DEZ ANOS SE PASSARAM DESDE A TRÁGICA NOITE QUE MUDARA AS VIDAS DE AUSTIN, HUNTER E ALEX. AGORA, CADA QUAL DEVE CUMPRIR COM SUA PARTE NA VINGANÇA CONTRA O HOMEM QUE ARRUINOU TUDO. Dono de uma determinação ferrenha, Alex Diaz superou sua origem pobre ao criar um império da comunicação. Mas ele ainda tem um objetivo a atingir: vingar a morte de sua amiga destruindo o responsável por ela. A apresentadora Chelsea Maxwell tem uma entrevista marcada com Jason Treffen em seu talk-show ao vivo. Essa é a chance que Alex precisava para desmascará-lo publicamente – e seduzir Chelsea ao mesmo tempo. Entretanto, por ter subestimado sua atração por ela, Alex percebe que para aniquilar Treffen também terá que destruir a vida que Chelsea havia construído para se proteger… O terceiro passo para a vingança. Alex possui o poder! Kate Hewitt QUERO QUE VOCÊ ME REVELE Tradução Angela Monteverde 2014 CAPÍTULO 1 ALEX DIAZ se inclinou para a frente no assento enquanto a limusine parava no meio-fio entre a Seventy-Second Street e a West End Avenue, diante do luxuoso arranha-céu moderno e envidraçado, exatamente o lugar onde esperava que Chelsea Maxwell morasse. Seus lábios se curvaram em um sorriso gélido de antecipação enquanto apertava o botão do interfone para falar com o motorista: – Espere alguns minutos, por favor. – Muito bem, senhor. Alex relanceou um olhar para o relógio de pulso e retirou um fiapo imaginário da manga do smoking. Sete horas e vinte e cinco minutos. A festa começaria dentro de cinco minutos, mas é claro que Chelsea Maxwell se atrasaria de modo elegante. Assim como ele, já que pretendia dar uma carona para ela. Lá fora as luzes de Manhattam brilhavam na escuridão e as pessoas se apressavam pelas calçadas largas da West End Avenue, as cabeças baixas para se proteger do vento cortante de inverno. Era o início de fevereiro e Nova York estava mergulhada em um frio implacável sem o alívio da suavidade da neve. Entretanto, o tempo, impiedoso e frio, combinava perfeitamente com Alex. Nessa noite começava sua vingança pessoal contra Jason Treffen, muito sonhada e há muito merecida. Dizia-se que a vingança era um prato que se comia frio, e, se fosse verdade, Jason iria engolir cada bocado gelado. E para tanto Alex precisava de Chelsea Maxwell, ou, pelo menos, de seu programa de televisão. Sete e vinte e sete. Será que ela resolvera não comparecer à festa? Ele deixou o ar escapar dos pulmões com impaciência. Hoje seria a festa de aniversário do chefe de Chelsea, Michael Agnello, e, se os boatos tinham fundamento, o homem com quem ela dormira para ser a anfitriã do principal talk show diurno da televisão. Chelsea precisava comparecer. Sete e vinte e nove. Alex se remexeu no assento, sufocando um suspiro de irritação. Onde estava ela? Então as portas de vidro fosco do prédio se abriram, e ela saiu para o frio da noite, o corpo envolto em um paletó longo e elegante de cashmere marfim. Os cabelos castanhos estavam presos em um coque elaborado, e longos brincos de brilhantes luziam e dançavam em suas orelhas. Alex a viu relancear um olhar para a limusine, e depois suas feições se contraíram, aborrecidas. Ele adivinhou que Chelsea estava irritada porque o motorista não saíra para lhe abrir a porta. Pensara que a limusine era sua, mas se enganara. Justamente porque ele telefonara para a agência e cancelara o pedido dela. Curvando os lábios em um sorriso de pura antecipação maldosa, Alex pressionou o botão para descer a janela. Inclinou-se para fora recebendo um sopro de vento invernal que despenteou seus cabelos, enquanto Chelsea se encaminhava para a limusine, muito confiante e radiante. – Srta. Maxwell? Ela parou e estreitou os olhos enquanto Alex se inclinava mais para que fosse visto. – Alex Diaz – apresentou-se, embora Chelsea devesse saber quem era, pois haviam se visto em alguns eventos, e a maioria do setor de mídia o conhecia. De qualquer modo, Chelsea Maxwell não parecia alguém que se esquecia de um rosto. – Se não me engano, estamos indo para o mesmo lugar, certo? – Depende de que lugar seja esse. – A voz dela soou baixa e rouca, atraente, mas ao mesmo tempo fria, enquanto continuava a estreitar os olhos. Quando aparecia enrodilhada nos sofás de veludo cor-de-rosa, marca registrada de seu talk show, Chelsea Maxwell estava sempre com os olhos bem abertos e com uma doçura sexy. Na vida real era mais dura, sagaz, porém Alex refletia que não se chegava aonde ela chegara sendo tola ou molenga. – A festa de 40 anos de Michael Agnello? – disse ele, e ela apenas inclinou a cabeça para um lado, aguardando. Em geral Alex não se daria o trabalho de comparecer a uma festa desse tipo. Não tinha tempo nem paciência para maquinações mesquinhas e conversa mole, contudo sabia que Chelsea compareceria, e precisava conversar com ela. Precisava descobrir o que ela sabia e o que pretendia fazer. Enfim, usá-la ou usar o seu programa. Abriu a porta da limusine quando uma nova lufada de vento gelado fez o paletó de Chelsea se enroscar em suas pernas longas e bem torneadas. – Posso lhe oferecer uma carona? Ela hesitou e Alex esperou, adrenalina e impaciência correndo por suas veias mesmo que continuasse imóvel. Não considerara a hipótese de Chelsea negar seu convite. Jamais pensava em fracasso. – Obrigada – disse ela finalmente, e se sentou ao seu lado no carro. Alex se afastou um pouco, mas a coxa de Chelsea pressionou a sua e ele sentiu seu perfume, caro e suave. Estirou um braço por cima do encosto quando a limusine deixou o meio-fio, e Chelsea se voltou para ele com um sorriso de pessoa entendida. – Então, não vai me dizer por que roubou minha limusine? Ele ficou surpreso e divertido ao mesmo tempo. Então ela queria flertar um pouco? Ótimo. Ele podia brincar também. Arqueou as sobrancelhas e sorriu de volta. – Tenho cara de quem faria isso? Ela lhe lançou um olhar significativo da cabeça aos pés. O corpo de Alex reagiu à análise, e ficou excitado. Refletiu que havia algo de muito erótico na maneira como Chelsea o olhava. – Tem, sim – murmurou ela. Alex balançou a cabeça com zombaria. – Como é desconfiada. – E não somos todos nesse ramo? – Ela parou com a voz macia e o fitou de modo severo. – Por que está agindo como um personagem de filme de capa e espada? O que quer? Ele tornou a sorrir e franziu a testa. – Por que pensa que quero alguma coisa? – Não nasci ontem, sr. Diaz. – Chame-me de Alex. – Adoraria. – O sorriso era de flerte, mas o olhar continuava frio. Ela tinha lindos olhos. Verde-acinzentados com longos cílios negros. – Então, Alex, alugo uma limusine para hoje e encontro você me oferecendo carona. Coincidência? – O tom era sussurrante e ela arqueou as sobrancelhas, sempre sorrindo. – Acho que não. Alex reparou na boca da mulher, que era linda também. Achou graça, embora a sagacidade de Chelsea Maxwell descobrindo sua artimanha devesse alarmá-lo ou, pelo menos, aborrecê-lo. Não seria tão simples como pensara. Nem um pouco. Ainda bem que gostava de desafios. E que pretendia arruinar Jason Treffen publicamente a qualquer custo. E saber que poderia fazer isso na televisão ao vivo era ainda melhor. Deu de ombros e se recostou no assento. – Muito bem. Quero uma coisa, srta. Maxwell. Percebeu que ela não pedira para ser chamada de Chelsea. Apenas esperou com os olhos estreitados e o sorrisinho frio. – Há quanto tempo está na AMI? – perguntou ele, mencionando o nome do canal. Um brilho de surpresa nos olhos dela foi tão rápido que Alex mal percebeu. Chelsea Maxwell era boa em esconder as emoções. Trabalhar em televisão devia ajudar. – Dez anos – respondeu ela. – E tem o Bate-Papo com Chelsea há... – Quase quatro. – Ela inclinou a cabeça mais ainda e arqueou as sobrancelhas. – Por que pergunta...? – Estou interessado em seu programa. Ela nem piscou. – Não me parece o tipo que assiste à tarde celebridades fazendo confidências, mas todo mundo tem seus vícios secretos, não? Ele riu de mansinho, divertindo-se com a tirada inesperada. Estava acostumado com lisonjas, e ela o surpreendia com ironias. – Seu programa é campeão de audiência – argumentou Alex. – Sei disso – retrucou Chelsea, sempre sorrindo. – Não estou interessado em seu programa da tarde – disse Alex após um segundo. Precisava tomar cuidado e saber quanto revelar. Até que ponto ser honesto. Não daria mais informações do que o necessário... até saber o que Chelsea faria com elas. – Estou interessado na entrevista de uma hora que fará com Jason Treffen no horário nobre em março. – Verdade? – Ela cruzou as pernas, o paletó se abriu, e Alex viu a fenda até a coxa no vestido cinza, que revelava toda a pele bronzeada. A excitação o dominou de novo, e ele tentou se conter. Não iria complicar a situação com sexo. A não ser que servisse a um propósito, é claro. – Verdade – respondeu. Ela inclinou a cabeça com um olhar cuidadoso, fitando-o de cima a baixo como fizera antes. Alex pensou que talvez fosse interessante complicar a situação com sexo. Às vezes sexo era um meio de se chegar ao fim, e com Chelsea sem dúvida seria agradável. Imaginou como ela seria na cama. Selvagem e solta ou controlada? Suspeitava que pertencesse ao segundo tipo, porém gostaria de vê-la perder as estribeiras e queimar de desejo. – Está querendo me fazer uma proposta? – perguntou ela em um claro tom de duplo sentido, seguido por uma risada de flerte. Fora por isso que Michael Agnello não pudera resistir? Alex compreenderia. Ele esticou o braço mais um pouco sobre o assento e roçou o ombro de Chelsea, sentindo a maciez do cashmere. – Não, apenas dizendo que sou curioso. – Deu-se a um enorme trabalho por mera curiosidade, sr. Diaz. – Ela sacudiu a cabeça e os brincos reluziram. Apesar do amigável flerte Alex sabia que Chelsea não era nenhuma tola. E ele também não. – Esperar em uma limusine não é muito trabalho – replicou ele, enquanto ela continuava a sorrir de um modo que ele não sabia se desejava beijá-la ou apagar aquele sorriso de sua boca. Isso o aborrecia e intrigava. Chelsea parecia tão segura de tudo. Era perturbador. Percebeu que esperara um pouco de lisonja e interesse por parte dela. Não gostava de bajuladores, mas presumira que Chelsea morderia a isca e se sentiria grata pela possibilidade de trabalhar no canal Diaz News. Entretanto, agora que falara com ela, sabia que Chelsea Maxwell não mordia isca nenhuma. Exceto por Michael Agnello. Raios, ela iria ceder a Alex Diaz também. – Tenho um contrato de mais três anos com a AMI – revelou ela, e Alex aquiesceu com um gesto de cabeça. – Eu sei. – Então...? Alex olhou pela janela. Aproximavam-se de Columbus Circle e só dispunham de mais alguns minutos antes de chegar à festa e Chelsea ser arrebatada pelo grupo de amigos íntimos de Michael Agnello. – Vamos conversar no jantar. Ela riu delicadamente. – Não sabia que tínhamos algo para conversar. – Não brinque comigo, Chelsea. – Alex falou com aspereza e a fitou nos olhos, mas, em vez de ver raiva ou aborrecimento, ou mesmo arrependimento, ele viu rapidamente outra coisa que quase o fez pular no assento. Desejo. Luxúria. Mas desapareceu logo, apesar de deixar seu órgão rijo sob a calça. Teve o súbito impulso de passar a mão pela perna bem torneada, enfiar os dedos sob o vestido cinza e descobrir o que havia por baixo. Parecia que Chelsea queria a mesma coisa. Que interessante. Complicado, talvez, mas muito interessante. Talvez não precisasse fingir que a desejava em sua rede de notícias. Quem sabe bastasse demonstrar que a queria na sua cama. E talvez o complicado se tornasse simples. – Acha que estou brincando? – quis saber ela com expressão misteriosa. – Foi você quem se escondeu em uma limusine agindo como James Bond. – Sacudiu os brincos e riu de leve. – Quando quiser falar a sério comigo, Diaz, ouvirei. – Tornou a olhá-lo de cima a baixo se detendo um segundo na protuberância que surgia da calça de Alex. – Talvez. Ele quase disse um palavrão. Sentiase como um adolescente cheio de hormônios, incapaz de se conter, e o absurdo da situação o constrangia. Quando fora que perdera o controle com uma mulher? Com qualquer pessoa? A limusine estacionou em frente ao Mandarin Hotel. Um porteiro se adiantou para abrir a porta para Chelsea. Ela acenou de leve com os dedos e acrescentou: – De qualquer modo, obrigada. E foi embora. Alex voltou a se recostar no assento, furioso, frustrado, mas animado. Então Chelsea Maxwell era um desafio maior do que imaginara. Embora seu olhar alerta devesse ser levado a sério... ou não. Talvez pudesse fazer um jogo diferente do que planejara. Quando ele, Hunter e Austin haviam discutido sobre arruinar Treffen para sempre, seu plano fora atrair Chelsea com a possibilidade de um programa no Diaz News. Assim ela o deixaria participar na elaboração da entrevista com Treffen. Parecera simples. Sem dúvida ela queria se firmar como jornalista séria, e, como principal executivo da maior rede de notícias do país, Alex poderia realizar seu sonho. Contaria a verdade sobre Treffen quando tivesse certeza de que ela entenderia. Quanto a oferecer de verdade algo no Diaz News para Chelsea... essa era outra história. A vingança era um negócio caro, um preço alto a ser pago, e sem dúvida Alex pagara o seu. Mesmo nesse momento a lembrança da última vez em que vira Sarah o deixava gelado e muito determinado. Iria vingá-la e todas as outras mulheres que Jason Treffen usara e enlameara. Faria o que fosse preciso, e que Chelsea Maxwell se danasse! – Senhor? – O motorista escrutinou o interior da limusine e Alex tratou de descer. Não desistia tão facilmente. Ainda não acabara com Chelsea Maxwell. Prometera a Hunter e Austin. Os outros dois haviam feito sua parte, e era hora de Alex fazer a sua, custasse o que custasse. Sorrindo de modo sombrio, rumou para o hotel. CHELSEA TIROU o paletó e entregou à moça na chapelaria, desatenta ao tíquete que recebeu e ao elevador que a levou para o trigésimo quinto andar onde se realizava a festa de Michael. Fechou os olhos e respirou fundo. O inesperado encontro com Alex Diaz a deixara tonta e sem fôlego. Um pouco agitada e preocupada também. Era muito experiente para saber que devia se preocupar quando um homem queria negociar com ela. E, sem dúvida, Alex Diaz queria alguma coisa. A adrenalina percorreu suas veias quando se lembrou do modo como ele preenchera a limusine com sua presença, as pernas levemente abertas, os dedos roçando seu ombro. Mesmo sob a espessura do cashmere ela sentira seu toque, e Alex também. Era evidente que a leve carícia fora intencional. Chelsea fizera muita força para não estremecer. Não gostava de se sentir tão atraída por um homem, qualquer homem, e especialmente alguém como Alex Diaz. Ele era másculo demais, potente e primitivo, e seu corpo reagira mesmo quando seu cérebro se negara a ceder às palavras dele. Estou interessado em seu programa. Não no programa da tarde, mas na entrevista de horário nobre que ela suara em bicas para conseguir. Desde que iniciara o Bate-papo com Chelsea soubera que queria mais. Queria ser levada a sério como jornalista, e isso não aconteceria enquanto se sentasse em um sofá de veludo cor-de-rosa e entrevistasse chorosas cantoras country e artistas de novelas. O programa podia ser popular e tê-la feito enriquecer, mas sem dúvida não significava que fosse respeitado de verdade... ou que ela fosse respeitada. Chelsea sabia o que falavam a seu respeito e de Michael; não era tola nem surda. Mas nem mesmo Michael poderia lhe dar uma entrevista de uma hora sobre um assunto sério. Porém, se a entrevista com Treffen fosse a sensação da década como esperava e planejava, todos saberiam. E teria feito tudo sozinha. Deixou escapar o ar dos pulmões. E se a entrevista com Treffen levasse a algo no Diaz News? A um emprego de âncora ou mesmo ao seu próprio programa no segmento de jornalismo sério? Sentiu o estômago apertado e voltou a divagar. Não, não podia pensar assim. Ainda não. Não até saber o que Diaz desejava de verdade. Lembrou-se do volume sob a calça dele quando descera da limusine. Sabia que o deixara faminto, como fora sua intenção. Diaz se sentia atraído por ela, sem a menor dúvida. Porém, a vida a ensinara a ser cética e cínica. A se proteger. E não iria pular na cama com um homem como Alex Diaz nem mesmo por um trabalho. Especialmente não por um trabalho. Mesmo assim... a remota possibilidade de estar no Diaz News fazia seu coração acelerar e suas mãos se crisparem. A rede de notícias de Diaz era a mais respeitada da TV, e a única que conseguia se destacar entre as outras redes alarmistas envolvidas em mexericos e rixas políticas. “Fatos, não opiniões” era o lema de Alex Diaz, que transformara seu canal de notícias no mais visto da televisão. E ela poderia trabalhar ali como uma jornalista séria e respeitada... Torceu a boca com cinismo. Ou talvez Alex Diaz só a quisesse na cama. E não seria um lugar ruim... Talvez, porém Diaz não fazia seu tipo. Era arrogante e controlador demais. Chelsea gostava de homens mais submissos, que aceitassem as condições dela. Mas se conseguisse que Alex Diaz se submetesse... Sorriu em antecipação. Seria satisfatório. Alex Diaz de joelhos na sua frente. Implorando. Como ela já implorara. Entretanto, nunca mais. Agora não implorava, não rogava nem mesmo pedia “por favor”. E, quando queria sexo, tinha. Mas precisava parar de pensar em sexo. Chelsea respirou fundo de novo e ergueu o queixo quando o elevador parou no trigésimo quinto andar. Caso Diaz tivesse algo concreto em mente iria procurá-la de novo. Com franqueza. Ela não iria correr atrás dele pedindo favores. A festa já estava muito animada quando Chelsea se viu no salão particular com vista para Manhattam, Central Park, e pontos escuros em meio às luzes da cidade. Adiantou-se de cabeça erguida, acenando para alguns conhecidos, pessoas que se diziam suas amigas, mas Chelsea sabia que não eram. Ela conhecia milhões assim, porém ninguém a conhecia de verdade; ela não deixava. Continuou a avançar pelo salão, rindo, conversando, lançando beijinhos no ar e acenando. Era cansativo, porém isso também Chelsea ocultava de todos. A maioria sentia inveja dela pelo rápido e enorme sucesso como apresentadora de um talk show aos 28 de idade, e os boatos de que dormira com muitos para chegar ao auge ainda a perseguiam quatro anos depois, embora os ignorasse com ares de quem pouco ligava. E não ligava mesmo. Não ligaria. Aquele caminho para o sucesso podia ter funcionado no passado... ou não... porém, agora era outra mulher. Mais forte, mais esperta, e não faria papel de boba... ou de objeto... para ninguém. – Chelsea. – Michael se aproximou com as mãos estendidas. Chelsea as segurou e se inclinou para ele, que a beijou na face. Podia sentir os olhos dos outros sobre eles, olhos aguçados, ouvidos atentos para qualquer fragmento de conversa picante. Não que essas pessoas precisassem ouvir. Podiam inventar. E Chelsea nunca negava nada. Negar boatos a deixaria na defensiva, e os rumores acabavam se tornando mais sérios com a imaginação aguçada das pessoas. Que sorrissem com malícia. Ela acabaria driblando todos. – Suas mãos estão frias – observou Michael, e ela riu. – Está gelado lá fora, Michael. Afastou as mãos, de súbito consciente de que alguém a observava. Não precisava procurar para saber quem era. Sentira os olhos dele desde que saíra do elevador. Sentira sua presença morena e forte mesmo sem um olhar de esguelha. Alex Diaz estava ali. E ela podia senti-lo. Michael se afastou para examiná-la com uma expressão preocupada que acentuava os dignos pés de galinha nos cantos dos olhos. Estava sempre preocupado com ela, mesmo com Chelsea garantindo que não havia motivos para isso. Fingia não precisar dos cuidados de ninguém, porque senão pareceria fraca e carente. Mas precisava de Michael. Ele a descobrira quando ela estava com 22 anos, desesperada, sofrida e determinada, e para ele Chelsea se abrira mais do que para a irmã. Mesmo assim ainda não lhe contara tudo e jamais contaria. – Parece cansada – comentou ele. – Muito obrigada. – Ela fez graça se fingindo ofendida. – E linda, é claro – acrescentou Michael, sorrindo. – Nem preciso dizer. Mas espero que não esteja trabalhando demais. – Não comece. Apesar da diferença de apenas oito anos de idade entre os dois, Michael insistia em bancar o pai dela ou irmão mais velho. Protetor e um pouco mandão. Nunca tiveram um romance, mas Chelsea não desmentia os boatos. E nem Michael, a pedido dela. Era melhor manter a cabeça erguida e não dar explicações em vão aos outros. Afinal, ninguém acreditaria. E se soubessem do passado de Chelsea seria pior. Mas não sabiam. – Está bem. – Michael exibiu os dentes brancos no rosto bronzeado... fora esquiar em Aspen na semana anterior... e Chelsea refletiu como era carismático, bonito e boa praça. Se desejasse um bom relacionamento, sem dúvida escolheria Michael, que quase a fazia se sentir segura. Contudo, jamais desejara um relacionamento; os homens eram para encontros casuais e a satisfação dos sentidos apenas. Tal pensamento a fez lembrar-se de Alex Diaz. Raios! Não conseguia deixar de procurá-lo com o olhar. Estivera determinada a não fazer isso nos últimos 15 minutos, mas não resistira. Ele estava no centro do salão com seu smoking elegante, moreno, poderoso e um pouco intimidador. Chelsea concluiu que era extremamente atraente. Michael Agnello tinha carisma, porém Alex Diaz possuía algo mais poderoso e primitivo. Apelo sexual, puro e simples. Musculoso, parecia ocupar todo o espaço no salão. Devia ter no mínimo 1,90 m de altura. Chelsea tinha quase um 1,80 m, e com os saltos altos – jamais andava sem saltos apesar de muito alta – continuava mais baixa que ele. Gostava de estar ao lado de um homem que não a fazia se sentir uma girafa, mas afastou a ideia. Não gostava dos homens. Usava. Imaginou como seria usar Alex Diaz. Perigoso. E perigoso também era constatar que ele vinha na sua direção. Chelsea estremeceu de antecipação e de alarme. Algo em Diaz parecia... fora de lugar. Seu olhar era intenso demais, seu caminhar, predador demais. Se a desejasse para sua rede de notícias seria fácil agir. Ele procuraria o agente de Chelsea e marcaria um jantar no Le Cirque. Dariam muitas risadas regadas a vinho, e ele não seria esse homem sombrio com ar de fera que se aproximava dela como se Chelsea fosse um carneirinho indefeso. Ela aprumou os ombros e sorriu. Não há carneirinhos aqui, idiota, pensou sem deixar de fitá-lo. Os lindos olhos de Alex eram castanhos com toques dourados. Os cabelos eram negros e curtos, fazendo Chelsea imaginar como seria tocá-los, se de fato lembrariam seda entre seus dedos. Quanto ao físico... cheio de confiança e força em cada músculo. Chelsea afastou os olhos das coxas firmes, e sorriu com ar de flerte. – Olá de novo. – Olá, Chelsea. – Como era possível ser tão sexy dizendo palavras tão triviais? Ser tão... sensual? Chelsea percebeu que estava descontrolada por não se sentir atraída por alguém há muito tempo. Talvez a vida toda. – Posso lhe trazer uma bebida? – perguntou ele, chegando tão perto que ela sentiu o aroma de loção de barba. Chelsea deu um passo atrás. Resistiria. Não iria para a cama com ele. Seria tolice e loucura. Não cederia, quando o que ele queria era discutir negócios. Chelsea era esperta demais para cair na esparrela. – Água com gás, por favor. Ele rumou para o bar, sexy e atraente. Sim, era muito bonito. Isso já ficara decidido. Agora era seguir em frente. Chelsea suspirou, desejando acabar com a tensão. Detestava festas há dez anos, e começava a sentir a costumeira ansiedade de quando estava no meio da multidão. Alex voltou com o copo de água e uma garrafa de cerveja. – Aí está – disse com delicadeza, mas com determinação a empurrou para um local isolado perto da janela. Chelsea não resistiu, porém guardou uma distância apropriada. – Vista incrível – comentou Alex, tomando um gole da garrafa. – Jamais me canso de admirar. Chelsea nem olhou para a janela panorâmica. Tinha a mesma vista de sua cobertura, e só queria olhar para Alex. – Por que está interessado no meu programa? – Achou melhor ir direto ao ponto. Ele sorriu de leve. – É boa no que faz. – No que faço? – Sim. Parecer simpática enquanto enfia uma faca no entrevistado. Ela piscou diversas vezes, surpresa, e logo sorriu de volta porque era verdade. Deixava as celebridades à vontade para que confessassem o que queria ouvir, porém todas gostavam. Precisavam da catarse que seu programa parecia oferecer. – E você gosta disso? – Não pretendera soar sexy, porém notou que as pupilas de Alex se dilataram com o mesmo desejo que ela sentira na limusine. Doloroso. Inoportuno. – Gosto de gente boa no que faz. – Mesmo assim, não parece ser o tipo de coisa que precise ter na sua rede, se é que de fato quer persistir na ideia. – Sim, não parece. – Alex tomou outro gole de cerveja, e Chelsea se manteve serena. Esperando... o quê? Voltou a sentir as aguilhoadas do desejo. Sabia que ambos se sentiam atraídos e imaginou como essa história poderia ficar complicada. Não gostava de complicações. Não misturava prazer ou sexo com emoção ou com qualquer outra coisa. Não mais. Para ela, sexo era como o exame de saúde anual que fazia ou a limpeza semestral dos dentes. Às vezes divertido, às vezes, monótono, mas necessário para se manter saudável. Alex a fitou atentamente, baixando a garrafa. – Como conseguiu que Treffen concordasse em lhe conceder uma entrevista no horário nobre? Ela ficou irritada com seu descrédito. Como se ele duvidasse que uma ex-loura fosse capaz disso. – Foi difícil – respondeu. – Treffen nunca deu entrevistas na televisão. – Sei disso, mas trabalhei bem. – Ela soou na defensiva. Patética. Algo raro. Alex sorriu. Tinha o sorriso mais sensual que ela já vira, e Chelsea estremeceu. Bastava ele mover os lábios para enlouquecê-la. – Conte-me – incentivou ele com voz suave. – Como conseguiu? – Com paciência. – Agora só o cinismo a salvaria do desejo que dominava seu corpo, minando suas forças. – Passei um ano tentando conhecê-lo bem, comparecendo às mesmas festas, admirando seu trabalho... – Bajulando. Chelsea recuou, espantada com o tom de zombaria. E pensar que segundos antes brincara com a possibilidade de dormir com Alex. – Ele é uma pessoa incrível – resumiu – que fez muito pelos direitos das mulheres... – Sei o que ele fez. – Alex sorriu com frieza, e os olhos, antes com frisos dourados, agora estavam negros como carvão. – Mas me pergunto se você sabe. – O que quer dizer com isso? – Vai sentá-lo no seu sofá? Fazê-lo confessar seus segredos e chorar? A voz de Alex não passava agora de um sussurro, porém Chelsea ainda notava a zombaria. Sentia. – Não será esse tipo de entrevista – respondeu com igual frieza. – Não estou interessada em causar escândalos com a entrevista de Treffen. Mas o que isso interessa a você? – Interesso-me por Treffen. – Parece que o odeia – comentou Chelsea. – Ódio não é a palavra certa. Mas gostaria de vê-lo dando a entrevista. Ver como você se sairá. – Ainda com o sorriso frio e o ar duro, tomou outro gole da cerveja. Chelsea estava farta das insinuações e da ironia. Alex não gostava de Jason Treffen. Estranho, considerando que as atividades de advogado e a atuação com direitos humanos haviam convertido Treffen em um santo moderno. Mas ela não tinha nada a ver com isso, tinha? Talvez sim. Porque iria entrevistar o homem, e se queria ser uma jornalista séria precisaria escavar por baixo do que já conhecia. Porém, não nesse momento. Não quando Alex Diaz a deixava fraca apesar da zombaria, e a enchia de desejo. Era como um rio que a arrastasse. Quase. Chelsea endireitou os ombros e lançou um de seus sorrisos mais bonitos. – Bem, então deixe seu aparelho de televisão ligado. Será ao vivo no dia 20 de março. E, sem esperar resposta, ela deu as costas e foi embora, altiva, os ombros eretos e o queixo firme. ALEX A seguiu com os olhos, tomando mais um gole de cerveja. Por um momento pensara em lhe contar a verdade sobre Jason Treffen, mas por sorte desistira. Não seria uma conversinha para um coquetel, e não a conhecia o suficiente para lhe confiar tal barril de pólvora. Pelo menos ainda não. Sabia que Chelsea era ambiciosa e dura. Tinha certeza de que possuía coragem suficiente para acabar com Treffen ao vivo na televisão se assim quisesse. A pergunta era: Chelsea iria querer? Poderia convencê-la? Alex ansiava por destruir o mundo de Treffen aos olhos de todos. O maldito não iria mais enganar as pessoas se fingindo de santo. Todos iriam conhecê-lo. Não apenas como pecador, mas como o próprio demônio. Austin já desmascarara Treffen para sua família com a ajuda de Katy, a irmã de Sarah. Hunter agia para expulsar Treffen de sua firma de advocacia, e Alex fora incumbido de confrontar o homem em rede nacional de televisão, mostrando ao mundo sua verdadeira personalidade: um monstro que usava as mulheres em vez de salvá-las. Que as forçava a uma vida de vergonha, escândalo e pecado. Alex ansiava por expor Treffen publicamente... e faria de tudo para conseguir. Incluindo usar Chelsea como pudesse. Ela era fria. Dormira com muitos para chegar ao topo. Não sentiria remorsos por usá-la. Dormiria com ela se chegasse a esse ponto, e já estava um pouco frustrado. Sexualmente. Independentemente de Treffen, desejava Chelsea sob seu corpo, os olhos verdes cheios de excitação. Queria vê-la desesperada, implorando por seus beijos, desejava tornar sua risada um suspiro de prazer. Queria ser o homem que derreteria aquela camada de gelo. Para seu próprio prazer. Fitou-a caminhando com o vestido esvoaçante. De frente era discreto e casto como um hábito de freira, mas o decote nas costas ia até a cintura. Alex sempre fora um apreciador de seios, mas as costas de Chelsea, bronzeadas e perfeitas, o fizeram reconsiderar suas preferências. Viu-a se afastar da multidão e, instintivamente, seguiu-a, curioso para saber por que deixava a festa tão cedo. Parou ao ver que apenas se dirigia ao toalete feminino. Por que ele estava agindo assim? Permitia que essa mulher o levasse pelo cabresto, e ela nem sabia disso. Ou talvez soubesse. CHELSEA CHECOU a maquiagem no espelho e suspirou. Festas como essa... e conversas como a que tivera com Alex Diaz... a deixavam à beira de um ataque de ansiedade. Não que ela demonstrasse. Em dez anos aprendera a se controlar e esconder. Fitou seu reflexo no espelho e desejou não estar tão pálida e trêmula. Você pode, Chelsea. É mais forte. Vai se controlar. Respirou fundo. Mais uma vez. Continuou a se fitar no espelho. Por fim a cor voltou ao rosto e o coração bateu normalmente. Pronto. Viu? Com mais um suspiro, se afastou do espelho e saiu do toalete. Mais vinte minutos e iria embora. A ideia a aliviou. O diálogo com Alex Diaz a enervara, fazendo-a se sentir exposta. Mas conseguira ocultar. Graças a Deus. Nem Michael sabia como essas ocasiões eram uma tortura para Chelsea. Apesar da carreira brilhante, eventos sociais a deixavam abalada. Aquelas pessoas a aterrorizavam. Pessoas como Alex Diaz. Continuara a sentir os olhos dele enquanto se movia pelo salão, deixandoa preocupada e atenta, porque mesmo à distância ele a influenciava. Era poder demais. De volta à festa, alguém bloqueou seu caminho. Paul Bates, o âncora dos noticiários da AMI e um completo idiota. Idiota e bêbedo, a julgar pelo hálito. Chelsea tentou se esquivar. Ele a segurou pelo braço, machucando-a com os dedos que apertavam sua pele sob o tecido do vestido. – Aonde vai, beleza? – disse com a voz rouca. Chelsea não se moveu nem retirou o braço. Sabia como agir com homens como Paul Bates, que gostavam de um pouco de resistência. Ou muita. – De volta à festa – respondeu com calma. – Mas sugiro que largue meu braço se não quiser ser processado por assédio sexual. – Oh, deixe disso, Chelsea. – Ela voltou a sentir o bafo de bebida. – Podia ser mais amigável comigo. Posso ajudála como Agnello ajudou. Pois sim. Já sentira os olhares de Paul no estúdio, suportara alguns insultos velados, indiretas ofensivas, mas nunca antes ele a assediara. Nem a tocara. – Oh, tenho certeza que sim, Paul. – Sorriu para desanuviar a tensão. Então ele levou a mão dela até seu órgão sexual sob a calça, e Chelsea sentiu o volume inexpressivo. Sorrindo com doçura, apertou os testículos com tanta força que o fez engasgar. Praguejando, ele a soltou. Chelsea tratou de caminhar, mas foi detida por outra figura. Alex Diaz. – Estava indo salvá-la – murmurou ele. – Tome cuidado para não ser o próximo – avisou ela, mantendo um tom de voz displicente. – É melhor eu sair do caminho. – Ele riu. Assim dizendo, Alex abriu passagem, e Chelsea passou por ele roçando os seios em seu peito. Sua respiração acelerou, e ela ergueu os olhos para fitálo, sorrindo. – Talvez você fosse gostar muito – murmurou ela, enquanto ele a olhava com expressão neutra. – Talvez sim. O coração de Chelsea disparou. Por que estava agindo assim? Alex Diaz era perigoso e o tipo errado de homem. E ela o estava provocando. Mas brincar com fogo provava sua força e esperteza, não? Caso não se importasse em chamuscar os dedos. Então, ainda sorrindo, ela deixou a mão roçar o meio das coxas de Alex, tateando sua excitação, mas ele não se moveu, apesar de tudo. – Não preciso ser salva, Diaz – murmurou, inclinando-se para alcançar seu ouvido, o desejo queimando seu corpo. O brinco fez cócegas no queixo dele, mas mesmo assim Alex não se moveu. – Sem dúvida que não, srta. Maxwell – replicou ele junto à sua boca. Antes de perder o controle, Chelsea se afastou. Podia sentir os olhos dele quando se dirigiu ao elevador. CAPÍTULO 2 ALEX VIU Chelsea ir embora e balançou a cabeça. Ela era incrível, mas não sabia se no bom sentido. Mas talvez soubesse. Pelo menos certa parte de sua anatomia sabia, porque quando deslizara os dedos pelo seu corpo ele lutara para não agarrá-la, encostá-la na parede e beijá-la até perder o fôlego. E mais ainda. O que o igualava a Bates, que ainda se contorcia de dor com o aperto de Chelsea. Ela não era uma vítima. Não era Sarah, usada e abusada pelos homens poderosos. O pensamento lhe deu uma selvagem satisfação porque Chelsea era o tipo de mulher de que precisava. Porém, primeiramente era necessário fazê-la concordar. Estreitou os olhos ao vê-la rumar para o elevador. Indo embora tão cedo? Pensou em segui-la, mas resolveu que não. Lançara a rede esta noite, agora necessitava refletir em como manipular Chelsea Maxwell antes de voltarem a conversar. E também precisava refrear a atração por ela. Não gostava de se sentir fora de controle, em especial a respeito de sexo. Os homens tomavam decisões erradas quando se deixavam guiar pela parte do corpo abaixo da cintura. E Alex não queria isso. Se dormisse com Chelsea teria que ser sob suas condições e para seus propósitos. Mesmo suspeitando que seria maravilhoso. Ela entrou no elevador com a cabeça erguida em desafio. Estava linda como uma rainha do gelo... até que Alex notou a mão crispada agarrando a saia do vestido. O insignificante gesto disfarçado o surpreendeu e denotava alguma coisa. Raiva por causa do bêbedo que a assediara? Chelsea parecera apenas achar levemente engraçado quando Bates se aproximara dela cambaleando. Às suas costas ouviu Bates praguejar: – Vadia – murmurou, e Alex o fitou. – Só diz isso porque ela se vingou. – Digo e repito. – E você mereceu. – Alex fitou o homem quarentão cuja beleza viril ia desaparecendo por causa dos olhos injetados, dos capilares rompidos no rosto... sem mencionar a barriga protuberante... que revelavam uma vida de dissipação. – Sabe que ela é a amante de Agnello, não sabe? – perguntou Bates. Alex deu de ombros. – Mas não é sua amante – retrucou com zombaria, se afastando enquanto Bates continuava a respirar com dificuldade. NA MANHÃ seguinte rumou para seu escritório na Hudson Street, lendo as manchetes dos jornais no seu smartphone enquanto subia até a cobertura. Entrou na sala toda de vidro e aço, ligou o computador e refletiu se telefonava ou não para Chelsea. Precisava ser cauteloso com o próximo passo, mas não negava que ansiava por revê-la e travar um duelo verbal. A conversa com ela o deixara ansioso. Não havia muitas como Chelsea: impiedosa, ambiciosa e sexualmente confiante. Sim, sem dúvida combinariam na cama. E, fosse lá o que acontecesse com Treffen, decidiu que faria sexo com Chelsea. Mas primeiro... Treffen. Voltou a sentir um aperto no estômago, um misto de remorso e determinação. Jason Treffen era glorificado como advogado dos pobres e oprimidos, em especial do sexo feminino. Ganhara uma boa reputação por ajudar mocinhas a cursar as escolas da Ivy League com bolsas de estudos... sem que o público soubesse que, na verdade, as obrigava a cometer os atos mais sórdidos. Sentiu um aperto no peito ao se lembrar do que Austin, filho de Jason e grande amigo seu, descobrira por intermédio da irmã de Sarah, Katy, antes do Natal. Todos aqueles anos após a morte de Sarah haviam presumido que se tratara de um triste, mas comum assédio sexual que ela sofrera. Porém, depois souberam da terrível verdade quando Katy se aproximara de Austin informando que Treffen não apenas assediava suas jovens funcionárias, mas que as colocava na prostituição. Sarah não fora apenas assediada por Jason, mas forçada a se prostituir com seus clientes. A verdade ainda trazia bílis à boca de Alex. Desde aquela noite do décimo aniversário da morte de Sarah, quando Austin atirara aquela bomba enquanto conversavam sobre trabalho e mulheres, haviam descoberto mais sujeira. Jason não só dirigia uma rede de prostituição como também chantageava os clientes, homens poderosos e de posição, para não revelar seu envolvimento com as garotas. Austin revelara a verdade para sua família, afastando o pai da esposa e dos filhos. Junto com Hunter e contando com a ajuda de Katy, começara o processo para expulsar Jason da firma de advocacia. Até o momento Treffen conseguira manter sua imagem pública de homem honesto e benfeitor. Sua separação da esposa fora explicada pela vida estressante e de muita responsabilidade com o trabalho que tinha. A esposa, mãe de Austin, ficara envergonhada demais para admitir a verdade. Hunter agia para fazer Treffen desistir da advocacia, mas até o momento o homem se agarrava com unhas e dentes ao prestígio e à sua reputação de santo. Alex, Austin, Hunter e Katy Michaels não descansariam até que Jason Treffen estivesse completa e publicamente arruinado, até que a verdade fosse revelada e a memória de Sarah fosse vingada. E a maneira perfeita de conseguir isso seria no programa ao vivo de Chelsea, visto por trinta milhões de telespectadores. Entretanto, após conversarem na noite anterior, Alex não se sentia pronto para confiar em Chelsea revelando a verdade. Não tenho interesse em causar escândalos. O que Treffen fizera fora a obraprima dos escândalos! Bastava Alex convencer Chelsea disso... e sobre a necessidade de arruinar o sujeito. Alex pegou o telefone. Ligou para a American Media Industries, o canal de Chelsea, e dentro de segundos falava com sua assistente, que disse que Chelsea estava em reunião e que o chamaria depois. Alex refletiu se de fato ligaria. Definitivamente Chelsea era do tipo que o faria esperar. Endureceu os lábios. Ela podia pensar que controlava, mas iria provar o contrário. Tiraria todo o controle de Chelsea... na cama e fora dela. Impaciente, tamborilou com os dedos sobre o tampo da escrivaninha. Podia estar louco para despir Chelsea Maxwell de sua arrogância... e de outras coisas também... mas no momento era ela quem dava as cartas. Só lhe restava trabalhar e esperar que ligasse. Oito horas depois Alex deixou o escritório e rumou para o centro a fim de se encontrar com o amigo Jaiven Rodriguez para uma cerveja. Ambos se conheciam desde a infância vivida nas vizinhanças do Bronx dominadas por dominicanos. Enquanto Alex escapara com uma bolsa de estudos para a exclusiva escola preparatória Walkerton em Connecticut, Jaiven ficara no Bronx e abrira caminho com o suor do rosto e os punhos. Da primeira vez que Alex voltara de Connecticut, Jaiven lhe dera um soco. Ainda sorria ao lembrar-se da expressão beligerante do amigo, e de seu próprio espanto ao sentir o lábio cortado e um olho roxo. – Se vai se tornar um almofadinha arrogante – dissera Jaiven –, não se dê o trabalho de voltar para cá. Essas palavras doeram em Alex. Estava diferente, apesar de não ter percebido. De camisa polo, rolando os olhos quando Jaiven falara dos velhos amigos, mencionando nomes de gente rica, garotos que frequentavam a escola e que sempre humilhavam o menino meio dominicano com uma bolsa de estudos do Bronx. Alex usava uniformes de segunda mão e ia à escola de ônibus, e não de carro com motorista. E estivera fingindo para Jaiven que esses ricaços eram seus novos amigos. Até agora sentia vergonha de como perdera depressa o bom senso, mesmo que, na época, só tivesse 14 anos. Desejara se encaixar no novo meio, em vez de proclamar quem era de verdade. Nunca mais fizera isso, jamais esquecera suas raízes fingindo que não tivera que trabalhar muito para obter sucesso. Nada lhe viera de bandeja como para os outros em Walkerton e, mais tarde, em Harvard. Fora isso que primeiro o atraíra em Sarah. Ambos cursavam aulas de finanças e possuíam a mesma ambição e esperanças. Eram grandes amigos, mesmo depois que Sarah começara a namorar Hunter, jogador de futebol americano, e fizera amizade com Austin e Zair, colegas de quarto. Alex não tinha tempo para três filhos de ricaços até que Sarah lhe mostrara que eram boas pessoas. Após a faculdade, Zair voltara para seu país no Oriente Médio, e Alex, Austin, Hunter e Sarah se tornaram inseparáveis até a morte dela. Depois que Sarah falecera, Alex se concentrara na tarefa de construir uma rede de notícias comprometida com a honestidade. E vencera. Era conhecido no meio por sua integridade. Quem sabe deveria ser honesto com Chelsea também, e ir direto ao ponto. Hesitou e deixou o pensamento dominá-lo por algum tempo. Não, ainda não. Podia ter baseado sua carreira na honestidade, mas a vingança contra Treffen era outra coisa. Os meios justificariam os fins dessa vez. Entrou no bar do Bronx que era quase uma espelunca, e procurou por Jaiven. O amigo estava em um cubículo nos fundos já tomando sua cerveja. Alex se aproximou e fez seu pedido. – Você está um lixo – comentou Jaiven. – Muito obrigado – resmungou Alex, recebendo a cerveja da garçonete. – Não dormi bem a noite passada. Jaiven arqueou as sobrancelhas. – Por um bom motivo? – Não o que está pensando – respondeu Alex, imaginando Chelsea nua e seu vestido cinza atirado ao chão. Os cabelos soltos e longos. Os lábios entreabertos e inchados... Raios. Estava ficando excitado só em pensar nela. Remexeu-se no assento e se forçou a encarar Jaiven, que riu, percebendo do que se tratava. – Quer dizer que o grande Alex Diaz não teve sorte ontem? Inacreditável. Alex sorriu e balançou a cabeça. – Não tentei. Jaiven se espreguiçou e tomou um gole. – Certo. Onde esteve? Em algum evento da mídia? – Uma festa de aniversário. Jaiven deu de ombros. Embora fosse tão rico quanto Alex, recusava-se a se familiarizar com as pessoas que considerava esnobes, e nunca comparecia a festas ou eventos da alta sociedade. Largara a escola aos 16 anos e dera início ao próprio negócio de navegação, contando apenas com sua força de vontade e uma van velha, mas nos 15 anos seguintes erigira um negócio multimilionário. E jamais deixara o Bronx. Ainda morava lá, é claro que em situação muito melhor, e tinha orgulho de suas origens, de quem era e de quem seria ainda. Sempre dizia a Alex que lhe daria outro soco se começasse a agir como um idiota, e Alex sabia que ele era mesmo capaz de fazer isso. – Mas existe uma mulher, não? – insistiu Jaiven. – Pode ser – murmurou Alex com displicência. – Está bancando a difícil? – Não exatamente. Jaiven tornou a rir. – Seja quem for, deixou você de quatro, meu amigo. Está precisando fazer sexo. – Pode ser – admitiu Alex com um sorriso sem alegria. Ele e Jaiven tinham a mesma teoria sobre sexo e amor: encontros de uma só noite ou romances de uma semana de vez em quando, e nada mais. Era honesto sobre isso como sobre tudo o mais. Garantia que a moça entendesse as regras antes de tirar seu sutiã. Porém, duvidava que Chelsea Maxwell estivesse atrás de um relacionamento. Tinha certeza de que encarava o sexo do mesmo jeito que ele. Algo mutuamente agradável por uma noite e nada mais. Sentiu uma onda de antecipação. Seria demais. CHELSEA OLHOU para o pedacinho de papel cor-de-rosa com o recado e o nome de Alex Diaz, e refletiu de novo sobre o que ele quereria. Alex ligara duas horas atrás, e ela não largaria tudo para responder. Não. Que ele esperasse. Que imaginasse se ela iria responder ou não. Guardou o recado na bolsa – ninguém precisava saber que Alex Diaz a chamara – e pegou o laptop. – Chelsea? Tem um minuto? Ergueu o rosto para Michael Agnello, que entrara no seu escritório. – Claro. – Fechou o laptop, empurrou a cadeira para longe da escrivaninha e cruzou as pernas. – Ia só responder alguns e-mails. – Quero falar sobre a entrevista com Treffen. – Muito bem. Parecia que todo mundo queria falar sobre isso, pensou ela. Coincidência? Não. Provavelmente todos, até Michael, estavam surpresos por ver que ela conseguira uma entrevista no horário nobre com alguém tão importante. Todos menos ela. Lutara para isso, vencera, e esperava que essa entrevista impulsionasse sua carreira. – Sim? – perguntou, enquanto Michael se sentava na sua frente. – Treffen e seu advogado querem encontrá-la antes para saber exatamente como a entrevista será. Chelsea franziu a testa, embora não estivesse muito surpresa. – Parece contraproducente. Pretendia que nossa conversa fluísse naturalmente na entrevista – respondeu. – Treffen quer mais controle. – Por quê? Michael deu de ombros. – E por que não? O homem tem uma reputação a zelar, Chelsea, e não vai se debulhar em lágrimas no seu sofá de veludo cor-de-rosa. Chelsea ficou aborrecida, embora soubesse que Michael tinha razão. – Sabe que essa entrevista não será assim. – Sei, e por isso deve se encontrar com Treffen. Faz sentido – explicou Michael. – Talvez. Na última semana Chelsea gravara dois programas, um com uma campeã olímpica que tivera que devolver a medalha de bronze depois de um escândalo sobre doping; o outro com uma cantora country que tentava reerguer a carreira após vários fracassos e um público que lhe dava as costas. Chelsea fizera as duas chorar. Contudo, sua entrevista com Treffen seria diferente. Nada de segredos sórdidos nem choros convulsivos. Apenas jornalismo honesto e respeitável. Afinal, Treffen não era uma celebridade decadente tentando reaparecer. Sei o que ele fez. De súbito se lembrou do olhar sombrio de Alex Diaz quando falara de Treffen. Fosse lá o que houvesse dito ou deixado de dizer, ele não gostava de Treffen. E Chelsea percebeu que desejava saber o motivo. Precisava, principalmente agora que Treffen pretendia controlar a entrevista. – Ficarei contente em encontrá-lo – disse a Michael. – Mas é melhor que não espere ditar todas as condições. – Pode ser que sim – alertou Michael. – E se deseja essa entrevista com Treffen deve ceder. Chelsea apertou os lábios em silêncio, aceitando de má vontade. Nada devia atrapalhar essa oportunidade com Treffen, que impulsionaria sua carreira, fazendo-a se erguer acima dos boatos que nunca se importara em negar. Nada a atrapalharia... nem mesmo o próprio Treffen. CAPÍTULO 3 MUITAS mais tarde ela continuava matutando sobre a entrevista que teria com Treffen na semana seguinte, quando sua assistente avisou: – Alex Diaz está na linha. Chelsea ficou satisfeita. Então ele telefonara. Duas vezes. Sorrindo com antecipação, atendeu: – Alex? – Alô, Chelsea. Estremeceu ao ouvir a voz profunda que mexia com suas entranhas e sua HORAS alma. Não era justo ser tão afetada por uma voz. Principalmente, era estúpido, e Chelsea nunca agia estupidamente com os homens. Não mais. Ignorou a emoção. Seria profissional. Esperta. Ficaria do lado seguro. – O que posso fazer por você? – perguntou com brusquidão. – Interessante perguntar – retrucou ele, e sua voz arrancou mais um pedaço da alma de Chelsea. – Por que é interessante? – Porque o que pode fazer é sair comigo para jantar. Parecia um convite para um encontro. Talvez fosse. O coração dela acelerou. – E por que sairia com você? – Dessa vez ela falou em um tom meio agressivo e meio provocante. – Porque desejo conhecê-la melhor. Impossível decifrar essa frase. Conhecer? Particularmente? Profissionalmente? Chelsea não fazia ideia, e tinha certeza de que a intenção de Alex era deixá-la curiosa. – Não sei se o desejo é mutuo – murmurou ela. Alex riu de leve, um som estranhamente íntimo ao telefone. – Tem certeza, Chelsea? O som de seu nome nos lábios dele a deixou absurdamente exposta, em especial porque nem era seu nome de verdade. – Jamais disse que desejava conhecêlo – respondeu com descaso. – Mas, se está oferecendo outra coisa... – Interrompeu-se imaginando como ele responderia à indireta. E ela também. – O que gostaria que oferecesse? – perguntou Alex sem hesitação, sempre com a voz sexy. – Ainda não me decidi. – Então vamos discutir sobre isso no jantar. Ela hesitou e a mão escorregou do telefone. Era apenas um jantar, disse a si mesma. Com um homem muito sexy. E algo em Alex Diaz e sua determinação... b e m, assustar não era exatamente a palavra ideal, mas a ideia era mais ou menos essa. Percebia que era um homem que teria controle absoluto. E ela precisava ficar no controle, insistindo nisso com todos os homens, fosse lá com o técnico da máquina de lavar roupa ou com quem ia para a cama. Era Chelsea quem ditava as regras. Sempre. Porém, algo lhe dizia que Alex Diaz não jogaria segundo suas regras. Entretanto, Chelsea não recuava diante dos desafios. – Está bem – disse por fim. – Tenho sempre uma mesa disponível no Le Bernardin... – Ótimo, mas será do meu jeito – interrompeu ele. – Até amanhã. E desligou, para irritação de Chelsea, que fitou o aparelho alguns segundos e depois o desligou também. Praguejou em voz alta. Ele desligara primeiro porque sabia o que ela pretendia fazer... e não permitiria. Mas a irritação se transformou em diversão e até admiração. Quem sabe, afinal, tivesse encontrado um concorrente a sua altura. Vinte minutos depois recebeu uma mensagem de texto: Seu apartamento. 19h. Refletiu como Alex conseguira o número de seu celular, porém percebeu que obteria a informação que quisesse, pois era dono da rede de notícias mais respeitada do país. Controlou os nervos. Tinha muitos segredos para deixar um homem como ele curioso. Presumiu com relutância que seria melhor cortar o mal pela raiz. Recusar o jantar e se despedir de qualquer possibilidade na sua rede de televisão, e, definitivamente, nada de sexo. Que tipo de amante seria Alex Diaz? Será que continuaria sendo arrogante e seguro de si? Imaginou as mãos potentes em seu corpo, a boca flexível na sua pele. Seria dominador no quarto, mas faria isso tão bem que a mulher em questão não se importaria. O desejo a dominou. O que, diabos, estava pensando? Excitada por causa de Alex Diaz? Era controlador e talvez se tornasse seu patrão. Votou contra ele. Mas não negava que o desejava do jeito que era: no comando. Dominador. Meu Deus. Chelsea balançou a cabeça e sentiu nojo de si mesma. Não aprendera nada em dez anos? Três anos de humilhações e sofrimento, sem mencionar um tratamento psiquiátrico intensivo, não valiam de nada? Poderia analisar a possibilidade de trabalhar com Alex Diaz, mas definitivamente não dormiria com ele. Ou vice-versa. Aborrecida com os próprios pensamentos desencontrados, abriu o laptop e voltou a trabalhar. Na noite seguinte estava em frente ao enorme espelho de seu quarto analisando seu reflexo. Penteara os cabelos em um coque apertado e severo, e usava brincos discretos de pérolas. A maquiagem era leve, apenas rímel e brilho labial. E o vestido era muito modesto, embora acentuando seus pontos mais fortes. De cashmere creme com um cinto dourado, iria cobri-la do pescoço aos joelhos. Era levemente sexy, mas mesmo assim profissional, e era desse modo que precisava ser nessa noite... porque ainda não sabia o que Alex Diaz queria com ela ou o que ela queria de Alex. Nas 24 horas após o telefonema pensara em desmarcar o jantar. Por mais tentadora que fosse a possibilidade de trabalhar para o Diaz News e de ter um programa de notícias respeitável, sabia que Alex nada prometera e seria muito mais seguro, muito mais são se manter afastada de um homem que já a afetava tanto. Mas fugir seria fraqueza, e Chelsea não era fraca. Jantaria com Alex, descobriria se desejava contratá-la para sua rede ou, como tantos outros, tentava apenas seduzi-la. E se assim fosse? Bem, talvez aceitasse. A ideia a deixou alarmada e excitada ao mesmo tempo, e era perigosa. Alex Diaz era tão diferente dos homens que levava para a cama. E isso o tornava excitante, um desafio, se pudesse controlá-lo, deixá-lo fraco de desejo... O interfone tocou, e Chelsea avisou ao porteiro que encontraria Alex no saguão. Ele não subiria a menos que ela o convidasse. Essa noite, como todas na sua vida, seria conforme suas normas... fosse lá o que ele pretendesse e pensasse. Alex examinava uma escultura moderna no saguão quando Chelsea saiu do elevador. Usando um terno cinzachumbo, e exibindo uma leve penugem no queixo, ele estava lindo. Maldito homem. – O que acha que é isto? – perguntou, apontando para a monstruosa escultura de ferro e cobre retorcido que ela nunca se dera o trabalho de observar. – Não sei. Uma árvore? – Ela sorriu. – Que árvore esquisita! – Não é fã de arte moderna? – Ela sorriu repentinamente. – Não deste tipo. – Alex desviou os olhos da escultura e olhou para Chelsea. – Mas sou fã da arte do subentendido. – Passeou o olhar pelo vestido de cashmere. – Definitivamente. O corpo de Chelsea logo respondeu à provocação. Sorriu com calma. – Então, aonde vamos se não para o Le Bernardin? – Le Cirque – respondeu ele, pousando a mão em suas costas e guiando-a para fora do prédio. Chelsea entrou na limusine. Alex voltou a esticar o braço sobre o assento, tocando de leve os ombros dela. Parecia muito tranquilo e sem perceber o que fazia, mas Chelsea sabia muito bem que o leve toque fora intencional. E o efeito era o que ele queria, pois estava inquieta, insegura e constrangida. Não era assim que desejara começar a noite. – Le Cirque? – repetiu. – Muito previsível. – Está desapontada? Da próxima vez tentarei com mais empenho surpreendêla. – Fitou-a com expressão misteriosa sob a pouca luz do veículo. – Não me parece do tipo que tenta com empenho certas coisas – retrucou Chelsea. – Creio que espera que as mulheres caiam aos seus pés. Ele arqueou as sobrancelhas de modo divertido. – Não têm grande utilidade aos meus pés. – Oh? – Ela o fitou, percebendo o brilho em seu olhar. – E onde elas são mais úteis, Alex? – Em vários lugares. E posições. Chelsea arqueou as sobrancelhas. – Curioso. Pode ser mais específico? Ele sorriu. – Agora não. – Mais tarde talvez? – Talvez. Ela sorriu contrafeita. Sempre que tentava virar a mesa ele fazia isso primeiro deixando-a desesperada de desejo e vontade de se sobressair. Mas lembrou que já não era assim. A não ser com esse homem. – Não é educado encarar as pessoas – comentou ele, e Chelsea percebeu que estivera fitando-o sem parar. Raios. Deixara de falar, pensar, porque só via as longas pernas de Alex estiradas, o queixo firme com o início de barba, além dos cílios longos e da boca máscula e sexy. Como era possível? Devagar ergueu os olhos para ele. – Estava apenas checando o que oferece – respondeu com malícia. – Até agora não disse o que estava oferecendo, Chelsea. – Então pode ser mais claro? Ele não respondeu, apenas aguardou com os olhos brilhando e a tensão aumentando entre os dois. Chelsea percebeu que se esquecera de respirar e prendia o fôlego. – Creio que não vai explicar – disse ela por fim, e fingiu balançar a cabeça com desânimo. Alex apenas riu. Nada o abalava. Nada o chocava. Nada o fazia perder o controle, e Chelsea se enfureceu porque já perdera o seu. Ele estava no comando desde que surgira dentro da limusine, e ela não conseguia arrancar a direção de suas mãos. – Então vamos falar de negócios. – Chelsea cruzou as pernas de novo e falou com frieza: – Você me quer para o Diaz News? – Não – respondeu ele sem titubear. Chelsea piscou diversas vezes. Manteve uma expressão neutra com muito esforço, e, após alguns segundos tentando descobrir o que dizer, apertou os lábios e disse com severidade: – Então só está querendo brincar comigo. – Não, apesar de ser um comentário interessante. – Muito engraçado. – Chelsea cruzou os braços sobre o peito. Queria atacar, mas estava na defensiva. Ele não a desejava para sua estúpida rede de notícias. Não a surpreendia com isso. Não devia se sentir magoada. – Por que me convidou para jantar, Alex? Está apenas querendo me levar para a cama? – Caso esse fosse meu único objetivo, haveria meios mais simples de conseguir – respondeu ele com serenidade. Aborrecida, ela retrucou: – Sem dúvida. Basta cruzar a FortySecond Street para encontrar mulheres... – Não seja infantil, Chelsea. – Não banque o meu pai, Alex... – Só estou dizendo a verdade. Não me interesso em tê-la na minha rede, mas estou focado em sua entrevista no horário nobre. – Treffen. – Ela quase cuspiu a palavra. – Sim. Chelsea estava zangada e vulnerável, querendo agredir, porém sabia que isso a deixaria ainda mais exposta. Respirou fundo e tentou se acalmar. – Não gosta dele – afirmou. – Não – concordou Alex. – Por quê? – Chegaremos a isso. – No tempo certo? – zombou ela. – Não gosto de ser usada, Diaz, ou manipulada. – Momentos atrás me chamou de Alex. E quem planeja manipulá-la é Treffen. Ela pensou na reunião que teria com Treffen e seu advogado na semana seguinte. Talvez Alex tivesse certa razão, porém não queria ser sua ferramenta. – Não permitirei que sabote minha entrevista. – Não é essa minha intenção, Chelsea. Ela não acreditou, fitando seus olhos escuros. Tinha certeza de que Alex sabotaria sua entrevista ou até sua carreira para conseguir o que queria. E mesmo assim, nesse momento em especial, sentia o corpo vibrar por ele. Por mais que Alex Diaz fosse duro e impiedoso. Talvez por isso mesmo o desejasse. Talvez porque a ideia de vê-lo vibrar por ela e desejá-la fizesse seu sangue ferver. Queria vê-lo se curvar para ela. Ficar de quatro por ela. – Chegamos – anunciou ele, retirando o braço do encosto, segurando seu ombro por cima do paletó e do vestido, e descendo os dedos até quase alcançar a lateral de um seio. Fitaram-se e Chelsea se sentiu aprisionada pelos olhos castanhodourados. Mal conseguia respirar. Saiu da limusine e de seu contato, imaginando como conseguiria chegar ao fim desse jantar. ALEX A fitou de costas, os quadris meneando discretamente enquanto ela entrava na frente no restaurante. Cada palavra que trocavam era repleta de duplo sentido. Mas já a dominara, tinha certeza. Chelsea era curiosa, ambiciosa e ansiosa. Faria o que ele dissesse, e o sexo seria um modo doce de selar o acordo. Já vira o desejo nos olhos dela, apesar de Chelsea negar. Faria com que admitisse. Faria que se ajoelhasse, soluçando seu nome, implorando pelo seu toque. Esse pensamento o fez sorrir e ficar muito excitado. Controlando-se, seguiu-a para dentro do restaurante. – Fale-me ao seu respeito – pediu, assim que se sentaram com os cardápios abertos e os guardanapos sobre os joelhos. – Nada sei sobre você exceto as informações genéricas de sua biografia. Ela estreitou os olhos em dúvida, e Alex percebeu que se lembrava de alguma coisa. Por fim, deu de ombros e tomou um gole de água para depois responder: – Não há muito mais além do que diz meu histórico. Praticamente vivo para minha carreira. – Como eu, mas não significa que possa comprimir minha personalidade em uma simples folha de papel. O que gosta de fazer nas horas livres? Ela ficou surpresa como se ninguém jamais tivesse lhe perguntado isso. – Hobbies? – sugeriu, recostando-se na cadeira. – Faço ginástica. Muita. – Já imaginava. Você é obcecada por controle. – Somos iguais – ironizou Chelsea. – Sem dúvida. Era uma guerra de vontades. Seria tão bom levá-la para a cama, refletiu Alex. E depois deixá-la ali. – Antecipo um problema – comentou Chelsea, fitando o cardápio e baixando os longos cílios cor de chocolate. – Qual? – Alex também se recostou. – Nós dois não podemos ficar no controle. – Definitivamente não. – Alex sabia o que ambos estavam pensando. E teve certeza de como terminaria a noite. O ar entre os dois estava repleto de estática e tensão. Alex respirou fundo, a fim de diminuir a tensão, e disse: – Não acredito que não tenha um hobby de verdade. Todos têm um. – E qual é o seu? – revidou ela. – Mergulho submarino. – Não é algo para fazer todos os dias. – Não. Só nas férias. – E o que faz para relaxar diariamente? Ele gargalhou. – Além do óbvio? Ela sorriu. – Não me refiro às necessidades básicas. – Também não – acrescentou Alex, e Chelsea sorriu ainda mais. Alex prestou atenção. Tinha uma boca linda, polpuda e sexy. – Isso conta como ginástica? – perguntou ela. – Como necessidade básica. Ela gargalhou de leve. – Então você deve ser muito sarado. – Terá que descobrir. – Alex riu também. – Isso é uma promessa? – Sim. Chelsea riu mais, exibindo uma covinha na face. – E isso o relaxa? Por um segundo ele pensou que estava se referindo a sexo, porém logo se lembrou do que estavam discutindo ou, pelo menos, fingindo discutir. Natação. – Aprendi a me deixar relaxar. – Como assim? – Só aprendi a nadar quando estava no segundo grau. – Alex podia sentir o cheiro de cloro na piscina da Walkerton. O empurrão grosseiro em suas costas. – Alex. Ergueu os olhos, distraído, e viu Chelsea, que o provocava com seu sorriso. – Seja lá no que esteja pensando, não deve ser agradável. – Talvez, mas o desagradável me ajudou a aprender a nadar. – Viu que ela franzia a testa e aguardava. – Recebi uma bolsa de estudos para a Walkerton. Sabia disso? – O internato em Connecticut? Quem não quer estudar lá? Parece que todos os ricaços desejam matricular os filhos lá. – Sim, mas fui uma exceção. Era um garoto pobre do Bronx meio dominicano. – Disso eu não sabia – murmurou Chelsea com ar pensativo, inclinando a cabeça para um lado. – Qual parte, a de ser dominicano ou do Bronx? Ela tornou a sorrir com seus lábios maravilhosos. – Ambos. Mas estava me contando como aprendeu a nadar. – Natação era obrigatória em Walkerton. No primeiro dia um dos garotos da minha classe me atirou na parte funda da piscina quando o treinador se ausentou. – Alex ainda podia sentir o pavor da água se fechando sobre sua cabeça, enchendo sua boca e narinas, enquanto uma dúzia de garotos observava friamente. – Ele tinha conhecimento de que você não sabia nadar? – Oh, sim. – Alex fora ingênuo o suficiente para revelar isso antes de ser empurrado. E acabara de contar esse episódio para Chelsea Maxwell. Não falava dos anos em Walkerton para ninguém. Não gostava de lembrar o garoto solitário que fora, louco para ser aceito e ter importância. Teria vendido sua alma para isso naquele tempo. Graças a Deus Jaiven o salvara com o soco no nariz. Graças a Deus aprendera a ser mais duro, resistente para esnobar aqueles garotos mimados. – Por sorte o treinador voltou antes que eu me afogasse. Creio que aqueles meninos deixariam eu me afogar. – Que horror. – Chelsea se calou por um momento com expressão séria. – Mas acredito – acrescentou em tom compreensivo e experiente. Alex quase a questionou se também sofrera bullying, mas mudou de ideia. Se já achava que sexo complicaria a situação, uma afinidade emocional estragaria com tudo. Não arriscaria. Jamais. – Bem, como já disse, aquilo me motivou. Aprendi a nadar e acabei na equipe de natação da universidade. Cheguei a capitão no último ano, enfurecendo os sujeitos que tentaram me afogar. Doce vingança. – Sem dúvida. – Também na universidade aprendi a mergulhar, e hoje passo muito tempo na água. – E gosta? – quis saber Chelsea. Ninguém nunca perguntara isso a Alex. – Acha que mergulharia se não gostasse? Ela estreitou os olhos com sagacidade, fazendo-o rir. – Acho que você gosta de controlar. É maníaco por controle, não? Ele ergueu as mãos fingindo derrota e riu de novo, embora se sentisse um pouco exposto. – Bem, tem razão, srta. Maxwell. Ainda tenho medo da água. Mas nado e mergulho. Ela aquiesceu com um gesto de cabeça lento. – Posso entender isso. Seu tom era sério, e Alex se perguntou por quê. Queria saber do que Chelsea não gostava. Sabia que estava louca para provar seu valor profissional, mas será que de fato odiava sentar no sofá cor-de-rosa com aqueles astros e estrelas ultrapassados? Não iria perguntar. Na verdade, não queria conhecer essa mulher. Apenas usá-la. Em mais de uma maneira. – Vamos pedir? – sugeriu, e ela voltou a concordar. Depois que o garçom veio e se foi de novo, Alex tentou retomar a conversa para um terreno seguro. Mantê-la inocente pelo momento. – Você é do Alabama, certo? – perguntou, para vê-la ficar tensa imediatamente com expressão sombria. Interessante. Estranho, mas interessante. Chelsea tomou um gole de água e repôs o copo sobre a mesa bem devagar. – Sim – respondeu como se estivesse fornecendo informação demais. – Perdeu o sotaque. – Sim – repetiu ela com voz neutra. – Por que tenho a sensação de que não gosta de falar sobre seu passado? – Ele se reclinou na cadeira. – Não é interessante. – E se eu estiver interessado? – Duvido. Mas pode ler minha biografia na internet. – Já li. – Alex lera sua entrevista com perguntas e respostas. Também começara como jornalista, e lutara como ela. Segundo a biografia de Chelsea, ela tivera uma infância idílica no Alabama com bolinhos caseiros e feiras de animais. Depois fora trabalhar na AMI aos 22 anos. Havia a costumeira lista de premiações recebidas, e de entidades que ela ajudava, e ponto final. Muito vago, e Chelsea parecia gostar assim. – Então já sabe tudo de que precisa saber – murmurou, dando de ombros e erguendo os seios redondos por baixo do vestido creme. Alex queria tirar aquele vestido dela com urgência. – O que é igual a nada – retrucou ele. Estava curioso. Quem era essa mulher? Melhor não imaginar. Não saber. A entrada foi servida e passaram a falar das fofocas do setor televisivo até o final do jantar, o que agradou a Alex. Estava em um bom restaurante com uma bela moça, e pretendia aproveitar um pouco. Para depois aproveitar muito mais. CHELSEA REFLETIA . O que havia com esse homem que a fazia falar tanto? Sentir tanto? Já contara mais para Alex do que para qualquer outra pessoa, exceto Michael e sua irmã Louise. E mal o conhecia. Muito bem, não contara muita coisa, mas se sentia exposta. Agora ele poderia pesquisar sua vida, dados do Alabama, e descobriria mais. Muita coisa. Sentiu uma garra de gelo percorrer sua espinha dorsal e jurou não contar mais nada. Ficaria no campo profissional ou do flerte, porém não se abriria mais. Raios, não deixava os homens se aproximarem. Não fazia confidências. Usava-os para os negócios ou para o sexo e apenas isso. Era assim que precisava ser. Pretendia usar Alex também. Quem sabe nos negócios e no sexo. Após a conversa cheia de duplo sentido sabia que ele a desejava, e ela também o queria. Isso, pelo menos, poderia ser facilmente resolvido. Quanto aos negócios? Ele não tocara no nome de Treffen durante o jantar, e Chelsea agradecera. Não estava pronta para essa conversa. E não entraria em conversas íntimas nem emocionais. Exceto que já sentira pena do garoto que ele fora e que quase se afogara. Entendia isso. As pessoas adoravam ver alguém fracassar. E sorrir enquanto alguém era humilhado, rir ao vê-lo se magoar. Não, precisava parar com essa linha de pensamento, porque senão abriria mais sua alma para ele. O sexo a curaria, pensou. Sexo simplificava tudo, uma função física, uma troca primitiva, e quando acabava ela sempre passava para o próximo parceiro. Nunca dormira com o mesmo homem duas vezes nos últimos dez anos. O sexo faria com que esquecesse Alex Diaz em seguida. Assim pensando, empurrou a xícara de café para o lado e mal tocou na sobremesa. Escolhera sorvete de frutas, o item menos calórico do cardápio. A televisão não perdoava quilinhos a mais. Arqueou as sobrancelhas e perguntou com simplicidade e sem malícia: – Podemos ir? Alex a fitou com seus olhos dourados e retirou do bolso um cartão de crédito que ela reconheceu como dos mais exclusivos. – Sim. Vamos. Deixaram o restaurante com a mão de Alex em suas costas. Ele já avisara ao motorista que estavam saindo, e a limusine esperava. Ocuparam os assentos de couro, as coxas se tocando levemente, e Chelsea lutou para não tocá-lo, não sentir a rigidez dos músculos... Sua mão quase o tocou, e ela a baixou depressa. A pele de Alex seria macia ou rija? Quente ou fria? Os dedos de Chelsea comichavam. Tarde demais percebeu que rumavam para o centro da cidade. – Aonde vamos? – Meu apartamento – anunciou ele. – O quê? – exclamou ela. – Belas maneiras! Não me lembro de me ter convidado, Alex. – Não convidei. Encararam-se. Alex estava tranquilo, parecendo quase entediado. Ela sentia uma gama de emoções: fascinação, frustração e um pouco de medo. E estava excitada de uma forma como já não sentia há muito tempo. Isso mostrava como estava fragilizada. Cruzou os braços sobre o peito. – Acha atraente a tática de homem das cavernas? – Não, apenas prefiro ir direto ao ponto. Sabia que dormiríamos juntos quando concordou em jantar comigo. – Muito precipitado da sua parte, não acha? – A voz dela, por sorte, soou calma. – Estamos atraídos um pelo outro, ambos vemos o sexo como... o que você disse? Uma necessidade básica? – E daí? – Daí que, é claro, dormiremos juntos. – Alex deu de ombros como se fosse um assunto sem importância. – Uma conclusão lógica. – Como é romântico. – A voz de Chelsea soou em falsete. – Violinos e rosas! – Pensei que gostaria de minha honestidade. Normalmente sim, porque era desse modo que Chelsea lidava com o sexo. Só não gostara da decisão dele. Era ela quem dizia aos homens o que iria acontecer, e que os expulsava de casa logo depois. Jamais ia ao apartamento deles. Jamais permitia que ditassem as regras. Estava sempre no controle e por cima. Literalmente. E em geral nem mesmo tirava toda a roupa. Pelo menos não a camisete. Viu que já estavam em Tribeca perto do rio Hudson. E, mesmo que estivesse surpresa com sua arrogância, não iria ao apartamento dele. Não era tão tola. – Desculpe, Diaz, mas estas são minhas regras. Não vou para a sua casa. A expressão dele não mudou. – Certo. Quem disse precisamos de uma cama? Chelsea estremeceu. Só porque ele era tão sexy estava ignorando sua arrogância? Não, era a confiança de Alex que a tirava do sério, e, levando em conta sua própria experiência passada, isso a tornava um bichinho indefeso. Entretanto, continuou imóvel. Calada. Ele também. O motorista aguardava no banco da frente separado por um vidro fosco antirruído. Mas Chelsea tinha certeza de que sabia o que os dois pretendiam no banco de trás. Quem sabe já estivera antes com Alex na mesma situação, esperando que ele terminasse seus... assuntos. Sentiu as palmas das mãos suadas e resistiu ao desejo de enxugá-las no vestido. A voz de Alex sou firme: – Venha cá, Chelsea. Obviamente ela não devia se mover. Não devia obedecer a um comando tão absurdo. Claro que não. Na verdade, devia lhe dizer o que fazer com sua ridícula arrogância. Engolir... Entretanto, se moveu como se seu corpo tivesse vontade própria, e deslizou no assento sem afastar os olhos dele, o tecido da roupa fazendo um ruído leve. Respirava depressa, e no silêncio do carro era um barulho ensurdecedor, revelador, mas nada podia fazer. Alex a segurou pelos quadris, e com um movimento ágil a colocou no colo, entreabrindo suas pernas. O vestido subiu até os quadris, e ela apoiou os pés no assento. Chelsea fechou os olhos. Podia sentir o órgão intumescido de Alex mesmo sem ele se mover, e esse contato já era enlouquecedor. A respiração dele estava apressada também. Chelsea se inclinou para a frente com urgência. Abriu os olhos. Alex a fitava, o rosto ainda estranhamente inexpressivo. De novo ela pressionou o corpo contra sua ereção, e ele apertou as mãos em seus quadris. Com uma lentidão deliberada, passou os dedos pela sua coxa sob o vestido, e depois dentro da calcinha sem mudar de expressão. Ela prendeu a respiração e o coração pareceu parar. Sentia a umidade entre as pernas. Alex começou a mover os quadris e ela o acompanhou no mesmo ritmo. Chelsea sentiu que iria gemer de prazer. Queria mais. Mais carícias e beijos, mais pele contra pele. A outra mão de Alex a segurou pela nuca, os dedos entremeados nos cabelos. Chelsea sentiu que o coque apertado se desfazia enquanto ele a via baixar o rosto. – Beije-me – ordenou de novo, mas Chelsea percebeu o tom de desespero e desejo em sua voz. Sem questionar, ela obedeceu. Suas bocas se uniram e logo Alex tomou o controle como sempre, deslizando a língua entre seus lábios enquanto seus corpos se uniam. Quase. Chelsea arqueou as costas querendo e precisando mais. A mão dele a segurava por trás, e de repente seu pé escorregou e ela se viu tombando de lado, batendo com a cabeça no vidro da janela. Teria sido engraçada essa visão – tanta intensidade sensual se transformando em um gesto desengonçado –, se ela fosse uma outra mulher, com um passado diverso. Se assim fosse, se Chelsea vivesse em um mundo diferente com outro tipo de vida, tudo teria terminado em gargalhadas. Alex perguntaria se estava bem, e depois a faria se sentar de novo no seu colo. Quem sabe até lhe daria um beijinho onde batera com a cabeça. Mas ela era Chelsea, com suas lembranças, experiências, ansiedades e medo. Piscou diversas vezes, se encolhendo como se a colisão a tivesse feito desmaiar. Sua cabeça não doía, mas o coração sim. Agora seu corpo ardia não de desejo, porém de vergonha. O que andara pensando? Percebeu que Alex não a ajudava a se aprumar. Apenas a fitava, encurvada sobre o assento, a cabeça presa de modo ridículo de encontro ao vidro, o vestido ainda erguido até os quadris. Lágrimas de humilhação e raiva encheram seus olhos e ela as engoliu. Depois ajeitou o vestido. – Movimento cheio de elegância – brincou, feliz por ver que sua voz não tremia. Pegou a bolsa. Alex nada disse. Mal a olhava. A mágoa que Chelsea sentiu foi tão aguda que quase soluçou. Lutou com a maçaneta da porta, os dedos trêmulos. Alex segurou sua mão. – Deixe-me levá-la para casa – disse com suavidade. – Estamos parados no meio do nada. – Estamos em Manhattan – corrigiu ela com aspereza. Sabia que a raiva era sua melhor defesa. – Então estamos no meio do nada em Manhattan – acrescentou ele com calma. A mão permanecia segurando a dela, e Chelsea sentiu uma estranha serenidade. Mas afastou a sensação, e se sentou no assento em frente. – Ótimo – disse com frieza como se estivesse entediada com a companhia dele, já que Alex devia estar entediado de verdade com ela. Chelsea fitou a rua pela janela enquanto ele mandava o motorista prosseguir. CAPÍTULO 4 ALEX ENCAROUa escuridão dentro da limusine e refletiu sobre o que acabara de acontecer. Segundos atrás Chelsea estivera no seu colo, as mãos dele em seus cabelos, as bocas unidas, e a seguir... Ela se esparramara no assento com um olhar de horror e mágoa. Até agora, no silêncio da limusine que percorria o centro, ainda podia ouvir o rumor seco da cabeça de Chelsea batendo contra o vidro da janela. Um acidente estúpido, sem dúvida na hora errada, mas nada de catastrófico. Entretanto, ela o fitara de um modo que o fizera se sentir... sórdido. Não, pior que isso. Ela o fitara como se sua queda no assento fosse culpa dele. Como se a tivesse empurrado, usado e abusado da maneira como Treffen fizera com inúmeras mulheres, inclusive Sarah. Alex passou as mãos sobre o rosto cansado. Por certo estava exagerando. Franziu a testa. Raios, Chelsea ficara constrangida. Chelsea Maxwell não era do tipo que cometia gafes, então cair e ser desajeitada devia tê-la aborrecido muito. E sem dúvida acabara com o clima. Momentos atrás Alex estivera a ponto de perder o controle. Começara bem, deixando claro para Chelsea que estavam fazendo o jogo dele. E então a sentira no seu colo, o corpo encostado ao seu, a boca polpuda e macia, e sua mente ficara vazia. De quase tudo. Mais. Ainda bem que terminara assim, Alex decidiu. Naturalmente desejara Chelsea na cama. Ou na limusine. Porém, acima de tudo, desejava se vingar de Treffen. E a julgar por aquele olhar... e talvez estivesse exagerando... sexo com Chelsea seria mais complicado do que imaginara. Não, definitivamente fora melhor assim. Uma pena que sua libido não concordasse. A limusine se deteve em frente ao prédio de Chelsea, e Alex percebeu que não falavam havia 15 minutos. Chelsea alcançou a maçaneta e abriu a porta. Virou-se para ele com os lábios ainda inchados pelos beijos e os cabelos caídos nos ombros. Seu sorriso era zombeteiro ao fazer alusão ao incidente: – E você disse que não gostava das mulheres caindo aos seus pés. Balançou a cabeça e, sem dizer mais nada, desceu do carro. Ele a viu caminhar para o prédio com o porteiro alerta, o paletó dançando em volta de sua silhueta alta e delgada. Então se recostou no assento sentindo um enorme cansaço. – Para onde vamos agora, senhor? – perguntou Eric, o motorista, enquanto Alex fechava os olhos. – De volta ao centro – respondeu ele com um suspiro. O CORAÇÃO de Chelsea batia forte e seu corpo doía de desejo insatisfeito, mas sua mente estava fria e clara enquanto se afastava da limusine. Fora por pouco. Quase fora incrivelmente idiota... de novo. Quase dormira com um homem que desejava controlá-la. Que chegara a controlar. E ela permitira. Graças a Deus que perdera o equilíbrio, por mais que isso também tivesse sido idiota, e batera com a cabeça. Servira para acordá-la. Talvez não fosse forte o suficiente para enfrentar um homem como Alex Diaz. Era bom perceber que, quando alguém como ele, carismático, poderoso e arrogante, fazia um sinal com o dedo, ela era capaz de vir correndo. Ou se arrastando. Lembrou-se de como deslizara no assento e ele a pegara no colo. Poderia ter pedido o que quisesse que ela, cega de desejo, teria concordado. Quase fizera isso. Chelsea se lembrou de todas as coisas ruins, sentindo um gosto amargo na boca. Nunca mais. NA MANHÃ seguinte ela já tinha um plano. Era isso que fazia sempre que a vida saía de controle como na sua infância. Ficarei quietinha. Dormirei debaixo da cama. Fingirei ser invisível, e ninguém me verá. Infelizmente, nenhum desses planos dera certo, mas o atual daria. Iria ignorar totalmente Alex Diaz. Não o veria de novo, não atenderia suas ligações, não procuraria saber o que ele tinha contra Treffen. Raios, era uma jornalista. Descobriria por conta própria. Desse momento em diante, Alex Diaz pararia de existir na sua vida real. Não era uma boa demonstração de força? Exceto que esse plano também não estava dando certo, porque durante a filmagem de dois programas, várias reuniões corporativas e uma com sua equipe para obter novas ideias, sem contar as horas no salão de beleza para permanecer bonita, continuava pensando em Alex. No brilho de seus olhos. Na boca que podia ser dura ou suave. No toque de suas mãos, fortes e firmes, na sua nuca. Venha cá, Chelsea. Beije-me. E ela obedecera. Oh, como obedecera. Ainda o desejava. E, mais do que isso, desejava consertar a vergonha que passara diante de si mesma... e dele. Queria que Alex rastejasse aos seus pés. Como se isso fosse acontecer. Mas se pudesse... Então, quem sabe, daria atenção a ele de novo, enquanto fosse do seu agrado. Três dias após o encontro com Alex, Chelsea deixou o trabalho às 17 horas para se encontrar e jantar com a irmã Louise, um acontecimento ainda estranho que a deixava nervosa. Após o desastre de trem na infância das duas, perdera contato com Louise por quase 15 anos. Então, havia alguns meses, Louise a vira no Bate-Papo com Chelsea... a reconhecera, apesar da mudança de nome, dos cabelos tingidos de castanho, da cirurgia plástica, e entrara em contato. Agora se encontravam para jantar uma vez por mês, o máximo de intimidade emocional que Chelsea aguentava. Não gostava de se lembrar da infância nem dos momentos terríveis, escondida debaixo da cama. Quando criança tinha medo e acreditava que só teria valor se fosse bonita. Levara anos para se livrar dessa crença. De vez em quando ainda refletia se acreditava nisso. Sem dúvida, em parte, sim. Não havia como trabalhar em televisão sem acreditar um pouco nisso. As duas se encontraram, como sempre, em um restaurante tranquilo no Upper West Side. Louise já esperava com uma pilha de redações à sua frente. Era uma das mais jovens professoras efetivadas na Universidade de Columbia. Seu rosto, em geral severo, anguloso e forte, se contraiu em um sorriso hesitante ao ver Chelsea. – Aur... Chelsea. Chelsea sorriu também, mas constrangida. – Jamais dirá meu nome sem hesitar, não? – Desculpe. É difícil esquecer velhos hábitos. Louise se levantou, e Chelsea lhe deu um abraço rápido. As duas se acomodaram. Louise balançou a cabeça devagar. – Fazemos isso há quase seis meses e ainda é estranho. – Sei disso. – Talvez porque você está tão diferente agora. – Pode ser. Louise concordou com um gesto e franziu os lábios. Refletiu que Chelsea contara muito pouco sobre seu passado. Tivera um homem que não fora bom. E o modo como Louise parecera compreender fizera Chelsea imaginar quais outros segredos ela guardaria. Que sofrimentos. Talvez a infância das duas as tivesse obrigado a tomar decisões erradas. – Então, alguma novidade? – perguntou Louise animada. Retirou da mesa a pilha de redações e colocou na sacola aos seus pés. – Na verdade, não. – Não? – Louise arqueou as sobrancelhas, esperou, e Chelsea deu de ombros. Desejava muito falar sobre Alex, o que era absurdo considerando como eram estranhos os jantares com a irmã. Tinha dificuldade até de falar sobre o tempo! Não iria despejar suas aflições sobre essa quase estranha, mesmo lembrando-se do modo como Louise a embalava para fazê-la dormir quando eram crianças, ambas solitárias, temerosas e extremamente infelizes. – E você? – perguntou Chelsea exagerando na animação e simpatia. Merecia um Oscar pelo modo como era doce com as celebridades, mas não conseguia fazer o mesmo com a irmã. – Alguma novidade na sua vida? Louise sorriu com frieza e discordou com um gesto. – Palestras e pesquisas. É quase só isso na minha vida. – E está contente assim? – insistiu Chelsea, de repente curiosa. Vivia para o trabalho, e imaginava se a irmã também era assim. – Sim. Fica tudo mais fácil, não acha? Chelsea aquiesceu com um gesto de cabeça e ambas ficaram em silêncio por um momento. Não haviam compartilhado muita coisa, e estavam apenas recomeçando o relacionamento. Louise remexeu na salada e depois perguntou com um surpreendente brilho malicioso no olhar: – Então “na verdade, não” nada tem a ver com a foto que vi de você e Alex Diaz? Chelsea ficou imóvel. – Que foto? – Em uma revista de fofocas... – Você lê essas coisas? Louise deu de ombros, dessa vez com um olhar realmente divertido. Chelsea jamais a vira tão descontraída. Suavizava as linhas severas de seu rosto, e a iluminava de dentro para fora. – Quando aparecem na minha frente. Essa que li estava no grêmio estudantil... Chelsea suspirou, comentando: – Não demorou muito. – Então está saindo com ele? – Não. Foi apenas um encontro de trabalho. Louise mordeu o lábio com os olhos ainda brilhando, mas nada disse. Chelsea tinha consciência de que as duas nunca haviam trocado confidências, nem mesmo quando crianças. – O que foi? – perguntou Chelsea por fim, irritada, porque Louise continuava a sorrir. – Ficou vermelha. – Claro que não... – replicou Chelsea. Nunca ficava vermelha. E, mesmo negando, sentia o rosto quente. Só em mencionar Alex ficava corada e com o corpo pegando fogo. E o coração dolorido. Tomou um gole de água e tentou se acalmar. Podia falar sem piscar em rede nacional sobre os problemas de impotência sexual de um astro de Hollywood, mas, quando pensava em Alex Diaz, mesmo de modo inocente, tudo mudava. O que estava errado com ela? – Desculpe – murmurou Louise. – Não deveria provocá-la. Na verdade, não somos íntimas para isso. Sim, não eram. Mas Louise jamais a provocara quando criança. Abraçava Chelsea, embalava, e de vez em quando a afastava. Mas a vida, na época, não permitira brincadeiras, e o tempo era muito precioso para provocações. – Façamos uma troca, então – disse Chelsea por fim. – Conte-me alguma coisa que não sei ao seu respeito. Sobre um homem. Louise fez um gesto descartando a ideia. – Não há nada a contar. – Deve ter tido um namorado ou algo assim – insistiu Chelsea de bom humor. – Nos últimos 15 anos? A expressão de Louise se tornou sombria, e toda a alegria desapareceu. – Ninguém – respondeu com brevidade. – Há muito tempo. Chelsea achou melhor não insistir. Lembrou-se da infância e da distância entre as duas: ela com seus cachos louros, e dominada pela ambição da mãe. Louise, tímida e gaga, sempre posta de lado. Ambas haviam sofrido. Sua mãe, Diane, morrera quando Chelsea tinha 16 anos. Louise era apenas 18 meses mais velha, e cada uma seguira seu próprio caminho. O serviço social não se interessara por duas adolescentes que moravam em um acampamento de trailers. Chelsea imaginava como teria sido sua vida se tivessem ficado juntas. Ajudado uma à outra. Mas não se demorava nessas divagações. Não valia a pena. Afinal, no momento se viam bastante, até demais. – Bem, me avise quando o cenário mudar – disse Chelsea, e Louise murmurou: – Não vai mudar. Chelsea analisou o queixo firme e as olheiras da irmã. Imaginou o que teria lhe acontecido 15 anos atrás que a deixara tão desconfiada. Nenhuma das duas jamais mencionava esse espaço de tempo em que haviam ficado separadas, e também não discutiam sua infância. Nenhuma delas queria lembrar das incertezas, da raiva e do medo. Nenhuma falava dos namorados de Diane, bêbedos e desempregados, com quem ela gostaria de casar. Imagine! Chelsea não lembrava de todas as tristes figuras que a mãe trazia para casa, porém sabia que nenhum desejara se tornar seu pai. Principalmente quando a mãe a estava sempre preparando para outro concurso de beleza infantil. Usando saltos muito altos e um vestido muito justo cheio de brilhos e babados, o rosto pintado como o de uma prostituta com apenas 6 anos, chamara a atenção dos bêbedos de Diane. E alguns não resistiam. Graças a Deus tivera Louise. A mais velha tentara protegê-la contra os avanços lascivos de um dos namorados da mãe em várias ocasiões, e conseguira. Quase sempre. Porém, quando o perigo passava, Louise afastava Chelsea como se estivesse zangada com ela. Não, nunca tinham sido íntimas. Mas precisavam uma da outra, e talvez ainda precisassem. ALEX AP ERTOU uma tecla e o rosto de Chelsea congelou na tela do computador. Uma estrelinha de cinema soluçava no sofá cor-de-rosa e Chelsea a fitava com compaixão, expressão triste, e lenços de papel na mão. Porém, seus olhos continuavam frios como aço. Era boa no que fazia, Alex admitiu, muito boa. Possuía um calor e vibração que ele experimentara na pele. As pessoas eram atraídas por ela, para o seu sofá, e ficavam prontas a fazer confidências. E, quando se sentiam compreendidas, aceitas, Chelsea despejava sua bateria de perguntas contundentes: E isso foi quando teve um caso com ele? Roubar era uma grande tentação? Diria que tinha um problema de alcoolismo? Eram perguntas sempre feitas em tom de compaixão e sinceridade como se Chelsea prometesse a salvação para todos. A absolvição. E confiavam nela, amavam-na, mesmo quando ela os fazia caminhar sobre as brasas de seus próprios pecados. Ela era uma profissional, mas daria conta de Jason Treffen? Queria dar conta? Chelsea admitira não pretender que a entrevista com Treffen fosse uma novela chorosa como as outras. Entretanto, será que iria expor o entrevistado? Isso poderia selar sua carreira de jornalista séria, mas acabaria com seu talk show na AMI. Treffen poderia levá-la aos tribunais. Sem dúvida pretendia fazer com que ela assinasse um acordo antes para fazer perguntas previamente aprovadas. Mesmo assim, Alex ainda não confiava o suficiente em Chelsea para contar a verdade. Para lhe dar controle. Suspirou, fitando a tela com Chelsea. Ela usava uma blusa branca e fina, e uma saia justa cinza. As longas pernas se inclinavam para um lado enquanto seu torso pendia para a entrevistada como se bebesse suas palavras... Quem era mesmo a atriz? Uma aspirante a Hollywood que fora pega em uma situação comprometedora. Chelsea estava serena e profissional, mas ele lembrava como agira na limusine antes de escorregar do seu colo. Os olhos cheios de desejo, os lábios entreabertos. Desejara-o, estivera ponta para ele, e dera tudo errado. Uma mensagem chegou pelo celular e Alex viu que era de Austin perguntando sobre seus progressos com Chelsea. Ele digitou um texto rápido. Estava agindo. Frustrado, Alex girou na cadeira. Ainda não conseguira nada com Chelsea Maxw el l . Precisava superar. Devia pensar exclusivamente em Treffen. Em Sarah. Em vingar sua morte. E quanto a Chelsea? Pouco ligava. Era Sarah quem importava. Sarah, cuja memória o assombrava. Sabia que Hunter e Austin sentiam o mesmo. E Katy; afinal, era a irmã de Sarah. Tanta gente querendo levar Treffen aos tribunais. Treffen já perdera a família e estava para perder o emprego, mas Alex sabia que não era o suficiente. O homem precisava pagar publicamente. Lembrava-se da primeira vez que Sarah viera falar sobre o assunto. Ele estava ocupado com um artigo... o perfil de algum herói corporativo... e ela, com os cabelos despenteados cobrindo parte do rosto e a boca torcida, dissera: Às vezes esses heróis corporativos não são tão perfeitos. Ele percebera que ela falava de alguém em particular. Sim, todos têm esqueletos no armário. Em quem está pensando? Ela dera de ombros. Talvez Jason Treffen não seja o santo que parece. E Alex rira. Pensara que ela estava brincando. Será que a essa altura Treffen já a arrastara para seu grupo de garotas de programa? Agora Alex podia imaginar como acontecera. Você é tão meiga, Sarah. Tenho um cliente que precisa de um toque feminino, tente agradá-lo por mim. Vá jantar com ele... E quando Sarah percebera o que estava acontecendo já era tarde demais. E ficara envergonhada e assustada demais para protestar. Para procurar ajuda. M a s procurara Hunter. Austin. Ele, Alex, seu grande amigo, e de nada adiantara. Mas agora adiantaria. Não podia ressuscitar Sarah, porém vingaria sua morte. Podia arruinar Treffen. Com a ajuda de Chelsea. Precisava revê-la. Não havia discutido sobre Treffen no jantar, e isso fora um erro. Talvez, se tivesse parado de pensar em levá-la para a cama, ele pudesse tê-la do seu lado agora, em vez de zangada. Mas Alex consertaria a situação. Precisava. E de repente soube como. Estivera tão focado em se mostrar no controle que perdera sua meta de vista. Fora estúpido, cego, mas da próxima vez que visse Chelsea manteria as rédeas... e ela nem perceberia. TRÊS DIAS após seu jantar com Alex, Chelsea estava de pé perto do set de filmagem de Bate-Papo com Chelsea, revendo os cartões com as perguntas, enquanto um dos produtores acalmava a convidada do dia para fazê-la sair do camarim. Parecia que a moça ficara com medo, e Chelsea não se surpreendia; muitos convidados ficavam em pânico e na última hora não queriam entrar no ar e contar seus segredos. – Olá, Chelsea. Ela ficou tensa e quase deixou cair os cartões. Virou-se devagar e se viu de frente com Alex Diaz em um elegante terno cinza, as mãos enfiadas nos bolsos da calça, sorrindo levemente e de modo misterioso, lindo demais para sua própria segurança... e a dela. – O que faz aqui? – Apreciando seu programa. Queria vê-lo ao vivo. Ver você em ação. Ela não detectou nenhum duplo sentido nas suas palavras, embora não acreditasse na explicação. Por que a procurara de novo? E por que ela precisava se sentir tão animada com isso? Apontou para os assentos na frente do palco. – A plateia do estúdio senta-se ali. – Pensei em assistir daqui. Chelsea estreitou os olhos. Os bastidores eram restritos ao pessoal da emissora. – Quem o deixou entrar? – Pisquei o olho para os seguranças. Ela quase riu, mas se conteve. Entretanto, não conseguiu deixar de torcer a boca, e ele notou. – José foi o que mais sucumbiu ao meu charme. – Alex continuou com a brincadeira. José tinha um 1,80 m de altura e pesava mais de 100 quilos. Chelsea pensou na cena, e o riso quase escapou e a fez engasgar. Tampou a boca com a mão. Alex já era perigoso sem acrescentar graça na mistura. – Qual é a razão para ver meu programa? – perguntou mantendo a voz calma. – Treffen? Ele se aproximou e ela sentiu o perfume da loção pós-barba que a fazia desejá-lo de um modo que já se tornara conhecido. Poderia se afogar nesse momento como ele na piscina da escola. – Quero assistir porque estou interessado – murmurou Alex para que apenas ela o ouvisse –, mas principalmente queria vê-la. Ela balançou a cabeça sem convicção. Ele ali. Querendo vê-la. – Não. – Não o quê? – Não sei, mas não – repetiu ela, balançando a cabeça de novo. – Não para tudo. – Uma resposta incoerente e chula, mas a única que podia dar. – Também vim pedir desculpas. Isso era raro. – Por quê? – quis saber Chelsea. – Não tenho certeza, algo a assustou na limusine, e... – Não me assustei. – Então se irritou – emendou Alex com serenidade. Chelsea fez um gesto com a cabeça. De novo. Onde estava seu encanto, sua segurança? Precisava ter isso de volta. – Apenas mudei de ideia, Alex. Acredito que isso lhe aconteça com as mulheres de vez em quando. – Na verdade, nunca aconteceu. Chelsea ergueu os olhos com impaciência. – OK, machão. Desculpe desapontálo, mas decidi não ser seu bichinho de estimação. – Quem disse que eu desejava isso? Ela lhe lançou um olhar duro. – Tudo é controle para você, não? Tenho certeza de que algumas consideram isso muito sexy, mas eu não. Mentirosa. Ela considerava, sim, e ele sabia. Entretanto, nada disse. Apenas a fitou com expressão misteriosa, a boca apertada. – Vamos entrar no ar em cinco minutos, Chelsea. Ela aquiesceu com um gesto de cabeça para o assistente de produção, e a maquiadora se aproximou para um último retoque. – Tanya já saiu do camarim? – perguntou para o assistente, que lhe lançou um olhar nervoso. – Quase. – Quem é sua convidada de hoje? – perguntou Alex. – Uma modelo de lingerie que tirou toda a roupa? – Essa foi ontem – disse Chelsea, feliz por estar com a maquiagem em ordem. – Tente se atualizar. Hoje é Tanya Hart, a estrela da garotada que foi multada por dirigir bêbeda. – Isso não é muito escandaloso, é? – Tanya só tem 14 anos. – Agora compreendo. O sorriso de Chelsea não atingiu seus olhos. – Vou começar, Alex. Obrigada por vir. Espero que goste. – Tenho certeza que sim. – Ele deu um passo na sua frente com os olhos brilhantes. – Acha que sou controlador? Você também é. – E é por isso que não caio na sua armadilha. – O coração dela batia forte. – Talvez isso mude o cenário. Quem sabe eu permita que comande. – Permitir? – perguntou ela quase sem fôlego. – Sim. Então ele continuaria no controle. Apenas afrouxaria as rédeas um pouco. Não, obrigada. A menos que... Se ela conseguisse fazê-lo perder o controle de verdade. Deixá-lo de joelhos... – Fica excitada, não? – murmurou ele, e ela sorriu de má vontade. – Um pouco. – Dois minutos, Chelsea – gritou o assistente. Ela acenou para o rapaz e encarou Alex, que continuava a fitá-la com seriedade. Tensão sexual. Cada nervo de Chelsea estava tenso. Mas negar talvez não fosse o ideal. Nadara naquelas águas perigosas por muito tempo. Iria admitir a atração e lidar com ela. Faria Alex implorar. Respirou fundo e aquiesceu com um gesto de cabeça e o queixo duro: – Muito bem. Encontre-me aqui depois do programa. – Estarei esperando – respondeu ele, arqueando as sobrancelhas. Acenando de novo, ela caminhou para o cenário da gravação, ansiosa, preocupada e furiosa. Tanya já estava sentada no sofá de olhos arregalados e lenços de papel na mão. Estava pronta para chorar, confessar e ser absolvida por Chelsea e pelo público. Era assim que funcionava o programa: chore e se purifique. Ser entrevistado no Bate-Papo com Chelsea era a maneira mais rápida de limpar uma imagem enlameada. Irônico, não? Chelsea se sentou na frente de Tanya, tentando se concentrar enquanto ajeitava o microfone. Seus ouvidos zuniam. Tanya sorriu com timidez, e Chelsea correspondeu. Pelo menos pensou ter sorrido. Estava frágil, uma descarga elétrica atravessava seu corpo. Desmoronando. Precisava ser forte de novo, e conseguiria isso dormindo com Alex. Ele podia dizer que a deixaria controlar, mas ela viraria o jogo para sempre. Faria com que implorasse. Desejasse. E isso acabaria com o encanto que Alex exercia sobre ela. Respirou fundo, fechou os olhos e relaxou. Era um exercício que aprendera havia dez anos, após o ataque, quando ficara tão tensa que começara a perder os cabelos. Isso e as cicatrizes a haviam feito se sentir muito feia. Mas ela se libertara desse horror, trabalhara muito para ser menos ansiosa, fizera cirurgia reparadora e aprendera lutas de autodefesa. Conhecera Michael, que lhe dera a grande chance, e há dez anos trabalhava como louca. Não arriscaria tudo por causa de Alex Diaz. Fazer seu joguinho de submissa a lembraria de como fora patética, ansiosa por agradar. Nunca mais. Provaria isso. – Trinta segundos. Abriu os olhos e sorriu de novo para Tanya enquanto a música de abertura soava. Sentiu-se calma de novo como se colocasse de volta a máscara familiar, seu disfarce seguro. Chelsea Maxwell estava no ar. CAPÍTULO 5 ASSIM o programa terminou Chelsea desapareceu do local de filmagem. Seu rosto lindo tinha uma expressão determinada, o que deixou Alex curioso... e muito excitado também. Havia algo na sua atitude de durona de que gostava muito. Desejara vê-la perder as estribeiras na outra noite, mas agora imaginava como ela seria ditando as regras. Ou pensando ditar. Veria por quanto tempo deixaria o QUE joguinho prosseguir. Se obtivesse o que queria... a confiança de Chelsea... valeria a pena. Poderia ser muito interessante... e agradável. Ela parou na frente dele, deixando ver uma parte ínfima da camisete de renda creme sob a camisa branca. Usava sapatos de couro preto com saltos muito altos, além da saia justa, e se estivesse de lingerie vermelha não conseguiria ser mais sexy. Chelsea estreitou os olhos e colocou as mãos nos quadris. Alex ficou em silêncio, franzindo a testa com curiosidade. – Vamos – disse, e ele concordou, divertindo-se com a sua atitude mandona, e pensando até onde ela chegaria. Aonde a deixaria chegar. Porque podia conceder um pouco de controle para Chelsea, mas era uma concessão. Pretendia ser sempre quem comandava. Sempre. – Para onde vamos? – perguntou, ao deixarem o estúdio. – Meu apartamento – respondeu ela. – Boa escolha. Não falaram ao deixar o prédio, porém Alex sentia a tensão. Era uma nova experiência para ele que o deixava elétrico. Há quanto tempo não se sentia tão vivo? Não lembrava nem queria lembrar. À porta dos escritórios da AMI Chelsea chamou um táxi, erguendo o braço delgado e a expressão determinada. – Não parece contente – observou Alex, entrando com ela no carro que parara junto à calçada. Chelsea sorriu com falsa doçura. – Acredite, estou. Alex sorriu também. – Bem, estou me divertindo. – É bom saber. Enquanto seguiam, ela checou seu celular. Alex a observava, divertido; ela tratava de um assunto de negócios atrás do outro. Gostava de uma mulher assim. Não precisaria se preocupar com rompantes emocionais por parte de Chelsea. Tomava cuidados com suas parceiras de cama, porém às vezes cometia um engano. Dormira com uma mulher que pensara e m relacionamento. Alex não tinha relacionamentos. Vira os problemas com sua mãe, e o sofrimento de Sarah. Sexo era sexo: essencial, divertido, acabando ao amanhecer. Geralmente antes. Tinha certeza de que Chelsea pensava assim também... ou quase. Dez minutos depois estavam no prédio de Chelsea e subindo o elevador. – Cobertura? – perguntou ele, e ela aquiesceu com um gesto de cabeça, enquanto Alex apertava o botão. Não conversaram enquanto subiam para um saguão de mármore preto e branco que dava para uma sala decorada também inteiramente em preto e branco. Alex se deteve diante de uma enorme tela branca com linhas negras de cima a baixo. – Não sei se compartilho do seu gosto em arte. – É uma peça de colecionador – replicou Chelsea, retirando o casaco e pendurando-o em um armário. Até agora se mostrava muito controlada. Ele refletiu se perderia o controle em algum momento. Perdera na limusine. Ele comandara dizendo para ela se aproximar, e ela viera com a boca entreaberta e cheia de desejo. Queria ver isso acontecer de novo fosse lá quem ficasse no controle. Calma no momento. Havia muito em jogo para se deixar levar pela paixão. – Vale mais de cem mil dólares – comunicou ela, e Alex voltou a fitar a tela. – Lamento dizer, mas acho que você foi enganada. – Tenho certeza que não. – Parou na frente dele e cruzou os braços sobre o peito, enquanto Alex aguardava, arqueando as sobrancelhas. – Tire a roupa, Alex. Ele riu, surpreso e muito excitado. – Não é muito criativa, Chelsea, mas obedecerei. – Claro que sim. – Ela se aproximou e afrouxou o nó da sua gravata com dedos experientes. A gravata foi retirada, e Alex começou a ficar excitado. – Pensei que eu deveria me despir, mas fico contente que esteja fazendo o trabalho por mim. Muito contente. – Só estou ajudando – murmurou ela. A seguir foi o paletó. – Já que estamos sendo tão profissionais e formais, pode pendurar? – pediu ele. Mas ela apenas atirou o paletó para longe. Alex riu. Ela estreitou os olhos, aborrecida, enquanto ele continuava com muita roupa. Não queria aborrecê-la, porém Chelsea tinha muito a aprender sobre controle. Parecia uma criança tentando pegar todos os brinquedos. Mas não deixava de ser sexy. – E agora? – perguntou Alex, enquanto ela continuava estreitando os olhos. – Camisa. – Certo. – Alex desabotoou e atirou a camisa para perto do paletó, enquanto Chelsea observava todos os seus movimentos. – Feliz? – Ainda não. – Imagino o que virá agora. – Imagino que sim. Alex desafivelou o cinto e o retirou, produzindo um rumor suave que fez as pupilas de Chelsea brilharem. Ela deixou escapar um suspiro. E pensava estar no controle. Alex enrolou o cinto em uma das mãos e arregalou os olhos, perguntando: – O que faço com isto? – Jogue na pilha – comandou ela com a voz tensa. Interessante. Ele atirou o cinto ao chão e Chelsea relaxou, os ombros ligeiramente arqueados. – E agora? – Continue, Diaz. Ele abriu a braguilha, sentindo a própria ereção. O strip-tease estava afetando os dois. Baixou a calça até os tornozelos. Não era a visão mais sofisticada, porém ele pouco se importava. – Percebo que não quer criar um clima romântico? – quis saber, ao vê-la sorrir com malícia diante de sua ereção. – Estou criando o clima. Ele baixou a cabeça. – Tudo bem. – Tire a cueca. – Não quer fazer isso por mim? – provocou Alex. – Não, faça você mesmo. Alex fitou os pés. – Sapatos. Percebeu que Chelsea hesitava. Não queria ficar de joelhos na sua frente; seria um sinal de submissão e perda de controle. – Creio que podemos resolver isso – murmurou ele, decidindo concordar com ela no momento. Sorriu e chutou os sapatos para longe junto com a calça. – Mas posso precisar de ajuda com as meias. Chelsea se aproximou com os olhos brilhantes e baixou a cueca de Alex. – Pode ficar com as meias. Então ele despiu apenas a cueca, chutando-a para longe. Chelsea passou os dedos pela ereção. A pele era suave, e o órgão enrijeceu ainda mais. – Impressionante, Alex. – Muito obrigado. Ela deu um passo atrás. Alex estava apenas de meias com uma majestosa ereção. Acenou para as roupas dela, sentindo a maior excitação de sua vida. – Não vai se despir? – Tudo a seu tempo. – Chelsea tornou a cruzar os braços sobre o peito, e ele riu. Então era assim que ela demonstrava controle? – Tudo a seu tempo – repetiu ela, mas começou a desabotoar a blusa branca caminhando para ele. O simples gesto dos dedos delicados desabotoando as casas era muito erótico, incrível. O desejo percorria o corpo de Alex como uma corrente elétrica. Ela retirou a blusa, exibindo a camisete de renda branca e tiras finas que cobria muito bem os seios, deixando tudo a imaginar... e, oh, ele imaginou. Queria segurar os seios arredondados, retirar a camisete pela cabeça de Chelsea e tocar sua pele nua. Que o controle fosse para o inferno. Mas se controlou e a observou descer o zíper da saia justa com um som seco em meio ao silêncio. A saia deslizou pelas pernas cobertas pelas meias, e ela sorriu do seu modo provocador, afastando a peça de roupa. Alex engoliu em seco de maneira ruidosa. Chelsea usava calcinha branca de renda que cobria o início das coxas, meias transparentes, e ligas. Ligas. Além dos saltos altos. Jamais vira uma mulher tão sensual, e ela sabia disso. Aliás, Chelsea estava adorando tudo. Aproximou-se dele com os saltos fazendo um ruído sexy sobre o assoalho, e esfregou os seios em seu peito, a seda da camisete fazendo cócegas. Ela passou os dedos pelo seu peito e Alex estremeceu. Chelsea perguntou, ampliando o sorriso e arqueando as sobrancelhas: – Gosta? – Gosto quando me toca. Então ela apertou o órgão intumescido o suficiente sem fazer muita pressão, murmurando: – E isto? Alex quase gemeu. Fechou os olhos sem perceber. – Sim, gosto também. Queria tocá-la, sentir a maciez de sua pele. Enlouquecê-la como ela o enlouquecia. Mas resistiu. Controle agora significava deixá-la no comando, ver até onde ia com seu pequeno espetáculo de poder. Ganhar sua confiança... e de preferência não se perder no processo. Ela continuou a massagear seu órgão, e Alex projetou o corpo para a frente no desejo de penetrá-la. Ela riu de leve e pela primeira vez Alex pensou em acabar com a brincadeira. Chelsea estava se divertindo demais. – Paciência, Alex. Sua voz, ele observou, estava apenas um pouco trêmula. Estava tão excitada quanto ele, mas o deixava esperar. Chelsea ficou por trás dele, acariciou suas costas e disse: – Quarto. – Que bom – retrucou ele, e rumaram para o quarto com Chelsea o empurrando pelas costas. Alex se deteve diante de uma cama king size com lençóis de cetim branco, a cidade surgindo em volta através das enormes janelas em três paredes. Ela o empurrou para a cama, e Alex cairia em cima do colchão sozinho se não torcesse o corpo, pegasse a mão dela, e a fizesse cair junto. Ficou deitado de costas e Chelsea em cima. – Agora está melhor. – Verdade – murmurou ela, escondendo a irritação por ter sido jogada na cama também, mas se erguendo nos joelhos e montando sobre Alex. Alex quase perdeu a noção de tudo ao senti-la por cima, experimentando um desejo primitivo que não queria esconder nem negar. Ela riu de leve, provocando e pressionando os quadris de Alex com os joelhos, mas de um modo que só roçavam os corpos. – Estamos quase lá, Alex – assegurou. Queria tanto quanto ele, embora fingisse calma. Alex quase praguejou. Estava praticamente enlouquecido, e queria penetrá-la, e logo. Chelsea balançou a cabeça com um risinho provocador. – Paciência, lembra? – Lembro – murmurou ele. Raios. Estava justamente prestes a perder a paciência. Ela se inclinou para a frente e roçou os seios no rosto dele. Alex gemeu, enquanto Chelsea retirava um preservativo do criado-mudo. Ele estendeu os braços para pegá-lo, mas Chelsea se esquivou, prendendo seus braços sobre o colchão. – Quê? Não posso nem tocar você? – Oh, sim, pode. – Chelsea ergueu a mão, abriu o envelope com os dentes e, vagarosamente, colocou o preservativo em Alex. – E eu posso tocar você – murmurou, retirando a calcinha e se deitando sobre ele. – Chelsea... – O nome deixou os lábios dele com um gemido, um pedido, enquanto mergulhava dentro dela, ajeitando os quadris para um acesso melhor. – Estou quase lá – sussurrou Chelsea cheia de desejo, e ele notou sua satisfação. Agora o tinha onde queria, por baixo e suplicante. Muito bem. Ele imploraria. Pelo menos dessa vez imploraria com seu corpo. Segurou-a pelos quadris e deu uma investida firme. Ela começou a se mover mais depressa, atirou a cabeça para trás e colocou as mãos na nuca. Ambos estavam prestes a perder o controle, e o joguinho de poder já não tinha sentido para ele. Então parou de raciocinar e se entregou até o final, quando Chelsea sufocou um grito de prazer. Ela deixou a cabeça pender para a frente, os cabelos roçando o peito dele, enquanto a respiração voltava ao normal. Antes que o último tremor desaparecesse, ela rolou o corpo para o lado, e colocou a calcinha com dedos trêmulos, um brilho de triunfo nos olhos. – Sabe onde fica a porta – avisou, e, sem olhar para trás, rumou para o banheiro, deixando-o satisfeito e cansado na cama. Mas Alex só ficou deitado por mais um segundo antes de arrancar o preservativo e pular da cama com agilidade. Agarrou-a pelo pulso, sentindo a pele macia e fria. – Ideia interessante, Chelsea, mas nossa noite não terminou ainda. Ela o fitou com desdém, embora Alex sentisse seu tremor, e respondeu: – Para mim terminou. Alex sorriu e balançou a cabeça sem largar seu pulso. – Não chegamos nem perto. – Não fico de conversinhas depois do sexo. Ele ampliou o sorriso sem deixar de fitá-la. – Também não. Ela se livrou com um repelão. – Então terminamos por aqui. Alex a segurou pelos ombros, e a fez encará-lo. – Não, não terminamos. CHELSEA VIU a determinação no rosto de Alex e sentiu uma emoção desconhecida. Não sabia que emoção era, porém não queria reconhecer. Excitação. Pura e simples excitação sexual. Então agora ele queria um pouco de controle. Raios, ela concederia. Conseguira seu intento. Fizera Alex implorar e se submeter, e isso lhe dera um prazer fora do comum, o maior orgasmo de sua vida. Entretanto, ainda queria mais, assim como ele. Não era assustador? Ergueu o queixo, fitou Alex, mas ele nem piscou. – Tem certeza de que está pronto para uma segunda rodada, companheiro? – brincou. Alex mostrou os dentes como uma fera. – Definitivamente. Chelsea não respondeu. Fora estúpida por desafiá-lo e mais ainda por sentir essa súbita emoção. – Muito bem – murmurou, fingindo um tédio que estava longe de sentir, e voltando para a cama. – Está pronto? Ele riu de mansinho. – Você é uma figura, Chelsea, mas agora é minha vez. Levante-se. Ela não se moveu, mesmo querendo, ansiando por obedecer. Estúpida, estúpida, estúpida. – Disse que não faria seus joguinhos, Alex. – Tudo com você é um jogo. Mas quer ficar deitada na cama fingindo tédio? Certo, posso lidar com isto. Maldição. Chelsea se metera em apuros. Sentou-se. – Lamento, mas não dou bis. Com gesto lento Alex a ergueu da cama, e Chelsea não resistiu. – Não será um bis, Chelsea. Alex a fez se erguer da cama, e ela sentiu o calor de sua mão. – Você se excita com isso, Alex? Essa história de controle? – Você acabou de fazer isto. Entretanto, não se preocupe. Não a obrigarei a fazer nada que não deseje. Estou longe de ser esse tipo de homem. – Fitou-a com atenção. – Mas você está assustada... – Não estou. – Então está furiosa porque acha que a obrigarei a fazer coisas que não quer. Não é isso? – Tente – retrucou ela em tom de bravata. Sabia muito bem que Alex poderia forçá-la se quisesse. E isso era bastante assustador e perigoso. – Oh, tentarei. Você quase não atingiu o clímax, Chelsea, lutou contra. O que foi aquilo? – Eu me diverti – respondeu ela muito tensa. Como Alex, no meio de um orgasmo, percebera isso? Chelsea sempre detestara ficar vulnerável e se deixar levar demais pelo clímax. Não era puritana; gostava de sexo. Mas sempre terminava depressa. E com ele nem mesmo se controlara. Seu corpo simplesmente assumira o controle respondendo com um ímpeto jamais sentido antes. – Quero que se deixe levar – disse Alex cheio de promessas na voz. – Quero que perca a razão, senão será um insulto à minha virilidade. – Oh, por favor. – Ela tentou recuperar a compostura e o ar de desdém. Mas não conseguiu. – Gosto quando pede por favor – disse Alex, segurando-a pelo ombro sem deixá-la se mover. Ela o encarou com raiva, os lábios apertados, mas o corpo quente. – Então se trata do seu ego? – Se meu ego for uma questão de querer que você sinta o prazer plenamente, então é isso, sim. – Senti prazer, Alex, ao vê-lo por baixo do meu corpo, gemendo e pedindo. Acredite, gostei muito. Ele sorriu com frieza. – Está acenando com a bandeira branca? – Estou apenas dizendo a verdade. – Também posso fazer isso. Ele a beijou na boca. Apenas um beijo, mas foi um choque para Chelsea como se mergulhasse na água fria. Ficou imóvel, mas alerta. Sentindo toda a pressão de seus lábios e língua. Ele sabia beijar. Foi com muita força de vontade que Chelsea evitou enlaçar seu pescoço. Queria sentir o corpo dele de novo, porém resistiu. Por orgulho. Por medo, ou por desespero de não se dar... não se perder... para esse homem que a afetava tanto. Alex ergueu a cabeça, e ela quase gemeu de frustração porque o beijo terminara. – Vai me dar trabalho, não? – perguntou Alex. Chelsea se forçou a sorrir. – E achou que não daria? Então ele trabalhou. Voltou a beijá-la deslizando a língua pelos seus lábios, penetrando ali e fazendo-a sofrer de desejo. Ficar viva. Ela continuou imóvel, os lábios mal abertos. Não facilitaria a conquista, e jamais deixaria que Alex percebesse o quanto desejava essas carícias. Desejava-o. Mas por certo ele sabia. Sentia o calor do corpo dela embora ela negasse. E tarde demais Chelsea descobriu que deixava escapar leves suspiros e gemidos no quarto silencioso. – Resiste para valer – comentou ele com os lábios próximos aos dela, deslizando a mão e apertando suas nádegas. – Por que tem tanto medo do prazer total? E havia uma surpreendente ternura em sua voz. Não se entregar estava sendo mais revelador do que a entrega, refletiu Chelsea. Por que não percebera isso antes? Ele a apertou e Chelsea ouviu o próprio gemido. Depois a tocou no rosto. Ela abriu os olhos enquanto Alex perguntava: – Quer que pare? Ela ficou calada. Impossível admitir não desejar que ele parasse, porém também não tinha forças para dizer nada. – Acho que não. Ou sim? – Alex pareceu em dúvida, mas enfiou a mão dentro de sua calcinha, e Chelsea gemeu. – Maldito seja, Alex – murmurou, lutando contra o desejo. – E disse que não gostava de conversinhas depois do sexo. Ela meio que riu e soluçou porque esse homem a tirava do sério. Tentou se equilibrar segurando-o pelos ombros. – Vou fazê-lo pagar por isto... – Estou ansioso. Retirou a mão do corpo dela, e Chelsea gemeu: – Não... – Não o quê, Chelsea? Ela apenas balançou a cabeça. Não falaria. Não. – O quê? – insistiu ele. – Não quer que pare? É isto que ia dizer? Implorar? – Jamais imploro. – Ela o fitou com ar de desafio. – Talvez não, mas seu corpo sim, seu corpo fala por si e implora que termine o que comecei. Chelsea sabia que ele estava certo. Remexeu-se, sentindo dor na pélvis, mas ainda tentou enfrentá-lo com o olhar. – Acho que vou me apiedar de você e acabar com isto – murmurou ele –, mas sou durão, Chelsea. Vou fazê-la implorar por isto. – E já não estou implorando? – Ela riu com zombaria. – Não é fraqueza sentir desejo, sabia? – retrucou ele, e Chelsea permaneceu quieta, pois para ela desejo significava fraqueza. – Quer que seja eu a implorar? Quer que eu seja fraco, Chelsea? Muito bem. Desejo você. Estive dentro de seu corpo minutos atrás, e ainda a quero, e quero que você me deseje e que admita isso. Não só com o corpo, mas com a mente. Use sua boca e diga que me deseja, Chelsea. E ela quase disse. Nunca um homem lhe pedira para dizer essas coisas, mas quando abriu a boca nenhum som saiu. Ele tornou a beijá-la com força. Estava destruindo-a, fazendo desabar anos de defesas bem construídas, e nem percebia, não sentia o tumulto no coração dela, e ela jamais permitiria que sentisse. Ele a empurrou até que as costas de Chelsea bateram em uma das janelas do apartamento, que iam do chão ao teto. Então ele se ajoelhou na sua frente e ela passou os dedos pelos seus cabelos enquanto Alex baixava a calcinha e encostava a boca entre suas pernas. Os joelhos de Chelsea cederam. Ele estava aos seus pés e isso deveria fazê-la se sentir forte, porém se sentia mais fraca do que nunca. Encostou a cabeça no vidro da janela fechando os olhos e por fim se entregando, incapaz de resistir à onda de sensações que a dominava. Estava encostada à janela que descortinava Manhattan logo atrás, porém era o homem na sua frente que a deixava exposta. Vulnerável. E não tinha forças para lutar. Com os olhos cheios de lágrimas de pura emoção, alcançou o clímax. Seu corpo estremeceu em ondas ininterruptas com um prazer tão intenso que chegava a machucar. Enfiou os dedos ainda mais em seus cabelos, desejando que ele sentisse o prazer que lhe proporcionava nesse instante. Deleite. Dor. Demais. Por fim ele se ergueu e, enquanto o orgasmo ainda a fazia estremecer, com um gesto inesperado e rápido Alex ergueu a camisete pela sua cabeça e a retirou, deixando-a incrivelmente exposta. Mesmo em meio ao desejo que ainda a cegava, ela viu o sorriso desaparecer do rosto de Alex, e o choque dilatar suas pupilas. – Chelsea – disse ele com a voz rouca. – O que aconteceu com você? CAPÍTULO 6 CHOCADO, ALEX fitou a longa linha desigual de carne dilacerada no seio esquerdo de Chelsea. Ela não se constrangeu nem se cobriu, apenas ergueu o queixo enquanto ele percebia que essa atitude era um padrão de defesa. Ela sustentou seu olhar com a respiração ainda ofegante. – Caí de uma árvore quando era criança. – E sobre o quê? – perguntou ele. – Uma serra elétrica? – Está bem, foi um acidente de carro. Uma placa de metal entrou pela janela e me atingiu. – Chelsea deu de ombros, mas seus olhos brilhavam de raiva e o queixo estava duro como granito. Pensar que momentos atrás se dissolvera em prazer e gemera em um clímax sexual que procurara não alcançar. – Já olhou o suficiente? – perguntou, fazendo-o cair em si e perceber que continuava fitando seu seio esquerdo. Há muito o ferimento cicatrizara, porém a carne dilacerada era um sinal da ferida antiga e perigosa. – Desculpe – murmurou ele. – Não quis constrangê-la. – Não constrangeu. – Ela enfiou a camisete de novo. – Mas, agora que conseguiu o que queria, pode ir. E, sem mais uma palavra nem olhar, rumou para o banheiro. Alex ouviu o barulho da fechadura e se deixou cair na beirada da cama com os lençóis de cetim amassados, refletindo sobre o que acabara da acontecer. Sexo devia ser algo simples. Era assim que gostava... nada de emoções envolvidas, apenas o prazer básico. E a atitude de Chelsea parecera combinar com a sua, porém tudo saíra do controle e as emoções o dominavam, quase o sufocando em um nó que não tinha forças para desatar. Começara como um joguinho de “quem manda aqui”, algo divertido, mas se transformara em outra coisa, algo profundo, complexo e emocional. Ele não provocara isso. Nem Chelsea. Então, como haviam chegado a esse ponto? E o que fazer agora? Sabia que Chelsea desejava que tivesse partido quando saísse do banheiro, e Alex também sabia que seria a opção mais fácil. Sumir do apartamento antes que as coisas complicassem ainda mais. Porém não se moveu. Não podia sair assim. De jeito nenhum. Fosse lá o que tivesse acontecido, não importava. A questão ainda era Treffen. E Sarah. Não podia jamais se esquecer disso, nem mesmo agora. Principalmente agora. CHELSEA ESP EROUquase uma hora para sair do banheiro. Tomou banho, lavou a cabeça, escovou os dentes: todas tentativas inúteis para tirar o perfume e o gosto de Alex do seu corpo. Não importava se sua boca agora cheirava a menta, e a pele, a amêndoas. Alex continuava impresso no seu cérebro e alma. Ele conseguira o que ninguém mais conseguira, deixando-a fraca e exposta, e vendo mais do que deveria. E ela ainda o desejava. Pelo menos não se veriam de novo. Alex já deveria ter ido embora, e Chelsea não tinha intenção nem mesmo sorrir para ele outra vez. Amarrou o cinto do roupão de seda cor de creme, fez um rabo de cavalo e respirou fundo. Então abriu a porta e se deteve ao ver Alex sentado na beira da cama. Pelo menos já se vestira. Contudo, com o nó da gravata por fazer e os cabelos despenteados continuava tão sexy como quando estivera apenas de meias. Chelsea desejou derrubá-lo sobre a cama, e, em vez de montar sobre o corpo dele, ficar enrodilhada ao seu lado com os braços dele à sua volta. Apertou mais o cinto do roupão e o fitou estreitando os olhos. – O que faz aqui? Ele sorriu com timidez e arqueou as sobrancelhas. – Acha que iria embora enquanto você tomava banho? – Já que pedi, sim. – Talvez não tenha percebido, mas não gosto de ordens. – E eu não gosto de idiotas que já não são bem-vindos – retrucou ela. Alex arqueou as sobrancelhas ainda mais, exclamando: – Nossa! – Falo sério, Alex. Já acabamos. – Acredita mesmo, Chelsea? – Sorriu, mas não era um sorriso amigável, apenas uma curva dos lábios. – Que vai se esquecer de mim? Era isso que queria, não? Ir para a cama comigo e depois me chutar para fora, satisfeita porque outro imbecil fez o que você mandou. Bem, pior para você, pois não sou esse tipo de homem. Ela sustentou seu olhar e murmurou: – Estou vendo. Alex levantou da cama e caminhou até ela. Já estava tão perto que poderia tocá-la, mas Chelsea não se moveu. Manteve-se firme esperando pelo próximo passo. – Quero falar sobre Treffen – anunciou Alex. – Treffen? – Ela o fitou perplexa. – Que hora boa. – Qualquer hora é hora. – Muito bem. – Chelsea cruzou os braços sobre o peito. – O que tem ele? Alex a encarou por um momento com uma vulnerabilidade que a assombrou, mas que logo desapareceu. – Quero que você acabe com ele na sua entrevista. – Acabar com ele? – Chelsea arregalou os olhos. – O que pensa que sou? Uma agente secreta? – Ele é mau, e o mundo precisa saber disso. Chelsea se surpreendeu que um homem como Alex pudesse ser tão melodramático. – O que Treffen lhe fez para deixá-lo com tanto ódio? – Ela se lembrou de algo. – Espere... Ele não falou mal do Diaz News no seu lançamento? Não disse que você era preconceituoso? – Isso nada tem a ver – murmurou Alex, franzindo a testa. – Pois sim! – Falo sério, Chelsea. – E eu também. Não serei usada para sua vingança pessoal. – Balançou a cabeça. Agora tudo parecia fazer sentido para ela. – Então por isso me esperou na sua limusine. Talvez também tenha sido o motivo para me levar para a cama. Tudo por um ridículo plano de vingança. E de modo absurdo aquilo doeu. – Se bem me lembro, foi você quem me levou para a cama – ponderou ele. – Tanto faz. – Não quer saber o que Treffen fez? – Não muito. – Isso é ser uma péssima jornalista, Chelsea, e você sabe. E acha que sou eu quem tem um problema pessoal por causa de Treffen? – Que problema eu teria com ele? – retrucou ela, e ele sorriu com os olhos frios. – Não contra Treffen. Contra mim. Está furiosa porque a fiz perder o controle, e tem medo do que sente ao meu respeito. – Também é formado em psicologia? – atacou ela, porém Alex a deixara contra a parede. Maldito por enxergar demais, e maldita ela por permitir. – Sei, porque sinto o mesmo – respondeu ele com simplicidade e olhar brilhante. – Como você, Chelsea, gosto de sexo, mas tudo acaba sempre no quarto. Não mantenho relacionamentos. Tudo não passa de uma só noite de diversão. – Sorriu sem espontaneidade. – Não há bis. – Que bom que concordamos. – Porém, hoje foi diferente para nós dois. Chelsea cruzara os braços com tanta força que sentia dor nas juntas. Mas tentou se conter ao comentar: – Não sabia que você gostava de violinos e rosas, Alex. – E você nega o que sentimos? Ela não respondeu por que não podia. Tentou fazê-lo baixar os olhos, mas não conseguiu. Alex sempre vencia. – O que quer? – perguntou ela por fim, com a voz irritada. – Quero que ouça. De verdade, esquecendo quem controla quem. Esse assunto é mais importante, Chelsea. Ela enfiou as unhas nos braços com suspeita e curiosidade. – Muito bem – murmurou afinal. – Conte. ALEX FITOU Chelsea e imaginou o que fazer a seguir. Nada disso fora planejado. Sim, queria falar sobre Treffen, mas não tivera intenção de comentar sobre emoções. Foi diferente para nós dois. Soara ridículo. Mas falara com sinceridade, e mesmo assim não conseguia admitir para si mesmo e muito menos para ela. Respirou fundo. – O trabalho de advocacia de Treffen com direitos humanos é uma farsa. E sua firma não passa de fachada. Ela o fitou quase com um ar divertido, sem dúvida ainda pensando que Alex planejava uma vingança pessoal. – Fachada? Para quê? – Uma rede de prostituição. Chelsea gargalhou. – Está me dizendo que Jason Treffen é um cafetão? – Basicamente, sim. – Alex cerrou os maxilares. Ela balançou a cabeça. – Pois sim. – Não acredita? – E por que deveria? – Por que eu mentiria? – redarguiu Alex. Chelsea deu de ombros. – Quem sabe sua honesta rede de notícias não seja uma fachada também? Quem sabe joga sujo e é assim que destrói seus inimigos, ou pelo menos tenta? – Por que desejaria destruir Treffen? – Ele desacreditou você, Alex. – Há dez anos, tentou. Porque eu sabia demais – respirou fundo. Ela ainda sorria com zombaria, e ele cerrou os dentes. – E o que você sabia, detetive Diaz? – Na época pensava que fosse apenas um caso de assédio sexual, o que já era muito ruim. Porém, recentemente, novas evidências surgiram. – A foto que Katy encontrara. Só em pensar nisso Alex sentia náuseas. – Evidências de que ele é um cafetão – ajudou Chelsea em tom de descrédito. – Sim, ele mantém uma rede de prostituição e alicia garotas de sua firma... – Advogadas – disse Chelsea com zombaria, e isso deixou Alex furioso com ela e consigo mesmo. Antecipara que ela resistiria a ajudar, porém não que o desacreditasse. Deveria ter pensando melhor e previsto que isso poderia acontecer. M a s parecia loucura. Ele mesmo custara a acreditar. Acreditar em Austin, em Katy. Em Sarah. E agora Chelsea não acreditava. – Escolhe moças que estão afogadas em dívidas da faculdade e desesperadas para demonstrar valor profissional. – Você está parecendo um ativista dos direitos humanos. Alex deu um passo à frente com os punhos cerrados. – Raios, Chelsea, isto não é uma brincadeira. – Não estou rindo. Mas não sei aonde quer chegar com isto, Alex. Quer que acredite nesta história sensacionalista e faça o quê? Encoste Treffen na parede ao vivo na televisão? – Garantiria a sua carreira de jornalista séria. – Se fosse verdade. Mas acabaria com minha carreira na AMI e você sabe disso. Além do mais, seria processada. Obrigada, mas não vou fazer parte de sua vingança particular. – Não se trata de mim... – Então por que se importa tanto? Alex não iria contar sobre Sarah. Era pessoal e doloroso demais. – Caso fosse você quem soubesse sobre isso, não se importaria? – perguntou por fim. – Ainda não sei como tomou conhecimento disso. – Austin, o filho de Treffen, foi meu colega de quarto na faculdade. E é um de meus maiores amigos. – E Treffen o deixou a par das sujeiras secretas? –perguntou ela sem se impressionar. – Filho, venha ser cafetão com o papai? – Claro que não. Deixe de ser absurda. – Então o quê? Alex respirou fundo para não perder a paciência. – Austin descobriu. – Como? – quis saber Chelsea. Katy, a irmã de Sarah, o confrontara com a terrível verdade. Mas Alex não meteria Katy na história. – Ele apenas descobriu. – Ora, Alex! Agora quem está pretendendo fazer jornalismo barato? Se eu for fazer isso, preciso de fatos. Evidências. E de uma fonte fidedigna. – Mas você já disse que não vai fazer. Encostar Treffen na parede. – Não. Você não tem bases e não irei atrelar minha carreira a uma hipótese, muito obrigada. – Não é hipótese. É a verdade – disse Alex com firmeza. – Então me mostre evidências concretas – pediu Chelsea. – Por que acha que Treffen se separou da mulher? – Incompatibilidade de gênios. Muita gente se separa ou se divorcia, Alex... – Ele será expulso da firma de advocacia dentro de meses – anunciou Alex. Pelo menos esperava que Hunter tivesse sucesso. Ela deu de ombros. – Todo mundo sabe que Treffen pensa em deixar a firma. Pode se candidatar a senador. – Não vai, não – replicou Alex com voz irada, espantando os dois. As coisas não estavam ocorrendo como desejara. Controle. Precisava reconduzir a conversa para a calma. Trinta segundos se passaram sem que falasse. Por fim respirou fundo e disse: – Uma mulher apresentou fotos para Austin. Chelsea estreitou os olhos. – Fotos? De quem? De Sarah. – De uma das... moças. – Uma das prostitutas? – Chelsea balançou a cabeça sem acreditar. – E como a foto de uma advogada sexy prova alguma coisa? – Era a fotografia de uma das garotas com um cliente da firma, e Treffen a usava para chantagear o homem. Chelsea arqueou as sobrancelhas. – Então, além de cafetão, Treffen é chantagista? Alex aquiesceu com um gesto de cabeça seco. Sabia que parecia incrível. Quase absurdo. Como culpar Chelsea por não acreditar? Ela ficou quieta por muito tempo. Por fim disse: – É uma história muito grande para não ter explodido antes. – Treffen é mais poderoso. – Mas não houve nem mesmo um boato, Alex. Ele sabia que agora deveria lhe contar sobre Sarah. Como ela se atirara do telhado do escritório de Treffen para não continuar vivendo sob o jugo sádico dele. Como Katy trouxera tantas informações horríveis para Austin, condenando não apenas Treffen, mas todas as pessoas que haviam abandonado Sarah. Condenando a ele. As palavras queimavam sua garganta querendo sair, mas ficaram sufocadas. Ele não conseguia. E Alex queria vingar Sarah, mas não levar seu nome à lama. Os tabloides, as fofocas, a mídia. O rosto de Chelsea se suavizou com piedade. – Desculpe, isso significa muito para você, eu sei, mas a entrevista não será sensacionalista. Será jornalismo sério. Não havia motivo para continuar a conversa. – Certo – disse ele, acenando com a cabeça e pegando o paletó. – Creio que terminamos. Ela concordou com os olhos muito abertos. – Também creio. Alex deu meia-volta e partiu em silêncio. No elevador o celular tocou com uma mensagem de Hunter. Precisavam se encontrar. Novas informações. – Raios. Alex deveria se sentir radiante por Hunter cumprir com sua parte no acordo, porém no momento o sucesso do amigo o deixava pior por ter fracassado. Austin expusera Treffen para sua família; Hunter o expulsaria da firma. E Alex? Que diabos estava fazendo de produtivo? ALGUNS DIASdepois Chelsea parou em frente a um dos mais sofisticados salões de baile do Plaza Hotel, onde se celebrava um evento de gala para caridade. Não costumava comparecer a muitos do tipo, porém esse oferecia ajuda para crianças que sofriam abusos e que estavam longe de suas famílias ou de seus benfeitores. Estava sempre interessada em causas que defendiam crianças molestadas. Nem todo abuso parecia abuso. E ela, mais do que ninguém, sabia disso. Como era fácil pensar que a culpa fora sua ou que você desejara aquilo. Entretanto, continuava sendo abuso. Precisava acreditar nisso, mas o problema era que não acreditava. Talvez acreditasse em todas as outras pessoas que sofriam abuso, porém essas regras não se aplicavam a ela. Pelo menos, era assim que se sentia. Parou na soleira da porta e respirou fundo. A multidão ao seu redor a intimidava; eram mais de cem pessoas e ela conhecia muitas delas. Mesmo assim sua respiração estava ofegante, o coração batia forte, e ela via pontos negros diante dos olhos. Maldição. Segurou-se no batente da porta para se equilibrar. Seja forte. Então seu olhar se deteve em um dos homens presentes que era mais do que um simples conhecido. Mas que continuava sendo um estranho. Alex Diaz. Tola e inexplicavelmente Chelsea se sentiu melhor sem entender por quê. Saber que ele estava ali a acalmava. Era um mistério. Tentara se esquecer das mãos dele em seu corpo e da reação que só tivera com Alex. Tentava não pensar nisso nos últimos três dias. Mas não estava dando certo. Entretanto, não importava como se sentia ou deixava de se sentir. Suspeitava que Alex só dormira com ela para falar sobre Treffen. Talvez pensasse que uma conversinha açucarada fosse convencê-la a ajudá-lo. Chelsea estava satisfeita por não ter concordado, mesmo que a ideia de ter sido usada por ele a afligisse. Por outro lado, uma parte de seu íntimo dizia que ele não a usara. Afinal, um usara o outro. E prazerosamente. Contudo, a paixão de Alex fora real. A intimidade, por mais que houvesse sido torturante, fora real. Não? Ou será que ela desaprendera a julgar as pessoas? Afinal, estava muito emotiva. Respirou fundo e avançou no salão. Passou a hora seguinte se movimentando, mantendo um olho em Alex, em parte querendo se aproximar após o encontro sexual, em parte tentando evitá-lo, e querendo também que fosse ele a se aproximar, o que eram muitos desejos ao mesmo tempo. Mas ela o evitou. Mesmo assim estava consciente de sua presença a cada instante e sabia onde Alex estava sem precisar olhar. De repente, com o canto do olho, viu a expressão dele mudar de afável para tensa e furiosa. Alex nem disfarçava. Pelo menos não para ela, que podia sentir seu ódio a metros de distância e ver seus dentes e punhos cerrados. Seguiu o olhar de Alex e viu quem ele fitava: Jason Treffen. Treffen estava muito distinto, com as luzes incidindo sobre os cabelos prateados. Sorria para um grupo de bajuladores que o cercavam, porém Chelsea notou que seus olhos azuis eram sagazes. Bem, era um advogado, afinal. Porém, era o olhar de Alex que a fazia pensar. Recusara-se a conversar sobre Treffen com ele por muitos motivos, mas principalmente porque a ideia de trabalhar com Alex era alarmante. Estava muito vulnerável para ser sua parceira naquele plano. Não faria jornalismo barato. E Chelsea se recusava a acreditar nas coisas horríveis que ele dissera sobre Treffen. Ela o escolhera para sua primeira entrevista séria porque admirava seu trabalho em defesa das mulheres e acreditava firmemente no que ele fazia. Não podia ser um cafetão e chantagista. Mas era ingênuo pensar assim porque sabia como a humanidade podia decair. Inclusive ela. Quem sabe devesse considerar a possibilidade de Alex ter razão. Erguendo os ombros, se aproximou de Treffen. – Ah, Chelsea, minha entrevistadora favorita – saudou ele com a voz possante e bem treinada na oratória. Trocaram beijos leves nas faces. Alguns dos bajuladores se afastaram e Chelsea sorriu de modo radiante. – Soube que deseja impor regras na entrevista. – Apenas precaução. – Ele estreitou os olhos, porém não deixou de sorrir. – Pensei que fôssemos amigos. – Tenho uma reputação a proteger – retrucou Treffen com afabilidade, mas firmeza. – Não sabia que sua reputação estava em jogo – disse Chelsea desafiadoramente. – É praticamente um santo. – Arqueou as sobrancelhas, sorrindo de modo atraente. – A menos que esconda algo? Algum grande segredo obscuro? – concluiu, rindo como se fosse uma brincadeira. Treffen enrijeceu por um segundo. Depois riu também do modo paternalista como os homens velhos faziam com os mais jovens, e que Chelsea detestava. – Muito engraçado, Chelsea. – Balançou um dedo na sua frente. – Muito engraçado. Mas isso não dava a ela nenhuma pista, e ele continuava querendo que um advogado comparecesse à reunião. Fitando os olhos frios de Treffen, de repente Chelsea teve certeza de que ele escondia algo. E que Alex podia estar certo. Sempre sorrindo como se tudo fosse muito engraçado, ela deu um passo atrás sabendo que Alex a observava. Virou-se e o viu fitando-a com intensidade. Chelsea caminhou na direção oposta. Não queria deixar Treffen com suspeitas. E também tinha receio de conversar com Alex. Controle-se, Chelsea. Foi apenas sexo. Pense na sua carreira. Afastando as emoções, minutos depois, ela o procurou junto ao bar. – Creio que talvez você tenha razão, Alex. – Quer dizer... – Sabe o quero dizer – murmurou, continuando a caminhar. Todos se sentavam para o início do leilão de caridade, e Chelsea ocupou um lugar nos fundos, examinando o catálogo de ofertas. Ela doara um fim de semana em um spa no Arizona e um jantar para dois no Le Bernardin como fazia todos os anos. O leilão principiou e ela observou dois executivos gordos disputarem um camarote VIP para um jogo da NBA, Associação de Basquete Nacional. O vencedor deu vinte mil dólares. O próximo item foi um jantar para oito pessoas preparado por um famoso chef. Chelsea jamais dava lances. Não tinha amigos verdadeiros para levar a um jantar, ao spa ou a um jogo. Pensou em Louise, porém não estava pronta para muita intimidade com a irmã. Tudo ainda entre as duas era estranho e doloroso. Talvez pudesse convidar Michael, porém a amizade entre os dois era mais voltada ao trabalho. E não havia mais ninguém, percebeu com certa tristeza. Até então sempre fora feliz com sua independência e liberdade. E não pensava muito na solidão. Nos últimos dez anos dizia a si mesma que tinha tudo que queria. Dinheiro, fama, um lindo apartamento, roupas caras e um trabalho satisfatório... quase sempre. Contudo agora... será que desejava um relacionamento? Alguém na sua vida que fosse importante? Que se importasse com ela só um pouquinho? E... o principal... a conhecesse... a verdadeira Chelsea... só um pouquinho? Será que se sentia assim de verdade? Teria Alex plantado esse desejo em seu coração? O pensamento era novo e indesejável. Relacionamentos eram arriscados; intimidade significava perigo. Chelsea tinha muitos segredos para manter. Aceitara isso como o preço para recomeçar; porém, de súbito, queria ser sincera com alguém. Foi sincera com Alex quando ele a fez alcançar o clímax mais soberbo da sua vida. Não quis ser sincera, mas foi. Instintivamente seu olhar percorreu o ambiente, e ela viu Alex de pernas esticadas na segunda fila. Fazia um lance de dez mil dólares, e Chelsea procurou no catálogo o item em questão. Uma Noite Com a Família? Um passeio pela cidade em ônibus particular de dois andares e entradas VIPs para o circo Big Apple. Que diabos Alex faria com isso? Chelsea percebeu que, embora ela não tivesse amigos, ele poderia ter. Quem sabe tinha irmãos e sobrinhos e fosse um tio amoroso. Ou daria de presente para alguém com família. Ou iria com alguma garota sensual do trabalho. Uma dor aguda atingiu o coração de Chelsea, que perdeu o fôlego. Não podia ser ciúme. Jamais sentira ciúme de um homem por sair com outra mulher. – Vendido para o número 17! Surpresa, ela viu Alex se virar e sorrir em sua direção. O que era aquilo? Descobriu assim que o leilão terminou. Alex caminhou em sua direção, deixando-a ansiosa. – Sabe que não devemos ser vistos juntos – murmurou ela, quando Alex parou na sua frente, fazendo seu coração bater mais forte com seu físico musculoso e poderoso. Ficou trêmula ao olhar para seus olhos dourados. – Quer dizer, por causa de Treffen? – Não quero que ele suspeite, e de qualquer modo não sei se acredito... – Treffen partiu antes do final do leilão. – Oh. – Chelsea franziu a testa. – Por que faria isso? – Está limitando suas aparições em público no momento. Quer evitar coisas desagradáveis. – Deu um passo à frente. – Então, o que a fez mudar de ideia? – Na verdade, não mudei de ideia. Ainda não, mas falei com Treffen. Posso afirmar que esconde algo, porém preciso de provas. – Sei que precisa, Chelsea. Mas não vim até aqui falar de Treffen. Surpresa e satisfação a dominaram. Não devia acreditar nele, porém queria. Desejava que houvesse mais entre os dois além de Treffen. – Não? Ele balançou a cabeça e esboçou seu meio-sorriso. – Não. Vim aqui – continuou Alex – convidá-la para ir ao circo comigo. Ela ficou em silêncio, chocada. Alex a estava convidando para um encontro? – Circo? – repetiu. – Por quê? Ele deu de ombros. – Porque é divertido? Porque tenho ingressos? – Aproximou-se mais. – Porque quero ir com você? – Qual é a razão? – perguntou ela estupidamente e ainda com o cérebro girando. Alex a fitou por um momento e depois disse: – Quero vê-la de novo. – Sua voz era rouca. – De modo adequado. Contudo, Chelsea não tinha encontros, nunca. E nem ele. Balançou a cabeça tentando evitar o desejo não só por ele, mas por um encontro inocente que a faria passar algum tempo ao seu lado. – Não saio socialmente – murmurou. – Existe sempre uma primeira vez. – Não sabia que você fazia isso, Alex. – Como disse, há sempre uma primeira vez. – E nós não damos bis – insistiu ela. – De vez em quando me concedo uma exceção. – Alex inclinou a cabeça. – Está com medo? – Claro que não! – Foi a vez de Chelsea sacudir a cabeça. – Então prove e vá ao circo comigo. – Não preciso provar nada para você, Alex. Esta tática não funciona mais. – Movimentou a cabeça com mais ímpeto ainda. – Então me diga a verdadeira razão para não sair comigo. Tem medo de palhaços? Ela sorriu, temendo ser fraca. Por que toda emoção parecia fraqueza? Porque você sabe aonde esse encontro irá acabar. – De fato, acho palhaços um pouco assustadores – respondeu ela de bom humor. – Porém, não seria esse o problema. – Então o quê? – quis saber ele. O que responder? Jamais um homem fora tão insistente e determinado não apenas em levá-la para a cama, mas para estar com ela. Será que Alex Diaz desejava mesmo sua companhia? E no circo? – É por causa de Treffen? – perguntou ela. – Para podermos ter um lugar para conversar? – Não. Quero sair com você – respondeu ele com uma simplicidade que chegava a ser assustadora. – Por que está fazendo uma exceção? – Por sua causa. – O olhar era quente e o sorriso, lento. – Você vale a pena. A declaração tão simples a deixou nas nuvens. Ou com vontade de chorar. O que havia de errado com ela? Por que Alex Diaz mexia tanto com ela levandoa da frieza à emoção? – Dormiu comigo só para ganhar minha confiança por causa de Treffen? – perguntou de supetão. Detestava perguntar isso, porém precisava saber. E esperava que Alex dissesse a verdade. Ele arqueou as sobrancelhas. – Não parece muito confiante, Chelsea. Portanto, se esse era meu objetivo, falhei. Agora não se trata de Treffen. É sobre... nós. Esse conceito era novo. Nós. As palavras não foram fáceis, e ela acreditou. Os olhos dourados dele a fixaram. – Só quero um simples encontro – insistiu ele, erguendo as mãos e sorrindo. – Acredite em mim. Chelsea sentiu alívio e decepção, sem saber que sentimento prevalecia. Será que esperara uma declaração de amor? Claro que não. – Um encontro. Porque ainda não terminamos, mesmo que você queira se convencer disso – declarou ele. – Que atraente. – Ela disfarçou porque a franqueza dele a desarmava e a ironia era sua única defesa. – Acha que sabe mais o que quero do que eu mesma. – Sabe o que quer, mas não admite. Diga não, Chelsea ordenou a si mesma. Não tem encontros inocentes. Nunca. – Por favor, Chelsea. Gosto quando pede “por favor”. Mas dessa vez não se tratava de controle. Nada de pontos a ganhar. Diga não. Salve-se. – Está bem – respondeu ela, sentindose mergulhar no desconhecido... perigoso. CAPÍTULO 7 QUATRO mais tarde Chelsea entrou em uma das salas de reuniões da AMI onde Jason Treffen e seu astuto advogado aguardavam. Um advogado precisando de outro, pensou Chelsea cinicamente, imaginando quanto Treffen tinha a esconder. Ainda não podia acreditar que fosse um cafetão ou chantagista. Esperava que Alex estivesse errado. De alguma forma. Grande erro. Jason se levantou ao vê-la, sorrindo e DIAS estendendo a mão manicurada. Para um homem de 60 anos, refletiu Chelsea, era muito atraente com os cabelos grisalhos, olhos azuis e rugas que lhe traziam dignidade e acentuavam o queixo forte. Seu advogado, por outro lado, era como ela imaginara: vestido com ostentação, tinha um rosto de fuinha, e usava muito perfume. – Que bom revê-lo, Jason – disse ela, apertando a mão dele com uma firmeza que o fez arquear as sobrancelhas. Suspeitaria dela? Ou estava acostumado com mulheres fracas que ajudava por caridade? Vítimas? Chelsea não era desse tipo. Ela se sentou junto a Michael, que já murmurara suas saudações, enquanto uma assistente trazia café e bolinhos que ninguém aceitaria. – Então – Chelsea cruzou as mãos sobre a mesa e sorriu de modo profissional para Treffen –, queria me mostrar algumas perguntas? O advogado dele abriu a pasta com gesto exagerado e retirou uma folha de papel que passou para Chelsea. Ela leu rapidamente com aborrecimento; as perguntas ali incluídas tornariam a entrevista muito sem graça. Maçante. Desinteressante. E davam todo o controle para Treffen. Qual é o ponto alto de sua carreira? O que o fez decidir ajudar a causa das mulheres? Nenhuma controvérsia ou interesse, apenas uma plataforma para Treffen exibir seus bons trabalhos. E durante sessenta minutos no horário nobre. Chelsea queria explorar algumas das escolhas polêmicas de Treffen, como oferecer seus serviços legais de graça para uma criminosa que matara um homem. Uma pesquisa mais profunda mostrara que a mulher sofrera abusos do namorado durante anos. Treffen vencera o caso. Entretanto, nenhuma das perguntas mencionava seus casos polêmicos. Chelsea entregou o papel para Michael, sempre sorrindo. – É um começo – disse. – E um fim, srta. Maxwell – retrucou o advogado com certo desdém. Boa escolha, Treffen, pensou Chelsea. Está bem representado. Fitou Treffen. – Uma entrevista apenas falando dos pontos altos de sua carreira não atrairá os telespectadores. – O sr. Treffen não quer participar de suas novelas chorosas – replicou o advogado. – Não irá soluçar no seu sofá. – Eric – alertou Treffen com delicadeza, mas em tom frio, sorrindo para Chelsea, que sentiu um arrepio. Será que começava a acreditar em Alex? Esse defensor das mulheres seria mesmo um cafetão? Costumava pensar que, caso Treffen tivesse sido seu chefe dez anos antes em vez de Brian Taylor, talvez ela não precisasse ter feito cirurgia plástica no rosto nem ter uma enorme cicatriz no seio. Uma cicatriz que Alex vira. Entretanto, Treffen talvez tivesse sido pior que Taylor. Talvez ela tivesse que se prostituir para muitos homens em vez de um só. – Deve entender, srta. Maxwell – disse Treffen muito meloso –, que sou um advogado respeitável e defensor dos direitos humanos. Concordei com essa entrevista porque gostaria de ampliar minha plataforma para as causas que ajudo há muitos anos. – Alargou o sorriso para ela. – E, é claro, será uma grande oportunidade para a senhorita. Chelsea foi invadida pela raiva, e o encarou com esforço. A indireta era clara. Concordar com a entrevista fora outro gesto magnânimo dele. – E sei que pode entender minha posição, Jason. Não sou um palanque para discursos. – Chelsea... – murmurou Michael, e ela respirou fundo. Não importava o que Alex queria; estava falando da sua carreira agora. Por que pôr tudo a perder? A entrevista com Treffen era sua chance de ser vista como alguém de valor, e não apenas a suposta amante de Michael que não merecia um programa sério. Porém, não seria usada por nenhum homem, nem mesmo Jason Treffen. E que tal Alex? Não, ele não a usara. Sim, ele a possuíra, a levara a um clímax divino, mas Chelsea não se sentira usada, apenas dolorosa e terrivelmente exposta. – Entendi, srta. Maxwell. – Treffen ainda sorria, enquanto seus olhos pareciam de aço. – Não esperava outra coisa da senhorita. Porém, essas são as únicas perguntas que pretendo responder se me quiser no seu programa, e deverá assinar um acordo legal prometendo se ater ao roteiro. – Minhas entrevistas não têm roteiros programados. – Escolhi mal a palavra – concordou Treffen. – Porém, mesmo assim, quero manter essas perguntas. – Parte do atrativo de uma entrevista franca é ver até onde a conversa alcança – replicou Chelsea com voz amável. Não valia a pena irritar Treffen ainda mais. – É preciso um diálogo de verdade, não perguntas e respostas ensaiadas. Eric se debruçou sobre a mesa com um sorriso antipático, porém Treffen o segurou pelo braço, estreitando os olhos para Chelsea. – Acha que seus métodos de entrevista são assim francos, srta. Maxwell? Já assisti e admiro o modo como manipula seus entrevistados e como os guia sem que eles percebam. E possui certo charme diante das câmeras, não? Já fazia isso quando era a garota do tempo no Alabama. A voz dele continuava amigável, mas Chelsea sentiu uma garra de gelo percorrer sua espinha dorsal. Pontos negros surgiram diante de seus olhos. Não teria um ataque de pânico ali, mas percebeu que Treffen conhecia seu passado, e a náusea a dominou. – É uma qualidade admirável – prosseguiu ele com voz macia. – Manipular as pessoas sem que percebam. Mas, infelizmente, isso não consta da minha agenda. E o que constava? Expô-la? Estaria de fato ameaçando divulgar seu passado se ela não obedecesse ao seu esquema? Alguém capaz de chantagem assim sutil era capaz de muito mais, refletiu Chelsea. Como Alex dissera. – O que tem na sua agenda, Jason? – perguntou, quando sentiu que a voz sairia firme. Os olhos dele brilharam de raiva antes que sorrisse e estendesse as mãos. – De novo escolhi mal a palavra. Não tenho agenda, srta. Maxwell. Mas prezo minha reputação ao mencionar as muitas mulheres que ajudei e as caridades que realizo; portanto, se deseja a entrevista comigo, irá fazer apenas as perguntas que desejo. Chelsea sabia que falava sério. – Raios, Chelsea – exclamou Michael, quando Treffen e o advogado foram embora. – Por que o irritou? Pensei que estava louca por essa entrevista. Ela atirou a folha com as perguntas no lixo. – Ele se irrita com pouco. Ainda tremia ao pensar que Treffen conhecia seu passado e de onde viera. O que fizera. Como descobrira? E por quê? Será que seu próprio passado sórdido seria um escudo protetor para Jason Treffen? Voltou-se para Michael. – Não serei usada por ninguém, nem por Treffen. – Ele pesquisou ao seu respeito – replicou Michael. – Não o irrite demais. – Ou o grande ativista dos direitos humanos irá me destruir? – Tentou parecer displicente, mas no íntimo estava apavorada. – Ele tem o poder de arruinar carreiras – disse Michael com serenidade –, assim como o poder de construí-las. – Sei disso. – Ele podia arruiná-la, refletiu Chelsea, embora isso ainda parecesse engraçado e impossível. Jason Treffen. O defensor das mulheres. Ou não. – Que perguntas quer lhe fazer que não estão na lista? – perguntou Michael. – Só não quero ser controlada. – Chelsea não contaria a Michael sobre as suspeitas de Alex. Não até ter mais provas. Talvez nunca. Michael era seu amigo, mas seu chefe também, e duvidava que quisesse colocar a rede de televisão em posição vulnerável. E isso aconteceria se fizesse o que Alex sugeria e confrontasse Treffen ao vivo na televisão. Só esse pensamento a fez suar. Loucura. Sua carreira seria arruinada e seu programa também. Poderia entrar para sempre na lista negra e nunca mais obter emprego na televisão. E para quê? – Mas vai assinar o acordo, não vai? – quis saber Michael. Ela fitou a lista amassada no lixo. – Não sei. – Ele não dará a entrevista a não ser que você assine. Chelsea deu de ombros tentando permanecer calma. – Talvez possamos entrar em um acordo. – Acha? Ela sorriu percebendo o ceticismo de Michael, e se sentindo nervosa por dentro. – Provavelmente não, mas posso tentar. Ainda temos cinco semanas. – Só você pode conseguir isso. Se fosse outra pessoa a dizer isso poderia ser da boca para fora, mas Chelsea sabia que Michael falava com sinceridade. Já confiara nela antes. Quando soubera que era uma estagiária sem salário na AMI com 22 anos, trabalhando também à noite em uma lanchonete barata para se sustentar. Certa vez, quando o âncora do jornal da noite fora embora, Chelsea ficara à frente das câmeras e fingira apresentar o programa. Caminhando pelo estúdio deserto, Michael a vira. Ficara observando por muito tempo nas sombras, e quando, por fim, surgira, Chelsea não se desculpara pelo pequeno show. Michael rira e lhe oferecera uma pequena participação no noticiário da manhã. Fora o começo, e seis anos depois Chelsea estreava o Bate-Papo com Chelsea, que em um ano se transformara em enorme sucesso. E todos pensavam que era porque dormira com Michael. Ela brincava com ele sobre isso, e Michael apenas balançava a cabeça com tristeza. Ele tinha um coração de manteiga e se preocupava demais com Chelsea, porém não conhecia toda a sua história. Ninguém conhecia. Alguns conheciam partes. Louise sabia sobre sua infância; Brian Taylor sabia... e ajudara... na sua queda na estação local de notícias de Huntsville, Alabama, onde Chelsea começara como garota do tempo aos 19 anos. Michael soubera que estava desesperada e louca para esquecer um homem. Os cirurgiões no Huntsville Hospital sabiam como seu nariz ficara dilacerado, e como ela quase morrera com a perda de sangue provocada pela facada que quase decepara seu seio. Porém, ninguém a não ser ela mesma conhecia toda a sórdida história. Será que Treffen conhecia também? QUATRO DIAS após convidar Chelsea para ir ao circo Alex foi se encontrar com Austin e Hunter em um bar. Hunter lhe deixara uma mensagem dizendo que haveria uma outra pessoa com ele. Alguém que poderia ajudar a derrubar Treffen, mas Alex não fazia ideia de quem seria. Austin estava sentado vendo as mensagens no celular, quando Alex entrou no bar. – Quem é a pessoa que Hunter quer que conheçamos? – perguntou para Austin. O amigo deu de ombros. – Não sei. Alguém importante. – Ergueu os olhos do celular. – Como vão as coisas com Chelsea Maxwell? – Bem. – Pode dar mais detalhes? Alex pediu um uísque. Sabia que Austin esperava resultados, como ele. – Ela embarcou na proposta. Só precisa de provas. – Que tal as fotos de Sarah? Alex cerrou os dentes. Não queria mostrar as fotos nem para Chelsea nem para ninguém. – Refiro-me a alguém que possa respaldar o que Katy disse... – A palavra de Katy não é suficiente? Alex ergueu uma mão. – Calma, Austin, sei que vocês dois estão de namorico, mas precisamos ser profissionais. A última coisa de que precisamos é responder a um processo, botando por terra as acusações contra seu pai. Austin relaxou. – Sei disso, e é mais que um namorico, Alex. – Sorriu de leve. – Eu a amo. Alex conteve a impaciência. – Certo, fico feliz pelos dois. – Hunter chegou – avisou Austin. Alex se virou para ver Hunter com uma morena elegante e com ar profissional. Seu jeito frio e sofisticado o lembrou um pouco de Chelsea. A moça apertou as mãos dos dois. – Sou Zoe Brook. – A rainha do setor de Relações Públicas em Nova York – disse Alex, imaginando por que Hunter a trouxera. O que Zoe Brook tinha a ver com Treffen? Austin parecia estar se perguntando a mesma coisa. – Se me desculpa a impertinência, o que faz aqui? Hunter fitou Zoe, e Alex viu em seus olhos a adoração. Como se o amigo... a amasse. E, absurdamente, pensou em Chelsea. Porque Chelsea era a última pessoa em quem pensaria sobre amor. Podia tê-la convidado para sair, explorar a atração intensa entre os dois, mas não era amor, nem mesmo um relacionamento. Era sexo... e o circo. Alex ainda não conseguia definir se a queria mais por causa do plano e para tê-la do seu lado contra Treffen ou se apenas a queria. Ela o fascinava. Ria do seu jeito duro e mandão, e quase o enlouquecera na cama. Mas, além disso... – Seu pai é um cafetão – disse Zoe para Austin, que enrijeceu embora todos soubessem disso. Ela passeou o olhar gelado pela mesa. – Hunter me garantiu que nunca foi chantageado por Treffen. E quanto a vocês dois? – perguntou com expressão sagaz. De súbito Alex fez um reconhecimento. Zoe falava por experiência própria. Como Sarah. Mal acreditava que essa mulher tivesse sido vítima de Treffen, porém via a amargura em seu olhar. Aí estava a prova decisiva... de que Chelsea necessitava. – Precisa contar sua história, Zoe – disse Alex. – As garotas de programa. A chantagem com todos os clientes. O mundo precisa saber a verdade sobre esse homem. – Concordo – retrucou Zoe friamente –, porém não posso. – Mas o testemunho de uma vítima... – retrucou Alex frustrado. – Fui sua vítima por tempo demais – interrompeu Zoe sem emoção. – Não serei de novo. Então Alex tinha razão. Zoe fora uma das garotas de programa como Sarah. Era o que ele precisava. O que Chelsea precisava. – Compreendo – murmurou ele. – Verdade? – replicou ela como se trocassem amenidades em uma festa. – Gostaria de convencê-la... Hunter o interrompeu com fúria, erguendo a mão. – Chega. – Sua voz era implacável, e Alex soube que não conseguiria nada dele nem de Zoe nessa noite. Porém, se convencesse Zoe... convenceria Chelsea. Poderia derrubar Treffen. Entretanto, obedeceu, percebendo o quanto Hunter se importava com Zoe. – Vamos falar de estratégia? – sugeriu Zoe com calma. Alex concordou. Sim, podiam confabular sobre como tirar Treffen da firma, mas não resolvia seu problema, pois para isso agora sabia que precisava de Zoe. No momento certo a convenceria a cooperar. Ainda pensava em Zoe... e Chelsea... tarde da noite, quando entrou em seu apartamento em um armazém reformado às margens do Hudson. O luar entrava pelas janelas e ele se deteve em frente a uma série de fotografias que Sarah tirara ao longo dos anos. Fora uma fotógrafa amadora de talento. Só depois de sua morte Alex percebera como suas fotos haviam se tornado sombrias. Na faculdade tirara fotos de cães, crianças e cerejeiras em flor. Mas aos poucos o trabalho fora ficando contemplativo, e Sarah retratava pessoas sozinhas vagando pelo Central Park ou inclinadas sobre uma xícara de café. As fotos finais eram cheias de angústia: uma criança chorando no parque, uma mulher sem-teto sentada na calçada com os braços marcados em volta dos joelhos. Porém, Alex não notara essa mudança. Na verdade, só passara a dar importância às fotos de Sarah depois de sua morte. Mas olhando para elas agora – Alex emoldurara as melhores fotos pendurando no seu apartamento – sentiu que Sarah desejara mandar uma mensagem mesmo subconscientemente. Como essas pessoas estou presa, só e amedrontada. Ajude-me. Alex fechou os olhos diante da emoção indesejada. Podia ajudar agora, vingar Sarah da única maneira possível: arruinando Treffen. E Chelsea poderia ajudar também, precisava ajudar... fosse qual fosse o preço para ela, para ele... para ambos. CAPÍTULO 8 O usar para ir ao circo? Seu guarda-roupa tradicional de saias justas e blusas clássicas não era apropriado, mas Chelsea não sabia se vestir de modo casual, a não ser às vezes, dentro de seu apartamento. Com as cortinas fechadas podia se enfiar em um pijama amarfanhado, mas só se estivesse de muito baixo astral. Mesmo sozinha se mantinha bem penteada; era como uma armadura. Possuía dois conjuntos de calça de cetim QUE que serviam para um coquetel. Mas não para ir ao circo. Por fim se decidiu por um jeans justo, um suéter de gola alta de cashmere cor de cereja e botas marrons de cano alto. Era um traje que um estilista providenciara no último outono para sua aparição no Central Park em um evento de caridade destinado a crianças molestadas. Depois Chelsea nunca mais o usara. Fez um rabo de cavalo e maquiagem leve e básica: delineador, pó dourado, blush e brilho labial. Difícil acreditar que chegara a se maquiar como um palhaço, usar muito spray nos cabelos e vestir conjuntos muito apertados, baratos e rosa-choque. Naquela época fora outra pessoa. Nem mesmo uma pessoa, mas uma concha vazia, uma morta-viva. E continua vazia. Só se veste um pouco melhor. Afastou o pensamento que continuou a importuná-la como uma nuvem no horizonte ameaçando estragar a noite e o encontro com Alex. Pensara sobre esse encontro toda a semana. Por três vezes tentara mandar uma mensagem para Alex cancelando covardemente. Porém desistira porque desejava muito ir. Vê-lo, flertar, se divertir. Quando fora a última vez que se divertira de verdade, e não apenas fingira? Quando tinha sido feliz? Que desaparecessem a cobertura, a carreira de sucesso, o dinheiro e a fama. Não era feliz há muito tempo. A constatação não surpreendia, mas magoava. Trabalhara tanto e se sacrificara para isso? A solidão, o vazio e o medo? Bem, essa noite seria feliz. Flertaria com Alex, riria dos palhaços e que tudo o mais fosse para o inferno. O interfone tocou, e minutos depois Alex estava no seu apartamento, usando jeans desbotado e camisa aberta com uma camiseta cinza por baixo. Os cabelos estavam levemente despenteados, e seu queixo exibia uma sexy e leve sombra de barba de fim de tarde. Chelsea prendeu o fôlego. Sentia-se nua e ele nem mesmo a tocara. Nem mesmo dissera “olá”. – Olá, Chelsea – saudou ele com sua voz rouca e profunda que a fazia corar e ferver. – Olá – respondeu ela, limpando a garganta e detestando o nervosismo que sentia. E tinha certeza de que Alex sabia que estava nervosa pelo seu sorriso disfarçado. Pegou a jaqueta vermelha que comprara para combinar com o resto da vesti menta. Chelsea Maxwell com Roupas Casuais. – Gostei do vermelho – disse Alex, apertando o botão do elevador. – É uma mudança do preto e branco. Ela o fitou de esguelha. – Também uso cinza, muito obrigada. E de vez em quando, cor-de-rosa pálido. – Grande variedade de cores – afirmou ele, quando as portas do elevador se abriram. – Mas prefiro o vermelho. Ela não respondeu e não falaram mais até chegarem à rua com o vento frio e cortante. Chelsea fitou o ônibus de dois andares parado na frente do prédio, e perguntou: – Fala sério? – É maravilhoso – respondeu Alex animado. – Não imagina como é por dentro. – Um ônibus falso? – Venha ver. Ele colocou as mãos nas costas dela e a conduziu, tudo parecendo muito certo. Era assim que gente normal e emocionalmente ajustada procedia. Encontros. Risadas. Toques. Ela nunca fizera isso... apenas sexo ou nada mais, e tinha certeza de que era o mesmo com Alex. Mas essa noite seria diferente. – Céus – murmurou Chelsea ao entrar no ônibus. Os assentos haviam sido retirados e substituídos por sofás vermelhos e cor púrpura, e a escada espiral que levava ao topo fora pintada com tinta fluorescente. Alex encheu duas faças com o champanhe que estava ali em um balde de gelo, e Chelsea aceitou depois de breve hesitação. Não costumava beber, mas nessa noite queria relaxar um pouco e ser menos rígida. E depois voltará a ser a mulher de sempre? É o que quer? Uma noite de liberdade e talvez de felicidade sendo outra pessoa para depois voltar à controladora e fria Chelsea Maxwell? Ela ergueu a taça. – Saúde – disse, tomando um longo gole. Alex brindou, encostando sua taça à dela. – A uma única noite fantástica. Vamos subir. Enquanto subiam com a mão de Alex nas suas costas, Chelsea refletiu o que significaria única noite. Nenhum bis? Nenhuma promessa? Deveria se sentir aliviada, e não desapontada. Alex dissera que seria apenas um encontro. Explicara que não costumava agir assim, mas acrescentara que ainda não acabara. O que significava que um dia acabaria com ela. Quem sabe esta noite. Mas, afinal, ela não estava procurando por contos de fadas. Estava? Claro que não. Como Alex, ainda não acabara, e como ele terminaria... um dia, em breve. O ar frio os atingiu no topo do ônibus que seguia devagar. Mesmo assim o vento fustigava o rosto dela. – Aqui deve ser melhor no verão – comentou Alex, dirigindo-se com Chelsea para o gradil. – Porém, eu não queria esperar. – Manhattan é sempre linda em qualquer estação, mas vamos congelar aqui. Deixaram o parque e agora desciam a Fifth Avenue com suas butiques iluminadas. Chelsea fincou os cotovelos no gradil e tomou mais champanhe, confessando: – Jamais vi a cidade do alto de um ônibus. – Nunca fez turismo em um ônibus da Big Apple? – Não. – Aposto que nunca subiu na Estátua da Liberdade nem no Empire State Bulding – murmurou Alex. Ela balançou a cabeça e ele também, fingindo uma pena que a fez sorrir. – Ellis Island? – Não e não. – Times Square? – Evito. – Aposto que fez as visitas clássicas ao MoMA e ao Metropolitan. – Só fui a festas ali. – Chelsea mentiu. Assim que se mudara para Nova York, sem dinheiro e com as cicatrizes ainda vermelhas, passara muito tempo no Jardim Chinês do Met, um oásis de calma na cidade e em sua vida. Ainda ia lá algumas vezes quando precisava se recompor. – Vejo que tenho uma missão – declarou Alex. Debruçou-se no gradil, tocando o ombro dela. – Mostrar para você a Nova York dos turistas. – Parece divertido. – Ver todos os lugares prosaicos e tolos com Alex, rir, brincar. De repente Chelsea desejou muito fazer isso... com ele. – Já fez todos os passeios turísticos? – A maioria dos nova-iorquinos nunca faz. Mas agora que tenho um motivo farei. Fiz um passeio com a escola na Estátua da Liberdade quando criança. – Isso não vale. – Por que não? Subi todos aqueles degraus. – Do jeito que fala pensei que ia à Ellis Island um fim de semana sim e outro não – Talvez eu faça isso agora que tenho um motivo. Fitaram-se, e por um momento a cidade e suas luzes desaparecerem, restando apenas o enorme magnetismo que sentiam um pelo outro. Chelsea foi a primeira a desviar o olhar. – Já deixou a cidade? Morou em outro lugar? – perguntou por fim em tom calmo. – Quatro anos em Boston na universidade. Apenas isso. – Sim, Harvard – murmurou Chelsea. – Isso mesmo. – Com o filho de Treffen. – Sim. – Como ele descobriu sobre o pai? Presumindo, é claro, que existisse algo a descobrir. – Ainda duvida de mim, Chelsea? – Não exatamente. – Ela o fitou com franqueza. – Mas é tudo muito difícil de assimilar. Acreditar. E, sinceramente, preferiria não acreditar. – Compreendo. – Então, como ele descobriu? Alex endireitou os ombros, fitou a Fifth Avenue e o Empire State Building, que parecia uma vela iluminada em meio à escuridão, e respondeu: – A irmã de uma das vítimas se apresentou. Sei que precisamos falar sobre Treffen e que você precisa de provas. Pode ser que lhe apresente uma em breve, mas esta noite... Vamos apenas nos divertir no circo. – Gosta mesmo do circo, não? – Ela sorriu com o coração acelerado em um misto de dor e animação. – Nunca fui lá quando criança. Ela sentiu pena sem saber por quê. E nem queria saber. – Certo, chega de falar de Treffen hoje. Ele sorriu e voltou a fitar o cenário de luzes da cidade. – Então você é do Alabama. Cresceu em uma grande plantação sulista? Claro que não, mas Chelsea não iria admitir. – Minha infância foi mais simples. – Uma educação feliz no sul – disse Alex, e Chelsea levou um minuto para perceber que ele citava sua biografia insossa e totalmente fictícia. – Você falou de seu pai em uma de suas entrevistas – prosseguiu Alex. – Fiquei com inveja. Parecia um grande sujeito. Chelsea ficou gelada. Ocasionalmente citava seu passado fictício no programa; era inevitável quando as celebridades lhe faziam perguntas, e sempre era bom para aumentar o índice de audiência. Chelsea inventara um pai que a levava aos jogos de futebol e a carregava nos ombros. Também tinha uma mãe que trabalhava meio período como advogada, mas ficava muito em casa assando bolos. E ocasionalmente os repórteres tentavam cavar mais fundo, e chegaram a criar um escândalo alegando que ela não se dava com os pais, o que, em parte, era verdade. – Não sabia que assistia ao meu programa – comentou, quando seu cérebro voltou a funcionar. Alex deu de ombros. – Assisti alguns on-line. – E por que sentiu inveja de mim? – Meu pai nunca esteve ao meu lado. Jamais o conheci. Alex afastou o rosto, e Chelsea sentiu que falara mais do que desejara. A emoção a dominou e as palavras ficaram presas em sua garganta porque desejava lhe dizer que sabia como ele se sentia, mas é claro que não podia fazer isso. Alex pensava que ela tivera um pai amoroso, e Chelsea também não conhecera o seu. Nem sabia seu nome. – Lamento – murmurou ela, e Alex deu de ombros de novo. – Bem, não se sente falta do que nunca se teve, não é? – Creio que você sente – retrucou ela. Sem dúvida ela sentia falta da infância que nunca tivera. Uma casa com quintal e um balanço. Um papai. Segurança, felicidade e apenas pequenas coisas com que se preocupar, como o que haveria para o lanche ou se o dever de casa era difícil. Nada de se preocupar se haveria o que comer ou se o namorado de sua mãe iria acordá-la no meio da noite com a mão sob sua camisola. – Pode ser – concordou Alex. – Costumava pensar em meu pai surgindo um belo dia e dizendo que sempre pensara em mim. – Balançou a cabeça. – Isso nunca aconteceu. E nem poderia. – Por que não? – perguntou Chelsea com doçura, embora pudesse imaginar. Um pai desaparecia porque não amava a família. Porque esposa e filhos... não era motivo suficiente para ficar. – Ele era casado com outra – explicou Alex. Chelsea piscou diversas vezes. – Oh. – Sim. – Ele sorriu e seus dentes brilharam no escuro. – Minha mãe não quis me contar. Nunca falava sobre ele; porém, quando eu tinha 14 anos, insisti e ela contou. Meu pai era um executivo no escritório onde ela fazia limpeza à noite. Tiveram um breve romance, e ela se envergonhava muito. Depois... -– Alex se interrompeu, balançou a cabeça, e mesmo no escuro Chelsea podia ver sua expressão sombria. Em geral, Chelsea não bisbilhotava. Não fazia perguntas íntimas fora do sofá cor-de-rosa, porque assim não lhe perguntariam nada também. Porém, agora estava curiosa, e não apenas a respeito de um conhecido, mas sentindo necessidade de compreender outra pessoa. Queria saber o motivo para Alex se fechar tanto e como fazê-lo se abrir. Que piada. Desconhecia tudo sobre essas coisas. Intimidade. Honestidade. Compreensão. Mesmo assim sentia uma compulsão amedrontadora de tentar. – O que aconteceu depois? – perguntou com calma. – Sua mãe contou outras coisas? – Não. – As palavras surgiram lentas, mas ele tinha vontade de explicar. – Porém, o modo como falava de meu pai... com repulsa... me fez imaginar se fora de fato um romance ou um estupro. Chelsea gelou. – Que horror – murmurou. – Lamento. – Nunca perguntei. Sempre a visito, todos os meses, mas nunca falamos disso. – Voltou-se para ela e sorriu com tristeza e frieza ao mesmo tempo. – Então percebe como seu pai, que a levava aos jogos de futebol, me parece algo maravilhoso? Sua infância normal e tudo o mais. Era mentira, mas Chelsea não podia contar a verdade agora. Toda a sua vida era baseada em mentiras, e fora a única maneira de deixar o passado para trás. Mas agora sentia a carga do engodo. Jamais havia sido muito honesta com ninguém nem tentara, nem mesmo com Michael. Contudo, com Alex ao seu lado, sorrindo daquele jeito, meio frio e meio triste, se sentia tentada a contar. Queria dizer que sua mãe nunca falara de seu pai, mas que ela e Louise encontraram na gaveta de calcinhas dela uma fotografia de um homem com cabelos claros e os mesmos olhos cinzaesverdeados que elas tinham. Ele possuía um sorriso amigo, e Chelsea imaginara o que a mãe fizera para que fosse embora. Entretanto, se forçou a não contar nada. Não havia razão para se abrir com Alex, porque era apenas um encontro e nada mais. Talvez com sexo ao final. Alex não oferecera nada mais do que isso, e ela também não estava procurando, nem mesmo nesses momentos de abertura, quando ansiava por algo mais. Alguma coisa mais profunda. – Creio que é fácil aceitar a normalidade – comentou, embora fosse pura conjectura. Nunca conhecera a normalidade. – Estou gelada aqui em cima. Vamos descer. – Espere. – Alex passou o braço por seus ombros com gentileza, e isso foi mais íntimo do que o sexo que haviam compartilhado. – Veja. Apontou no escuro, e Chelsea viu a Estátua da Liberdade iluminada no porto, o braço com a tocha erguido com orgulho. – Vou leva-la até lá – prometeu Alex, e por um instante Chelsea apoiou a cabeça em seu ombro, se revigorando no aconchego de seu braço. – Considero-me devidamente avisada. Rindo de leve, ele a conduziu para baixo. Tomaram mais uma taça de champanhe enquanto o ônibus rumava para o circo no Lincoln Center, e Chelsea se sentia relaxada e um pouco tonta. Em geral não bebia, e duas taças de champanhe eram demais. E isso deixava a noite mais solta. – Acho que estou gostando de andar de ônibus – confessou, espreguiçando-se no assento púrpura. Alex riu. – Para variar do sofá cor-de-rosa, não? Ela cruzou os braços atrás da cabeça e esticou as pernas em um gesto displicente. – Sem dúvida. Por que deu um lance pela “Noite em Família”, Alex? Ele se sentou ao seu lado, colocando as pernas dela sobre seu regaço. – Como disse, nunca fui ao circo quando criança. – Eu também não – confessou Chelsea, fazendo-o arquear as sobrancelhas. – Estranho. Pensei que tivesse tido todas as clássicas experiências infantis, conforme diz sua biografia. Chelsea deu de ombros. Talvez tivesse exagerado na falsa biografia, suprimindo todos os detalhes de sua infância solitária. Alex acariciou seu joelho de modo distraído, pois sem dúvida pensava em outra coisa. Porém, seu jeito distraído a fez desejar carícias de verdade. – Quando foi que ocorreu o acidente de carro? – perguntou ele de supetão, arrancando Chelsea de seu momento de prazer. Chelsea quase perguntou que acidente de carro, mas lembrou a tempo dessa mentira. Ninguém jamais vira sua cicatriz, portanto a mentira fora difícil de dizer e era difícil de sustentar. – Há... dez anos. – Deve ter sido muito sério – comentou Alex. – Sim. – Não fora bem um acidente, mas um atentado. Bobagem da parte dela ter começado com a mentira. Alex ergueu o rosto e a fitou com seus olhos brilhantes. – Não gosta de falar sobre isso... – Dá para perceber? – Ela arqueou as sobrancelhas. – Um pouco. – Ele sorriu com frieza. – Desculpe. Não quero bisbilhotar. Mas está bisbilhotando, pensou Chelsea. Bisbilhota sobre a minha vida e meu coração desde que me conheceu. Porém nada disse, e um momento depois o ônibus parou em frente ao Lincoln Center. – Acho que é fim da linha. – Vamos ver os palhaços – disse Alex, pegando Chelsea pela mão. Era uma sensação muito natural segurar a mão morena dele, e Chelsea ainda se sentia envolta na frágil bolha de felicidade quando entraram na enorme tenda erigida na praça do Lincoln Center. A multidão os envolveu, e Chelsea sentiu alguns olhares curiosos, percebendo que fora reconhecida. Era uma celebridade muito mais conhecida que Alex, cujo trabalho ficava afastado dos holofotes. Estava acostumada a ser reconhecida dentro de sua limusine ou usando suas roupas tradicionais no trabalho que a deixavam segura. Salva. Contudo, agora, mesmo com a mão segura de Alex e sua presença ao lado, ela sentiu a terrível e conhecida sensação de pânico. O coração disparou e começou a ver pontos negros diante dos olhos. Era só o que faltava. Um ataque de ansiedade tão difícil de dominar. Sentiu as mãos comicharem, e tratou de respirar. Inspire. Expire. Mas sua visão estava turva e a cabeça, leve. Não podia desmaiar. Não ali no meio da multidão e com Alex. Era cada vez mais difícil respirar. Seu coração batia tão forte que chegava a doer, e a cabeça parecia um balão flutuando. – Vamos, molenga – brincou Alex, arrastando-a pela mão. – Não quero perder os palhaços. – Virou-se para fitála porque Chelsea parara de andar. Parecia que não conseguia se mover com os pés pregados no chão. – Chelsea – disse de novo, porque sem dúvida algo não estava bem. Ela tentou falar, mas não conseguiu. Nem sabia se conseguiria abrir a boca. Sentiu o braço forte de Alex na sua cintura, e ele a puxava para si. – Venha, Chelsea – murmurou, sempre com o braço à sua volta, conduzindo-a para seus lugares na primeira fila perto do picadeiro. Sentaram-se bem próximos e o calor de Alex a confortou. A visão voltou ao normal. Superara o ataque. Entretanto, acontecera, e era tarde para disfarçar. Após um longo silêncio com Chelsea fingindo ler o programa que tinha nas mãos, ele comentou: – Disse que não tinha medo de palhaços – brincou ele, e Chelsea agradeceu a brincadeira que lhe dava uma desculpa. Não suportaria nenhuma pergunta séria nesse momento. – E acha que vou admitir isso? – Ela riu, graças a Deus com voz normal. – Já pensou em fazer terapia? – Pensei que enfrentar meu medo cara a cara seria bom. Ele sorriu com simpatia e algo mais. Admiração. – Parece que não deu certo, mas foi muito corajosa em aceitar meu convite. Na verdade, refletiu Chelsea, não estava falando sobre palhaços, mas sobre terrores mais profundos. – Chama-se coulrofobia – explicou Alex com seriedade. – Medo de palhaços. – Não sabia que existia um termo técnico para isso. – Poucas pessoas têm essa fobia de fato. – Ele a encarou com expressão severa. – E você não tem. Com certeza. Chelsea tinha medo de muitas coisas... demais... mas não de palhaços. Tentou dizer algo... mas o quê? O que explicar e como começar? Alex ignorava tanto ao seu respeito. E ela não estava pronta para admitir e se revelar por mais que, em parte, sentisse vontade. Chelsea examinou o programa que tinha em mãos com a capa colorida exibindo palhaços e ambos ficaram em silêncio. – Posso descobrir os segredos que esconde – disse ele por fim – em questão de minutos. Chelsea sentiu medo. – Sem dúvida, já que tem sua própria rede de notícias – respondeu ela quando se recompôs, e se voltando para encarálo. – É uma ameaça? O olhar penetrante dele parecia ler sua alma. – Não, é uma promessa, porque esperarei até que confie em mim para me contar. A promessa dita com calma a perturbou. Não sabia que ele desejava conhecê-la, saber de seus segredos. E essa conclusão a apavorava. Engoliu em seco e desviou o olhar. – Pensei que fosse apenas um encontro, Alex. Sexo e circo, estou certa? – Fitou-o de novo. Alex franziu a testa com expressão confusa. – Sim – respondeu devagar. – Está. AS LUZES diminuíram e o espetáculo começou. Alex fitou o picadeiro onde o mestre de cerimônias surgia com gestos floreados sob muitos aplausos. Mas estava distraído. Seu cérebro fervilhava. Por que diabos dissera aquilo? Essa noite era uma aberração. Um encontro. O flerte. Falar sobre sua mãe. Seu pai. Nunca fazia isso; entretanto, desde que convidara Chelsea para sair, vinha quebrando todas as regras. Agindo por instinto ou movido por uma necessidade que não desejava reconhecer. Porque era tão bom se abrir com alguém, poder contar para outra pessoa. E Chelsea era igual a ele de tantas maneiras: dura, forte, independente, isolada. E mesmo assim tinha ataques de pânico. E segredos. Será que ele queria enfrentar essas coisas? Voltou a se focalizar no espetáculo, e olhou para Chelsea esperando ver uma expressão impaciente diante das apresentações ingênuas e tradicionais no picadeiro. Fizera o lance pelas entradas no circo porque nunca fora quando criança e queria ir com Chelsea, por mais ridículo que fosse. Mas não esperara vê-la encantada. Não havia outra palavra para definir sua atitude enquanto se inclinava para a frente no assento, as mãos no rosto, os olhos brilhantes enquanto assistia aos dois acrobatas fazendo piruetas seguidas. Ele quase riu quando Chelsea pôs a mão sobre a boca ao ver o trapezista dar um salto mortal. E as risadas cristalinas quando os palhaços fizeram graça dando voltas no picadeiro. Porém, Alex não estava interessado no espetáculo com acrobatas e palhaços. O show muito mais interessante era a gama de emoções no rosto de Chelsea. Muita coisa nela era artificial, refletiu, e quando conseguia perceber traços da verdadeira mulher por baixo da máscara da apresentadora do talk show sentia vontade de conhecê-la ainda mais. Tocá-la. Fazê-la sentar no seu colo e se perder na sua suavidade... pois, para uma mulher que desejava ser conhecida no mundo como dura, Chelsea Maxwell podia ser incrivelmente suave. Quando as luzes se acenderam e ela piscou, Alex disse: – Então você gostou do circo. Era uma afirmação, pois seu encantamento fora tão óbvio, e a mágica ainda a envolvia. Tudo nela era rubor, maciez e beleza. Seus cabelos caíam em ondas emoldurando o rosto, os lábios rosados estavam entreabertos, e os olhos brilhavam. – Adorei – admitiu Chelsea com uma risada. – Quem diria?! – Eu, com certeza, não diria – retrucou Alex, passando o braço pela sua cintura. – Há tanta coisa que desconheço sobre você. E então ela balançou a cabeça e as portas voltaram a se fechar e os muros a se ocultar, trazendo de volta Chelsea Maxwell com seu maior talento, aquele que Alex já conhecia bem. Disfarçar. Quanto mais tempo passava com ela mais descobria que existia um coração terno sob o gelo, uma mulher calorosa e até boa sob a atitude dura. Mas o que ele faria com essa informação? Uma limusine os aguardava à saída do Lincoln Center. Chelsea se virou para ele e arqueou as sobrancelhas. – Chega de ônibus? – perguntou ela. – Foi só para a vinda. De qualquer modo, não posso fazer amor com você em um ônibus com o motorista tão visível. Tenho meus limites. Os olhos dela chispavam de desejo ao penetrar no interior luxuoso do veículo. – E quem disse que fará na limusine? Alex se sentou ao lado roçando a perna na dela enquanto o motorista fechava a porta. – Está me desafiando? – quis saber ele. Chelsea corou, fazendo-o lutar para não tocá-la. Segurá-la. Mergulhar tão fundo nela até esquecer o próprio nome. – Foi só uma pergunta. – Então responderei – murmurou Alex. – Digo que faremos amor. Passou a mão pela sua nuca com delicadeza, e a puxou para si. Sentiu a resistência abandoná-la enquanto roçava os lábios nos seus como um primeiro beijo da noite. Ouviu-a suspirar levemente enquanto relaxava e se entregava ao beijo, os lábios entreabertos. Em resposta ele roçou sua boca de novo, uma, duas vezes, embora a libido implorasse para que usasse de mais força e rapidez. Da última vez os beijos tinham sido uma questão de controle, poder, vencer ou esquecer tudo. Não estavam medindo forças no beijo desse momento; só a doçura existia. E doçura devia ser o que Chelsea desejava, porque ele sentiu as mãos dela em seus ombros o puxarem para perto de seu corpo, a respiração ofegante na boca aberta. Mas ele continuou a ditar o ritmo e ela permitiu, enquanto Alex continuava a beijá-la saboreando seu gosto devagar. Delicioso. Emoldurou o rosto de Chelsea com a mão e passou o dedo pelo canto de sua boca que ainda beijava. Deslizou os dedos pela sua face, e parou ao sentir umidade. Quando se afastou, Alex viu uma lágrima em seus olhos. O que estava acontecendo? Chelsea afastou o rosto depressa, colocando as mãos no rosto e apertando os cantos dos olhos como se assim pudesse negar a pequena lágrima traidora. Alex não fez comentários porque aquela lágrima o deixara aterrorizado. Que diabo estava fazendo tentando afetar essa mulher? – Pensei que fôssemos continuar – disse Chelsea com a voz sufocada. – Não era essa ideia, Alex? – perguntou com mais agressividade. – Porque estamos quase chegando ao meu apartamento. – Então não percamos tempo. Assim dizendo, ele a colocou sobre o colo, beijando-a com calor. Suas línguas se uniram, e Alex sentiu que ia gemer. Deslizou a mão para a frente do jeans de Chelsea e apertou. Ela o apertou também ali, deixando-o mais excitado. Ele baixou o zíper do jeans de Chelsea, comentando: – Não vai ser fácil – murmurou ele, e Chelsea se afastou, e arqueou as sobrancelhas em desafio. – Não sou fácil. – Sei disso. Ele desabotoou o jeans e baixou o zíper. – E não gostaria que fosse de outra maneira. E não foi fácil. Mas rápido, violento e passional, principalmente livre. Depois daquela lágrima, Alex sabia que era disso que precisava. E sabia que ela também. Havia segurança na selvageria, conforto no calor dos corpos. Não era preciso pensar. Não havia espaço para imaginar ou se importar. Bastava sentir, e era bom. Quando terminaram Chelsea encostou a cabeça em seu ombro e deixou escapar um suspiro. Seu jeans estava abaixado até os quadris, assim com o de Alex. Chegaram ao prédio dela e Alex se apressou a trancar a porta para que o motorista não tivesse tempo de abrir e ver os dois quase sem roupa. Chelsea riu, e sua risada reverberou até o coração dele. – Pensou depressa. – Sou assim. – Sem dúvida. Reparei que trouxe o preservativo no bolso de trás da calça. Muito preparado. – Sou um escoteiro. Dos bons. – Ainda bem. E de repente, estupidamente, Alex se sentiu um cafajeste. O senhor dos encontros de uma só noite se sentiu um gigolô. Haviam banalizado mais algo que já era banal ou assim acreditavam. Sexo e circo. Chelsea alcançou a maçaneta para destrancar e Alex soube que devia dizer alguma coisa. Pedir para ela ficar. Puxála de novo para si. Porém, a lembrança daquela única lágrima o manteve calado, pois não sabia o que fazer com a Chelsea que chorava quando ele a beijava. Que possuía segredos dolorosos, segredos que a tornavam diferente da mulher forte com a atitude dura. Segredos que complicavam a situação e a tornavam emocional e íntima, e Alex não gostava disso. Então ficou em silêncio enquanto ela abria a porta e descia da limusine, lançando-lhe um olhar por cima do ombro. – Adeus, Alex – disse, e ele notou que era o fim no seu tom de voz. Percebeu em seu rosto. Sentiu no íntimo. Era hora de se retrair e de se concentrar em Treffen, e não nesse pseudorrelacionamento com o qual os dois andavam brincando. Um leve sorriso triste surgiu nos lábios dela enquanto fechava a porta e Alex apenas olhava. Chelsea podia querer ir embora, mas fora ele quem deixara que isso acontecesse. CAPÍTULO 9 CHELSEA NUNCA chorava, e certamente não por causa de um beijo. Não chorara quando recebera o primeiro beijo babado e nojento aos 6 anos dado por Bo Fielding, o namorado de sua mãe. Não chorara com os beijos sem calor na adolescência quando quisera provar aos meninos sem importância que era digna de amor. E não chorara quando Brian Taylor a beijara mordendo seu lábio com tanta força que precisara levar pontos. E não choraria agora porque Alex a beijara com ternura, fazendo-a lembrar que tinha um coração que doía. Nunca fora beijada assim. Piscou diversas vezes para não chorar, e entrou no elevador respirando em grandes sorvos até chegar à cobertura. Ficara dizendo a si mesma para ter cuidado, para se esconder, mas Alex fora tirando suas camadas uma a uma sem perceber. E ela sentia que ele não quisera isso; não estava emocionado nem tocado pelas suas lágrimas. Não, Alex só queria sexo descompromissado como ela. Mas a questão é que ela já não conseguia isso. Algo se abrira em seu íntimo, e ela não sabia como sufocar essa sensação e fingir que não existia. Então lá estava, voltando para o seu recanto, sabendo que Alex conseguira tirar mais uma camada, tocar sua alma um pouco mais profundamente. E duvidava que conseguiria correr para longe e depressa a fim de escapar. Entretanto, tentaria. Passou a noite trabalhando no computador, preparando novas perguntas e ideias para suas entrevistas, porque o sono sempre era difícil, e nessa noite tinha certeza de que seria impossível. Trabalhou muito por várias horas a fim de não pensar em Alex, não recordar o beijo que fora como se uma mão afundasse em seu peito, agarrando seu coração e apertando com força. Não era uma sensação confortante, mas sem dúvida a fazia ficar acordada e se sentir viva. E ela não se sentia tão viva há muito tempo. Por volta das 3 horas da manhã, quando suas pálpebras começaram a pesar e depois da terceira xícara de café, ela digitou Jason Treffen na internet. O usual apareceu: seu trabalho com ajuda às mulheres na firma e nas obras de caridade; fotos dele muito dignas, uma com a família: a esposa com um sorriso fixo, o filho carrancudo e duas filhas bonitinhas. Teria sido um instante ao acaso preso na câmera ou algo mais profundo e sinistro? Será que a esposa sabia das atividades escusas de Treffen? Chelsea se aproximou da tela, deu um zoom no rosto de Treffen e analisou os olhos azuis com as rugas de lado, límpidos como um céu de verão. Ainda agora tinha dificuldade em acreditar em Alex. Muito bem, Treffen tinha seus segredos. Certo. Ela não imaginara a frieza em seu olhar nem a ameaça velada de revelar seu passado. Não era tão paranoica. Mas muita gente tinha seus segredos, até os santos. Treffen podia ter problemas de evasão fiscal, porém não era um cafetão para suas funcionárias. Porém, Chelsea sabia do que os homens eram capazes. Com tanta experiência negativa no seu passado, tendia a julgar os homens com rigor, e frequentemente tinha razão. Por que Treffen seria diferente? Michael conseguira fazê-la baixar a guarda um pouco. Quanto a Alex... Pensou em Alex de novo. Seus dedos se imobilizaram sobre o mouse e ela fitou o espaço, desejando não só parar de pensar nele, mas esquecê-lo. Esquecer o toque de suas mãos em seu corpo, o roçar dos lábios dela nos seus. E, muito mais difícil, como ele a fazia rir, mesmo que fosse apenas um esboço de sorriso. Chelsea sentia que ia se abrindo e relaxando por dentro... e, se Alex continuasse e ela deixasse, poderia desabar completamente. Iria cair como um parafuso frouxo, a máquina Chelsea Maxwell, para nunca mais se consertar. Chelsea refletiu por que Alex queria tanto se vingar de Treffen. Coisas terríveis aconteciam no mundo, Deus era testemunha, porém Alex se ressentia de Treffen de modo pessoal. O que a fazia imaginar o que estaria em jogo. Franziu a testa porque não gostava que Alex tivesse segredos, porém sabia que ele tinha, assim como ela também. E sendo ou não mau jornalismo não queria pesquisar mais a fundo. E também não queria que Alex investigasse. Aquilo era apenas sobre Treffen. Três dias mais tarde Chelsea terminou a gravação de um programa e correu de volta ao escritório para checar as mensagens no celular. Alex ainda não ligara. Bem, ele não prometera ligar, mas poderia contatá-la por causa de Treffen; afinal, precisavam trabalhar juntos no caso. Esperava uma chamada profissional, tratou de convencer a si mesma. Não uma ligação particular. Sim, a quem queria enganar? O celular tocou, e Chelsea praticamente saltou pelo escritório a fim de atender. Era Louise, sua irmã, e deixou escapar um suspiro involuntário de frustração ao cumprimentá-la: – Alô, Louise. A irmã zombou: – Ficou tão animada ao me ouvir. – Desculpe, esperava que fosse outra pessoa. – Oh? Alguém interessante? A irmã soou tão esperançosa por ela. – Apenas trabalho – retrucou Chelsea, e Louise suspirou também. Então Chelsea forçou uma risada animada. – Lamento desapontá-la. – Só quero que seja feliz, Aurora – murmurou Louise –, mesmo que não se ache merecedora. Era uma declaração tão profunda que doeu em Chelsea. – Meu nome agora é Chelsea. – Sei disso. – Louise ficou em silêncio por um momento, e Chelsea teve a impressão de que desejava dizer mais. Algo que talvez não quisesse ouvir. – Por que me ligou? Nosso jantar será só na próxima semana. – Pensei em almoçarmos. – Almoçar? Mas... – Sim, sei que não faz parte da rotina que estabelecemos. Uma rotina bastante confortável para nós duas. Mas sei como funciono, Aur... Chelsea, e creio que você é igual a mim. Mais 15 anos poderão se passar e continuaremos com um jantar mensal. Para Chelsea essa combinação estava perfeita, e ela perguntou: – Então, por que a mudança? – Você é minha irmã e única parenta viva. Desejo ficar mais próxima. Chelsea não aguentaria duas pessoas querendo ficar mais próximas a ela. Mas talvez Alex já tivesse desistido de se aproximar. Desistira dela. Quem sabe já não queria sua ajuda no caso de Treffen. – Certo – respondeu após um momento. – Podemos almoçar hoje. Meio-dia e meia? – Perfeito. – Louise limpou a garganta. – Obrigada, Chelsea – murmurou, e Chelsea pressentiu lágrimas em sua voz. Louise já esperava perto da famosa estátua de Atlas quando Chelsea deixou o prédio da AMI em Rockefeller Plaza. O céu estava muito azul e havia um ar de primavera. – Olá, Louise. A irmã sorriu e, para surpresa de Chelsea, abraçou-a com força. Chelsea retribuiu automaticamente, passando os braços pela irmã, embora nenhuma das duas jamais tivesse sido do tipo caloroso. Pelo menos Chelsea não era. E imaginara que Louise também não. – Do que se trata? – perguntou, afastando-se. – Almoço, abraços... pensei que quisesse uma rotina confortável de jantares. – Sim. Em geral iria preferir. Porém, a vida pode ser muita curta para tantas rotinas – comentou Louise. – Quem sabe é muito curta para não se ter rotinas – retrucou Chelsea com leveza. – Costumo pensar assim. Mas... – Louise se deteve demonstrando vulnerabilidade no olhar. – Você é minha irmã, Chelsea, e passei os últimos dez anos imaginando sobre você, desejando... – Balançou a cabeça fazendo os cabelos dançar. – Vamos almoçar. Chelsea imaginou o que Louise desejara. Que as coisas fossem diferentes entre elas? Que ficassem mais próximas? Às vezes também desejara isso, quando se sentira por baixo. A maior parte do tempo não se deixava levar pelo impulso e para a fria solidão que sentia. – Vamos almoçar – concordou. Minutos depois estavam sentadas em um compartimento forrado de couro em um bistrô elegante do centro da cidade e repleto de executivos. – Então, conte-me algo excitante na sua vida, já que na minha não acontece nada – pediu Louise. – Nada? – Chelsea tomou um gole de água. – Essas palestras femininas de estudos devem ser bem animadas. Louise ergueu os olhos com impaciência. – Sim, às vezes são demais. Chelsea sorriu, gostando dessa conversa diferente e bem-humorada com a irmã... pelo menos até que Louise parou de sorrir e a fitou com seriedade. – Conte-me o que está acontecendo. – Não tenho nada para contar. – Parece diferente. – Diferente? – perguntou Chelsea, arqueando as sobrancelhas. – Como? – Por que Louise perguntara isso? Ora, ganhava a vida entrevistando pessoas. Sabia como interromper um assunto inconveniente. Mas estava curiosa e queria saber o que a irmã observara. – Não sei bem. De certo modo está mais ansiosa e ao mesmo tempo mais calma, se é que isso faz sentido. De certa forma fazia. – Não sabia que me conhecia tão bem – comentou Chelsea. – Conheci você quando ainda estava crescendo, Chelsea – murmurou Louise. – Pode ter mudado muito por fora, mas... Por dentro continua a mesma. Chelsea balançou a cabeça. Não precisava ouvir essas coisas. – Chega disto, Louise – retrucou, pegando o cardápio. – Vamos pedir. Tentou manter a conversa fora de assuntos pessoais durante o almoço, reconduzindo para temas mais genéricos. – Nem sei onde você fez faculdade, Chelsea. Chelsea respondeu enquanto comiam um prato grande de salada. – Há muita coisa que não sabe ao meu respeito, nem eu sobre você – disse Chelsea, garfando um tomate. – Bem, vamos começar sobre você e onde fez faculdade – murmurou com displicência. Só isso e nada mais. – Aqui mesmo. Universidade de Nova York. – Então mora em Nova York há muito tempo? – Cerca de oito anos – respondeu Louise. E ela, há dez anos. Espantoso pensar que ambas haviam deixado o Alabama para ficar na Big Apple, viviam a poucos quilômetros de distância uma da outra e nunca tinham tomando conhecimento disso. – Procurei por você, sabia? – disse Louise de modo abrupto, mordendo o lábio e desviando o olhar. – E me encontrou. Mantenha o tom tranquilo, pensou Chelsea. – Não, me refiro a muito antes. Chelsea ficou tensa. – Quando? – Alguns anos atrás. Seis, sete? Depois que... bem, quando eu estava em um bom lugar. Chelsea não entendeu o que ela queria dizer com isso, e também não perguntou. – Já havia mudado de nome nessa época – disse em voz alta, e Louise aquiesceu com um gesto de cabeça. – Nunca me contou por que mudou de nome. – Já lhe disse que queria evitar certa pessoa do Alabama. – Um homem. – Sim... por que tantas perguntas, Louise? – Sua pele arrepiou e de repente sentiu um sentiu um nó na garganta. – Pensei que iríamos esquecer o passado. – E esquecemos? – Talvez não plenamente, mas também não está muito ansiosa em falar do seu. Sua história pessoal. Não me contou nada dos últimos 15 anos. Tudo que sei é que foi de menina pobre do estacionamento de trailers para professora registrada de faculdade. – E você tem seu próprio programa de televisão com celebridades. – Ainda bem que avançamos na vida. Louise concordou com um gesto de cabeça lento, e depois ergueu os olhos sombrios para Chelsea. – Exceto que, às vezes, não acredito nisso. Chelsea também balançou a cabeça. – Será que jogaram alguma coisa na água ultimamente que fez com que as pessoas ficassem emotivas e com vontade fazer confidências? – Então existe algo na sua vida – retrucou Louise. Um segredo íntimo. Um homem. – Não... – Posso não conhecê-la bem agora, Chelsea, mas a conheci com 6 anos. Dez. Dezesseis. – E não quero me lembrar daquele tempo. – Sei disso. Chelsea abriu a boca para pedir para a irmã parar com o interrogatório, mas de repente quis jogar tudo para o alto. Estava cansada de afastar as pessoas. Farta de se isolar. E qual era o problema de sua irmã saber o que acontecera? Tinha certeza de que não a condenaria nem julgaria, muito menos despejaria seu segredo nos jornais sensacionalistas. E seria tão bom desabafar com alguém, contar um pouco sobre sua vida. Seria como lancetar uma ferida... – Muito bem, quer a verdade? – perguntou, e Louise arregalou os olhos surpresa, concordando. – Claro que quero. – Conheci esse sujeito. Seu nome é Alex. De início me procurou por questões de... trabalho, mas... – Parou de falar sem saber como explicar. Quanto contar. – Mas? – A situação se tornou bastante pessoal. Mais do que eu esperava ou queria. – Só que, em parte, Chelsea queria. Uma parte bem grande de seu ser queria. Engoliu em seco. – E? – incentivou Louise com paciência. – E isso é tudo, verdade. Acho que se tornou muito intenso para ele... eu me tornei muito intensa, e ele se afastou. – Conversou com ele sobre isso? Sobre o que aconteceu, seja lá o que for? – Não. – Então... – Tanto faz – disse Chelsea com brusquidão. – Não estou interessada em um relacionamento. – Por que não? Chelsea apenas balançou a cabeça. Já passara por muita coisa antes. – E Michael Agnello? – perguntou Louise, surpreendendo Chelsea. – O que tem Michael? – Você e ele são muito próximos. – Louise deu de ombros. – Por isso pergunto. – Nunca dormimos juntos. – Louise aquiesceu com um gesto de cabeça, e Chelsea perguntou de supetão: – Acredita? – Sim – respondeu Louise com os olhos sombreados de dor. – Mas sou capaz de dormir com alguém para conseguir um emprego. Já fiz antes – confessou Chelsea. Por que, diabos, dissera isso? – Há 15 anos estávamos desesperadas – concordou Louise com calma. – O desespero nos torna capazes de muita coisa. – E do que foi capaz, Lou? – perguntou Chelsea com meiguice, usando o apelido de infância que não pronunciava há mais de uma década. Por um segundo apenas pensou que Louise contaria, mas ela torceu a boca, seus olhos ficaram ainda mais sombrios, e depois sacudiu a cabeça, murmurando: – Estamos falando de você, Chelsea. E do seu rapaz. – Quero saber sobre você – teimou Chelsea com sinceridade. Louise tornou a sacudir a cabeça. – Outra hora. Fale de Alex. E Chelsea obedeceu. Contou sobre o encontro em seu apartamento, deixando de lado alguns detalhes mais picantes, e sobre o único encontro para o circo. Contou até sobre a lágrima. – Nunca choro – disse, embora nesse momento se sentisse prestes a chorar de novo. – Mas quando ele me beijou como se me conhecesse... quase como se... como se... – Como se a amasse? – completou Louise suavemente. O queixo de Chelsea caiu. – Não seja ridícula! Mal nos conhecemos. Amor! Ele não me conhece. – Não está dizendo coisa com coisa, Chelsea. – Não preciso fazer sentido – retrucou ela com agressividade. – Isso nada tem a ver com amor, apenas com... Louise arqueou as sobrancelhas, incentivando: – Com...? – Oh, vamos parar! – Chelsea se recostou no assento com brusquidão. – Não aguento mais. Não gosto de falar dessas coisas com ninguém por um motivo. Porque me esgotam. – Eu sei. – Louise também falou com brusquidão. – Então o que fará agora? – Sobre o quê? – Sobre Alex. Vai ligar para ele? Revê-lo? – Alex não ligou mais desde... – E você por acaso tem 13 anos? Precisa esperar que o rapaz telefone? Acho que não. – Chelsea apenas balançou a cabeça e Louise se inclinou para a frente, segurando sua mão. – Olhe, Chelsea, entendo. Essa situação é assustadora. Você não quer se expor. Ser rejeitada. – Creio que você é igual a mim – comentou Chelsea. – Sim, mas gostaria de tentar... gostaria de poder ser diferente. – Louise suspirou. – Nossa carga emocional afundaria um navio, eu sei. Sem pai e com uma mãe quase prostituta. – Louise... – E outras coisas mais. – Mordeu o lábio, de repente com vontade de chorar. Chelsea sentiu uma emoção dolorosa queimar seu peito. – Olhe, a vida é curta, Chelsea. Muito curta. Quer viver sozinha em sua torre de marfim na cobertura até morrer e só descobrirem isso quando seu cadáver começar a cheirar mal? – Que linda imagem – ironizou Chelsea. – Falo sério. Isso pode acontecer. – Louise respirou fundo. – Comigo também, se nenhuma de nós deixar alguém entrar em nossas vidas. – E se Alex não quiser entrar na minha vida? – questionou Chelsea com voz trêmula, embora tentasse ser agressiva. – Não saberá até perguntar para ele – respondeu Louise com simplicidade. – Não pode arriscar seu coração e permanecer a salvo. Não funciona assim. O celular de Chelsea tocou e ela pegou a bolsa do chão com o coração pulando. Não era Alex, mas uma mensagem de Michael lembrando-a de assinar o papel que o advogado de Treffen enviara. Chelsea nem mesmo pensara em Treffen nesse dia. Talvez devesse se encontrar com Alex para falar sobre isso. Ainda precisava da famosa prova; pelo menos isso a deixaria mais próxima de Alex. Poderia vê-lo, tocá-lo... Ou talvez fosse melhor deixar tudo no campo profissional. Caso conseguisse. – Ligue para ele, Chelsea – disse Louise, dessa vez com ar de riso. Só então Chelsea percebeu que continuava fitando o celular na mão. – Veja Alex de novo. Não precisa fazer uma grande declaração, apenas lhe dê uma chance. – CHELSEA MAXWELL está aqui para vê- lo, Alex. Ele ficou imóvel, a mão sobre o mouse do laptop, enquanto ouvia a voz da assistente pelo interfone. Chelsea? Ali? Seu pulso acelerou de antecipação e uma trepidação ansiosa o incendiou. Não entrara em contato desde que ela saíra da limusine uma semana antes. Desejara telefonar e em várias ocasiões chegara a pegar no telefone. Mas não fora adiante, porque não soubera o que lhe dizer. Explicar o que sentia. Aquela lágrima o apavorara. Quisera sacudir a gélida segurança dela, mas não derretê-la. Não vê-la chorar. Embora, em parte, tivesse desejado beijar a lágrima e perguntar o motivo. Faze-la sorrir de novo, dessa vez com sinceridade. E isso o apavorara mais ainda. – Alex? Percebeu que ainda não respondera e disse à assistente: – Mande-a entrar, por favor. Segundos depois Chelsea abriu as portas duplas de seu escritório na cobertura, fechando-as em seguida com um rumor seco. Vestia-se no seu próprio estilo clássico: a tradicional saia justa preta até os joelhos com um cinto fino de couro e uma blusa cor-de-rosa pálido com listas cinza. Usava um coque elegante e maquiagem discreta, embora sensual. Tudo nela era sofisticado, cuidado, frio. Alex desejou se erguer da cadeira e tomá-la nos braços, abrir os pequenos botões de pérolas de sua blusa um a um e baixar o zíper da saia. Isso o deixou excitado, e ele permaneceu sentado atrás da escrivaninha. – Chelsea. – Cumprimentou-a com um aceno, sabendo que agia como um imbecil. Haviam feito sexo, duas vezes. E haviam conversado com muita intimidade. Compartilhado coisas. E ainda sentia a umidade quente da única lágrima dela na ponta do dedo. – Pensei que ia me apresentar provas – resumiu ela. Treffen. Chelsea estava lá por causa de Treffen. Estupidamente ele sentiu um misto de frustração e alívio, assim como uma grande culpa. Enviara mensagens para Hunter várias vezes a fim de se aproximar de Zoe, e enviara mensagens também para ela no seu trabalho pedindo que falasse. Tentativas muito patéticas, na verdade. Mas estivera com a mente voltada para Chelsea e para o que acontecia com eles. Tudo errado. Sabia que talvez não fizesse Zoe falar, porém precisava dar uma prova para Chelsea, e sabia o que era. – Tenho a prova – respondeu com a mesma frieza dela. – Então vamos ver. – Ela arqueou as sobrancelhas esperando, tudo em sua postura muito agressivo e duro, e tão diferente da mulher que estivera com ele da última vez. Era assim que os dois deviam agir. – Muito bem. Ele pegou uma chave no bolso e destrancou a gaveta inferior de sua escrivaninha, retirando uma pasta fina de papel. Respirou fundo, abriu e passou para Chelsea a foto de Sarah. Chelsea a pegou, e Alex observou seu rosto enquanto fitava a fotografia. A expressão de Chelsea se tornou neutra como se afastasse todo o tipo de emoção. Era uma reação estranha, porque Alex já olhara para essa foto muitas vezes e sempre reagia pressionando os lábios e sentindo bílis na boca. Sarah, nua, estendida de pernas entreabertas sobre uma cama, o corpo bonito e pálido, os olhos cheios de sofrimento. Olhou para a foto e teve vontade de bater em alguém. Ferir alguém. – Quem é? – perguntou Chelsea depois de um segundo, e Alex limpou a garganta. – Uma de suas garotas de programa... – Obviamente. Mas quem é a moça? Está por perto? Pode contar sua história? Alex cerrou os punhos sem querer. – Infelizmente não. Mas a irmã dela foi a primeira pessoa que contatou Austin com informações. Chelsea estreitou os olhos. – E ela quer falar? Alex se lembrou de Katy por um instante. – Está zangada e quer justiça. – Porém, é uma testemunha secundária – observou Chelsea. – Há outra? – Talvez. Chelsea o fitou com dureza e depois balançou a cabeça. – Isso é tudo, Alex? Sério? – Austin confrontou o pai, que nem ao menos negou... – A conversa foi gravada? – Alex fez um gesto descartando. – Austin iria à televisão para confrontar o pai ao vivo? Pausa. – Não sei. – Então o que sabe, Alex? – perguntou Chelsea. De repente furioso e agressivo, Alex se levantou. – Sei que Treffen é um monstro que precisa ser detido. Que destruiu a vida de jovens advogadas promissoras. Sim, tenho uma única foto. E uma vítima com medo de falar... por enquanto. Entretanto, sei o que Treffen fez, Chelsea. Sei. Ela o fitou e o gelo derreteu diante dos olhos de Alex. Os lábios dela tremeram e Chelsea os apertou, murmurando: – Acredito em você, Alex. Era tudo que Alex precisava. Tudo para derreter seu gelo também. Afastou a cadeira, deu a volta na escrivaninha, fazendo papéis voarem para o chão. Aproximou-se dela e a beijou com fúria. Desejava-a demais para ser gentil ou calmo, e isso os deixava em um território perigoso. Chelsea devia ter sentido o mesmo porque correspondeu com paixão, enfiando os dedos nos cabelos dele e pressionando o corpo ao seu. Botões pularam das roupas, espalmando-se pelo assoalho. Ele afastou a blusa e segurou seus seios por cima da camisete de seda. Chelsea gemeu com voz rouca e baixou o zíper de sua calça. A porta da sala nem mesmo estava trancada, Alex percebeu distraidamente enquanto a deitava sobre a escrivaninha. Mais papéis voaram e o laptop ameaçou cair, porém nada importava. A não ser ela. Eles. Ele deslizou a mão por baixo da saia e sentiu a cinta-liga, gemendo. – Está tentando me enlouquecer? – murmurou de encontro à boca de Chelsea, e em resposta ela passou as pernas pelos seus quadris, aproximandoo ainda mais de seu calor e maciez. A saia rasgou atrás com um rumor alto na sala silenciosa onde só se ouvia as respirações entrecortadas deles dois. Alex ergueu o tecido mais alto e a saia subiu para os quadris dela. – Chelsea... – gemeu de encontro à sua boca, tentando pressionar todo o corpo contra o dela, e percebendo então que não tinha preservativos. Ela o sentiu recuar e se remexeu por baixo de seu corpo, arqueando os quadris para mantê-lo em contato de novo. – Não tenho preservativos aqui – murmurou ele, e Chelsea resmungou. – Pensei que estivesse sempre preparado. Um verdadeiro escoteiro. Alex riu com voz rouca, muito excitado. – Nunca antes fiz sexo no meu escritório. – E, pelo visto, vai continuar sem fazer – declarou ela, afastando-se dele e pulando da escrivaninha. Alex ajeitou as roupas, enquanto a via se afastar alguns passos e tentar remediar os estragos nas próprias roupas e cabelos, logo percebendo que era em vão. – Esta saia era nova em folha – comentou de novo de costas para ele e muito rígida. – Compro outra. – Agora não vai ajudar. – Chelsea abotoou o único botão que sobrara na blusa e se virou para fitá-lo. Alex não sabia o que ela estava sentindo, e não deveria se importar. – Não posso sair daqui assim. – Veio de paletó? – perguntou ele. – Ficou na sala de entrada – respondeu ela, erguendo os olhos para o alto. – Vou buscar. Quando Alex voltou Chelsea estava em frente às janelas enormes que descortinavam a Estátua da Liberdade, segurando a blusa aberta com uma das mãos. A visão dela ali, tão solitária e orgulhosa, fez seu coração bater mais forte. Ou quem sabe estava sendo espremido, dilatado ou rompido. Algo acontecera e doía ao vê-la ali. E ia lhe entregar o paletó? – Chelsea. – Ela se voltou e ele viu seu rosto pálido e a expressão contida. – Não vá. Ela arqueou as sobrancelhas, ainda orgulhosa e agressiva. – E o que faço? Fico sentada aqui em farrapos enquanto você trabalha? – Não. – Ele ofereceu um sorriso hesitante. Tudo era tão novo. – Impossível imaginar isso. – Também acho. – Venha para casa comigo. Ela não respondeu, mas Alex notou sua surpresa. Dominava seu olhar e deixava seu corpo tenso, mas mesmo assim ela o encarou. E ele continuou falando, porque ao fazer o convite sabia que era exatamente o que desejava. Que ela ficasse ao seu lado. E nada tinha a ver com Treffen ou vingança. – Venha comigo – insistiu. – Para o meu apartamento. Agora mesmo. Terminei meu trabalho. – Alex... – Passe a noite comigo. Com o rosto sem cor, ela arregalou os olhos verdes que pareciam dois lagos na floresta. – Chelsea – disse ele em tom de súplica. Promessa... exceto que não sabia o que estava prometendo. Ou o quanto prometia. – Está bem – murmurou ela, e Alex sentiu o coração dolorido de novo. Espremido ou rompido, doía. A situação era nova para os dois. Nova, estranha e muito aterrorizante. Mas iriam em frente. E que Deus os ajudasse. CAPÍTULO 10 CHELSEA quebrando outra de suas regras. Nos últimos dez anos jamais fora à casa de um homem. Nunca se expusera a uma situação tão vulnerável. Seus encontros eram sempre no seu apartamento, segundo suas normas, e ela mantinha spray de pimenta no criado-mudo. Embora devesse admitir, enquanto deixava com Alex o prédio da Diaz News na Hudson Street, que não tinham sido tantos homens assim. Certamente ESTAVA não tantos quantos as pessoas imaginavam. Só alguns que já esquecera, que haviam lhe dado algum prazer físico, mas que não guardara em seu coração. Homens que haviam aliviado sua solidão um pouco. Muito pouco. Contudo, não quisera mais do que isso. E agora? Havia Alex. Seu corpo ainda doía com o toque dele, e Chelsea sentia o desejo insatisfeito. Inacreditável como fora inconsequente e passional. Não costumava ser assim. Sexo selvagem sobre uma escrivaninha... nunca a excitara, considerando seu passado. Mas com Alex fora diferente. Forte e sensual, e de certa forma revigorante. Haviam se abraçado como iguais, e mesmo quando ele arrancava sua blusa ela se sentira a salvo. Talvez precisasse disto: reviver os anos de subjugação de um modo totalmente diferente do que imaginara. Uma limusine esperava quando saíram do prédio da Diaz News. – Tem preservativos no carro? – murmurou ela meio que brincando, enquanto o motorista se apressava a abrir a porta para ela; mas Alex chegara primeiro. – Deve pensar que minha vida é mais aventurosa do que realmente é, Chelsea – respondeu, ocupando o assento ao lado dela. – Ora, Alex, sua reputação de mulherengo é grande. Assim dizendo, ela apertou o paletó contra o corpo. A blusa estava praticamente em frangalhos e o talho na saia aumentara consideravelmente, muito maior do que no modelo original. Quanto aos cabelos e maquiagem... nem queria pensar. Mas continuava desejando Alex. – Está linda – murmurou ele. Chelsea arregalou os olhos, virando- se para ele. – Como leu meus pensamentos? – Você estava tentando arrumar os cabelos. Ela baixou a mão tarde demais e fitou pela janela as filas de armazéns e velhas fábricas desativadas, comentando: – Ótima vizinhança. – Gosto de privacidade. A limusine parou em frente ao que parecia um velho armazém de três andares e fachada de tijolos. O motorista abriu a porta e Alex desceu da limusine, conduzindo Chelsea pela mão para a porta do armazém que era de aço com um enorme cadeado. Sorriu para ela à medida que escurecia. – Não brinque! – exclamou ela, acenando para o cadeado. – É sério – respondeu ele, e ela sentiu um arrepio... de medo ou surpresa... porque de repente não soube se Alex estava se referindo à porta do prédio. Alex tirou um cartão magnético do bolso e o passou no painel afixado na parede do armazém. A porta de aço se abriu sem fazer barulho, e Chelsea balançou a cabeça. – Como você é exibido! Ele riu de leve. – Só um pouquinho. Conduziu-a por um corredor escuro; luzes com sensores se acendiam à medida que avançavam. Chelsea fitou o enorme e antigo elevador com sua porta de grades e perguntou: – Este lugar é todo seu? – Tenho o último andar. Mas a Diaz News possui o prédio... os outros andares são para hóspedes, escritórios e almoxarifado. – Bem, a Diaz News é você – comentou ela, enquanto entrava no elevador com a mão de Alex em suas costas. Ele aquiesceu com um gesto de cabeça. – Sim, a Diaz News sou eu. Apertou um botão e subiram de elevador até a porta se abrir no último andar constituído por um único espaço aberto e enorme. O apartamento não tinha paredes internas, e estantes de livros e balcões serviam de divisórias. Chelsea entrou, sempre com Alex segurando suas costas. – O que acha? – perguntou ele, e ela soube, apesar de seu tom de voz displicente, que sua resposta era importante. – Um minuto – pediu. Assim dizendo, Chelsea começou a passear pelo lugar que era a marca registrada do dono. Estantes de carvalho com livros de bolso muito manuseados, uma mistura de filosofia e romances policiais várias vezes lidos. Uma guitarra elétrica a um canto. Fotos em preto e branco mostrando instantes singelos da vida: um senhor em um banco de praça segurando uma bengala com as mãos nodosas; uma criança no playground com o joelho machucado e uma única lágrima na face; uma mulher passeando no Central Park, olhando para o sol. Podia sentir os olhos de Alex enquanto perambulava por ali, assimilando tudo. Chelsea refletiu que parecia muito mais um lar do que sua cobertura luxuosa e impessoal. A personalidade de Alex estava em tudo ali, enquanto ela tentara propositalmente despersonalizar sua residência. Terminou a visita silenciosa e sem guia no quarto dele separado do resto do apartamento por estantes altas, e parou em frente à cama king size. Viu-se deitada ali com ele, bocas unidas, pernas e braços entrelaçados em meio aos lençóis de seda azul-marinho... O desejo cresceu e ela se virou para Alex, imaginando se podia ler seus pensamentos agora. E, pelo brilho dos olhos dele, refletiu que provavelmente sim. – Gostei. É aconchegante. – Creio que sempre quis um espaço só meu. – Espaço é o que não falta aqui. – Ela baixou os olhos para as próprias roupas. – Pode me emprestar alguma coisa para vestir? – Claro, mas as roupas vão ficar um pouco largas em você. – Sorriu para ela de modo provocador. – Eu não vou me importar. Então ele foi buscar em uma gaveta uma calça de moletom e uma camiseta cinza muito macia, entregando-as em seguida para Chelsea. Ela resistiu à vontade de apertá-la contra o rosto e sentir seu perfume. – O banheiro tem porta, não tem? – perguntou. – Sim, ali no canto. Alex apontou para uma porta ao canto, e Chelsea para lá se dirigiu. Cinco minutos depois ressurgiu com o cós da calça enrolado na cintura para que não caísse até os quadris, e a camiseta deslizando pelos ombros. Sentia-se um pouco tímida, mas muito confortável com as roupas de Alex; eram do tipo que jamais usara, e tão diferentes de suas costumeiras vestimentas elegantes. Seus escudos. Caminhou até Alex escarrapachado em um dos sofás de couro na área da sala, os pés sobre uma mesinha de café de madeira pesada e escura. Ergueu os olhos enquanto ela se aproximava, e analisou: – Gosto do novo visual de Chelsea Maxwell. Ela riu de leve. – Camiseta e calça de moletom? Não acho o ideal. – Muito sexy – garantiu ele com seriedade, embora seus olhos brilhassem com humor. – E são fáceis de tirar. – É uma promessa? – Sem dúvida. Chelsea se sentou ao seu lado olhando em volta. – Não tem aparelho de televisão? – Respiro televisão demais no trabalho. Aqui é meu refúgio. – Seguroua pela cintura e a puxou para si em um gesto mais carinhoso que sedutor. Respirou fundo e deixou o ar sair dos pulmões devagar. – Nunca trouxe uma mulher para cá, Chelsea. – Nunca? – Nunca. Ela aquiesceu sem nada dizer e, em um gesto inusitado que ia contra seu instinto de proteção, apoiou a cabeça em seu ombro e fechou os olhos, murmurando com toda a franqueza: – Isto é assustador, Alex. – Eu sei. – Vivo a vida do meu jeito por um motivo. Os braços dele apertaram sua cintura, os dedos tocando seu ventre. – Eu também. E nenhum dos dois perguntou ao outro que motivo era esse. No momento, refletiu Chelsea, haviam alcançado o máximo de emoção e sinceridade possível, e não poderiam se abrir mais. Alex se levantou, pegou Chelsea pela mão, e rumaram para o final do apartamento até uma escada de ferro em espiral que, ela presumiu, devia conduzir ao telhado. – Hora de lhe mostrar o grande charme deste apartamento. – E o que é? – Espere e verá. Ela o seguiu pelos degraus em espiral até uma porta que se abriu para o telhado. Parou e admirou Manhattan em toda a sua glória reluzente de um lado, a escuridão do rio Hudson do outro, e uma piscina cercada por vidro. – Lindo. Sua própria piscina no telhado, e nem mesmo gosta de nadar. Ele riu de mansinho. – Mas aqui ninguém vai me empurrar na água e me ver afogar. Ela caminhou devagar em volta da piscina, admirando as luzes da cidade. – Não é preciso água para se afogar – murmurou, e logo desejou não ter dito isso. Informações demais. Fragilidade demais. Mas Alex não respondeu, só a observou, e, embora Chelsea se sentisse aliviada por ele não fazer perguntas, imaginou se ele simplesmente não estava interessado em saber. Talvez fosse melhor permanecer na superfície de tantas emoções intensas sem mergulhar. E, em vez de ficar contente com a ideia, isso a deixou inquieta e frustrada. – Hora de jantar – avisou Alex, e desceram. – Vai cozinhar para mim? – quis saber ela, enquanto se aboletava em uma banqueta alta na parte da cozinha e apoiava os cotovelos no balcão de granito preto com Alex do outro lado. – Não desejaria que eu cozinhasse para o seu pior inimigo, pois sou péssimo cozinheiro. Que tal encomendarmos? – Ótimo. Em geral, é o que faço. – Que tal pizza? – sugeriu ele. – Que tal comida tailandesa? Ele balançou a cabeça com olhar divertido e comentou: – Com você nada pode ser simples, não? – Nada – concordou ela solenemente, e de súbito o clima se tornou tenso como se ambos relembrassem o que já haviam feito e soubessem que desejavam mais. Alex pigarreou. – Então será comida tailandesa. Creio que tenho um cardápio por aqui. Minutos depois Alex já encomendara o jantar e eles voltaram para a sala. Chelsea sentou na borda de um dos enormes sofás. Tudo parecia tão estranho e ao mesmo tempo tão normal. Tão diferente de sua vida solitária, refletiu. Uma noite na casa do namorado, pedindo comida por telefone. Sentaram-se juntos e Alex passou o braço pelo seu ombro, puxando-a para si de novo. Era tão gostoso se sentir próxima de outra pessoa, pensou Chelsea, e a sensação confusa entre normal e bizarro quando encostava a cabeça em seu ombro voltou a dominála. Era tão bom se sentir próxima a alguém. Alex massageou os músculos de seu pescoço com os dedos fortes, rindo de mansinho ao fazer isso. – Você está muito tensa. – Não estou acostumada a isto. – A quê? Sentar em um sofá? – Basicamente. – Chelsea se endireitou para fitá-lo. – Não tive nenhum relacionamento significativo nos últimos dez anos, Alex. Arrependeu-se assim que falou. Soara tão sozinha e patética. Não acabara de dizer a si mesma que não deviam se aprofundar? Porém, lá estava ela, fazendo exatamente o oposto. Porque o oposto era o que queria, por mais que seu instinto de preservação negasse. Alex a fitou de maneira pensativa. Não havia pena no seu olhar, apenas consideração, felizmente. – Eu também não. – Só muitos encontros de uma noite. – Basicamente. E foi isso que me atraiu em você no início, Chelsea. Pensei que éramos iguais. – E fui. Sou. Alex sorriu de leve. – Qual dos dois tempos verbais, Chelsea? Ela balançou a cabeça, pois a confusão a obrigava a ser honesta, e murmurou: – Não sei mais. – Eu também não. Então, neste ponto, estamos no mesmo barco, certo? Mas que barco era esse? Alex se inclinou e a beijou nos lábios. Ah, esse barco, Chelsea pensou com alívio. Desse barco ela gostava. E esses beijos a desestruturavam. Eram tão doces, meigos, demais. Ele a mataria com tanta gentileza; derreteria a gélida Chelsea Maxwell e... o que iria sobrar dela depois? O interfone soou com seu jantar, e com relutância Alex se afastou. – Ainda não acabamos – avisou ele sorrindo, e Chelsea sorriu de volta, começando a odiar essa expressão. Ainda não acabamos. Mas em determinado momento acabariam... quando? Quem tomaria a decisão de acabar? Enquanto Alex pagava o entregador do restaurante, Chelsea foi à cozinha procurar pratos e talheres. Não pensaria no final desse relacionamento, prometeu a si mesma. Pararia de se preocupar e de ter medo, e aproveitaria os momentos com Alex... pelo tempo que durassem. PASSARAM O resto da noite comendo muitas iguarias tailandesas e conversando sobre tudo e nada. Chelsea contou como Michael a vira fingindo ser âncora do noticiário da noite depois da apresentação, como ela se sentira ridícula, mas mesmo assim ele lhe dera uma oportunidade. Como surgira a ideia do Bate-Papo com Chelsea após Michael ouvi-la conversando em uma festa com uma celebridade decadente e se impressionara com sua capacidade de fazer a pessoa se abrir. – Eu não estava nem tentando. – Chelsea riu. – Porém, a mulher bebera além da conta e quis fazer confidências. – E você estava no lugar certo na hora certa? – Creio que sim. – Embora não gostasse de atribuir todo o seu sucesso à sorte. – Não é apenas sorte – murmurou Alex, e ela o fitou espantada. – Fez de novo. Como soube o que estava pensando? – Não sei. Acontece. Ele a conhecia, refletiu Chelsea. Ela lutava contra isso, ainda mantinha tantos segredos a sete chaves, e mesmo assim Alex a conhecia. E no íntimo isso não a desagradava. – Venha – sussurrou ele, procurando a sua mão. Fez com que se erguesse do sofá, e a conduziu pelo apartamento banhado pelo luar que penetrava pelas inúmeras janelas e ia pousar no assoalho de tábuas de carvalho. Chelsea o seguiu, entrelaçando os dedos aos dele, até o quarto e a cama. Ele se voltou e lhe sorriu, e depois a puxou de leve, fazendo com que caísse sobre seu corpo de modo que os quadris dela encostaram nos dele, e ela sentiu a rigidez de seu órgão. – Olá – murmurou Alex, e Chelsea fechou os olhos recebendo um beijo na boca. – Olá. Passou as mãos pela sua nuca, retirou os grampos e fez seus cabelos caírem em mechas como um rio escuro sobre os ombros. – Nunca a vi de cabelos soltos – murmurou ele, deslizando os lábios para seu queixo. Chelsea estremeceu. – É um eufemismo? Um modo mais agradável de falar? – perguntou em leve tom de brincadeira, pois seu cérebro começava a não funcionar muito bem enquanto os lábios dele iam de seu queixo à garganta e depois para o meio de seus seios, muito perto da cicatriz. Chelsea ficou tensa, pois em dez anos nunca permitira que um homem beijasse seus seios, muito menos tirasse toda a sua roupa da parte de cima. Mas não se moveu enquanto Alex erguia a camiseta acima dos seios. Ela continuava de camisete e sutiã, e mesmo assim não era o suficiente. Os dedos dele deslizaram pela seda para envolver os seios. – Posso? – perguntou Alex, olhando fixamente para Chelsea e segurando a borda da camisete. Chelsea engoliu em seco e quase permitiu, com o coração aos pulos. Porém, quando Alex começou a erguer a peça de roupa, ela segurou sua mão. – Espere... – Não se sentia pronta para tamanha exposição. Ele já vira sua cicatriz, porém naquela ocasião Chelsea se ocultara atrás da raiva e do orgulho, mas agora era diferente. Agora não tinha nada com que se esconder a não ser o bocadinho de seda da camisete, e ele pareceu entender isso, pois apenas sorriu e baixou a mão. – Está bem – sussurrou e beijou-a de novo. Aliviada, ela se deixou cair sobre seu peito. Queria dizer que lamentava ainda não confiar tanto nele, mas as palavras morreram em sua garganta e Alex a beijou de novo, e não voltaram a se falar por muito tempo. Era um encontro totalmente diferente do outro, que fora violento. Dessa vez tudo era doçura e calma, deixando-a perdida em um novo mundo de sensações. Quando ele a penetrou, Chelsea passou as pernas de cada lado e o fez ir ainda mais fundo, olhos nos olhos. E, quando alcançou o clímax gritando e soluçando com alegria e entrega, ela beijou seus lábios. Depois ficaram deitados e abraçados entre os lençóis como ela imaginara, membros e dedos entrelaçados, ouvindo apenas o som de suas respirações entrecortadas enquanto os corações iam aos poucos se acalmando. E o luar continuava a se depositar silenciosamente sobre o assoalho de carvalho. Chelsea não saberia descrever o que acabara de acontecer nem o que se passava na sua alma. Queria dizer a Alex que ele conseguira romper a barreira deixando-a exposta, e que não era uma sensação ruim. Queria lhe dizer tantas coisas, desde os episódios tristes de sua infância aos anos perdidos do final da adolescência, passando por uma série de relacionamentos falidos até os três anos infernais com Brian Taylor. Queria, mas não contou. Seria demais para ele assimilar. E ainda não tinha certeza se Alex desejaria ouvir. Na verdade, acreditava que não. Por fim Alex adormeceu e Chelsea o observou por algum tempo. Dormindo ele parecia tão relaxado, quase um garoto. Os cílios escuros e fartos sombreavam as faces e seus lábios estavam entreabertos em um suspiro. Chelsea podia ver o sombreado da barba no queixo, e roçou os lábios ali. Alex se espreguiçou, passando a mão em seus cabelos e puxando-a para si. Ela se aninhou em seus braços por um momento, saboreando seu calor e solidez, e depois, quando ele voltou a se acomodar no sono, levantou-se da cama e enfiou a camiseta e a calça de moletom que ele tirara de seu corpo horas antes. Chelsea sabia que não conseguiria dormir nessa noite. Por mais que ansiasse pelo corpo de Alex ao seu lado durante toda a noite, sabia que não conseguiria relaxar. Abandonar toda a ansiedade e o medo tão comprimidos em seu peito. Então saiu do quarto dividido por estantes de livros e subiu a escada em espiral até a piscina. A porta rangeu quando abriu, mas Alex continuou adormecido sem se mover. Chelsea mergulhou na noite. A cidade se espalhava por todos os lados, os edifícios iluminados como joias de encontro ao céu fantasmagoricamente escuro. Ela caminhou devagar em volta da piscina, lutando contra uma tristeza inexplicável. Essa noite tivera os instantes mais doces e maravilhosos de sua vida nos braços de Alex. Sentia-se como se andasse pela borda de um novo mundo, vibrante e assustador, mas ao mesmo tempo... Não tinha certeza se poderia mergulhar nesse novo mundo por mais que desejasse. E, o mais importante, não tinha certeza se Alex a seguraria nos braços se caísse. ALEX ACORDOU no escuro e na cama vazia. Ficou tenso, detestando aquele espaço macio com os lençóis, pois apesar de quase sempre dormir sozinho, em uma única noite ficara viciado com Chelsea repousando ao seu lado. Sentia sua falta. Ali ficou por mais um momento, processando suas emoções e tentando resistir a elas. As coisas haviam mudado tão depressa e intensamente entre os dois, e mesmo tendo adorado a noite, meu Deus, não sabia quanto mais dessa estrada desejava percorrer. Quanto poderia percorrer. Relanceando um olhar para o chão, notou que Chelsea tornara a vestir as roupas emprestadas, sinal de que não fora embora. Rolou para fora da cama, procurando a roupa de baixo. Mais uma rápida olhada e verificou que Chelsea não estava no apartamento; a porta do banheiro estava aberta, o cômodo às escuras e vazio. Então subiu a escada em espiral, e parou quando a viu no outro extremo da piscina, de costas para ele, enquanto admirava a noite à sua volta. Os cabelos continuavam soltos caindo pelos ombros, e cruzara os braços sobre o peito. Parecia solitária, triste e linda, o que fez Alex sentir um aperto de pânico no peito. Demais. Tudo estava sendo demais. – Não conseguiu dormir? – perguntou ele, mas ela não se virou para encará-lo. – Não. Sofro de insônia, infelizmente. Ele deu um passo na direção de Chelsea, mas a piscina permanecia entre os dois como uma muralha de água. – O que estava pensando? – quis saber ele após um momento de pausa, logo desejando não ter feito a pergunta. – Nada de mais, na verdade. – Ela pressionou a palma da mão de encontro ao vidro, esparramando os dedos longos e delgados. – Apenas refletia como seu apartamento é fantástico. Sinceramente. Alex não acreditava que ela estivesse apenas admirando a arquitetura, porém não desejou pressioná-la. Talvez devesse se envergonhar de se sentir constrangido nesse instante, mas francamente as emoções haviam sido muitas e inéditas para um só dia, para eles dois. A única coisa que desejava nesse momento era levá-la de volta para a cama, mantê-la ali com seus braços à sua volta e seus corpos unidos da maneira harmoniosa que já conhecia. – Você percorreu um caminho tão longo... – murmurou ela, tão baixo que ele mal ouviu. – Não acha? – De certa maneira, sim. Mas por outro lado... – Ele deu de ombros. – Sempre serei aquele garoto pobre do Bronx. – Tem razão. As pessoas nunca escapam do passado, não é mesmo? Todo o corpo de Alex se contorcia com a vontade de dar um fim a essa conversa e levá-la para baixo. – Pode-se aprender muito com o passado – respondeu, pensando que era uma frase decisiva para terminar com o bate-papo indesejável. – Sim. Tem absoluta razão. Pode-se aprender a não cometer os mesmos erros duas vezes. Alex refletiu de que diabos ela estaria falando. Mas, fosse lá sobre o que fosse, sabia que não desejava ouvir. – Volte para a cama, Chelsea – disse, e por fim ela se virou, lançando-lhe um sorriso doce e triste que quase partiu o coração de Alex. Então, em silêncio, ela andou em volta da piscina, pegou a mão dele e o conduziu de volta para a cama. CAPÍTULO 11 PENSATIVO, ALEX olhou pela janela de seu escritório e de volta ao texto que Hunter lhe enviara nessa manhã. Retrocesso. Zoe não vai falar. Então Zoe podia ajudar Hunter, mas não Alex. Confrontaria Treffen em seu local de trabalho, com todos os seus associados presentes, como ela fizera ao lado de Hunter na semana anterior, mas não ao vivo na televisão. Alguns dias antes Treffen fizera um pronunciamento público dizendo que estava deixando sua firma de advocacia. Era uma desculpa fajuta, é claro, mas saíra da firma. E enquanto Alex, junto a Hunter e Austin, soubesse que estavam se aproximando do desfecho desejado, ele continuava muito satisfeito. E insatisfeito ao mesmo tempo, porque ainda estava muito longe de conseguir a prova de que Chelsea necessitava. E, para ser honesto, nem mesmo tentara com afinco. Mal pensava em Treffen desde que Chelsea vira a foto. De alguma forma, seu objetivo principal, que era desmascarar definitivamente Treffen, parecia ter se perdido no caminho de seu relacionamento. Relacionamento. De onde, diabos, tirara essa palavra? Não tinham nenhuma droga de relacionamento. Haviam feito sexo. Três vezes. Nessa manhã Chelsea deixara a cama de Alex, agarrara suas roupas rasgadas e abotoara a capa impermeável até o queixo. A cada botão Alex sentia como se Chelsea fosse se escondendo dele cada vez mais, sua expressão de novo uma máscara de frieza, ocultando a Chelsea calorosa e aberta com quem fizera amor durante metade da noite anterior, e Alex tentara convencer a si mesmo que isso era muito bom. Sabia que não desejava ouvir as histórias tristes e secretas de Chelsea, e tinha certeza de que ela sabia disso também. Precisavam não dar tanta importância àquilo que estava acontecendo entre eles. Mas será que já não haviam se aprofundado demais um no outro? Essa nova situação não era fácil. Machucava. E mesmo ansiando por possuir Chelsea de novo ainda refletia sobre as vantagens de fugir. Correr o mais que pudesse nas circunstâncias, pois não podia desaparecer completamente, já que precisava dela para ajudá-lo a derrubar Treffen. Respirando fundo com impaciência, Alex digitou uma mensagem de volta para Hunter. Chelsea não enfrentará Treffen sem uma fonte confiável. Precisamos de Zoe. Ou, se Zoe continuasse a se recusar, talvez pudessem encontrar outra pessoa. Quem sabe ela revelasse o nome de outra vítima. De qualquer modo, refletiu Alex, precisava parar de ser ridículo e ficar remoendo o que sentia ou não por Chelsea, e começar simplesmente a agir. Encontraria outras mulheres vitimas de Jason. Alguém disposta a falar. Precisa contar para Chelsea a respeito de Sarah. Ele omitira tanta coisa. Não contara para Chelsea que a moça da fotografia fora sua amiga ou que cometera suicídio. Não revelara como ele a desamparara quando mais precisara. E não queria revelar. Não conseguia admitir nenhuma dessas coisas nem a dor em seu íntimo, a qual se recusava a admitir ou sentir. Encontre outra vítima. Outra mulher cuja vida tivesse sido destruída por Jason Treffen. Essa era a solução mais fácil, embora não muito honesta, e iria tomá-la. Várias horas mais tarde Alex rumava para o centro da cidade para seu jogo de squash com Jaiven. Não via o amigo desde que bebera uma cereja com ele em um bar do Bronx, quando Chelsea Maxwell já tomara conta de seus pensamentos. E continuava tomando. Ele não telefonara para Chelsea, embora pensasse em fazer isso todos os dias. Haviam deixado as coisas abruptamente e de uma forma indefinida naquela manhã e, olhando para trás, Alex percebeu que Chelsea praticamente saíra correndo de seu apartamento sem um último olhar para trás. E ele permitira que assim fosse. Talvez fosse melhor assim, dizia a si mesmo, pelo menos mais fácil. Mas, por outro lado, talvez não fosse. – Então conseguiu acertar as coisas com a garota que estava deixando você maluco? – perguntou Jaiven, enquanto atirava a bola com força no muro. Alex rebateu com segurança, comentando: – Boa memória a sua. – Então creio que não conseguiu. – Como sabe? – perguntou Alex. – Porque, do contrário, teria respondido simplesmente que sim. – Quem sabe desejo manter minha vida pessoal só para mim – sugeriu Alex. – Vida pessoal? – repetiu Jaiven, lançando a bola de encontro ao muro. – Pensei que estávamos falando sobre sexo. – Tanto faz – resmungou Alex, perdendo a jogada. Uma hora e três jogos terríveis mais tarde, Alex vencera, porém por pouco. Ele e Jaiven tomaram banho e rumaram para o bar que só servia sucos e vitaminas no último andar da academia. – E quem é ela? – perguntou Jaiven, enquanto tomava um milk shake de proteínas. Alex balançou a cabeça. – Ninguém que você conheça – respondeu evasivamente. Pelo menos não era ninguém que ele conhecesse em pessoa. – Pergunto porque anda péssimo, meu amigo. – Foi a vez de Jaiven balançar a cabeça, fingindo estremecer, ou, quem sabe, não fosse fingimento. – Antes você do que eu. Sim, ele estava mal, percebeu Alex de supetão. Queria... precisava... ver Chelsea de novo, e muito em breve. Não apenas para sexo, embora sem dúvida ansiasse por isso. Entretanto, queria mais do que simples... e não tão simples... sexo. Queria encomendar comida – dessa vez insistiria na pizza – e sentar em um sofá com as pernas dela em seu colo. Queria contar a Chelsea sobre seu dia e sobre o contrato com o âncora que se tornara uma terrível dor de cabeça. Queria simplesmente estar com Chelsea. Que diabos estava acontecendo com ele? Uma hora depois Alex estava de volta ao seu escritório, digitando o número do celular de Chelsea. Ela atendeu no segundo sinal. – Sim? – perguntou com a voz cautelosa. – O que vai fazer hoje à noite? – Tenho que adiantar o trabalho, Alex. Ele concluiu que Chelsea estava agindo com cautela e tentando se afastar. Bem, ele iria atacar. – Ótimo, eu também tenho trabalho a fazer. Deixe-me ir à sua casa e levarei o jantar. Ela respirou fundo. Uma sugestão tão simples, e ao mesmo tempo tão complicada para duas pessoas que pensavam como eles. – Chelsea – murmurou ele com suavidade, e foi o suficiente. – Está bem – respondeu ela –, mas preciso mesmo trabalhar. Ele chegou ao apartamento dela dez minutos depois das 19 horas com uma pilha de papéis e uma enorme pizza de pepperoni. Chelsea atendeu a porta ainda usando suas roupas de trabalho: blusa de seda cor de marfim e saia justa preta. Balançou a cabeça diante da pizza. – Deve estar brincando – comentou. – Reconheça que adora – provocou ele. – Não como um pedaço de pizza há anos. – Que tristeza. Ela sorriu. – Pode ser, mas creio que só um pedaço não me fará mal. Não vou gravar amanhã. Alex levou a pizza até a mesinha de café cromada com tampo de vidro no meio da sala de estar. Olhou em volta para os sofás de couro branco e o tapete de aparência cara, também branco e fofo. – Este lugar está implorando por uma mancha de gordura. Como consegue comer aqui sem sujar nada? Ela deu de ombros e sentou na beirada de um dos sofás. – Não faço isso. Como na cozinha ou fora de casa. Ele lhe entregou um pedaço de pizza, e ela aceitou, enquanto se sentaram um em frente ao outro como se fossem tratar de negócios durante um jantar. Alex não sabia se dava uma risada ou se resmungava. Ou se saía correndo dali. O que estava pretendendo, afinal? E mesmo assim disse: – Que parte disso tudo a deixa louca, Chelsea? Ela virou o rosto para o lado. – O que quer dizer? – Sabe muito bem. – Alex mal acreditava que estava dizendo essas coisas, mas mesmo assim as palavras iam escapando de sua boca. – A última noite juntos foi intensa e me deixou um pouco assustado, ou muito assustado, mas continuo desejando você. – De verdade? – replicou Chelsea, mas ele percebeu o tom de cinismo em sua voz, e franziu a testa. – Sim... – Creio que você quer um pedacinho de mim, Alex – prosseguiu ela. – Algumas horas de diversão e momentos quentes de sexo, além de um bate-papo casual de vez em quando sobre nossas vidas. Mas, o pacote completo? A coisa verdadeira? – Ela o encarou com firmeza. – Não acho que esteja preparado para isso. Ele se sentiu exposto sob o olhar dela, revelando-se de um modo que de fato não gostava, pois sabia que Chelsea tinha razão. Alex não soube o que fazer a respeito. – Talvez não esteja – replicou depois um longo e constrangedor momento. Chelsea apenas deu de ombros, e ele se forçou a perguntar: – Qual é a verdade, Chelsea? Ela balançou a cabeça e sorriu sem alegria. – Como já disse, você não quer um relacionamento, Alex. Raios! Isso o deixou aliviado. – Muito bem – murmurou ele após um momento. – Vamos comer a pizza antes que esfrie. E foi muito gostoso e agradável. Voltaram a provocar um ao outro e a flertar um pouco. Tudo simples e seguro. Chelsea comeu três pedaços de pizza antes de gemer e se recostar no sofá, apertando com as mãos o ventre liso. – Vou arrebentar o cós da saia. – Eu acho que vou gostar de ver isso – brincou ele. Ela deixou escapar uma risada e inclinou a cabeça antes que sua expressão se tornasse séria de novo. – Sabe que precisamos conversar sobre Treffen. Li no jornal que ele deixou a firma de advocacia. Quem é o responsável por isso? – perguntou. – Hunter – respondeu Alex. Chelsea aquiesceu com um gesto de cabeça lento. – Descobriu mais alguém que possa falar? Alex ficou tenso. – Ainda não. Ela ficou em silêncio por um momento. Depois disse: – Treffen me pediu que assinasse um papel. – Restringindo a entrevista para certas perguntas programadas? – ele se adiantou. – Isso mesmo. Alex fez um gesto de compreensão. – Já esperava por isso. – E sabe o que acontecerá se eu não obedecer ao acordo? – perguntou ela com a voz um pouco trêmula. – Ele a processará – respondeu Alex. – E provavelmente você será demitida do emprego. Os olhos dela fuzilaram-no. – Bem, contanto que você saiba de tudo isso. – Contanto que você saiba, Chelsea. – Ele afastou o pedaço de pizza que comia. – Sei o que estou lhe pedindo. – Não creio que saiba. – Essa entrevista poderá acabar com seu trabalho na AMI, porém poderá deslanchar sua carreira, e Treffen não conseguirá processá-la por difamação se as acusações forem verdadeiras. Ele irá para a prisão. – Assim você espera – zombou ela. – Sim, espero. Chelsea suspirou e balançou a cabeça. – Preciso de mais, Alex. Não posso surgir ao vivo na televisão sem nada a não ser uma única foto e uma irmã aborrecida. Sabe disso muito bem. Mencionou uma testemunha, não? Onde está essa pessoa? – Não deseja falar. – E será que falaria comigo? Alex não pensara nessa possibilidade. Será que Zoe conversaria com Chelsea mesmo sem ir à televisão? – Pode ser – respondeu com cautela. – E não me conseguiu mais nada? Alex ficou em silêncio porque sabia ter mais para lhe contar. As palavras não saíam, entretanto ela devia ter sentido o peso daquele silêncio que escondia tantas coisas, e o fitou com intensidade. – Não me contou tudo, contou? – Pressionou a palma da mão de encontro aos olhos. – Sou tão estúpida, tão cega. Claro que não me contou. Não iria atrás de Treffen desse modo, não o odiaria tanto, se não fosse um assunto pessoal. Deveria ter percebido antes. A garganta de Alex estava seca. Seu rosto parecia pálido. Chelsea deixou a mão cair no sofá, e perguntou com simplicidade: – Quem era ela? – Não sei... – Tolice, Alex, pensei que estávamos tentando ser honestos um com ou outro. Se não sobre... nós dois, pelo menos sobre Treffen. Ele abriu a boca e foi tudo que conseguiu fazer. – Quem era ela? – insistiu Chelsea. – A mulher que o deixou tão determinado e desesperado para arruinar e desmascarar Treffen? Era sua namorada? Amante? Ele tentou com esforço formular as palavras, mas seus lábios não conseguiam se mover. Alex sentia o coração disparado, o sangue abandonando sua cabeça. Por que isso era tão difícil? – Era ela, não era? – disse Chelsea com suavidade. – A garota na fotografia. Você a amava. Com enorme esforço, Alex balançou a cabeça e falou por fim: – Sarah. O nome dela era Sarah. – O que aconteceu com ela? – insistiu Chelsea. – É obvio...? – A voz de Alex saiu entrecortada e selvagem. – Quero dizer, depois – consertou Chelsea. – Porque você me disse que ela não estaria disponível para falar. – Ela está morta. Chelsea abriu a boca e baixou a cabeça com os olhos escuros de pena. – Oh, Alex. – Ela se matou. Atirou-se do telhado no prédio de Treffen. – Lamento tanto. Ele aquiesceu com um gesto de cabeça tenso. Agora que começara a contar, queria despejar toda a história. Purgar sua alma, mesmo sentindo que não se sentiria melhor contando toda a verdade. Provavelmente seria pior. – Fomos amigos durante toda a época de faculdade. Os melhores amigos, na verdade. Nunca houve nenhum envolvimento romântico; ela saía com um de meus colegas de quarto, Hunter Grant. – O ex-jogador da Liga Nacional de Futebol – murmurou Chelsea. – Sim, mas fui amigo dela primeiro. Não que isso venha ao caso, porém nós dois éramos de cenários difíceis, nada de piqueniques em família e de férias na Flórida como você. Assim dizendo, Alex ergueu os olhos e viu algo como remorso ou mesmo culpa contorcer as feições de Chelsea antes que ela acenasse que sim e pedisse: – Prossiga. – Sarah era como uma irmã para mim, irmã caçula. Eu a protegia, provocava, cheguei até a dar um soco em Hunter certa vez, quando achei que estava sendo arrogante com ela. Chelsea sorriu com discrição. – Conhecendo a reputação de Hunter, tenho certeza de que você teve razão em socá-lo. – Porém, no final... – Alex se deteve, não desejando admitir o resto, como abandonara Sarah terrivelmente. – Foi demais para Sarah – revelou, as palavras saindo de sua boca lentamente. – Não sei como aconteceu, como eu... não percebi, Sarah foi sugada para o buraco negro criado por Treffen e eu nem vi. Não... – Não ouvi quando ela tentou me contar. Impossível confessar isso para Chelsea. Não poderia se desculpar nem se explicar para ela. E não desejava admitir uma fraqueza assim vergonhosa. – E como você poderia imaginar uma coisa dessas? – perguntou Chelsea com tristeza na voz, fazendo-o balançar a cabeça. – Deveria ter percebido, precisava ter suspeitado. Deveria ter dado ouvidos para o que a Sarah tentava me contar, mesmo que ela titubeasse e sentisse vergonha. – Fácil dizer – comentou Chelsea, e Alex evitou olhá-la. Não queria que ela visse a culpa em seu rosto, e descobrisse que ele não estava contando tudo. Que não precisara de muita informação, pois já possuía bastante naquele tempo. O suficiente para refletir, perguntar mais, confortar. O suficiente para salvar Sarah. Contudo, não diria isso agora. Não podia. Não gostava de falar nem pensar sobre Sarah. Nem mesmo no canto mais recluso de seu cérebro, e certamente não para Chelsea. Era por isso que não conversara a respeito de Sarah até esse momento. O motivo para sempre fitar aquela fotografia por muito tempo, mesmo desejando rasgá-la em pedacinhos e garantir que ninguém mais a visse outra vez. Chelsea dissera que ele não estava preparado para ouvir seus segredos, e também não estava preparado para fazêla ouvir os seus. – Alex. – A voz de Chelsea era suave, tão plena de dor, mágoa e compaixão, que Alex sentiu lágrimas nos olhos. Piscou diversas vezes com fúria para afastá-la. Não merecia a compreensão e piedade de Chelsea. Não as queria. – Não foi sua culpa – disse ela, e Alex não respondeu. Estava paralisado, porque, diabos, fora sim sua culpa, porém não confessaria isso para Chelsea. – Alex – repetiu ela, e venceu a distância entre os dois, colocando os braços à sua volta e inclinando a cabeça dele para seu ombro. Alex não resistiu, mas também não relaxou com o abraço. Não merecia o consolo que Chelsea tentava lhe dar, mesmo que ansiasse por ele. Ansiava pela absolvição que não devia partir de Chelsea. Apenas Sarah poderia perdoá-lo, e estava morta. Chelsea o soltou, se recostou no sofá e fitou-o intensamente. Seus olhos cinzaesverdeados analisavam o rosto dele, encontrando... o quê? Será que ela conseguia ver a culpa que ele tentava ocultar com tanto empenho? Alex abriu a boca para falar, se esforçando para encontrar algo para dizer. Não vai dar certo, Chelsea. Deixeme em paz, diabos. Não suporto mais. Porém, Chelsea não lhe deu chance de se proteger. Simplesmente o pegou pela mão e o conduziu para seu quarto, com o rosto grave e determinado, e ergueu o top que usava acima da cabeça. Alex observou enquanto ela retirava a camisete e abria o sutiã. Depois ficou despida na sua frente sem nada para esconder a cicatriz, uma cicatriz que, Alex bem sabia, a deixava sempre muito constrangida e que possuía uma história terrível por trás. Chelsea retirou o resto das roupas e, quando ficou completamente nua, começou a tirar as roupas de Alex. Gentilmente, quase com reverência, seus dedos ágeis e macios tocavam a pele dele. E depois o beijou com doçura, porém ele a desejava demais e a puxou de encontro ao próprio corpo, beijado-a de volta com uma urgência desesperada que se avolumava como um grito em sua alma. E ela correspondeu, retribuiu, beijo a beijo, toque a toque, até que se afastou de repente, deixando-o tão desarvorado que quase o fez gritar, e a seguir ela se ajoelhou aos seus pés. – Chelsea... – murmurou Alex, porque sabia que talvez o gesto a deixava muito vulnerável. Ela ergueu o rosto e murmurou com meiguice: – Deixe. E tomou o órgão intumescido entre os lábios entreabertos. Alex estremeceu ao sentir a carne macia se fechando sobre a pele sensível, e passou as mãos pelos cabelos dela. – Chelsea – conseguiu dizer com a voz rouca cheia de desejo e prazer. Piscou diversas vezes, a sensação maravilhosa. Porém, ele sabia o quanto esse gesto estava custando para ela. Ficar de joelhos na sua frente como ele fizera com ela. Deixando-se subjugar e expondo sua cicatriz. Chelsea estava lhe concedendo tudo, e ele retribuiu, estremecendo e gritando seu nome ao atingir o clímax. Mais tarde, quando estavam deitados na cama em silêncio, após fazerem amor lentamente e com muita doçura, Alex circundou a cicatriz com um dedo, e depois apertou o polegar sobre a pele endurecida e marcada. Ela rolou para perto, aninhando o corpo ao dele como se fosse um ponto de interrogação, sempre sentindo os dedos dele sobre sua cicatriz. – Não foi um acidente de carro – sussurrou, e ele não fez perguntas. Apenas a abraçou, porque sabia que era isso que Chelsea precisava. E ele precisava também. CAPÍTULO 12 CHELSEA deitada ao lado de Alex, o braço dele sobre seu corpo enquanto dormia, e ela fitou o teto imaginando quando fora a última vez que se entregara desse modo a um homem. Lembranças que reprimira por tanto tempo vieram à tona de modo doloroso, mas necessário. O olhar analítico de Brian Taylor quando ela fizera testes para ser a garota do tempo. E o que está disposta a fazer para conseguir este trabalho, srta. ESTAVA Jensen? Ora, faria qualquer coisa, senhor. E ela pestanejara. Sorrira com malícia. Não deixara dúvida sobre o que estava querendo dizer. E ele levara ao pé da letra... ou as implicações do que ela dissera... e se levantara da cadeira. Agendara uma reunião particular com ela e quase a arrastara da sala, na frente de dois executivos, uma secretária e um mensageiro. E ela o seguira, o rosto ardendo, mas o queixo erguido, e assim que a porta se fechara ele a fizera sentar sobre um armarinho com panos de chão e baldes, levantara sua saia e a possuíra. Depressa. Um ato sujo. E que podia destruir a alma de uma moça caso ela tivesse uma alma. Entretanto, ela não tinha. E havia outras lembranças amargas como essa. As piadas e indiretas de toda a equipe. Os olhares lascivos e as propostas de todos os empregados homens da estação de notícias. E Brian, sempre Brian, possuindo-a sempre que queria. Usando-a como bem entendesse. Ela enfrentara tudo isso mantendo a cabeça erguida. Não se curvara nem pedira desculpas pelas suas escolhas. Uma garota fazia o que tinha que fazer, portanto dera respostas sarcásticas para os amigos. Pisara nas rivais. Mantiverase forte até que aquele homem arrogante a deixara sem dois dentes e com problemas de visão. Quando ela saíra do hospital era outra pessoa, de quem detestava se lembrar. Desesperada, paranoica, com severos ataques de ansiedade, e três receitas dos médicos para se manter sã. Graças a Deus se reerguera e tivera a força para recomeçar. E agora queria recomeçar. E dessa vez seria para valer. Com Alex. Desejava um relacionamento saudável, positivo e amoroso. Estava farta de sua existência fria e isolada, sempre armada com a imagem de glamour e segurança. Queria ser verdadeira do modo como Alex fora verdadeiro com ela. Mais ou menos. Será que ele lhe contara tudo? Chelsea sentia que Alex ainda escondia algo, e de segredos ela entendia muito bem. Entendia sobre esconder, sobre escuridão. E só em pensar em contar seus segredos a fazia se encolher como uma tartaruga escondendo a cabeça no casco. Proteja-se de qualquer maneira. Além disso, mesmo que arrumasse coragem para falar de seu passado com Alex, talvez ele não quisesse ouvi-la. Admitira isso na noite anterior, e as coisas haviam mudado para ela. Ver Alex um pouco vulnerável despertara seu desejo e a necessidade de ser vulnerável também. Um pouco. Primeiro passos, certo? Talvez um dia chegassem lá, em algum lugar. Mesmo que levasse muito tempo. Ela segurou a face de Alex com delicadeza e deslizou o polegar sobre seus lábios. Depois se inclinou e o beijou muito docemente para que não acordasse, imaginando o que aconteceria agora. Devia ter adormecido inesperadamente, porque Alex a despertou com um beijo logo após o amanhecer. Fizeram amor devagar e com ternura, e Chelsea ali ficou, saciada e feliz com nunca, até que olhou para o relógio. – Passa das seis... – murmurou, se levantando de supetão e em pânico. – Tão tarde assim para acordar no Mundo de Chelsea? Ela o fitou com ironia. – Não finja que não é viciado em trabalho. – Não fingirei, porém não me sinto assim agora. Volte para a cama. – Estendeu um braço para ela. – Avise que está doente. – Não posso, Alex. Ele sorriu e deixou o braço pender. – Acho que também não posso. Que tal no fim de semana? – O próximo? – Vamos viajar. Surpresa e preocupação a dominaram. – Para onde? – Que tal Miami? Um voo rápido. E está quente nesta época do ano. – Está bem – concordou Chelsea, sentindo algo adorável e precioso florir em seu íntimo. Um fim de semana fora. Tão normal, e mesmo assim maravilhoso. Sorrindo, ele atirou as cobertas para longe. – Estou mesmo atrasado. Teria um barbeador no armário do banheiro? Ela sorriu também. – Desculpe, mas não tenho. – Não pensei que tivesse. – Nunca antes um homem passou a noite aqui – explicou ela. – E eu nuca dormi na casa de ninguém antes. Ele a fitou longamente com um olhar que parecia dizer como aquela situação era nova... para os dois. Extraordinário como iam da ironia à emoção. À honestidade. E mesmo assim manter tanta coisa escondida. Chelsea foi ao banheiro luxuoso com uma enorme banheira e o chuveiro para duas pessoas. – Não tenho mesmo um barbeador – anunciou, abrindo um armário e pegando seu creme facial. – Nossa! Quantos band-aids! Chelsea parou com o pote de creme na mão. – Quê...? Alex escancarou a porta, perguntando com ar de troça enquanto Chelsea ficava vermelha: – Era uma liquidação? Muito bem, ela guardava muitos bandaids. Caixas e mais caixas nos mais diferentes tamanhos, dos pequeninos aos enormes. Percebia que podia parecer um pouco... neurótico. Ela fechou a porta do banheiro com firmeza, dizendo: – Gosto de estar preparada. – Gosta mesmo. Percebeu o olhar pensativo de Alex e soube que refletia. Mas não estava pronta para explicar. Sua infância feliz? Não fora assim feliz. E sempre que precisara de band-aid não havia. Ninguém para cuidar de seus joelhos machucados. Sua mãe jamais viera correndo para beijá-la e mimá-la. Uma coisa tão insignificante, entretanto que ficara gravada na sua mente, fazendo-a estocar curativos. Nunca percebera antes que fazia coleção deles, apenas que quando ia à farmácia sempre comprava mais uma caixa. Para garantir. Para se sentir a salvo. Embora nunca tivesse se sentido a salvo. Até que conhecera Alex. Foi apenas quando chegou ao trabalho e viu a lista de perguntas previamente aprovadas em um fax que sentiu pânico. Faltavam três semanas para sua importante entrevista no horário nobre. Poderia pensar em sabotar Treffen? Confrontá-lo? Só em pensar nisso sentiu as palmas das mãos suadas e viu pontos escuros diante dos olhos. Afastou o pânico. Alex precisava encontrar outra testemunha. Ambos sabiam disso, e, até que ele conseguisse, ela nada podia fazer. Mesmo lembrando-se do olhar de Sarah estendida naquela cama que a assombrava, porque se reconhecera ali. Vira a si mesma assim, em cada foto tirada durante os três anos que ficara em Huntsville. Não queria que Alex soubesse disso e não demonstrara emoção ao ver a foto de Sarah. Mas sentira o desespero como se Sarah gritasse para ela. Aprenda com meus erros. Chelsea esperava ter aprendido. Dois dias depois estava sentada na primeira classe de um voo para Miami ao lado de Alex. Observou-o passar os olhos pelo jornal que recebera no avião, uma das mãos repousando na sua coxa, e refletiu, surpresa, como haviam avançado na relação. Quem os visse diria que eram um casal normal, e talvez a normalidade no momento fosse tão preciosa porque parecia fácil. Correta. Alex a fazia se sentir assim. Esse homem poderoso, complexo, bondoso... que ela amava. Impossível deixar de se sentir assim. Ou querer se sentir assim. A história simplesmente fora longe demais. Precisava parar de querer se sentir segura, sã e protegida. Chelsea o amava e queira amar apesar de conhecer os riscos. Alex poderia concluir que ela era muito difícil ou muito estragada e dar um basta naquilo. Ela poderia culpá-lo? Chelsea sabia que era uma pessoa muito complicada. Só não sabia quanto tempo mais poderia ocultar essa verdade. TRÊS HORAS depois deram entrada em um luxuoso resort em Miami Beach. Alex foi para o terraço que ocupava toda a fachada do apartamento e aspirou o ar balsâmico, surpreso com o quanto se sentia feliz. Espantado por ver como fora bom contar todo para Chelsea. Bem, quase tudo. Segurou com força o gradil do terraço sentindo vergonha. Não contou tudo para ela, idiota. Não contou nada. E ela não lhe contara... nada também. E Alex não sabia se queria ouvir. Respirou fundo, odiando saber que ainda escondiam muito um do outro, e ciente de que não estava preparado para contar mais. O que tinha, decidiu, precisava bastar. Um dia ensolarado e quente. Um belo quarto de hotel, uma mulher linda. Ouviu o rumor da porta de vidro, e Chelsea veio ficar ao seu lado. – Admirando a vista? – perguntou, fazendo-o sentir que a pressão em seu peito desaparecia. Isso era o suficiente. Precisava ser. – Então, o que faremos hoje à noite? – quis saber Chelsea, animada enquanto ambos fitavam o oceano. – Jantar na praia ou no centro, no Coconut Grove? – Fitou-o com um sorriso de flerte. – Ou podemos pedir o jantar no quarto. – A última opção sem dúvida é a mais atraente -– respondeu Alex –, mas vou levá-la a Allapattah. – Alla-o quê? – Um bairro latino na parte oeste de Miami. Ela o fitou, pensativa, e depois murmurou: – Está bem. O que Alex não lhe contara com medo de que se assustasse era que iria levá-la à casa de sua mãe. Se bem que, na verdade, era ele quem estava muito assustado. Há dois dias parecera natural quando ligara para a mãe. Ela morava em Miami agora; por que não podiam todos se encontrar? Porém, no momento presente parecia que estava dando uma importância e um significado muito grande ao relacionamento com Chelsea, e isso o alarmava. Ora! Talvez estivesse lhe dando muito valor, e daí? Alex engoliu em seco e sorriu depressa para Chelsea, que estava relaxada, meiga e feliz. Talvez desse muito valor a ela de verdade. ALEX LHE dissera para se vestir com simplicidade para o jantar, esquecendo que Chelsea não tinha roupas displicentes. Ela trouxera na mala duas calças tipo pescador, duas calças sociais, um vestido pretinho e alguns tops clássicos, mas na verdade nada era muito simples. E nada que ela gostaria de usar agora. Então, enquanto Alex tomava banho, Chelsea correu para uma das butiques no saguão do hotel e comprou um vestido de verão com alças finas, amarelo-ouro. O decote permitia ver um pouco de pele marcada, que era o início da cicatriz. Ela não usava nada parecido há dez anos, desde que Brian Taylor a surrara até que desfalecesse e lhe apontara uma faca. Mas usaria agora. Aplicou apenas um pouco de brilho labial e deixou os cabelos soltos sobre os ombros. Comprou também um par de sandálias com tiras que nada tinham a ver com seus costumeiros saltos altíssimos. Quando entrou na sala da suíte, Alex a fitou por longo tempo. – Está – começou a dizer, se aproximando para beijá-la – incrível. E era assim que Chelsea se sentia. Mas, por quanto tempo? Quanto mais até um dos dois decidir que estavam exagerando e sendo muito intensos e emocionais, e que era hora de terminar? No terraço Alex parecera preocupado, e Chelsea matutara sobre o que estaria pensando. Não ousara perguntar. Que estranho relacionamento aquele. Um passo de cada vez, tratou de lembrar com certo desespero, pequenos passos, mesmo que alguns fossem para trás. Pegaram o carro alugado, um conversível cor de cereja, e percorreram Miami enquanto o sol desaparecia no oceano e a noite cobria a cidade. – Aonde vamos exatamente? – quis saber ela enquanto Alex deixava o centro de Miami e penetrava em uma zona residencial. – Por acaso conhece algum restaurante secreto? – Mais ou menos isso – respondeu Alex ao parar em frente a um pequeno bangalô com um lindo jardim. – Minha mãe é uma grande cozinheira. O choque a deixou rígida. – Sua mãe? – repetiu por fim, sem poder acreditar e cheia de medo. – Você me trouxe à casa de sua mãe? – Sim... – Mas pensei que tivesse crescido no Bronx! – E cresci. Mas quando fui para a faculdade ela se mudou para Miami a fim de ficar perto da irmã, minha tia Patricia. Chelsea balançou a cabeça, pressionando as mãos nas faces. – Deveria ter me dito, Alex. Não estou preparada para isso... E também não achava que ele estivesse. Alex simplesmente lançara seu relacionamento tão frágil na estratosfera. Ela estava para conhecer seus pais. – Não lhe disse porque sabia que ficaria nervosa – respondeu Alex com calma. – Minha mãe é uma pessoa muito carinhosa e compreensiva. E vai aceitar você. – Deixou escapar o ar dos pulmões devagar. – Não se trata de um teste ou de um campeonato, Chelsea. Simplesmente ela mora em Miami e eu quis vê-la. Só isso. Prometo. Seria uma promessa ou um aviso? Não tente ler nas entrelinhas, Chelsea. Certo, não leria. Mas continuava sendo obrigada a conhecer a mãe dele. – Tudo bem – murmurou com voz calma, graças a Deus, e Alex sorriu rapidamente. – Agora vamos. minha mãe faz uma empanada sensacional. Chelsea o seguiu para o bangalô com o coração começando a disparar e as palmas das mãos suadas. Estaria tendo um ataque de ansiedade? Quase entrou em pânico, mas percebeu que não era isso. Não, estava apenas nervosa por ir conhecer a mãe de seu namorado. Seu namorado. Podia chamar Alex assim? Engoliu em seco sentindo a garganta áspera, e tentou estampar um sorriso alegre no rosto. Sabia que Alex ainda acreditava que tivesse tido uma infância feliz, que estava familiarizada com reuniões de família, quando na verdade não poderia estar mais enganado. Ela jamais conhecera os parentes da mãe, e o Dia de Ação de Graças, Natal e aniversários passavam em branco normalmente. Essa experiência era nova para ela de várias maneiras. – Alex! – Uma senhora abriu a porta do bangalô e estendeu os braços. Alex mergulhou no abraço com um sorriso doce, e a senhora falou depressa em espanhol por alguns segundos antes de olhar para Chelsea. – Seja bem-vinda. Meu nome é Beatriz – disse em inglês. – Estou tão feliz em conhecê-la. – Digo o mesmo – murmurou Chelsea. Gostou à primeira vista da mãe de Alex; era uma mulher alta e com uma postura orgulhosa, cabelos negros estriados de cinza e os mesmos olhos dourados do filho. – Entrem – convidou Beatriz, pegando a mão de Chelsea. – Todos querem conhecê-la. Chelsea enrijeceu de novo. – Todos? – murmurou, lançando um olhar de pânico para Alex, que parecia surpreso, mas nada constrangido. – Quem você convidou, mama? – perguntou Alex, e Beatriz riu. Apenas Patricia e suas filhas com os maridos e as crianças, você sabe. Parecia uma multidão para Chelsea, que sentiu a visão embaçar. Muito bem, agora estava tendo um ataque de ansiedade. – Só um segundo, mama. – Alex arrastou Chelsea pela mão e ficaram do lado de fora enquanto Beatriz entrava no bangalô. – Droga. Deveria ter imaginado que ela faria algo do gênero. – Fitou-a e Chelsea percebeu a preocupação em seus olhos. – Se não se sente bem com esta situação, iremos embora já. – Você se sente bem com a situação? – perguntou ela com o costumeiro tom de cinismo. Alex franziu a testa. – Não é o ideal, mas não vem ao caso, Chelsea. Não se sente bem em meio a muita gente, e não quero piorar as coisas para você. Ou para ele. Chelsea tinha a sensação de que Alex já se arrependera de ter marcado esse jantarzinho e o impulso o fizera agir assim. Bem, pior para ele. Não iria dar meia-volta e fugir. Pelo menos não por causa de um ataque de pânico. – Dê-me um minuto – pediu, e ele aquiesceu com um gesto de cabeça. Chelsea se inclinou para a frente respirando fundo várias vezes, enquanto o coração voltava a bater normalmente. Alex massageou suas costas, e o leve toque lhe deu coragem para se aprumar e sorrir. – Certo – murmurou e, altamente orgulhosa, entrou na casa da mãe de Alex. Era uma loucura. Muita gente falando ao mesmo tempo, uma vibração com as pessoas enchendo os cômodos pequenos, rindo, gritando, oferecendo comida e bebida. De imediato Chelsea se sentiu aceita. Ninguém a olhou de soslaio ou imaginou por que estava ali. Ninguém nem mesmo notou o início da cicatriz no seu decote. Patricia, a irmã de Beatriz, pegou suas duas mãos e a beijou nas duas faces, elogiando seu programa de televisão. As primas de Alex pediram seu autógrafo com timidez, mas logo fizeram perguntas. Não sobre a celebridade Chelsea Maxwell, mas sobre ela mesma, fazendo-a se sentir uma pessoa de verdade, e não uma anfitriã de talk show. Chelsea começou a se sentir muito bem... Até que olhou para Alex e viu que ele franzia a testa. Ele não estava gostando da noite como ela, e Chelsea temia saber o motivo. Ficaram até depois da meia-noite, e por fim Alex alegou que precisavam voltar. Parecia zangado. Ela ajudou a tirar a mesa. Estava colocando pratos no secador, quando Beatriz entrou na cozinha e disse: – Por favor, não o magoe. Chelsea ficou tensa e se virou para a mãe de Alex, perguntando: – Por que acha que o magoaria? – Você já foi ferida, não? Posso dizer, porque isso me aconteceu também. Por um homem – disse Beatriz. Chelsea se lembrou do que Alex suspeitava a respeito do pai, e confessou: – Sim. Porém, é por isso mesmo que sou... tão grata a Alex. – Ele é um bom rapaz – concordou Beatriz. – E quero que seja feliz. – Acha que ele não pode ser feliz comigo? – perguntou Chelsea, ciente de que seus segredos e sofrimentos seriam demais para ele. – Creio que, quando se foi magoada uma vez, existe sempre o medo de que aconteça de novo. É difícil confiar, amar. – É verdade – murmurou Chelsea, afastando as lágrimas, e Beatriz sorriu com simpatia. – Você tem cicatrizes... e não me refiro a essa. – Fez um gesto para o decote de Chelsea. – Na alma e no coração, as mais profundas, e Alex não conseguirá curá-las. Nenhum homem pode. Só você. Chelsea apenas acenou. Entendia o que Beatriz estava dizendo, embora não acreditasse muito. Duvidava que pudesse ser curada por Alex ou qualquer outro. Queria acreditar, mas... Permaneceram calados de volta para o resort. Superficialmente a noite fora um sucesso, mas... Não o magoe. Não queria magoá-lo, mas fizera tantas escolhas ruins na vida que a assombravam... um bom relacionamento ainda lhe parecia um campo minado. Demais. E mesmo assim os últimos dias haviam sido divinos. Fora machucada no passado, mas ainda queria tentar, queria contar a verdade para Alex. A reação dele seria outra história. CAPÍTULO 13 FORA completo idiota levando Chelsea para jantar na casa da mãe. Que diabos tinha sido aquilo? Deveria saber que a mãe ficaria muito entusiasmada; nunca antes trouxera uma moça para conhecê-la. Jamais. Sabia que fizera isso porque em parte desejava um relacionamento com Chelsea, e por outro lado queria fugir. Saltar desse trem quando ainda havia tempo. E tinha a impressão de que Chelsea UM sabia disso. Talvez estivesse em conflito também. Ambos ainda mantinham segredos, mas não pressionavam um ao outro. Não era uma proposta muito interessante. Manterei meus segredos bem guardados, muito obrigado. Só que já não estavam tão bem guardados, nem os dele nem os dela. Alex mostrara a fotografia. Contara sobre Sarah. Ela falara sobre a cicatriz e sobre os ataques de pânico. Parecia que seus segredos seriam revelados querendo ou não. A não ser que ele acabasse com tudo. Por que tal pensamento era terrível? Como fazer funcionar? Assim que voltaram para a suíte do hotel, Alex a tomou nos braços. Não queria complicar as coisas com palavras. Mas isso era simples. Fácil. E Chelsea entendeu, porque o abraçou com desespero, passando as mãos pelo seu pescoço. Fizeram amor sem falar. Nem mesmo uma palavra, pois isso abalaria a fragilidade de sua intimidade, a segurança do sexo. Depois ficaram agarrados, membros entrelaçados e corações batendo forte. E continuaram sem falar. Quando amanheceu Chelsea o acordou com um beijo que roubou seu coração e seu fôlego. Ela o beijou como se provasse seu corpo, provocando, antes de afastar os cabelos em um gesto feminino e poderoso que existia desde o início dos tempos, para depois ficar por cima dele. Alex se lembrava da primeira vez que haviam feito sexo... e fora apenas sexo... e Chelsea agira dessa maneira. Agora, querendo ou não, era tudo completamente diferente. Chelsea se empinava sobre ele, nua e liberada, um sorriso nos lábios enquanto levava os dois ao máximo do prazer em um ato que parecia cheio de amor. Diabos! Mais tarde tomaram banho juntos e fizeram amor de novo, conseguindo por fim deixar o hotel e ir à praia, fazer o que os turistas faziam conforme Alex prometera em Nova York. Ele não sabia por que tudo parecia tão melancólico e um pouco amargo. Estava se divertindo caminhando pela praia de mãos dadas com Chelsea, comendo camarões no mercado ao ar livre, e almoçando em Little Havana. Estava se divertindo a valer, e mesmo assim... sentindo que tudo isso era passageiro. Quase um final. Quase como se tivessem chegado a um acordo sem palavras na noite anterior de que isso era tudo que teriam. Nessa noite uma limusine os esperava no aeroporto JFK, e eles voltaram em um silêncio ainda mais profundo para o apartamento de Alex. Já no apartamento Chelsea caminhou quieta pelo espaço aberto, detendo-se diante das fotos em preto e branco que adornavam uma parede de tijolos. – Foi Sarah quem tirou essas fotos? Surpresa... e pânico... cruzaram o rosto de Alex. – Como sabe? – Não sei. Apenas me parecem tão... tristes. – Os temas foram se tornando mais tristes à medida que ela se aproximava da morte – admitiu Alex. – Quando me lembro, sinto que deveria ter percebido isso. – Porque ela me contou sem palavras. Mas engoliu em seco e desviou os olhos. – Você está sempre lembrando – concordou Chelsea. Havia muita mágoa e remorso reprimidos em sua voz para que Alex continuasse calado. O problema era que não sabia o que dizer, e mesmo se soubesse ainda não tinha certeza se desejava falar. – Chelsea... – Deteve-se, desarvorado, e ela se voltou para fitá-lo, declarando de supetão: – Quero lhe contar algumas coisas, Alex. Maldição. O que fazer agora? A expressão de Chelsea era neutra e determinada, e a ansiedade o dominou, corroendo suas entranhas. – Muito bem – disse Alex por fim, percebendo como soava relutante. Sabia que Chelsea percebera também, e a viu erguer o queixo com um olhar duro, os ombros eretos, cada centímetro de seu corpo mostrando a elegante e fria Chelsea Maxwell. – Dormi com um homem para conseguir meu primeiro emprego. Não era o que Alex esperara ouvir. Sentiu uma leve surpresa, uma aguilhoada de censura, porém no geral aceitou quase com alívio. É só isso? – Certo – murmurou. – Fui para a entrevista de emprego e me ofereci, claramente, para dormir com o chefe e conseguir o que desejava. Ele aceitou minha oferta, e consegui o emprego como garota do tempo para uma estação local de notícias em Huntsville. – Devia saber o que queria. – Alex parecia ter bolinhas de gude na boca, e isso era estranho e desconfortável. Não sabia o que dizer. Ignorava o que ela queria ou precisava ouvir e, francamente, rezava para essa conversa acabar logo. Algo cruzou o rosto de Chelsea rápido demais para Alex detectar o que era. – Acho que sim – prosseguiu ela. – Se quiser, procure por mim na internet. Aurora Dawn Jensen. Esse era meu nome. Quem eu sou. Um outro nome? Alex estava surpreso, mas não chocado. Afinal, não parecia grande coisa. – Não preciso entrar na internet, Chelsea... – Não cresci do modo como o fiz acreditar – interrompeu ela, a voz mais dura e aguda. – Menti sobre isso. Não sei quem era meu pai, e minha mãe era uma inútil. A fila de namorados que tinha ficava cada vez pior. Eu era a clássica criança que morava em estacionamentos baratos de trailers. Ela aguardou, e Alex deu de ombros, ainda incerto sobre aonde Chelsea queria chegar. – Por que mentiu? – perguntou, e a viu se encolher. – Porque desejava acreditar na mentira. Queria ser alguém diferente. Bem, isso ele podia entender. Não quisera também ser diferente na escola preparatória Walkwerton? Não o garoto pobre do Bronx com o uniforme de segunda mão que chegava de ônibus à escola, e não de limusine ou helicóptero. Mas mesmo assim não encontrava as palavras para dizer que a compreendia, que qualquer coisa que Chelsea lhe contasse ele aguentaria. Mas talvez não aguentasse. Talvez não quisesse saber porque isso escancararia todas as suas deficiências. Era por isso que não mantinha relacionamentos. Porque não fazia ideia de como lidar com a dor de outra pessoa. Porque não suportava pensar que a outra pessoa veria sua dor também. – Menti sobre tudo, Alex. – Agora as palavras dela saíam mais depressa, até demais para Alex processá-las, saber como ela se sentia, e muito menos como responder. – Chelsea Maxwell... a mulher que você acredita conhecer... não existe. Eu a inventei quando me mudei para Nova York, a fim de um novo começo. Mas ela não é real. – Você é real, Chelsea. – Ele conseguiu dizer afinal, mas percebeu que sua voz soou fraca, e ela apenas balançou a cabeça. – Acredita mesmo? Bem, creio que continuo sendo a garota estúpida que pensou que a única maneira de conseguir um trabalho seria se deitando com um homem. Ou de joelhos, como aconteceu. Ou no armário do material de limpeza, sobre uma escrivaninha, no elevador, no estacionamento... Alex se encolheu e ergueu a mão. Não queria conjurar essas imagens na mente. – Pare, Chelsea. – Por quê? – Os olhos dela brilhavam, e ele não sabia se por causa de lágrimas ou por desafio. – Esta é a verdade, Alex. Está pronto para ela? – Não esperou a resposta. – Tive um caso com Brian Taylor durante três anos. Um caso doentio e sórdido, mas optei por isso porque desejava demais trabalhar na televisão. Ele percebeu o nojo em sua voz, porém não entendeu. Chelsea nunca pedia desculpas pelas suas escolhas, e ele aceitara isso nela. Entretanto, agora não sabia o que Chelsea desejava dele. – E depois, o que aconteceu? – conseguiu perguntar. – As coisas saíram um pouco dos trilhos. Brian sempre gostava de provocar um pouco de dor, mas se descontrolou e acabei no pronto-socorro com o rosto com hematomas e isto. – Apontou para a cicatriz no seio. – Brian vira um sujeito olhando para meus seios e ficou louco. – Chelsea respirou fundo. – Arrastou-me pelos cabelos para fora de uma festa no escritório. Levou-me para sua sala e ninguém interferiu. Ninguém chamou a polícia ou mesmo bateu à porta enquanto ele me surrava até me deixar uma massa ensanguentada, e depois avançava para cima de mim com uma faca. Então conheço a sensação de ser atirada na piscina, por assim dizer. Sei como é ver as pessoas observando seu afogamento. Alex a fitou com o cérebro fervilhando diante dessas novas informações, desse terrível e novo conhecimento, agora sabia por que ela preferia encontros de uma só noite, por que as multidões a deixavam com crises de ansiedade. Por que agia com dureza, frieza e no controle por saber como seria se assim não procedesse. Mas mesmo assim não disse nada. Não conseguia. – Ninguém sabe de tudo isso – prosseguiu ela com calma, seu rosto ainda neutro, e evitando fitá-lo. – Ninguém conhece toda a história a não ser você. Então esperou pelas palavras dele, por algo, mas Alex continuava oco. Que diabos poderia dizer? Que estava tudo bem? Obviamente não estava. Que não se importava com o passado dela? Mentira, porque se importava. Quem sabe devesse apenas abraçá-la, porém não conseguia se mover. E sabia a razão. Porque não desejara tomar conhecimento de tudo isso. Não quisera se aprofundar tanto. Raios, se Chelsea contara tudo, ele também teria que revelar suas mazelas e admitir suas fraquezas. Sabia para onde isso conduziria. Para nada de bom. – Diga alguma coisa – pediu ela sem conseguir prosseguir. Alex apenas a fitou. – Lamento... – Oh, Alex. – Chelsea balançou a cabeça, enxugando os olhos antes que as lágrimas jorrassem. – Sua mãe tem medo de que eu o magoe. Ela leu minha alma aquela noite em Miami. Percebeu quanta coisa eu escondia. E tive medo de magoá-lo e de não ser boa o suficiente para você. Não ser forte ou inteira o suficiente. Porém, no final, talvez seja você quem vá me magoar. – Não quero magoá-la – retrucou ele serena e sinceramente. Mas não querer era diferente de não fazer. – Sei que não quer. Mas vejo em seu rosto que não deseja lidar com tudo isto. – Ela fez um gesto abrangendo o espaço entre os dois, porém Alex entendeu o que Chelsea realmente queria dizer. Lidar com ela. – É mais do que você pediu. Entendeu. E a verdade é... a verdade é... – Sua voz falseou. – Preciso de alguém que deseje lidar com isto, que assuma o risco. – Levantou-se, ergueu os ombros como a moça que ele vira pela primeira vez saindo de um prédio, o mundo aos seus pés. – Quero alguém que me dê valor – terminou de mansinho, e, antes que Alex soubesse o que dizer, Chelsea deu meia-volta, abriu a porta do elevador e partiu. ALEX OLHAVA sem nada ver para as mais recentes manchetes, no alto da tela do computador. O mundo poderia estar acabando e ele não sabia. Não se importava. Seu mundo pessoal terminara. Quatorze horas intermináveis desde que Chelsea deixara seu apartamento. Desde que ele a ouvira abrir seu coração sem retrucar com uma só palavra de simpatia. Que diabos estava errado com ele? Foi só quando ela desapareceu que sua mente voltou a funcionar, e ele pulou do sofá, desceu a escada correndo e abriu a porta de aço, recebendo o ar gelado da noite de fevereiro. Ela devia ter corrido como uma gazela para sumir tão depressa. Alex pegou um táxi até o apartamento de Chelsea e pediu para o porteiro chamá-la pelo interfone. Não houve resposta. Ligou para seu celular, enviou 12 mensagens, mas nada. Tarde demais. Sabia disso, sentindo o vazio que o dominava. Lembrou-se de quando fitara o corpo inerte de Sarah, a confusão logo substituída pelo imenso horror. A percepção crescente de que fora tudo culpa sua. Como estava sendo... de novo. – Alex? – A voz de sua assistente pelo interfone interrompeu sua leitura distraída nas novas manchetes. – Hunter Grant e Zoe Brook para você. Alex franziu a testa. Nunca antes Hunter o procurara no escritório, porém podia adivinhar o motivo para estar ali agora: queira falar sobre Treffen. E talvez devesse se focar nisso, porque assim, pelo menos, resolveria uma das situações. Apertou o botão do interfone. – Mande-os entrar. Ambos entraram em seguida e de mãos dadas. Alex observou como Zoe se inclinava para Hunter, e como ele entrelaçava os dedos aos dela. Refletiu que Hunter deveria ter lidado bem com a questão amorosa. Ambos pareciam sérios e determinados agora, mas não dava para negar que se importavam um com o outro. Amavam-se. Que pena ele, Alex, não ser capaz disso. Entretanto, podia ser melhor assim. Não merecia Chelsea. A essa altura, ela estava melhor sem ele. Alex os cumprimentou para depois se sentar de novo. – Que surpresa agradável! – exclamou. – Mas sinto que não será uma visita social. Zoe foi a primeira a falar, com a voz baixa e firme: – Não, não é. – Fitou Alex intensamente, sempre segurando a mão de Hunter. – Quero contar minha história. Conversarei com Chelsea na televisão se for necessário. Alex sabia que deveria se sentir triunfante, porém só sentia cansaço. Aquiesceu com um gesto de cabeça lento. – Farei com que entre em contato com ela. Tem certeza de que quer fazer isso? Zoe acenou que sim seriamente. – Preciso esclarecer sobre Treffen. Sobre mim mesma. – Respirou fundo. – Começou tão inocentemente... ou assim pensei. Não achei estranho quando ele me pediu para jantar com um cliente, sugerindo que usasse o vestido de coquetel porque se tratava de um velho que gostava de flertar. Inofensivo, disse Treffen. – A voz dela tremeu. – Inofensivo. Um olhar angustiado cruzou o rosto em geral irônico de Hunter. – Zoe, não... – Não, Hunter, preciso. Sabe que preciso. Vivo com isto um tempo que parece uma eternidade, porque tinha tanta vergonha por ter sido tão tola e fácil de manipular. – Balançou a cabeça. – Treffen é um monstro. Ameaçava todas nós... suas garotas, como costumava nos chamar... e adorava nos ver recuar de medo, encolher, implorar. Alex pensou em Sarah, e então, de repente, com um entendimento que chegava a ser doloroso por ser tão claro, pensou em Chelsea. Em todas as coisas que ela dissera, e também nas que omitira, que deixara subentendidas. Creio que continuo sendo a garota estúpida que pensou que a única maneira de conseguir um trabalho seria se deitando com um homem. Não acreditava em si mesma, porque ninguém jamais acreditara. Brian sempre gostava de provocar um pouco de dor. Ela sofrera os piores abusos por três anos. Não sei quem era meu pai, e minha mãe era uma inútil. A fila de namorados que tinha ficava cada vez pior. E quem sabe sofrera abusos na infância também. Deus, por que ele não percebera isso? Ouvira o que ela realmente dizia? Ficara tão preocupado com o que deveria dizer que não fora capaz de ver e ouvir realmente o que se passava. O que alguém tentava, desesperadamente, lhe contar. Deveria ter saltado daquele sofá e a abraçado. Enxugado suas lágrimas com beijos que ela ainda teimava em não aceitar. Porém, ela fora embora antes que ele a afastasse, o que era o que Chelsea imaginara que Alex faria. Afinal, como diz o ditado, quem cala consente. Com esforço ele retornou ao momento presente e se focou em Zoe e Hunter. – Lamento pelo que suportou, Zoe. Sei que Chelsea Maxwell vai querer essa conversa. Pálida, Zoe aquiesceu com um gesto de cabeça resoluto. – Só me diga quando e onde. BRAVAMENTE CHELSEA conseguira superar mais um dia. Três dias desde que deixara o apartamento de Alex e toda a esperança de felicidade com que já sonhara. Três dias desde que olhara nos olhos dele e vira o choque e o medo, sentindo seu silêncio como uma rejeição. E era isso mesmo. Três dias intermináveis. Iria superar, sabia disso, com superara antes; afinal, quantos relacionamentos tristes já tivera? A fila de namorados ruins que deixara ao longo do Alabama na esperança de encontrar quem a amasse. Brian Taylor, que ela tentara se convencer de que amava mesmo que a humilhasse e torturasse vezes sem fim. E agora Alex. Mas Alex era diferente de todos os homens que já conhecera. Completamente diferente, e ela também, porque o amava de verdade. Amava Alex com todas as fibras de seu ser, e cada batida de seu coração partido, amava o modo como ele a fazia se sentir segura e especial, amada e desejada. Amava sua ambição, sua sensibilidade, sua bondade e humor. Era uma pena que ele não a amasse assim também. Uma pena ela ter percebido em sua expressão que não estava pronto para a verdade, a versão bagunçada e sem verniz do que ela era. E a coisa boa, disse a si mesma, era que ela previra isso... e sabia que precisava de mais. Fugir de Alex agora era sua única opção, porque a ideia de revê-lo a fazia se sentir desarmada, cada nervo exposto e dolorido. Chelsea sabia que Alex podia querer se desculpar. E talvez não. Talvez agradecesse a sua boa estrela por ela ter ido embora antes. Mas, se Alex quisesse se explicar, Chelsea sabia que era fraca demais e que aceitaria qualquer coisa que ele oferecesse. Esqueceria que vira a verdade em seus olhos e que a ouvira em silêncio. E a verdade era que tinha medo. Se agora sentia agonia, o que sentiria após uma semana, um mês, um ano, quando Alex decidisse que se cansara dela e de sua loucura? Talvez não procedesse com a maldade de Brian, mas seria ainda pior. Não iria apunhalá-la no seio; esmagaria seu coração. Então ela apagou suas mensagens de textos sem ler. Instruiu os seguranças no trabalho e o porteiro no seu prédio para que não o recebessem se fosse procurála. Eventualmente Alex desistiria. Três dias depois da última vez que o vira, Chelsea deixou o trabalho e seguiu para entrar no carro que guardava nos fundos de Rockefeller Plaza, quando uma sombra se afastou da parede, e de repente lá estava ele, ao seu lado, os braços cruzados sobre o peito. Rosto contrito, mas tão lindo que ela desejou se lançar sobre ele. Mas ela não se moveu. – Olá, Chelsea. Sua voz baixa e rouca continuava despertando o desejo de Chelsea. Mas ela balançou a cabeça. – Por que está aqui? – Precisava descobrir uma maneira de fazê-la me receber. Ouvir, porque não me deu muita oportunidade na última vez. Mas admito que quando me deu chance eu não aproveitei. Burrice. – Não tem importância. – Com pode dizer isso? Fala com sinceridade? – Ele deu um passo à frente. – Ou está apenas com medo? – Fica sempre me perguntando isso. – E você sempre responde que não tem medo. A frustração a dominou. – Certo, agora digo que estou com medo, Alex. Temo um relacionamento com você, porque já me queimei antes e dói. E não tenho forças para passar por tudo de novo. Mesmo no escuro ela podia ver a raiva nos olhos dele. – Está me comparando com o lixo que era o seu patrão? Brian Taylor? – Não. Você é completamente diferente. Sou eu que sou sempre a mesma. – A voz de Chelsea fraquejou, mas ela logo se recuperou. – Continuo confusa, Alex. Tentei agir com segurança, mas não consigo, nem remotamente. Ele deixou escapar uma risada. – E acha que eu consigo? Chelsea balançou a cabeça, tentando ser objetiva. Precisando que ele soubesse. – Tenho ataques de pânico, empilho caixas de band-aids. Não sou honesta nem verdadeira com ninguém há dez anos. Ele deu um passo à frente e disse em voz baixa: – Foi verdadeira comigo. – E veja o que me causou. Você não me queria verdadeira, Alex. – Admito que não reagi como deveria – retrucou ele com firmeza. – Falhei com você. Fiquei... com medo, Chelsea. Não gosto de admitir, mas é isso. Confiou em mim me contando essa verdade como... – respirou fundo – como Sarah. Chelsea franziu a testa e inclinou a cabeça para um lado. – O que quer dizer? – Ela me contou, Chelsea, contou sobre Jason. Não com todas as letras, mas o suficiente. Deveria ter sido o suficiente, exceto que não dei ouvidos a ela. Chelsea o fitou, abriu a boca para falar, mas não sabia o quê. – Estava obcecado pela minha careira – continuou Alex, agora com voz entrecortada pela dor. – Queria provar meu valor, naquela última noite, quando ela morreu. Tentei... – Dessa vez sua voz quase falhou. – Fui a última pessoa a vê-la com vida, Chelsea. E ela tentou me contar o que Treffen estava fazendo, porém eu só pensava em uma maldita notícia. Pedi... – interrompeu-se, engoliu em seco e recomeçou. – Pedi a ela que me desse uma opinião sobre uma história de assédio sexual. Opinião. E minutos depois ela foi embora, subiu para o telhado do prédio e se atirou de lá. Chelsea se sentiu derreter de compaixão. – Oh, Alex... – Não quis lhe contar antes. Não queria admitir ser esse tipo de homem. Mas você confiou em mim contando sua verdade, Chelsea, e eu agi do mesmo modo como agi com Sarah. Desculpe. Deus, lamento tanto não ter agido corretamente. Não sabia como nem queria me abrir, porque se você me contou seus segredos teria que contar os meus. – Alex ergueu as mãos. – Então aqui está minha verdade, Chelsea. Escolha o que fazer com ela. Chelsea o fitou tentando acreditar, querendo que isso fosse o bastante, mas não era, porque conhecia Alex. Sabia que ele tentava consertar a situação, mas será que sentia vontade de verdade? Será que a desejava? Não via isso em seus olhos. Não sentia em sua voz. – Sabe o que vi ao olhar para aquela foto? – perguntou ela, e Alex balançou a cabeça. – Vi a mim mesma. Aquela expressão nos olhos de Sarah... como se estivesse morta por dentro, mas apenas ela sabia disso. Ninguém via. Foi assim, Alex. Foi assim que senti por tanto tempo... – Tomou fôlego depressa. – Você me despertou – disse, quando confiou que sua voz não falharia. – Você me fez retornar à vida, mas não é o suficiente. Não para o tipo de relacionamento que desejo agora. – Sei que não é. – Não eram as palavras que ela desejava ouvir, porém não estava surpresa. – Lamento – acrescentou ele, e ela também não gostou dessa palavra. – Sei que lamenta – conseguiu dizer. Alex a encarou por um longo momento. – Chequei o prontuário do hospital, Chelsea. Seu nariz e queixo foram quebrados, uma artéria foi rompida no peito, e teve três dedos fraturados. Meu Deus. – Sacudiu a cabeça como se quisesse clarear as ideias. – Sabe o que gostaria de ter feito quando me contou? Desejei abraçá-la como você me abraçou, enxugar suas lágrimas com beijos e ser tão forte que como sei que você é. Chelsea sentiu uma única lágrima fria escorrer, e murmurou: – Gostaria que tivesse feito isso. Ele aquiesceu com um gesto de cabeça lento, aceitando, e ela desejou segurá-lo pela lapela do paletó e sacudilo. E lhe dizer que não era tarde demais, que ainda podiam perdoar e tentar amar de novo. Exceto que Alex não a amava o suficiente. Chelsea sabia disso e ele também porque, se a amasse, não ficaria falando sobre o que gostaria de ter feito. Faria de uma vez. Lutaria por ela, e Deus era testemunha de que ela precisava de quem a defendesse. Alex fitou o vazio por um momento com expressão misteriosa e então disse abruptamente: – Zoe Brook me procurou ontem. Espantada, Chelsea piscou diversas vezes. Engoliu em seco e tentou ser profissional. – A especialista em Relações Públicas? – Sim. Ela é a fonte que mencionei antes. Foi uma das vítimas de Treffen. – E ela quer falar? – Quer falar com você. A esperança surgiu na alma de Chelsea em meio a tanto sofrimento. – Sim, eu também quero falar com ela. – Ótimo. Zoe entrará em contato com você. – Assim dizendo, ele deu um passo atrás como se fosse um adeus. Então tudo acabava ali, pensou Chelsea sombriamente. Amava-o, mas ele não a amava, pelo menos não com a mesma intensidade. E o que começara como uma tentativa desesperada de reconciliação se transformara em uma reunião de negócios. Ela acenou secamente, despedindo-se também. Ficaram se olhando sem falar. Contudo, algo em Chelsea parecia gritar com força e profundidade, e ela apenas estendeu a mão e o tocou no rosto. Nada disse, porque sua garganta doía muito. Porém, Alex deve ter entendido, pois girou a cabeça e roçou os lábios na palma de sua mão. Outra despedida. E então ele se afastou e abriu a porta do carro. Deixou-a partir como Chelsea imaginara que deixaria. CAPÍTULO 14 ELA ESCOLHERA partir, mas ainda se sentia terrivelmente só. De volta à sua sala de estar abriu o laptop e começou a trabalhar. Tinha três semanas para pesquisar Jason Treffen, descobrir tudo que podia, e orquestrar a completa derrocada dele... Assim como a sua. Seis horas mais tarde se recostou no sofá e olhou em volta do apartamento com olhos corajosos. Antes a decoração em preto e branco a acalmava, porém agora parecia estéril, vazia e fria como Chelsea Maxwell, a personagem que criara. Seus olhos repousaram sobre a tela branca com listras pretas da qual Alex zombara. O quadro era feio, refletiu. E estúpido. Podia vendê-lo por cem mil dólares e dar o dinheiro para caridade. P o d i a começar uma obra filantrópica... algo para mulheres que sofreram abusos nos relacionamentos. Mulheres inteligentes, bem-sucedidas, que mesmo assim haviam sido degradadas e desmoralizadas pelos homens que julgavam amar. Um leve sorriso aflorou em seus lábios, e ela voltou a se concentrar no laptop. Uma semana depois telefonou para Louise. A dor de ter perdido Alex ainda machucava muito, mas dizia a si mesma que com o tempo passaria. Ficaria até curada. Com a ajuda de Deus. Entretanto, precisava começar a lidar com as coisas. Com toda a bagagem emocional da qual Louise falara, antes que o navio afundasse. Dessa vez se encontraram perto de Columbia, e rumaram para uma lanchonete perto dos principais prédios da universidade. O lugar tinha compartimentos forrados de vinil já rachado, as mesas estavam riscadas, mas ali se faziam os melhores waffles de Nova York, segundo dissera Louise. – Mas você não come waffles, come? – perguntou Louise, enquanto examinava o enorme cardápio plastificado. – Talvez coma agora – respondeu Chelsea –, se são tão bons como apregoa. Louise ergueu os olhos do cardápio. – Parece diferente, Chelsea. – Foi o que me disse da última vez que nos encontramos. – Sim, mas então você estava uma pilha de nervos. Agora parece... mais calma. Chelsea sorriu de leve. – Não sei. Pelo menos tento ser calma. – Como? – Louise inclinou a cabeça curiosidade. – E por quê? – Precisa me perguntar isso? – Chelsea tomou um gole de água. Queria mudar, saber lidar com as coisas, e depois esquecer, porém não era nada fácil. – Você já se sentiu feliz, Louise? – Não – respondeu a irmã mansamente –, mas você parecia determinada a fazer com que todos a considerassem feliz. – Sim. Estava desesperadamente determinada a finalmente transformar minha vida em um sucesso. – E mudou de ideia a esse respeito? – Concluí que não vale a pena. Fingir o tempo todo. Viver sem deixar ninguém se aproximar de mim e saber quem sou de verdade. Louise se inclinou para a frente com um leve e triste sorriso. – E quem é você de verdade, Chelsea? – Sou Aurora Dawn Jensen – respondeu ela mansamente também. – Não se trata apenas de um nome. – Não – concordou Chelsea. – Não se trata. Embora você saiba por que escolhi o nome Chelsea, não é? – Deixou escapar uma risada baixa. – Porque, quando criança, li um livro sobre uma garota que tinha seu próprio cavalo. Era mais um folheto promocional, e o nome da garota era Chelsea. – Parou de falar com a garganta apertada. – Enquanto crescíamos eu sempre pensava em ser essa garota. – Fitou Louise, chocada ao ver lágrimas escorrendo por seu rosto. – Louise... A irmã sacudiu a cabeça enquanto as lágrimas rolavam livremente. – Deveria ter protegido você, Chelsea. Dos namorados da mamãe. Deveria ter sido uma irmã melhor... – Não foi sua culpa. – Mas via como olhavam para você e às vezes... como a tocavam. – Deixou escapar um soluço em meio à torrente de lágrimas enquanto ocultava o rosto dos outros fregueses que, felizmente, não notavam o drama que se desenrolava em meio ao café e waffles. – Não fiz nada. – Fez, Lou – replicou Chelsea com calma. – Lembro como me arrancava da cama e me fazia dormir com você. – Mas não sempre. Chelsea deu de ombros. – Era apenas 18 meses mais velha que eu, Louise. Fez o melhor que pôde. – Não fiz. – Louise enxugou com o guardanapo os olhos lacrimejantes. – Não fiz, Chelsea. Porque tinha... ciúmes. O queixo de Chelsea caiu. – Ciúmes? – Sei como parece tolo. Como é estúpido. Ciúmes de uns homens bêbedos e nojentos que colocavam as patas em você? Sei disso. – Deixou escapar um som entre soluço e risada. – Mas tinha ciúmes. Não me olhavam duas vezes. Mamãe não me dava atenção. Você era sua estrelinha, desfilando nos concursos de beleza infantis. – Odiava aqueles concursos. – Sei disso, e eu também odiava. Ficava lhe dizendo o tempo todo como eram bobos, mas a verdade era que daria tudo para participar de um deles. Para que nossa mãe me julgasse apta a participar, e que não me achasse feia, estúpida e sem importância. – Louise enterrou o rosto nas mãos, sacudindo os ombros, e Chelsea saiu do seu canto no compartimento para se sentar ao lado dela e abraçá-la enquanto chorava. Que os outros fregueses fossem para o inferno! Isso era mais importante. – Não foi sua culpa, Louise. De verdade. Tinha 8 ou 9 anos, e era uma criança, lembre-se disso. – Sabia o que estava fazendo. E Chelsea não dizia a mesma coisa? Não era orgulhosa? Mas talvez, de certa forma para ela, ter 19 anos não fosse tão diferente de ter 9. Talvez ainda fosse uma criança no íntimo, desesperada para ser amada, pensando que a única maneira de alguém amá-la seria dando tudo que tivesse. Louise fungou de encontro ao seu ombro e Chelsea acariciou seus cabelos. – Sabe? Precisa se perdoar pelas coisas que não fez assim como pelo que fez – murmurou, se lembrando de Alex e sentindo uma dor no coração. Por quanto tempo ainda ele se flagelaria por não ter ajudado Sarah? Falhado com ela? Não devia se importar, pensou Chelsea, já que estava tudo acabado entre eles dois, e Alex não tinha amor suficiente para lhe dar. Pelo menos, refletia, estava consciente disso, pelo menos sabia o que queria e que talvez merecesse mais. Após um momento Louise se afastou e a fitou com os olhos vermelhos. – Por que precisa se perdoar, Chelsea? Chelsea sorriu friamente. Sua irmã não perdia nada. – Principalmente por ter sido estúpida, e desesperada, e apenas... triste. – Está falando de ir para a cama com homens para conseguir emprego? Chelsea acenou que sim. – Porém, não apenas isso. Quase posso perdoar isso porque estava desesperada por trabalho. – Suspirou e se recostou. – Desesperada por amor também. Fiquei com esse homem por três anos, Louise. Três anos sendo humilhada e usada. – Sentiu a garganta apertar e piscou diversas vezes, pois as lembranças eram como facas afiadas e dolorosas. – Deixei um homem me tratar como se fosse lixo. Como se não valesse nada, menos que nada. Não me perdoo por isso. Não será fácil me perdoar. E me fez evitar outro relacionamento mesmo com um homem que... – sua voz falhou – vale a pena. Mesmo que ele não quisesse tentar. NESSA TARDE Michael veio ao camarim de Chelsea, que se aprontava para filmar. Cabelos e maquiagem perfeitos, sua roupa simples e elegante. A maquiadora dava os retoques finais em seu rosto. – Ouvi sobre Treffen. Quer que você assine aquele papel com as perguntas até o final do dia. Aposto que quer, pensou Chelsea. Mas ela ainda hesitava porque sabia que, uma vez assinando, todas as oportunidades estariam canceladas. Sua carreira na AMI terminaria. – Chelsea? – Assinarei e mandarei um fax após o programa. – Não quer negociar? Ela lhe ofereceu um sorriso nervoso. – Não se negocia com terroristas. Michael arqueou as sobrancelhas. – Você não gosta mesmo desse sujeito, hein? – Não gosto que me digam o que fazer. Obviamente Michael ignorava a verdade sobre Treffen. E Chelsea não lhe contaria porque o comprometeria e ameaçaria sua própria carreira. Ela seria a única a conquistar os louros da glória, mesmo que tal perspectiva ainda provocasse um frêmito de terror pelo seu corpo. – Pode se negar a fazer a entrevista – sugeriu Michael calmamente. – E perder a oportunidade de aparecer no horário nobre? – Haverá outras oportunidades. Não, não haveria. Não como essa. Jamais teria outra chance de confrontar um homem como Treffen. Como Brian Taylor. Virou-se para sorrir para Michael. – Farei a entrevista, Michael, e assinarei o papel. Não se preocupe comigo. – Cinco minutos para entrar no ar. Chelsea acenou para o assistente de produção e fitou Michael. – Estou tentando mudar – murmurou. – Pode não parecer, mas estou. Aproximou-se e o beijou na face, enquanto Michael apertava sua mão. E então Chelsea se encaminhou para o set de filmagem. Sua convidada do dia era uma jornalista feminista que infelizmente tirara fotos de nudez sensual, e que recentemente descobrira estarem circulando pela internet e jornais. No momento se sentava em frente à Chelsea, o rosto calmo, mas o olhar sóbrio, cheio de desespero. E disso Chelsea entendia muito bem. E pela primeira vez desde que iniciara o Bate-Papo com Chelsea sentiu não apenas empatia pela convidada do seu programa, mas admiração. Ambas haviam errado e estavam dispostas a admitir. Ambas queriam prosseguir e tinham a coragem de tentar. Será que ela, Chelsea, tinha? E Alex? – Dois minutos, Chelsea. Ela aquiesceu com um gesto de cabeça, respirou fundo e sorriu com sinceridade para a convidada. O programa seguiu bem. Houve lágrimas, confissões de coração aberto, e ao final Chelsea fez algo que não costumava fazer. Levantou do sofá, se encaminhou para a convidada e a abraçou. A jornalista correspondeu com surpresa e gratidão. – Foi fantástico – exclamou Miles, o produtor, quando Chelsea saiu do set de filmagem. – O abraço... que toque perfeito, Chelsea! Com pensou nisso? Ela o fitou friamente, consciente de que em outra vida... há apenas algumas semanas atrás... esse abraço nada mais seria do que uma manipulação. Mas hoje fora real. – Não foi o planejado, Miles – respondeu. – Apenas aconteceu. Uma semana se passou, e então Chelsea se encontrou com Zoe Brook, e ouviu sua história triste e sórdida. Conversou com Katy Michaels, irmã de Sarah, e elas redigiram perguntas para a entrevista e discutiram táticas. Chelsea tentou se concentrar no que importava no momento. Curar a si mesma. Preparar-se para a entrevista com Treffen. Tentar não pensar em Alex. Mas continuava pensando nele. O tempo todo pensava nele. Noite insone após outra ficava deitada na cama recordando a sensação do corpo dele contra o seu, seu gosto, cheiro e visão. Pensou em procurá-lo, em lhe dar uma segunda chance, mesmo que Alex não a tivesse pedido, mas não fez isso. Não podia. Estava ainda muito fragilizada e medrosa. E Alex não lhe enviara nem uma mensagem desde que a deixara partir. Entretanto, ela não poderia evitá-lo para sempre, e três dias antes da entrevista com Treffen ela apareceu nos escritórios da Diaz Network. A assistente de Alex, uma jovem delgada com cabelos muito louros e grandes olhos verdes, piscou nervosamente ao vê-la. – Srta. Maxwell? Alex está fora em uma reunião, mas me pediu que avisasse imediatamente se a senhorita aparecesse por aqui. Chelsea ficou surpresa e levemente esperançosa. – Verdade? – murmurou. – Importa-se em esperar alguns minutos? – Claro que não. Chelsea se acomodou na elegante sala de entrada e repassou mentalmente tudo que precisava dizer a Alex... sobre Treffen. Não iria entrar no campo emocional, não nesse dia. Não quando tanta coisa estava em jogo. E dez minutos depois ele irrompeu pela porta sem fôlego e despenteado. – Chelsea... – Quantos sentimentos nessa única palavra, mas ela não sabia dizer que sentimentos eram. Sorriu calorosamente. – Olá, Alex. – Vamos para o meu escritório. Ela o seguiu até o enorme escritório na cobertura, as janelas do chão ao teto descortinando Manhattan em toda a sua gloriosa luminosidade. Chelsea fechou a porta ao entrar e Alex a fitou de cima a baixo. Ela enfrentou o olhar, o coração aos pulos apenas por fitá-lo. Por desejá-lo. – Senti saudades – murmurou ele, e a perigosa esperança aumentou dentro de Chelsea deixando sua alma dolorida. Esperança. Tão perigosa. Tão maravilhosa. – Também senti – conseguiu dizer, e Alex cravou os olhos escuros e sombrios nela. – Sério? Chelsea aquiesceu com um gesto de cabeça e engoliu em seco. Não podiam entrar nesse assunto, não agora. – Vim aqui falar sobre Treffen. Ele fez um aceno e seus olhos se encheram de tristeza. – Certo. Então me fale sobre Treffen. – Conversei com Zoe Brook. E Katy. – Ótimo. – Zoe vai ao programa. Alex acenou de novo. – Treffen não vai gostar. – Não saberá – retrucou Chelsea. – Vai ficar furioso. – Bem, é esse o objetivo. Se não conseguir fazê-lo perder completamente as estribeiras, não terei sucesso. Um rápido sorriso iluminou o rosto de Alex, porém logo desapareceu. – Tem certeza de que quer fazer isso? – perguntou, e Chelsea o encarou por um momento, tentando entender o que se passava por trás dos misteriosos olhos dourados. – Não quer que eu faça? Não quer ver Treffen humilhado e fazê-lo pagar? – Sim, quero. – Ele fez uma pausa, afastando os olhos dela para fitar a vista da janela por um instante, porém Chelsea sabia que sua mente estava em outras coisas. Outras lembranças. – Mas não quero ficar cego pelo desejo de vingança. Já fui cego antes por ambição. E não há muita diferença, na verdade. Cegueira é cegueira, seja lá qual for a causa. – Mas, o que Treffen fez... – Foi expulso de sua firma de advocacia, afastado da família, será processado mesmo que não seja desmascarado ao vivo na televisão. – Sei disso. Mas ele é advogado, Alex, e milionário. Poderá encobrir tudo como faz sempre, e quero que o mundo saiba o que ele fez. – Chelsea respirou fundo e deixou o ar escapar dos pulmões lentamente. – Faço isso tanto por mim como por você e qualquer outra pessoa, Alex. Porque sei o que é viver com medo. Terror. E vergonha. – Engoliu em seco. – Muita vergonha. – Chelsea... – Você me ajudou a seguir em frente, Alex, mesmo que não tenha percebido. Conhecer você, estar ao seu lado... – Amá-lo... sufocou esse final. – Fez com que me abrisse de novo, fez com que entendesse que é bom desejar mais. Ser feliz. Ele nada disse por um longo momento, e Chelsea podia ver o movimento de sua garganta, o tormento em seus olhos que não compreendia. Sentiria remorso de suas ações ou de não ter agido? Ou estaria apenas constrangido diante do arroubo de honestidade que ela acabava de ter? – Fico contente – disse Alex por fim, e ela aquiesceu com um gesto de cabeça. Nenhum dos dois falou por alguns momentos, e Chelsea ansiava que ele dissesse algo significativo. Raios, talvez ele devesse fazer isso. Estou com saudades não era exatamente toda a verdade. Amo você era aterrorizante. – Sabe que se confrontar Treffen ao vivo na televisão – disse Alex de supetão – ele se sentirá acuado. Preso em uma armadilha. Poderá prejudicá-la. – Alguém já fez isso comigo antes – respondeu Chelsea. – Dessa vez saberei lidar com a situação. Ele esboçou um leve sorriso, porém seus olhos continuavam tristes. – Não quero que seja magoada. Mas já estou. – Já lhe disse que quero ir até o fim com isso. Não quero mais que homens como Treffen escapem impunes. Muitos escapam. – Brian Taylor escapou – disse Alex suavemente, e Chelsea lhe sorriu com tristeza. – Recebeu uma pena de 18 meses por lesão corporal. – E agora tem seu próprio programa na TV a cabo. – Muito barato – replicou Chelsea, sempre com um leve sorriso. – Não passa de um programa local. Patético. Alex sorriu também, olhos e dentes brilhando no lusco-fusco. – Se alguém pode derrubar Treffen é você, Chelsea. Seja o que for que pense ao meu respeito, saiba que acredito em você. Ela inclinou a cabeça concordando, e sentiu que seu coração se partia de novo. Amava esse homem. Mas não era o suficiente. Ele precisava amá-la também do mesmo jeito, intensamente, e Chelsea sabia que não amava. ALEX FITOU Chelsea e o sofrimento que viu em seus olhos passou para sua alma. Não era o suficiente. Acredito em você não era amo você. Não derrubava as barreiras que ele erigira em volta do coração nem abria as comportas para sua alma. Tentara na outra noite, mas sabia que continuava se fechando. Precisava pular naquela maldita piscina, não ficar na borda, e mergulhar. Mas, como em Walkerton, tinha medo, sabia o que acontecia quando se contava segredos para os outros: as pessoas o abandonavam. E mesmo que Chelsea não tivesse feito isso... por enquanto... ele ainda não conseguia se lançar na água. E sabia que era isso que Chelsea queria. A verdade completa. Compromisso total. Amor incondicional. A coisa verdadeira. Alex não sabia se era capaz disso ou mesmo se merecia essas coisas, depois de Sarah. Quantas vezes era preciso falhar com alguém até decidir não mais tentar? Não arriscar o coração de outra pessoa sem se importar com o seu? Porque falava a sério. Não queria ver Chelsea magoada, mas mesmo assim sabia que já a magoara. – Fico contente a faça a entrevista – disse. Se não podia lhe dar tudo, pelo menos isso. – Para o seu bem. Esqueça a vingança e os níveis de audiência. Fico feliz que faça isso porque Treffen fez com dúzias de mulheres o que Taylor fez com você. Chelsea deixou escapar o ar dos pulmões, e Alex viu a negativa em seus olhos. Impulsivamente segurou sua mão; estava fria como gelo. – Sei que não quer acreditar. Não pode. Ainda se agarra à ideia de que foi tudo sua escolha. Talvez isso a deixe mais forte de certa maneira, mais no controle. E talvez tenha sido sua escolha se entregar a Brian naquela entrevista. Mas, três anos, Chelsea? Com a infância que teve e o sofrimento? Foi abuso puro e simples. Não foi sua culpa ou sua estupidez, ou seja lá o que a convenceu disso. – Sorriu com tristeza. – Gostaria de ter lhe dito tudo isso antes. – Não teria acreditado, Alex. – E agora? – Não... não sei. Alex apertou sua mão. – Eu sei. Ela apertou a sua também e ofereceu um sorriso trêmulo. – Você continua a me fazer chorar. – Quero fazê-la sorrir. Rir. Eu... quero que seja feliz, Chelsea. – Diga de uma vez, maldição. Diga apenas que a ama. Conte tudo que sufoca. De como tem medo de tudo isso. De qualquer modo, ela provavelmente sabe. – Estou tão orgulhoso de você, Chelsea. Covarde. Ela o brindou com o sorriso confiante, luminoso, de Chelsea Maxwell, porém dessa vez havia calor e humor nele. Uma mulher real, viva, maravilhosa, não apenas um personagem perfeito e envernizado. – Espere até me ver dar um chute no traseiro de Treffen. A SESSÃO com Treffen estava sendo divulgada na rede. Seria filmada em um set fechado com segurança máxima, conforme o entrevistado solicitara. Nada de sofá cor-de-rosa, apenas duas poltronas e uma mesinha de centro, algumas gravuras de bom gosto e estantes com livros encadernados em couro servindo de cenário, para que lembrasse a biblioteca de uma mansão de classe. Chelsea se sentava em seu camarim enquanto a maquiadora retocava seu rosto. Os cabelinhos na nuca se eriçavam e seus nervos estavam à flor da pele. – Está um pouco pálida hoje – comentou Sonya, a maquiadora, aplicando mais blush nas faces de Chelsea. – Sente-se bem? – Estou ótima. – Dez minutos atrás Chelsea deixara sua carta de demissão, admitindo culpa total, sobre a escrivaninha de Michael. Sabia que ele não veria a carta até o final da entrevista. Também se encontrara brevemente com Treffen, antes que ele fosse conduzido para a preparação com os maquiadores. Ele apertara sua mão e a fitara com seus olhos frios e sagazes, e Chelsea precisara de muita força para corresponder ao aperto de mão com firmeza profissional e amigável, dar um breve sorriso como se tudo caminhasse conforme o plano... dele. Creio que será um programa muito bom, ele comentara, e Chelsea notara sua arrogância nessa frase. Treffen se julgava intocável. Chelsea percebera um pouco antes que a única razão provável para ele ter concordado com a entrevista era porque precisava reparar alguns danos. Polir sua reputação impoluta. Sem chance. É claro, ela respondera, sorrindo de modo provocante, que sabia ser do gosto dele. Creio que será fabuloso. – Dez minutos para entrar no ar, Chelsea. Ela aquiesceu com um gesto de cabeça, suas entranhas se contorcendo com adrenalina e ansiedade. Nada de ataques de pânico agora. Não podia estragar isso. Zoe Brook estava vestida e maquiada, pronta para agir. Dera certo trabalho trazer Zoe e Katy Michaels ao set sem chamar a atenção de ninguém. Chelsea as fizera entrar como suas amigas, e junto a Katy ajudara Zoe com os cabelos e maquiagem. Agora Zoe e Katy estavam escondidas em um camarim vazio, evitando Treffen. Chelsea rezava para tudo dar certo, que Zoe conseguisse entrar no set quando fosse chamada. Se a segurança impedisse, se Miles, o produtor, ou mesmo Michael percebessem o que estava acontecendo e desligassem os fios... Bem, Chelsea precisava simplesmente ir em frente. Apenas esperava que desse tempo. – Acho que está pronta – anunciou Sonya, e Chelsea agradeceu com um rápido sorriso. – Obrigada por tudo – disse. Sonya ficou um pouco espantada, e Chelsea não disse mais nada. Após dez anos esse era seu último dia na AMI, porém não podia alertar ninguém. Não podia deixar ninguém com suspeitas. Respirando fundo, caminhou para o set de filmagem e assumiu seu lugar em uma das poltronas. Técnicos de som e eletricistas ainda corriam de um lado para o outro, checando e gritando instruções. Treffen ainda não aparecera, e faltavam cinco minutos para entrar no ar. Ela sentiria falta de tudo isso, refletiu, olhando em volta. Falta do burburinho da televisão ao vivo e da animação em orquestrar entrevistas. Sentiria falta do entrosamento com os convidados, porque algumas vezes eles haviam sido seres humanos muito importantes na vida dela. Contudo, isso mudaria, porque ela estava mudando... ou tentando mudar. Talvez não ficasse com Alex, mas encontraria a felicidade com outro homem algum dia. Por que esse pensamento doía tanto? Nesse momento Treffen surgiu no palco, bem penteado e charmoso como sempre. Chelsea se ergueu para apertar sua mão e ele sorriu com seu encanto displicente, mas seus olhos continuavam frios e astutos. Os olhos de uma cobra. Chelsea não acreditava que nunca houvesse percebido antes, até que Alex lhe contara. Alex a fizera ver tanta coisa, tanta dor e beleza, alegria e amor. – Dois minutos. Chelsea voltou a se sentar e relanceou os olhos pelos cartões com as perguntas escolhidas por Treffen. Fale-me de seu trabalho humanitário. Pois sim! – Um minuto. Treffen ficou absolutamente imóvel enquanto um dos técnicos de som mexia em seu microfone, fazendo um último teste antes de entrarem no ar. O coração de Chelsea batia tão forte que ela mal ouvia a própria voz. Também sentia dor no peito. Então, na contagem regressiva dos segundos, e com a luz que se acendia para o iminente início do programa, Chelsea se sentiu muito calma e fria para executar seu propósito. Sentia os olhos de todos os assistentes e técnicos, os olhos de Treffen também, e soube que havia três homens de pé na coxia desejando ardentemente que a entrevista desse certo. Alex, Austin e Hunter queriam estar presentes quando Treffen desabasse. Caso desabasse. Se Chelsea conseguisse essa façanha. Ela ajustou o microfone, olhou além do cenário e viu Alex de pé nas sombras. O pânico a invadiu porque se Treffen o visse... Mas então Alex lhe sorriu e havia tanta confiança e verdade em seus olhos que Chelsea quase engasgou. Revelaria que o amava, decidiu de repente, diria as palavras mesmo que ele não pudesse retribuir. Era importante, pelo menos para ela, que Alex soubesse. Sorriu levemente de volta, e então a música de introdução começou e a luz do aviso ficou verde. Chelsea Maxwell e Jason Treffen estavam no ar. CAPÍTULO 15 ALEX ENFIOUas unhas nas palmas das mãos à medida que a música da introdução acabava e Chelsea começava a entrevista. Ele se encontrara com Hunter e Austin à entrada do prédio, e vira a expressão tensa de seus rostos assim como os cumprimentos. Tudo dependia da próxima hora. Poderia ter dito à Chelsea que não tinha importância, que não se importava com sua vingança, e pelo bem dela tentaria soar com sinceridade, mas, diabos, estava louco para ver Treffen ser consumido em uma grande bola de fogo, e queria que fosse Chelsea a acender o fósforo. – Acha que ela consegue, Alex? – perguntara Austin em voz baixa, enquanto se encaminhavam para o estúdio de gravação. Mexendo seus pauzinhos, Alex conseguira passes VIP. – Sei que ela consegue. – Chelsea não vai esmorecer? – Não. – E Alex acreditava nisso. Acreditava plenamente em Chelsea, com todo o seu coração e sua alma. Pena que ele próprio fosse um covarde para declarar seu amor. Dizer que queria a coisa verdadeira também, mesmo morrendo de medo. No momento se focalizou na entrevista à sua frente. – Jason, estou encantada pela oportunidade de entrevistá-lo esta noite – começou Chelsea. Sua voz soou quente e atraente como calda de chocolate, seu sorriso era cativante, e sua postura, tranquila. Alex sabia como devia estar tensa, e seu coração se encheu de orgulho. – É um prazer estar aqui, Chelsea. – Duvido existir uma só pessoa nos Estados Unidos que desconheça o trabalho que você realiza e as causas que ajuda. Defende os oprimidos há mais de duas décadas. Jason se aprumou na poltrona, e nas sombras Alex sentiu que Austin enrijecia, e Hunter cerrava os punhos. – É o trabalho de minha vida, Chelsea. – Falemos um pouco sobre os motivos que o levaram a isso – disse Chelsea, e Alex viu o olhar penetrante de Hunter. Até o momento Chelsea seguia as ordens de Treffen, porém Alex sabia que era sua estratégia. Deixava os convidados à vontade e lhes dava um senso de segurança e aconchego para que se abrissem mais. E Jason dançaria conforme a música de Chelsea, querendo ou não. – Quando comecei a exercer a advocacia – começou Treffen, obviamente disposto a falar sobre si mesmo um pouco –, as mulheres não tinham tantas oportunidades como hoje em dia. Não existiam sócias na minha firma, e poucas moças eram advogadas. As coisas simplesmente eram assim. – Fez uma cara de tristeza que Alex achou ridícula, mas que as pessoas costumavam apreciar. Chelsea aquiesceu com um gesto lento de cabeça, parecendo também acreditar. – E como você mudou essa situação, Jason? – Comecei a recrutar moças promissoras para trabalhar na minha firma. Queria lhes dar as oportunidades que mereciam e que haviam conquistado. Ao lado de Alex, Austin parecia prestes a explodir. E Alex também sentiu a própria raiva crescer no íntimo. O engodo arrogante que Jason praticava há tanto tempo era diabólico. – Se elas mereciam essas oportunidades – comentou Chelsea, franzindo a testa levemente – e eram qualificadas para serem advogadas, não vejo onde você foi tão magnânimo. Afinal, apenas demonstrou não ser preconceituoso. – Sorriu com doçura enquanto Jason estreitava os olhos. A observação astuta de Chelsea sem dúvida não fazia parte do roteiro. – Sei que fez muito mais, Jason. Não precisa ser modesto agora. – Sorriu para as câmeras, convidando todos os telespectadores a participar de sua curiosidade. – O mundo quer ouvir ao seu respeito. Jason relaxou um pouco. – Bem, creio que tem razão, Chelsea, embora não veja as coisas desse modo. Dar as oportunidades devidas a essas moças... embora ninguém mais tivesse pensado nisso... pode não representar um grande esforço humanitário – sorriu com presunção –, mas também criei fundos de escolaridade para meninas de regiões pobres... – Creio – interrompeu Chelsea com meiguice – que queira dizer “jovens mulheres”. O ar ficou tenso. – É assim que se refere a uma garota de 17 anos? – brincou Jason, mas Alex sabia que ele estava furioso. – Desculpe, sou um velhote que não está muito acostumado com as terminologias mais modernas. – Compreensível – murmurou Chelsea. – Porém, trata-se mais de como se vê uma pessoa, não? – Jason a encarou, desconcertado, e Chelsea se inclinou para a frente como se o convidasse a fazer confidências. – Por que não falamos sobre Sarah Michaels? Jason ficou paralisado apenas um segundo. Alex precisou admirar o sangue frio do homem. Se o câmera não tivesse focalizado nele nesse instante, ninguém teria notado a breve pausa, o rápido piscar de olhos. – Sarah Michaels – repetiu Treffen em tom neutro. – Sem dúvida se lembra da jovem que trabalhou para você há dez anos? – A voz de Chelsea soou suave e cheia de dor. – Ela se matou se atirando do teto de seu edifício. Um sussurro percorreu as coxias como um vento forte. Alex imaginou esse vento percorrendo o mundo todo com milhões de pessoas grudadas em seus aparelhos de televisão, e soube como estivera errado ao tentar suprimir a participação de Sarah na entrevista, e escondê-la porque estava se escondendo. Sarah merecia essa vingança. Jason ficara imóvel, ainda tentando parecer relaxado, e com expressão misteriosa. – Claro que me lembro de Sarah. – Balançou a cabeça. – Que tragédia. – Sim – concordou Chelsea. Balançou a cabeça também, olhando para o chão, parecendo perdida em sua dor por um instante, antes de erguer o rosto e atingir Treffen com um olhar gelado e duro. – E uma tragédia que poderia muito bem ter sido evitada. Jason lhe endereçou um sorriso tenso. – Creio que um suicídio sempre pode ser evitado. Chelsea inclinou a cabeça. – Não é um ponto de vista com muita compaixão, mas sei o que quer dizer. – Senti muito por Sarah – disse Jason, percebendo como seu comentário soara frio. – E por sua família. Na verdade, ela era grande amiga de meu filho. Todos nós sentimos muito. – Encarou Chelsea com firmeza enquanto falava, e até Alex, ao fundo, pôde perceber o aviso nos olhos de Treffen. Não cruze os limites, dizia seu olhar para Chelsea. Não avance ou eu a derrubarei. – E qual foi a razão para seu suicídio? Treffen não piscou e continuou a encarar Chelsea. – Obviamente era uma jovem com problemas. Estava namorando Hunter Grant, o ex-jogador de futebol, não estava? – Arqueou as sobrancelhas, convidando Chelsea e todos a presta atenção nas implicações do que dissera. – Não creio que fosse um relacionamento feliz. Hunter deu um passo à frente, e Austin o segurou pelo braço. Um gemido partiu da garganta de Hunter. – Bastardo. – Calma – pediu Austin. – Nada sei sobre os problemas dela com Hunter – disse Chelsea com ar pensativo. – Mas conversei com Katy Michaels, a irmã de Sarah, e ela pareceu pensar que você esteve envolvido com o suicídio de Sarah, Jason. Às suas costas Alex podia ouvir os assistentes de produção sussurrando, apavorados. – Que diabos... – Vamos cortar para os comerciais? Alex ficou tenso, e então viu alguém influente erguer a mão em um sinal de aviso. Esperem. Iriam ver o que Chelsea faria com essa novidade. Afinal, era televisão de qualidade. Bom para os índices de audiência. – Realmente não sei do que você está falando, Chelsea – disse Jason. Sua voz soou no tom certo, entre perplexa e triste. – Como já disse, senti muito por Sarah. E o suicídio é sempre muito penoso para quem fica. Imagino que Katy sinta a necessidade de culpar alguém, e percebo por que sou o alvo perfeito. – Por que você seria o alvo perfeito, Jason? – perguntou Chelsea em um tom meigo e simpático. – Minha firma de advocacia exigia muito dos jovens advogados. Longas horas de trabalho, ética rígida, casos complicados. Talvez Sarah tenha desabado sob a pressão. – Abriu as mãos em um gesto de sofrimento. – Acontece. – Sim, acontece – concordou Chelsea –, mas não foi isso que Katy me contou. Jason estreitou os olhos ligeiramente. – Ela também é uma jovem problemática, Chelsea. Não prestaria atenção ao que diz. – Sua voz era agradável, mas as palavras sem dúvida eram um aviso. – É difícil não levar a sério uma afirmação como a de Katy – insistiu Chelsea. – Quer saber do que ela o acusa? Falou com uma voz tão agradável quanto a de Treffen, e suas palavras também eram um desafio. Jason suportou seu olhar por um momento, e Alex soube que se debatia entre se desviar da pergunta ou enfrentar. Qual seria a melhor tática? Por fim deixou escapar uma risada mansa. – Não sei se quero. Seja o que for não tem fundamento e deve ser muito desagradável. Sem dúvida Chelsea conseguira fazêlo enfrentar, pensou Alex, e seu coração voltou a se encher de orgulho por ela. – É desagradável, Jason. Mas gostaria de ouvir de você por que é sem fundamento, e, obviamente, você não pode responder a nenhuma alegação se não sabe do que se trata. – Chelsea manteve o olhar no entrevistado, e Alex viu que agora Jason estava petrificado e com o queixo duro. Por fim disse: – Como deve saber, Chelsea, as pessoas famosas sempre são molestadas por rumores maliciosos. Pessoas como eu... ou você. Alex percebeu a ameaça velada na voz de Jason, e sabia que Chelsea percebera também. Diabos, o que o bastardo sabia sobre ela? – Oh, acredite, sei disso, Jason – garantiu Chelsea –, e por isso gostaria de esclarecer essa história hoje. – Não creio que haja algo a esclarecer. No meu caso, Chelsea, o rumor é malicioso e certamente falso, mas não é a mesma coisa no seu caso, não? – Ele sorriu como um predador próximo da vitória, e Alex enregelou. – Presumo – retrucou Chelsea sem se abalar – que está se referindo aos abusos que sofri de Brian Taylor quando trabalhei na Alabama Broadcasting Communications há dez anos. Jason abriu a boca, mas nenhum som saiu. Surpreendentemente, parecia não saber o que fazer. – Sim – disse afinal –, embora não sei se considero um abuso ir para a cama com alguém a fim de obter trabalho. Chelsea se inclinou para a frente com os olhos brilhando. – Deixe-me lhe dizer o que considero abuso – disse com voz calma, fria, e muito segura. – Atrair... quais foram as suas palavras? Oferecer trabalho na sua firma para jovens mulheres e depois fazer chantagem, levando-as para a prostituição. Dirige uma rede de prostituição para clientes de alto nível há quase vinte anos, Jason, segundo seus próprios funcionários. A reação chocada nas coxias se traduziu em discussões sussurradas e frenéticas sobre se deviam ou não desligar as câmeras. Jason apenas fitou Chelsea com expressão neutra. – Isso é nojento e totalmente falso. – Então nunca encorajou as moças que empregava a dormirem com os clientes? – perguntou Chelsea. Agora não havia nada de doce ou meigo em sua voz, que era dura e segura. – E não chantageou esse mesmos clientes por terem dormido com elas? Não coagiu mulheres a fazerem esses atos sórdidos porque pagava integralmente seus estudos e seus estágios? – Não. – Jason pareceu vomitar essa única palavra. – Não pode explicar esta fotografia? – perguntou Chelsea, retirando a foto de Sarah de uma pasta sob sua poltrona. Jason se imobilizou, e seu queixo ficou ainda mais rijo. – Não. – Pode explicar por que Zoe Brook, uma famosa especialista em Relações Públicas, está prestes a se apresentar aqui com sua história? – Zoe Brook? Creio que tem motivos egoístas para fazer isso. – Jason balançou a cabeça com pena. – Acontece. – Ela trabalhou para você durante vários anos, Jason – lembrou Chelsea friamente. – E você a obrigou a se prostituir com seus clientes. Jason se inclinou para a frente com os olhos fuzilando. – Chelsea, sei que gosta que seus convidados no talk show solucem e derramem segredos, mas isto já é demais. Sou um profissional respeitável e não posso suportar este tipo de acusação, em especial quando não existe nenhuma base exceto duas mulheres malucas... – Parou de supetão, e Chelsea sorriu. – Uma dessas malucas está aqui no estúdio, Jason. Zoe Brook está aqui e quer falar com você. Jason se recostou na poltrona e seu rosto parecia feito de pedra. – Esta é uma tentativa ridícula de me desmoralizar. – Por que alguém desejaria desmoralizá-lo, Jason? – perguntou Chelsea, sua voz ao mesmo tempo fria e doce. – Todos o amam. É o defensor dos direitos das mulheres, embora deva admitir que não pareça isso agora. Não queria acreditar nessas cosias que diziam ao seu respeito, e confesso que precisei ser convencida. Tive que ver fotos e falar com Katy Michaels e Zoe Brook. Agora quero que o mundo ouça isso de Zoe. E que você ouça também, Jason. Zoe Brook surgiu a um canto do set, pálida e ao mesmo tempo determinada. – Olá, Jason. Ele a fitou com frieza. – Está furiosa porque a demiti da firma, Zoe. Trabalhava mal e isso sem dúvida faz parte de sua vingança. Como disse antes, acredito em dar oportunidades às mulheres, mas devem merecer. Devem estar qualificadas. – A única coisa que importava a você com referência às suas funcionárias era que fossem qualificadas – replicou Zoe – para servirem a seus clientes, porém não permanecerei mais em silêncio, Jason. Não serei sua vítima. De novo, ao fundo, Alex ouviu um murmúrio furioso como se houvesse um ninho de vespas entre os assistentes de produção. As câmeras continuaram ligadas. – Isto é ultrajante – declarou Jason. – Recuso-me a ouvir mais destas acusações. – Levantou-se, pronto a deixar o set de filmagem. – Posso garantir – terminou friamente, escrutinando Chelsea com o olhar – que meus advogados irão procurá-la. Alex sabia que provavelmente faltavam apenas alguns minutos ou segundos para que o programa fosse cortado e saísse do ar. A rede não iria querer um processo judicial. Chelsea também se levantou, e enfrentou Treffen. – Não pode continuar blefando, Jason – disse, com os olhos e a voz severos. – Orquestra isso há vinte anos, porém a farsa chega ao fim, e sabe disso. Sua carreira está arruinada. Sua família conhece a verdade ao seu respeito. E agora o mundo todo sabe também. Acabou, sabe que acabou, mesmo que finja. Você sabe. Jason a encarou por vários segundos, as feições de pedra amolecendo e adquirindo um ar de sombrio desespero. – Sua vaca estúpida – disse devagar. – Não imagina o que está fazendo. Que buraco enorme abriu com esta história. Não se trata apenas... – Parou de supetão com o rosto contorcido em um sorriso sarcástico. – Não aprendeu nada desde que abriu as pernas para aquele produtor de meia-tigela no Alabama, aprendeu? – Então ergueu a mão e a esbofeteou no rosto. A cabeça de Chelsea girou para um lado com violência e Alex se adiantou, segurado por Hunter. – Maldição, me deixe... – Não pode dar um soco em Treffen ao vivo na televisão – disse Hunter com calma. – Acredite em mim, sei como essas coisas funcionam. Isso transformaria Treffen em vítima. A fúria ainda o dominava, mas Alex recuou. Podia ver a marca da mão de Treffen no rosto de Chelsea, mas ela sorria triunfante. As câmeras haviam parado de rodar, e dois seguranças agora cercavam Treffen, que estava pálido e abalado. Chelsea conseguira. Fizera Treffen desabar. E conseguira derrubá-lo também, pensou Alex. De todas as maneiras possíveis, sacudindo todas as suas crenças e sua armadura, e precisava dizer isso a ela. Caminhou para Chelsea, e ela se voltou para ele sempre sorrindo. – Consegui... – Eu a amo. – Foi extremamente fácil confessar, sentir. – Amo você – repetiu, pois ela parecia extremamente chocada, e Alex queria continuar dizendo. – Por isto – acrescentou, abarcando o set em um gesto –, mas por tudo, por você, Chelsea. Amo-a pelo que é. O sorriso dela se alargou ainda mais, simples e displicente. – Pode dizer mais uma vez? – Amo você. Amo você. – Tomou-a nos braços e enterrou o rosto em seus cabelos. – Amo-a e não acredito que tive tanto medo de confessar, admitir, por tanto tempo. – Tudo bem – replicou ela, enlaçando-o com os braços. – Porque agora você disse. E agora acredito. Os seguranças tiravam Treffen do set, e Hunter, Austin, Zoe e Katy estavam radiantes, mas também determinados a garantir que Treffen não fosse liberado após algumas perguntas ou um simples aviso. Com relutância Alex soltou Chelsea. Sabia que haveria tempo mais tarde para revelar tudo que seu coração sentia. E tempo também, assim esperava, para ouvir as três palavrinhas mágicas da boca de Chelsea. CHELSEA SABIA que fora graças a Michael que também não fora escoltada para fora do prédio pelos seguranças. Jason Treffen poderia ser preso, poderia pagar por seus crimes, mas ela também pagaria pelos seus. Não voltaria a trabalhar para a AMI e, surpreendentemente, não estava preocupada com isso. Hunter e Austin haviam saído com Zoe e Katy para celebrar, mas também para recapitular os acontecimentos da noite, processar tudo e decidir quais seriam os próximos passos. Chelsea pedira a Alex que os acompanhasse; precisava terminar seu trabalho, literalmente, na AMI. Mas agora desejava ter pedido que ele ficasse enquanto ia retirar seus objetos pessoais de sua sala. Agora o prédio estava quieto após o caos da entrevista. Provavelmente nesse momento Michael estava se reunindo com os advogados da AMI, e tentando controlar os danos. Ela falaria com ele mais tarde e tentaria explicar. Michael a entenderia. Deixou a AMI e dez anos de sua vida sem nenhum arrependimento. Um pouco de amargura, sim, e muitas lembranças. Mas, pela primeira vez na sua vida, sem arrependimentos. Alex lhe enviara uma mensagem dizendo que todos estavam em uma sala particular no Plaza Hotel com meio garrafão de champanhe nas mãos. Por favor, reúna-se a nós , escrevera. Reúna-se a mim. Chelsea se viu na soleira da porta da sala que haviam lhe indicado, e viu Zoe abraçada a Hunter, e Katy e Austin de mãos dadas. E Alex. Estava sentado sozinho com uma taça de champanhe balançando entre os dedos e um olhar pensativo enquanto ouvia os amigos conversando animadamente. Então girou a cabeça devagar e encontrou o olhar de Chelsea, que pegou fogo com o seu. O coração de Chelsea estava repleto de alegria. Ela se movia em uma sala cheia de gente e não sentia ansiedade ou medo. Sentia-se segura. Eu amo você, pensou em silêncio enquanto Alex mantinha seu olhar, sorria e estendia os braços. Ela se atirou naqueles braços, que se fecharam à sua volta, e sentiu que, por fim, alcançara um lugar seguro, o único lugar. – Amo você – pronunciou, dessa vez em voz alta, mas abafada de encontro ao ombro de Alex, que a apertou com mais força. EU AM O você. Palavras tão doces e simples e ao mesmo tempo tão poderosas, refletiu Alex enquanto abraçava Chelsea. Quanta alegria. Desse momento em diante jamais se cansaria de repeti-las. E diria com sinceridade e sentimento. Hunter, com o braço passado pelos de ombros de Zoe, os viu, e sua expressão se tornou divertida. – Vocês dois, venham se reunir à festa – chamou. – A menos que desejem um quarto? – Talvez mais tarde – respondeu Alex, passando o braço pela cintura de Chelsea e arrastando-a para perto dos amigos. Todos falavam sobre Treffen e o que aconteceria a seguir, e pela primeira vez, quando pensou em Jason e Sarah e todos os demais, Alex não sentiu raiva nem a costumeira pontada de remorso. Sentiu... paz. E se sentiu abençoado também, pois tinha Chelsea em sua vida. Porque recebera uma segunda chance, ambos receberam, e nem todo mundo recebia. – Você está bem? – perguntou Chelsea com meiguice, analisando o rosto amado. – Mais do que bem – respondeu Alex. Haveria tempo mais tarde para conversar, compartilhar, admitir tudo que sentira e sufocara. Muito tempo, porque tinham o resto de suas vidas. – Mais do que bem – repetiu com a voz embargada pela emoção. Chelsea sorriu compreendendo e concordando para, em seguida, beijá-lo. CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Hewitt, Kate H528q Quero que você me revele [recurso eletrônico] / Kate Hewitt; tradução Angela Monteverde. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Harlequin, 2014. recurso digital: il. Tradução de: Expose me Formato: ePub Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions Modo de acesso: World Wide Web ISBN 978-85-398-1667-5 (recurso eletrônico) 1. Romance americano. 2. Livros eletrônicos. I. Monteverde, Angela. II. Título. 14-16837 CDD: 813 CDU: 821.111(73)-3 PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Título original: EXPOSE ME Copyright © 2014 by Harlequin Books S.A. Originalmente publicado em 2014 por Harlequin Presents Trade Arte-final de capa: Isabelle Paiva Produção do arquivo ePub: Ranna Studio Editora HR Ltda. 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