XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
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ENSINANDO A ENSINAR A PARTIR DO PROJETO DE EXTENSÃO “100
ANOS SEM EUCLIDES”
Anabelle Loivos Considera Conde Sangenis – Faculdade de Educação da UFRJ
RESUMO:
O estatuto da Universidade Federal do Rio de Janeiro dispõe sobre a promoção e
a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituam
patrimônio da humanidade, além da comunicação deste saber através do ensino, de
publicações ou de outras formas de atuação universitária. Para o atingimento deste fim,
no inciso XII desse artigo, a UFRJ propõe como objetivo “a extensão [grifo nosso],
aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios
resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na
instituição”.
O Projeto Interinstitucional de Extensão “100 Anos Sem Euclides”
(UFRJ/UERJ) busca estabelecer o profícuo e necessário consórcio entre Ensino,
Pesquisa e Extensão, considerando que a universidade é um espaço permanente de
elaboração de propostas cujas ações permitem fortalecer e ampliar os vínculos com a
população. O Projeto atento está, ainda, à regulamentação do Fórum de Pró-Reitores de
Extensão das Universidades Públicas Brasileiras – FORPROEX (2010), sob o princípio
da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, como um processo
interdisciplinar educativo, cultural, científico e político que promove a interação
transformadora entre universidade e outros setores da sociedade.
Como contributo à formação de licenciandos em Letras (Língua Portuguesa e
suas Literaturas), o Projeto “100 Anos Sem Euclides” vem fomentando um destacado
projeto de capacitação de professores e de bolsistas PIBEX, no interior do estado do Rio
de Janeiro, buscando a complementaridade e a sinergia necessárias entre as instituições
parceiras, os propósitos instituídos e as experiências instituintes, dentro da tríplice
perspectiva que norteia qualquer ação da universidade pública: ensinar, pesquisar,
estender.
O presente artigo traz reflexões e algumas conclusões sobre o percurso feito pelo
Projeto, entre 2008 e 2011, sua patente articulação com as instâncias do ensino e da
pesquisa no âmbito da UFRJ e suas repercussões no processo formativo dos vários
agentes acadêmicos envolvidos.
Palavras-chave: Projeto de extensão, formação continuada, ensino de língua e literatura
A universidade pública, cada vez mais, se legitima como um espaço permanente
de elaboração de propostas cujas ações permitem fortalecer e ampliar os vínculos com a
comunidade em que se insere. Ainda que longe dos bancos universitários, quiçá por
falta de oportunidades, os cidadãos necessitam do conhecimento científico, técnico,
cultural e artístico produzido na academia, para a sua organização social, econômica e
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política. Neste sentido, o saber produzido pela universidade deve “retornar” às ruas,
voltando-se para a afirmação de todos os indivíduos (não apenas daqueles que privaram
da convivência acadêmica intramuros) como sujeitos de direitos e cumprindo uma
precípua agenda de compromisso social.
O trabalho mais “engajado” socialmente da universidade pública, na atualidade,
tem sido o conjunto articulado de projetos e ações de caráter multidisciplinar que ela
consegue integrar às suas atividades de pesquisa e de ensino, sob a designação do
“extensionismo”. Durante muito tempo, as ações no campo da extensão universitária
tiveram o “falso cognato” de atividades de caráter “menor” ou menos producente,
quando em comparação com as instâncias da pesquisa e do ensino (nesta ordem mesma,
respectivamente). Mas, gradativamente, dado o seu caráter orgânico-institucional, a sua
capacidade de integrar-se no território e/ou a grupos populacionais, a clareza de
diretrizes e a orientação para um objetivo comum e não excludente das tarefas de
pesquisar e ensinar, a extensão a cada dia mais esboça consórcios e alternativas para a
expansão das funções sociais da universidade. Como bem observa Paulo Freire,
O conhecimento não se estende do que se julga
sabedor até aqueles que se julga não saberem; o
conhecimento se constitui nas relações homem-mundo,
relações
de
transformação,
e
se
aperfeiçoa
na
problematização crítica destas relações. (FREIRE, 2006:
36)
O estatuto da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Capítulo II, Art. 7.º,
define, no inciso VI, como fim da UFRJ “... promover a divulgação de conhecimentos
culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar
o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação”. Para a
consecução deste fim, no inciso XII desse mesmo artigo, propõe como objetivo
... a extensão [grifo nosso], aberta à participação
da população, visando à difusão das conquistas e
benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa
científica e tecnológica geradas na instituição.
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Essa orientação marca, por assim dizer, uma viragem na cultura da própria
instituição superior de ensino, direcionando suas ações e metas para o acolhimento dos
saberes produzidos fora da universidade, e que com ela podem e devem dialogar. Tal
discurso está afinado com as propostas do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão
das Universidades Públicas Brasileiras, fundado em 1987 para regulamentar as
atividades extensionistas no âmbito das universidades públicas, como assevera Maria
das Dores Pimentel Nogueira:
A criação do Fórum Nacional ocorre tendo como
base algumas questões já consensuais entre seus membros
participantes, as quais seriam o fundamento para
elaboração das políticas de Extensão. Isso significa que o
entendimento entre os Pró-Reitores se deu a partir dessas
ideias consensuais, que podem ser apreendidas como
conclusões dos documentos dos encontros regionais. São
elas: o compromisso social da Universidade na busca da
solução dos problemas mais urgentes da maioria da
população; a indissociabilidade entre as atividades de
Ensino, Extensão e Pesquisa; o caráter interdisciplinar da
ação extensionista; a necessidade de institucionalização
da Extensão no nível das instituições e no nível do MEC;
o reconhecimento do saber popular e a consideração da
importância da troca entre este e o saber acadêmico; e a
necessidade
de
financiamento
da
Extensão
como
responsabilidade governamental. (NOGUEIRA, 2001:67)
O Projeto Interinstitucional de Extensão “100 Anos Sem Euclides”, uma parceria
entre a Faculdade de Educação da UFRJ e a Faculdade de Formação de Professores da
UERJ, desde 2008, ano do início de suas atividades em Cantagalo, pequena cidade do
centro-norte fluminense (a 180 Km da capital do Estado do Rio de Janeiro), buscou
estabelecer o profícuo e necessário consórcio entre Ensino, Pesquisa e Extensão, como
prerrogativas de todas as ações planejadas. As múltiplas iniciativas, levadas a cabo
nestes três anos de atividades, o foram através de vínculos de cooperação institucional
com a rede municipal e estadual de escolas da região, além de colégios particulares
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parceiros, entidades da comunidade civil organizada (ONG´s e associações), como
também pessoas físicas e jurídicas que, de alguma forma, colaboraram como apoiadores
ou patrocinadores dos eventos realizados e subprojetos implantados. Tais parcerias são
de fulcral importância para marcar o caráter democrático das ações do Projeto, bem
como fomentam a complementaridade e a sinergia necessárias entre as instituições
parceiras, os propósitos instituídos e as experiências instituintes, dentro da tríplice
perspectiva que norteia qualquer ação da universidade pública: ensinar, pesquisar,
estender.
Fazendo uma breve memória destas atividades, deve-se destacar a articulação,
desde 2009, do Projeto “100 Anos Sem Euclides” ao projeto de pesquisa “A poesia em
verso e prosa do escritor-engenheiro Euclides da Cunha”, da Faculdade de Letras da
UFRJ, coordenado pela Prof.a Dr.a Anélia Montechiari Pietrani, vice-coordenadora do
Projeto. Este consórcio possibilitou que todos os bolsistas PIBEX do Projeto “100 Anos
Sem Euclides” participassem de reuniões periódicas para leitura de textos de e sobre
Euclides, principalmente quando da preparação dos trabalhos a serem apresentados na
JIC (Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e Cultural) e no
Congresso de Extensão da UFRJ. No segundo semestre de 2011, articulamo-nos a mais
um projeto de pesquisa, desta vez interinstitucional, intitulado “História, Memória e
Identidade Fluminense”, da Faculdade de Educação da UFRJ e da Faculdade de
Formação de Professores da UERJ (FFP-São Gonçalo), coordenado pelos proponentes
do Projeto “100 Anos Sem Euclides”, nas respectivas unidades, Professores Doutores
Anabelle Loivos Considera Conde Sangenis (FE-UFRJ) e Luiz Fernando Conde
Sangenis (FFP-UERJ). Esta adesão teve um forte impacto na formação continuada dos
bolsistas, que apresentaram seus trabalhos de iniciação científica em congressos locais
(como o IV Seminário do Grupo Vozes da Educação, da FFP-UERJ) e também
nacionais, como a 99.a Semana Euclidiana de São José do Rio Pardo-SP, na
programação do Ciclo de Estudos Euclidianos (Área de Universitários).
Como se pode verificar, a patente articulação do Projeto “100 Anos Sem
Euclides” com as instâncias do ensino e da pesquisa no âmbito da UFRJ (no trânsito
entre a reflexão crítica e a aplicação do suporte teórico dos cursos de licenciatura
envolvidos, por intermédio da ação de docentes e discentes) tem trazido evidentes
repercussões para o processo formativo dos bolsistas envolvidos, além de propiciar a
produção e a sistematização dos conhecimentos adquiridos em campo pelos vários
agentes acadêmicos. Vale ressaltar que, no ano de 2011, uma das bolsistas de extensão
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do Projeto ficou com 1.o lugar na Maratona Intelectual Euclidiana de São José do Rio
Pardo, no interior paulista, com uma dissertação que versava sobre Euclides da Cunha e
sua revolucionária expedição, através da palavra, por um Brasil ignoto.
Além disto, deve-se destacar que o Projeto “100 Anos Sem Euclides” conta com
recursos humanos das mais diferentes áreas de atuação e interesse acadêmico: docentes
efetivos e substitutos das Faculdades de Educação e de Letras da UFRJ, além de
docente do quadro efetivo da UERJ, nossa parceira institucional; discentes-bolsistas de
extensão da UFRJ e discentes-bolsista de extensão da UERJ; membros do GEAC –
Grupo Euclidiano de Atividades Culturais, entidade da sociedade civil organizada
cantagalense; a diretoria da Casa de Euclides da Cunha, no suporte à gestão do espaço
cultural que funciona nas dependências do museu sob a chancela da UFRJ, o Ponto de
Cultura “Os Serões do Seu Euclides”; e a própria equipe do Ponto de Cultura, que conta
com um gestor cultural, um arte-educador, um quadrinista e uma historiadora/arquivista.
Há um consórcio com outras agências de fomento a projetos culturais para que
estes participem, direta ou indiretamente, da composição orçamentária que futuramente
garanta a continuidade do Projeto “100 Anos Sem Euclides” em Cantagalo-RJ:
Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro/MinC (convênio do Ponto de Cultura
“Os Serões do Seu Euclides”); Fundação Universitária José Bonifácio (para a realização
do III Ciclo de Debates com Educadores – Euclides da Cunha na sala de aula); e as
secretarias municipais de Educação e de Cultura de Cantagalo, parceiros na
infraestrutura dos eventos realizados. A construção de uma relação ética entre estes
mesmos parceiros, pela interação do conhecimento e experiência acumulados na
academia com o saber popular e pela articulação com organizações de outros setores da
sociedade, tem sido elemento catalizador de novas ideias e parcerias para o
desenvolvimento das competências regionais.
As propostas de extensão da UFRJ cumpriram, assim, papel de suma
importância no percurso formativo dos bolsistas envolvidos com o Projeto “100 Anos
Sem Euclides”, que puderam se apoderar de metodologias e técnicas para atuarem, sob
uma perspectiva dialógica, na idealização de eventos, na pesquisa de material de suporte
às atividades previstas, no acompanhamento da execução das propostas, no diálogo
produtivo com a comunidade atendida pelas ações extensionistas e nas demais
demandas que se fizeram necessárias. Melo Neto (2004:23) atenta para o perigo de uma
ação universitária que prescinda desta tríplice aliança entre ensinar, pesquisar e
estender, separando “... o processo educativo da própria educação, o processo cultural
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da própria cultura, bem como o processo científico da própria ciência.” A
indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão, caracterizada pela ação articulada
entre estes três pilares, conduziu a mudanças substantivas nos processos de ensino e de
aprendizagem dos estudantes, fundamentando didática e pedagogicamente a sua
formação profissional e cidadã. O percurso formativo encadeado pelas demandas do
Projeto possibilitou a cada membro participante operacionalizar a relação entre teoria e
prática, a democratização do saber acadêmico e o retorno desse conhecimento à
universidade, testado e reelaborado.
Semelhantemente, nas “Oficinas Pedagógicas e Ciclos de Debates – Encontros
com Educadores: Euclides da Cunha na sala de aula” (cujo público-alvo foram os
professores das escolas públicas e particulares de ensino do município de Cantagalo e
da região do entorno) e nos “Altos Papos Euclidianos” (evento voltado para estudantes
do Ensino Médio destas mesmas escolas), foi possível enxergar a haste da
interdisciplinaridade, aspecto fulcral do tríduo ensino-pesquisa-extensão, por conferir
maior capilaridade aos processos desencadeados a partir das atividades de cunho
extensionista. O benfazejo jogo interdisciplinar que caracterizou a interação dos
modelos das “Oficinas Pedagógicas” e dos “Altos Papos Euclidianos” propiciou a
circulação de conceitos complementares e de metodologias provenientes das diversas
áreas do conhecimento, com o objetivo de dar consistência teórica e estrutural ao
trabalho coletivo.
Dentro do escopo das duas edições já realizadas do evento “Ciclo de Debates
com Educadores” (2010 e 2011), foram realizadas, ao todo, dez Oficinas Pedagógicas,
com o objetivo de estimular nos professores participantes a criação cultural e o
desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo, a partir do contato
com a obra de Euclides da Cunha. As Oficinas Pedagógicas visaram, ainda, a promover
a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem
patrimônio da comunidade local, comunicando os saberes (institucionais ou não) através
do ensino. Uma das oficinas foi totalmente preparada nas aulas de Didática Especial e
Prática de Ensino de Língua Portuguesa/Literaturas, e aplicadas pela docente
responsável (Anabelle Loivos, FE-UFRJ) e pelos bolsistas de extensão do Projeto “100
Anos Sem Euclides”. Intitulada “Cordelando com Euclides: poesia e universo
euclidiano na sala de aula”, a oficina teve como objetivo instrumentalizar os professores
das redes municipal, estadual e particular de ensino, da grande área de Linguagens,
Códigos e suas Tecnologias, para a utilização da literatura de cordel como ferramenta
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pedagógica para o desenvolvimento da leitura e da escrita. Os participantes da Oficina,
nos dois dias de sua execução, em Cantagalo-RJ, leram textos teóricos sobre a oralidade
como linguagem base e seu poder de aproximação do leitor à escrita e vice-versa, para a
compreensão do texto e do contexto. Fizeram, ainda, atividades práticas, como a
construção de cordéis falados, como laboratório para aplicação da atividade em suas
próprias sala de aula. Para surpresa dos oficineiros, muitos dos professores nunca
tinham lido um folheto de cordel, ou mesmo julgavam-nos uma espécie de
“subliteratura”. A Oficina de Cordel serviu, então, para divulgar os importantes estudos
acadêmicos sobre o tema, além de disseminar a prática leitora em um dos subprojetos
do Projeto “100 Anos Sem Euclides”, a Cordelteca Madrinha Mena, implantada na Casa
de Euclides da Cunha em 2010 e única do gênero no interior do Estado do Rio de
Janeiro. Desta forma, foi possível compartilhar com os participantes da Oficina a
“novidade” que a Literatura de Cordel traz para a sala de aula: uma outra forma de ler e
ouvir, recitar e criar, superando a barreira da maniqueísta dicotomia popular x erudito.
Daí, o sucesso da proposta extensionista de “cordelar com Euclides da Cunha” as
histórias que ele próprio contou sobre Canudos e a Amazônia, rompendo as barreiras
entre o texto clássico e a elocução popular e versejante do cordel.
Aos “Altos Papos Euclidianos”, por exemplo, somaram-se jovens matriculados
regularmente no ensino médio em escolas públicas e privadas de Cantagalo, além de
“maratonistas” (como são chamados os alunos que, por seu desempenho destacado,
participam anualmente da “Maratona Euclidiana”, em São José do Rio Pardo-SP) e
membros da comunidade local (professores da ativa e aposentados, um jornalista, uma
documentarista e um artista plástico). A programação começou com uma “bate-papo”
com a coordenadora do Projeto 100 Anos Sem Euclides, Prof.a Anabelle Loivos, (FEUFRJ), que fez uma explanação sobre as várias figurações da imagem do “judeu
errante” na história e na memória literária ocidental, para chegar à representação feita
por Euclides da Cunha, num dos seus mais belos trabalhos: o conto “Judas Ahsverus”,
que trata do costume da malhação do Judas nas comunidades ribeirinhas do Amazonas.
Essa primeira aproximação ao denso texto euclidiano foi feita com profusão de leituras
de imagens e uma conversa descontraída com os jovens participantes, a fim de tornar a
leitura literária uma tarefa mais palatável. A atividade teve sua culminância com uma
leitura dramatizada do conto em questão, feita pela professora e pelos bolsistas PIBEX
da UFRJ, contando com a “atuação” de um boneco-Judas que foi sendo construído e
desconstruído pelo artista plástico Gilson Andrade, também professor da rede pública
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de ensino cantagalense. O resultado desta “epopeia” leitora foi surpreendente e
gratificante para o grupo: a teatralidade do texto, a gravidade de sua exposição e a
perenidade de seu relato levaram os jovens leitores a uma espécie de “catarse” coletiva,
buscando novas leituras, na contemporaneidade, para a saga secular do judas sertanejo
construído por Euclides. Saíram todos pela rua, em frente à Casa de Cultura Euclides da
Cunha, abraçados, e recitando as palavras finais do conto, em voz alta: “Caminha,
desgraçado, caminha!”.
É possível afirmar, assim, ter havido variados impactos na formação dos
graduandos da UFRJ que privaram das práticas sociais e leitoras do Projeto “100 Anos
Sem Euclides” em Cantagalo. Tais balizadores se revelaram na contribuição do Projeto
à formação técnico-científica, cultural e social dos estudantes, explicitada em um plano
didático-pedagógico que contempla o livre trânsito dos licenciandos entre a orientação
acadêmica e o encontro com as práticas docentes nas escolas-campo de sua atuação e
nos eventos realizados pelo Projeto. Os próprios bolsistas de extensão pontuam estes
momentos como verdadeiros “divisores de águas” em seus relatórios técnicos,
ressaltando a pertinência dos critérios de avaliação do Projeto (para o público e para
seus membros), dando amplo sentido à sua vida acadêmica, no que flexibilizam e
dinamizam a própria integralização curricular.
Em outras palavras, o desafio de “ensinar a ensinar”, através das atividades
extensionistas do Projeto “100 Anos Sem Euclides”, tem se consubstanciado como ação
transformadora sobre os contextos sociais locais, servindo como contributo à inclusão
de grupos sociais antes pouco mobilizados para o universo fractal da cultura euclidiana:
alunos, professores, comunidade em geral. O desenvolvimento de novos meios de
produção, inovação e transferência de conhecimento pode ser a chave para a ampliação
de oportunidades educacionais e do acesso a processos de formação e capacitação para
os atores do Projeto. Por fim, resta afirmar ser inestimável a contribuição dos bolsistas
de extensão da UFRJ e dos docentes da IES na formulação, implementação e
acompanhamento das políticas públicas prioritárias ao desenvolvimento cultural da
cidade de Cantagalo-RJ, berço do escritor fluminense, Euclides da Cunha. Porque os
“meninos e meninas”, licenciandos em Letras, percorrem conosco, pesquisadores e
docentes, a rota de uma navegação que de fato é necessária: a de conhecer,
compreender, avaliar e redimensionar o papel deste profissional a quem caberá a missão
de problematizar a realidade, instigar a curiosidade científica e filosófica, fomentar a
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descoberta e despertar no educando a paixão por aprender os domínios da sua própria
linguagem – seu jeito de ser, estar e “escreviver” o mundo.
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FARIA, Doris Santos de (org). Construção Conceitual da Extensão na América Latina.
Brasília: Editora UNB: 2001.
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