livros diferentes dos
usuais, provocar discussões sobre currículo e ensino, interação entre professores, reflexões,
experimentações em escolas, publicação de revistas.
Livros textos de matemática escritos por autores mineiros no Movimento da Matemática
Moderna
A Educação Matemática comporta também o estudo dos livros textos (livros didáticos),
pois são reveladores de características que ocorreram em determinado momento da história de
uma disciplina. Sendo possível conjecturar que eles revelem relações com a Educação Matemática
de hoje, já que grande parte dos educadores matemáticos de agora, foram formados sob a
influência do Movimento MMM.
Livros didáticos são considerados objeto e fonte de pesquisa, como importantes
elementos da cultura escolar presentes na relação professor aluno, pois segundo Valente (2005),
além dos documentos oficiais que regulamentam a função da escola (portarias, decretos, leis,
etc.) também constituem fontes documentais de grande valor para pesquisa dos processos
históricos da educação, elementos produzidos nas escolas, tais como diários de classe, cadernos e
livros.
Indicando a ligação entre livros didáticos e a Matemática escolar, para Valente (2005),
talvez seja a Matemática a disciplina cuja história mais esteja relacionada com a do livro didático,
“pois desde as origens de seu ensino (enquanto saber técnico militar) até sua promoção a saber de
cultura geral escolar, sua trajetória histórica de constituição e desenvolvimento pode ser lida nos
livros didáticos”. (VALENTE, 2005, p. 151).
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Assim, considerados objeto e fonte de pesquisa, importantes elementos da cultura
escolar presentes na relação professor aluno foram analisados livros textos de autores mineiros,
pois o objetivo desta pesquisa foi analisar livros didáticos (livros textos) de Matemática dos
ensinos Fundamental e Médio, veiculados em Minas Gerais durante o MMM, com ênfase em
autores mineiros, isto é um recorte do estudo do MMM em Minas Gerais, em busca de subsídios
para a compreensão do estado atual da escolarização em Matemática. Isto considerando-se que
um estudo de livros textos que reinaram no período de vigência do MMM, em Minas Gerais
poderia colaborar na compreensão do passado, servindo de fundamento para orientações sobre o
ensino de Matemática, a partir de ideias de Choppin (2000).
Do exposto, a questão central do trabalho foi: o que se encontra nos livros didáticos para
o Ensino Básico produzidos no MMM no estado de Minas Gerais, que caracteriza este movimento
neste estado?
Para a pesquisa foi utilizado instrumental teórico-metodológico de historiadores (André Cellard
- análise documental, Alain Chopin - livro e André Chervel - História das Disciplinas Escolares)
para compreender o presente, a partir do passado, pois esta investigação se insere na História da
Educação Matemática.
Foram procurados resultados de investigações já realizadas, e discussões de trabalhos
acadêmicos que contemplaram MMM em outros estados do país, pela escassez de pesquisas
sobre o MMM em Minas Gerais.
De acordo com Choppin (2000), atenção deve ser dada a “diferentes etapas na trajetória
de existência de um livro: aquelas que tratam da concepção, da produção e da difusão da obra”
(CHOPPIN, 2000, p. 563). Este autor pondera que há questões fundamentais a serem respondidas,
como: Que tipo de consumo se faz deles? Seguem os educadores fielmente o texto didático? O
papel de determinado livro está ligado à consulta ou à sua simples “decoração”? (p.565).
Os resultados da pesquisa indicaram livros que vão além de conjuntos, relação e função;
nem todos conforme a proposta do MMM para a geometria; alguns aspectos diferenciam os
livros: ênfase na linguagem simbólica, abordagem rigorosa do tema, preocupação com abstração
e contextualização, o uso de cores e de histórias em quadrinhos; a geometria, de modo geral não
foi tratada nos moldes das propostas pelo MMM.
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A Geometria nos livros didáticos de matemática de autores mineiros no MMM.
Este trabalho sobre o Movimento da Matemática Moderna (MMM) em MG focalizou livros
textos (livros didáticos) com um recorte para conteúdos da Geometria. Esta opção se deu pelo
fato do ensino dos conteúdos desta área da Matemática, ter sido considerado abandonado, por
alguns autores a exemplo de Pavanello (1993).
Assim, o objeto desta pesquisa é o estudo da apresentação de conteúdos de Geometria nos livros
didáticos escritos por autores mineiros. Com isso, o objetivo final da pesquisa foi desvendar
como e qual Geometria foi tratada nos livros didáticos de Matemática, para a escola básica,
escritos por autores mineiros à época do MMM em MG. Com isso, o trabalho de caráter
qualitativo, apoiou-se em diferentes estudos que envolvem o Movimento da Matemática
Moderna, a História dos Livros Didáticos, inserindo-se na História da Educação Matemática,
mais precisamente na História do ensino da Geometria.
Entre os autores que dão suporte teórico-metodológico, destacam-se, em relação ao
MMM, Viana (2004), Valente (2005); sobre o livro didático Chopin (2000), em relação à História
das Disciplinas Escolares Chervel (1990).
A opção foi pela análise documental, pois segundo Cellard (2008) é a adequada para
trabalhar com os livros didáticos. Para esse autor, esse tipo de metodologia exige uma análise
preliminar das fontes analisando o contexto em que o documento foi produzido, sua natureza,
confiabilidade, etc. E que para fazer a interpretação dos textos dos documentos usados como
fontes, é necessário o conhecimento prévio da identidade do autor, seus interesses e motivos que
o levaram a escrever. Neste sentido, foram aproveitadas as entrevistas realizadas com autores
mineiros pelos bolsistas de iniciação científica Alexandre Vasconcellos em 2009 e Allana Carolina F.
de Carvalho em 2010. Essas entrevistas auxiliaram a compreensão das escolhas dos autores por
um ou outro caminho seguido e os motivos de suas obras permanecerem ou não no mercado.
Os livros-textos, agrupados por coleções, pois nem sempre a Geometria é tratada
num único volume, tiveram analisados seus conteúdos relacionados à Geometria
Euclidiana e à Geometria das Transformações preconizada pelo MMM.
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Foram seguidas as etapas que Chervel (1990) propôs: escolha do período a ser
investigado, seleção, localização/aquisição, leitura dos livros didáticos e seleção das categorias de
análise para a comparação.
Também foram analisadas capas, prefácios, folhas de rosto, buscando elementos para
analisar a natureza, a linha editorial, os aspectos materiais, exercícios e problemas propostos e
modelos apresentados.
Os autores Alceu Mazzieiro e Antônio Davi não apresentaram Geometria das
Transformações em seus livros, mas estes eram bastante atrativos utilizando estórias em
quadrinhos muito do gosto dos estudantes. Mario de Oliveira apresentou a Geometria
Euclidiana sem retoques.
Apenas Reginaldo Lima e Maria do Carmo Vila abordaram, de fato, a Geometria de
Transformações sugeridas no MMM. Segundo Viana e Silva (2013) os livros destes autores
continham: o estudo da Geometria Afim por meio das transformações lineares e métodos
vetoriais, grupo de transformações (rotações, reflexões e translações); o plano afim, notação de
Grassman, etc., afirmando também que as abordagens (translações e homotetias, por exemplo)
foram interessantes. Os autores utilizaram também o recurso de história em quadrinhos, e que a
publicação foi interrompida com o fechamento da Editora Vega, sendo portanto pouco difundida.
Como o MMM teve maior ênfase em São Paulo, principalmente com Osvaldo Sangiorgi um
dos precursores do MMM em todo o Brasil, também foram analisados seus livros-textos.
Contudo, este autor não incorporou a Geometria das Transformações, esta foi colocada apenas
num apêndice de uma de suas obras.
Considerações finais
O estudo sobre o MMM no estado de Minas Gerais embora ainda inconcluso,
principalmente pela sua extensão territorial, permite tecer algumas considerações. Na região
metropolitana de Belo Horizonte, foram realizados cursos de capacitações para professores, que
não ocorriam antes do MMM, que provocaram renovação na área pedagógica. A implantação dos
novos livros didáticos nas escolas de Belo Horizonte foi difícil, pois o professor tinha dificuldades
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para aprender um novo assunto, abandonando práticas cristalizadas, até porque não tinham
tempo e nem dinheiro para estes investimentos. As escolas acabaram desistindo da ideia de
mudança e o movimento perdeu a força que tinha. Mas a região metropolitana de Belo Horizonte
teve grandes representantes que assimilaram a ideia de modificação nos livros didáticos e a
mudança necessária para um ensino melhor (VIANA; CARVALHO, 2009).
Até hoje há vestígios do movimento em livros didáticos, nas formas de ensino, mas o
MMM não conseguiu prosseguir, foi enfraquecendo talvez devido ao excesso de críticas feitas ao
modelo. A cultura escolar a partir do MMM incorporou a linguagem dos conjuntos no tratamento
de equações, funções e conjuntos numéricos.
Quanto à Geometria, apesar de poucas tentativas de mudanças, pois muito pouco foi
encontrado nos textos estudados, e que foram representativos para o estudo, permaneceu a
Euclidiana.
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