RACIONALIDADE E TENSÃO ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES:
UMA ABORDAGEM A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DA
ECONOMIA DE COMUNHÃO
Silvia Martí Barros (UFRGS) 1
Aida Maria Lovison (UFRGS) 2
Resumo
O presente trabalho teve como principal objetivo compreender de que modo os membros
(administradores e administrados) de uma empresa vinculada à proposta da Economia de Comunhão (EdC) enfrentam a ordinária tensão ética oriunda de modos distintos de racionalidade
(instrumental e substancial) enquanto realizam as suas atividades de trabalho. Trata-se de uma
pesquisa exploratória, de caráter qualitativo, realizada com ênfase no estudo de caso, e a etapa
de coleta de dados efetivada com recurso a entrevistas semi-estruturadas (realizadas com representantes de todos os níveis hierárquicos da Metalsul - uma indústria do setormetalmecânico situada em Joinville, Santa Catarina), à observação participante e à análise
documental. Para a interpretação dos dados coletados, utilizou-se a análise de conteúdo, centrada nas categorias presentes no quadro teórico referencial. Os resultados da pesquisa dão
conta de que, ao adotar a EdC como modelo de referência para o agir pessoal e para o agir
econômico, a empresa rompe com a primazia da lógica instrumental, permitindo aos membros
da organização conduzir-se como um sujeito ético, e à empresa ser reconhecida, no mercado,
como uma empresa ética. Consequentemente, admite-se, nas circunstâncias descritas e segundo a visão dos sujeitos entrevistados, que uma ação racional orientada por valores (neste caso,
àqueles vinculados à proposta da EdC na liberdade), torna possível conciliar, de forma inédita, com inteligência lúcida, todavia sob tensão, os aspectos de competitividade, eficiência e
lucratividade com os objetivos de respeito à pessoa, ou seja, de promoção humana em nível
individual e coletivo.
Palavras–chave: tensão ética, racionalidade, Economia de Comunhão.
1 INTRODUÇÃO
Vive-se em um tempo em que se percebe claramente a consolidação de um sistema de
mercado no qual as organizações formais de caráter econômico – ou seja, as empresas - ocupam um espaço cada vez mais considerável na vida dos indivíduos, acentuando sua influência
direta e indireta sobre as ações humanas. Segundo Prestes Motta (1978, p. 74), o contexto
socioeconômico mundial se encaminha para a configuração de uma “sociedade organizacional”, ou seja, “uma sociedade moderna, caracterizada pela existência de um grande número de
organizações, a ponto de se poder afirmar que o homem passa a delas depender para nascer,
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viver e morrer”. Silva e Webering (2010) corroboram tal afirmação ao dizer que o locus da
cultura ocidental é a economia enquanto as organizações 3 são a personificação do mercado.
É inegável que este fato contribuiu (e continua a contribuir) significativamente para o
avanço tecnológico, possibilitando a melhoria das condições de vida da sociedade em geral do
ponto de vista da produção e acumulação de bens. De fato, como bem salientam Silva & Webering (2010, p. 25) “é difícil imaginar como o crescimento da produção, da redução das fronteiras entre os países, facilidade no deslocamento, subsídios que viabilizam o comércio ocorreriam sem o seu desenvolvimento”. Mas se, por um lado, a lógica de mercado permite que a
sociedade tenha condições de suprir as necessidades primárias do ser humano do ponto de
vista material, de outro, a importância excessiva dada à racionalidade utilitarista que norteia a
atuação das organizações econômicas parece levar a
[...] uma inversão do que seria a ordem natural das coisas: ao invés do conjunto cultural (sociedade) determinar a produção de bens/objetos com que o conjunto natural (natureza) oferece
para atender as suas demandas e diferenciações, a economia passa a ser o locus [...] Ao que parece, a racionalidade do sistema é menos racional do que deveria (SILVA & WEBERING,
2010, p. 24-25; grifo do autor).
Atualmente, por razões diversas, muito se fala em “racionalidade utilitarista”, “racionalidade capitalista” ou, ainda, em “racionalidade do sistema”. É necessário porém, ao discutir essas terminologias, evitar a condição pouco prática e inoperante dos pressupostos ingênuos, refletindo, antes de tudo, sobre o significado da palavra razão, uma vez que ela é, na
visão de Guerreiro Ramos (1989), conceito básico de qualquer ciência da sociedade e das organizações, prescrevendo, em virtude de sua dimensão normativa, como os seres humanos
deveriam ordenar sua vida pessoal e social. O mesmo autor explica que,
no sentido antigo, [cujas bases são Platão e Aristóteles] a razão era entendida como força ativa
na psique humana que habilita o indivíduo a distinguir entre o bem e o mal, entre o conhecimento falso e o verdadeiro e, a assim ordenar sua vida pessoal. Mais ainda, a vida da razão
na psique humana era encarada como uma realidade que resistia a sua própria redução a
um fenômeno histórico ou social (GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 2-3; grifo nosso).
Em seu sentido moderno, todavia, a razão é vista “como uma capacidade que o indivíduo adquire ‘pelo esforço’ e que o habilita a nada mais do que fazer o ‘cálculo utilitário de
consequências’” (HOBBES, 1974 apud GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 3). Em outras palavras, a partir do século XVII, o conceito de razão é interpretado de uma forma cuja peculiaridade é marcante: há um deslocamento de centro ordenador da existência humana para o instrumento de previsão de cálculo (SERAFIM, 2001). Conclui-se, ao comparar os entendimentos respectivos, que houve uma mudança drástica no modo de conceber a razão, que se perpetua até os dias atuais.
Silva e Webering (2010) comentam que na Filosofia Clássica o homem (filósofo)
submete a situação humana à capacidade de avaliação e ao seu julgamento crítico, o qual contém um julgamento de valor. Já, no sentido moderno, ocorre o que Guerreiro Ramos (1989)
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O termo “organização” deve ser entendido neste trabalho como sinônimo de organização econômica, ou seja,
empresa.
denomina de “transavaliação 4” da razão, ou seja, há uma distorção neste conceito-chave da
vida humana: de acordo com as suas prescrições normativas, a sociedade centrada no mercado
ao invés de frontalmente declarar a sua incompatibilidade com as prescrições da razão, conservou a palavra em sua linguagem, mas deu-lhe um sentido que legitima a sociedade moderna somente em base utilitárias. Como a palavra razão, informa Guerreiro Ramos (1989), por
força de seu caráter central, dificilmente seria posta de lado, a sociedade moderna ao converter o concreto no abstrato, o bom no funcional, tornou-a compatível com sua estrutura normativa. A descrição de sua astúcia, quer dizer, o exame “[d]esta alta capacidade da sociedade
moderna, quando comparada com outras sociedades, de absorver, distorcendo-os, palavras e
conceitos cujo significado original se chocaria com o processo de auto-sustentação dessa sociedade” (GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 3) - processo que consiste no uso inapropriado do
vocabulário teórico que prevalecia antes do seu aparecimento - é, para o autor, uma das formas de criticar essa sociedade.
2 RACIONALIDADE E TENSÃO ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES
Para avançar na perspectiva enunciada, Guerreiro Ramos (1983, p. 37) considerou
“dois pares conceituais de origem weberiana. Trata-se da ‘racionalidade funcionalracionalidade substancial’ e ‘ética da responsabilidade-ética do valor absoluto ou da convicção’”.
A racionalidade formal e instrumental é determinada por uma expectativa de resultados, ou “fins calculados” (GUERREIRO RAMOS, 1989). A ética da responsabilidade corresponde, portanto, a toda a ação racional referida a fins (RAMOS, 1983). O autor defende
que, na grande maioria das organizações produtivas, a “razão instrumental prevalece como
lógica subjacente às ações, determinando o padrão de ‘sucesso’ a ser atingido, um sucesso
orientado pelas leis de mercado e predatório por natureza” (GUERREIRO RAMOS, 1989, p.
19).
Já a racionalidade substantiva ou de valor é determinada “independentemente de
suas expectativas de sucesso e não caracterizada por nenhuma ação humana interessada na
‘consecução de um resultado ulterior a ela’” (WEBER, 1968 apud GUERREIRO RAMOS,
1989, p. 5). A ética do valor absoluto ou da convicção está implícita em toda a ação referida a
valores (GUERREIRO RAMOS, 1983). Por meio dela os indivíduos poderiam conduzir sua
vida pessoal na direção da autorrealização, contrabalançando essa busca de emancipação com
o alcance da satisfação social, ou seja, levando em conta também o direito dos outros indivíduos de fazê-lo (SERVA, 1997).
Ao se observar atentamente os conceitos de racionalidade apenas apresentados, notase uma relação íntima entre a racionalidade substancial e a razão no sentido antigo, do mesmo
modo que há uma ligação forte entre a racionalidade funcional e a razão no sentido moderno
(SILVA e WEBERING, 2010). O problema da distorção no entendimento moderno do conceito de razão, conforme salientado acima reside no fato de que a racionalidade instrumental
se transformou em racionalidade em geral, assumindo com frequência, em virtude desta factibilidade, conotações antiéticas relativamente aos pressupostos fundamentais da existência
humana (GUERREIRO RAMOS, 1989).
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A transavaliação da razão – levando à conversão do concreto no abstrato, do bom no funcional, e mesmo do
ético no não ético – caracteriza o perfil intelectual de escritores que tem tentado legitimar a sociedade moderna
exclusivamente em bases utilitárias (GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 3).
Silva e Webering (2010, p. 29) enfatizam, consoante ao exposto, que “no desenvolvimento do capitalismo e o seu processo de industrialização houve a exacerbação da chamada
racionalidade funcional, que implica no ‘encolhimento’ da racionalidade substancial”. A principal conseqüência, portanto, foi a perda progressiva da autonomia do indivíduo, tendo em
vista que no contexto da sociedade moderna a vida humana está subordinada a um agir econômico centrado no mercado (GUERREIRO RAMOS, 1989). Os valores da cultura capitalista ocidental e a racionalidade do sistema induzem as pessoas a moldar suas vidas fundamentadas quase que exclusivamente na economia, sem se darem conta disso (SILVA e WEBERING, 2010).
A crítica à razão moderna apresentada por Guerreiro Ramos (1989) reside justamente
neste aspecto: forjou-se o homem como um ser unidimensional, cujo padrão de sua existência
é o critério econômico. E é unidimensional porque considera o mercado como a principal categoria para a ordenação dos negócios pessoais e sociais, deixando-se de lado valores inerentes ao ser humano, como a busca pela autorrealização e liberdade. Para Chanlat (1992, p. 69),
esta ‘economização’ das relações humanas sob o império de uma ética utilitária não fez, jamais, justiça à complexidade do comportamento humano. As relações humanas põem em jogo
regras que não são todas da ordem do econômico (grifo nosso).
Do ponto de vista histórico-social, Mannheim (1962 apud GUERREIRO RAMOS,
1983, p. 39) percebe uma deterioração da capacidade do indivíduo de agir segundo a racionalidade substantiva ao observar que “a industrialização tem desenvolvido a racionalidade funcional, e admite venha exercer efeito paralisador sobre a capacidade média de apreciação e
entendimento, à luz da racionalidade substancial”. O conflito permanente entre os valores do
indivíduo – que em sua natureza compreende o aspecto econômico, mas não se limita a este –
com os da empresa, requer do indivíduo o que Ramos (1983) e Mannheim (1962) definem de
autorracionalização da conduta. Em contextos onde se impõe a racionalidade funcional,
[...] a sobrevivência do homem depende de sua capacidade de autorracionalização, isto é, depende de que seja capaz de organizar-se mentalmente, de seu autocontrole moral e físico, tendo
em vista o exercício de tarefas funcionalmente racionalizadas (MANNHEIM 1962 apud
GUERREIRO RAMOS, 1983, p. 39)
Sobre o ponto de vista do desenvolvimento tecnológico, Guerreiro Ramos (1983, p.
40) atenta para o fato de que
Seria, portanto, infundada a expectativa de que quanto mais se desenvolve, em nível tecnológico, a sociedade, mais se eleva necessariamente a autoconsciência racional do homem [...] A racionalidade que a tecnologia e a industrialização difundem, quando entregues a um processo
cego, é a que submete o homem a critérios funcionais, antes que substanciais, de entendimento
e compreensão. [...] se indaga sob que condições pode o saber tornar-se um modo de preservação da liberdade, num mundo em que a tecnologia incoercivelmente, terá aplicação cada vez
maior em todos os domínios da existência.
O exercício de qualquer cargo, função ou carreira é um exemplo típico de autorracionalização da conduta de seu ocupante ou titular: a vida daqueles que a pretendem acaba se
resumindo na luta por promoções, melhorias, e ascensões (GUERREIRO RAMOS, 1983). Na
visão de Serafim (2001), para que isso ocorra faz-se necessário "dopar" a mente de sua dimensão substantiva, o que o torna parte funcionalmente racional da ação administrativa, autodominando seus impulsos, preferências e até crenças e ideologias. Muitas vezes essa postura
diante do mundo leva a uma diminuição do “conteúdo não apenas de simpatia, emoções e
sentimentos, [...] mas da racionalidade substancial, afetando sua vida fora do trabalho e até a
sua vida interior” (GUERREIRO RAMOS, 1983, p. 39-40).
Serafim (2001) complementa tal prerrogativa ao defender que a autorracionalização –
que tem como pressuposto a conduta estando sob a égide da racionalidade funcional – permite
a sobrevivência do indivíduo na organização, mas alerta que a submissão passiva do mesmo a
esses imperativos externos tem um profundo efeito sobre sua personalidade. A principal consequência deste tipo de conduta é a deterioração da dimensão substantiva do indivíduo, resultando no “enfraquecimento de sua capacidade de fazer julgamentos éticos e críticos de natureza pessoal” (GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 110).
Logo, quanto mais a atividade humana é considerada administrativa, menos ela é uma
expressão de realização pessoal, pois as exigências próprias das organizações econômicas não
coincidem, necessariamente, com aquilo que é requerido pela boa qualidade da existência
humana em geral (GUERREIRO RAMOS, 1989). Serafim (2001) afirma que, desta forma, o
ser humano – enquanto participante apenas do enclave econômico – é submetido a compulsões operacionais que o inibem de se tornar um sujeito ético, que de acordo com Marilena
Chauí (1997), caracteriza-se como um ser racional e consciente que sabe o que faz, um ser
livre que decide e escolhe o que faz e um ser responsável que responde pelo que faz.
Guerreiro Ramos (1983, p. 41) adverte, nos termos de Whyte, que “é ingênuo negar
que estejam em conflito o indivíduo e a organização, tem que estar sempre [...], e o preço para
um indivíduo é ter que defrontar-se com esses conflitos”. Mas tal incongruência dos valores
do indivíduo com os da empresa gera inevitavelmente uma tensão ética: enquanto o indivíduo busca a sua emancipação e sua autorrealização, a empresa busca atingir objetivos estritamente econômicos. Esta falta de equilíbrio entre o indivíduo e a organização, e preocupado
mais uma vez em demonstrar os efeitos da racionalidade funcional sobre a conduta, aponta
tendências que para ele são ameaçadoras, porque prejudiciais ao ser humano. Quer dizer,
a organização, ajudada pelas ciências sociais aplicadas e as técnicas científicas, está se tornando onipotente, e ao procurarem estas a integração e a harmonia entre o indivíduo e a organização, perseguem um objetivo falacioso e utópico. Um mundo espantoso seria aquele em que essa harmonia se efetivasse (WHYTE, 1956 apud GUERREIRO RAMOS, 1983, p. 40).
É importante sublinhar que Mannheim (1962 apud GUERREIRO RAMOS, 1989, p. 7)
não está sugerindo que
a racionalidade funcional deva ser abolida do domínio social. Estipula, antes, que uma ordem
social verdadeira e sadia não pode ser obtida quando o homem médio perde a força psicológica
que lhe permite suportar a tensão entre racionalidade funcional e a substancial e por completo
se rende às exigências da primeira.
Cabe destacar que, se por um lado Max Weber (1944 apud GUEREIRO RAMOS,
1983, p. 42) considerava as duas éticas “irredutivelmente opostas”, por outro, admitia a coexistência de ambas em relações de tensão, afirmando que a “absoluta racionalização na ação
com relação a fins é, contudo, um caso limite”. Desta forma, faz sentido sua argumentação, a
saber:
as duas éticas não são necessariamente antagônicas. No tocante à organização, teórica e concretamente, pode-se admitir congruência entre as duas éticas, na proporção em que as qualificações e a natureza do trabalho se coadunem com os valores dos indivíduos (GUERREIRO
RAMOS, 1983, p. 43).
Portanto, há que se admitir que “nenhum indivíduo organiza a sua conduta sob a espécie exclusiva de nenhuma das duas éticas [da responsabilidade e da convicção]” (GUERREIRO RAMOS, 1983, p. 43). Esta realidade reforça a idéia de que o indivíduo se encontra ordinariamente em tensão. Todavia, “os graus e o conteúdo dessa tensão podem ser mais ou menos deteriorantes, do ponto de vista humano, conforme as qualificações estruturais da organização” (GUERREIRO RAMOS, 1983, p. 43).
Desta forma, refletir acerca da conduta ética no contexto das organizações econômicas
requer uma investigação que extrapole suas fronteiras categoriais tradicionais, face à visão
reducionista e reificante do ser humano predominantes no mundo da gestão (SERAFIM,
2001). A organização não ocupa, jamais ocupará, todo o espaço existencial humano. Na opinião de Guerreiro Ramos (1983, p. 41-42), em fases mais adiantadas da cultura social, “a integração do indivíduo na organização [...] tende a ser obtida mediante a deliberada autorracionalização da conduta, em alto nível de consciência e compreensão. Supõe a ética da responsabilidade”. É necessário, então, um olhar sistêmico sobre outras propostas que constroem espaços de existência humana que permitem ao ser humano guiar-se de modo a corresponder às
expectativas econômicas sem, contudo, fragmentá-lo a ponto de fazê-lo desistir de critérios
pautados por sua razão substantiva (SERAFIM, 2001).
2.1 RACIONALIDADE ECONÔMICA E EMPRESAS DE “MOTIVAÇÃO IDEAL”
Diante do panorama apenas exposto, o de uma época em que a razão econômicoutilitarista é o centro do agir econômico, quaisquer propostas que vão de encontro a esta lógica, baseada no funcional/instrumental são, fundamentalmente, controversas. Ou seja, é incomum e pouco concebível uma atividade econômica na qual os critérios desta racionalidade
possam ser submetidos ou conjugados à outra racionalidade com objetivos não necessariamente econômicos (FERNANDES, 2007).
Ademais, o atual sistema econômico de mercado não leva em consideração uma série
de comportamentos humanos que transcendem a lógica do lucro, como por exemplo, o voluntariado exercido por milhões de pessoas, dispostas a desempenhar trabalhos e assumir responsabilidades, sem qualquer compensação econômica (FERRUCCI, 1998); ou ainda a economia
solidária, para citar apenas um exemplo, e que possui várias manifestações no Brasil (SINGER, 2002).Segundo Ferrucci (1998, p. 180),
não é correto limitar as motivações da atividade humana, inclusive a atividade econômica, apenas à lógica do lucro. O ser humano possui motivações mais profundas e objetivos mais
complexos, que não podem ser ignorados se quisermos superar a atual situação mundial, aparentemente sem saída [pois] são outras as reais motivações para a atividade do homem: ele trabalha para viver, para manter seus familiares; para criar coisas novas e válidas; para ser aceito
e respeitado pelos outros na comunidade; para ser valorizado e amado, para autorrealizar-se e
até mesmo para deixar um marco na história. São elementos que nada têm de econômico.
As motivações intrínsecas têm um valor muito importante na vida civil e também na
vida econômica e nas organizações (SMERILLI, 2009). Molteni (2002) também ressalta que
existem certas empresas com direcionamentos estratégicos e organizacionais cujas linhas de
desenvolvimento somente poderão ser compreendidas a partir da consideração ideal que, por
sua vez, dá forma às decisões e atitudes dos expoentes da cúpula empresarial. Trata-se de empresas denominadas de “motivação ideal”, isto é, são
associações, ONG’s, empresas sociais ou as empresas de economia de comunhão, etc. - nas
quais o motivo de inspiração (ou que inspiraram a sua constituição) não é o lucro em primeiro
lugar, nem elementos exclusivamente instrumentais, mas uma motivação ideal, uma missão ou
uma "vocação" que, em muitos aspectos, vem das motivações intrínsecas dos seus promotores
(SMERILLI, 2009, p. 1).
Justamente em virtude da orientação cultural dos próprios autores-chaves, esse tipo de
empresa tende a conjugar as exigências de competitividade e de rentabilidade típicas das empresas que operam numa economia de mercado, com uma profunda atenção aos próprios funcionários e ao desenvolvimento da sociedade como um todo (MOLTENI, 2002). De acordo
com Coda (1988a apud MOLTENI, 2002, p. 90) “seus responsáveis estão empenhados em
demonstrar – como os fatos comprovam – que, entre as duas dimensões, não existe incompatibilidade”. E, conforme explica Molteni (2002, p. 90), “com sua operação, portanto, as empresas de ‘motivação ideal’ inserem-se com plenos direitos [...] no debate [...] em torno da
compatibilidade entre lógica de maximização do interesse privado e tensão ética”. Para ele, as
empresas que participam do projeto Economia de Comunhão na Liberdade pertencem a este
grupo.
3 ECONOMIA DE COMUNHÃO: UMA NOVA PROPOSTA DE AGIR ECONÔMICO
Já há alguns anos estudiosos vêm desenvolvendo pesquisas em empresas que aderem à
Economia de Comunhão (EdC). Trata-se de uma proposta de agir econômico do qual fazem
parte empresas “plenamente inseridas no mercado, que salvaguardam a propriedade particular
dos bens... mas colocam o lucro – que a ideologia capitalista considera a finalidade da empresa – em comunhão” (BRUNI, 2005, p. 25). Ainda, “apresenta-se como uma proposta que visa
resgatar a dignidade do ser humano, colocando-o como fim último de todas as ações econômicas” (SERAFIM, 2001, p. 11).
A EdC 5 surgiu no Brasil no ano de 1991 e, desde então, expandiu-se para vários países dos cinco continentes, contando hoje com a adesão de cerca de 800 empresas. Em linhas
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Para que se possa entender os fundamentos que guiam a proposta de agir econômico da EdC é fundamental
compreender suas raízes, bem como situar-se no contexto histórico, social e cultural no qual ela surgiu. A
Economia de Comunhão é uma proposta de atuação econômica lançada por Chiara Lubich (então fundadora e
presidente do Movimento dos Focolares) no Brasil em 1991. Este Movimento é uma associação de caráter civil
e eclesiástico que foi por ela fundado em 1943, na cidade de Trento (norte da Itália), no âmago da II Guerra
Mundial. Tem como seu principal objetivo a construção da unidade e da fraternidade universal, processo baseado
em valores e princípios cristãos, no respeito à diversidade cultural e à liberdade (FALLER, 2010). Desse objetivo
gerais, a proposta é de que as empresas, por meio de suas respectivas atividades econômicas,
produzam bens e serviços (ou seja, riqueza) e, por livre decisão coloquem o lucro em comum
para três finalidades específicas, conforme descreve Bruni (2005):
a) reinvestir na própria empresa, garantindo e ampliando os postos de trabalho e a atividade
econômica;
b) investir na formação de “homens novos”, ou seja, na formação cultural das pessoas dentro
desta nova racionalidade, de modo a fortalecer e difundir a cultura da partilha, mediante a
promoção de congressos, estruturas, escolas formativas, bolsas de estudo, imprensa, etc.;
c) distribuir, co-dividir uma parte do lucro com pessoas em situação de pobreza, dando-lhes a
possibilidade de viver de modo mais digno, criando para elas projetos de desenvolvimento,
sem limitar-se a assisti-las financeiramente.
Todavia, os empresários devem agir com liberdade. Na prática, as três partes não precisam ser necessariamente iguais e cada empresa entende, em seu dia a dia, como fazer para
que a divisão dos lucros não comprometa o seu bom andamento, pois o objetivo é justamente
que as empresas prosperem, para que essa nova cultura se difunda. Evidentemente, para os
sócios que não aderem à EdC, seus dividendos lhes são conferidos normalmente (MOLTENI,
2002).
A EdC opta por colocar o homem no centro das ações econômicas e organizacionais.
As organizações, no entendimento do projeto, são feitas para o ser humano e não o ser humano para as organizações. Há, portanto, uma hierarquia bem definida de valores entre os meios
e os fins (SERAFIM, 2001). Porém, este autor recorda que “não basta estar o homem no centro. Se esse for egoísta, individualista, visto como inimigo, não há razão de ser para sua posição de centralidade” (p. 73).
Outro aspecto importante a ser destacado é que o objetivo principal da EdC é a transformação da vida econômica e empresarial, tendo por base os elementos que compõem a espiritualidade do Movimento dos Focolares, a qual é pautada na construção da fraternidade e
unidade universal. Especificando melhor, diria Burckart (2002, p. 77), a “Economia de Comunhão é a projeção da cultura do dar e da partilha do Movimento dos Focolares na dimensão
econômica da sociedade”. A cultura que permeia o Movimento dos Focolares e da qual se
originou a EdC é, pois, a chamada cultura da partilha ou cultura do dar (SORGI, 1992).
Mas afinal, pode-se interrogar, em que consiste exatamente a “cultura do dar”? Sobre
isso, registra Burckart (2002, p. 76):
no contexto do Movimento dos Focolares, o termo ‘dar’ não assume o significado de ‘dar de
presente’, ‘fazer uma doação’, no sentido de um humanismo assistencial, caritativo ou até
mesmo paternalista. Antes, o termo ‘dar’ é concebido em antítese à cultura vigente, que se baseia no ‘ter’, no ‘possuir’. Enquanto ‘dar caridosamente’ não faz senão consolidar a cultura baseada no ‘possuir’, constituindo, afinal, uma exceção à regra, o ‘dar’ coloca-se no centro de todos os valores e dinamismos sociais mais fundamentais.
A EdC nasceu como uma medida para superar as situações concretas de pobreza e,
desde o primeiro momento, confere lugar central ao dinamismo do “dar” (FALLER, 2010).
Assim, explica Araújo (1998), não se trata apenas de colocar em comum moeda corrente para
emanam em consonância os princípios, os valores, a visão de mundo, enfim, todo um paradigma para a atuação
econômica do trabalho e da produção que guiam as empresas de EdC (SERAFIM, 2001).
atingir os fins já mencionados, mas de criar empregos, investir os lucros das empresas em
projetos de expansão, fornecer equipamentos ou serviços, colocar em comum a experiência
adquirida, a capacidade gerencial, e etc.
Serafim (2001, p. 71-72) afirma que a cultura econômica da partilha se exprime tanto “em nível de opções individuais” quanto “em nível de organizações produtivas”, conforme
mostra o quadro a seguir:
INDIVIDUAL
ORGANIZACIONAL
Na aspiração a uma comunhão com o outro, feita de
abertura recíproca, de estima, de respeito e de partilha
da condição humana.
Na conciliação das exigências de eficiência e de rentabilidade, com o objetivo de tornar a atividade econômica um verdadeiro lugar de encontro de todos os
sujeitos envolvidos.
Na participação ativa dos trabalhadores na vida da
empresa.
Em um estilo de consumo sóbrio e crítico, respeitoso
dos recursos comuns da humanidade e da aspiração
natural a uma igualdade substancial com os outros
homens.
No uso responsável da própria riqueza, a fim de que
ela sirva à promoção do bem comum.
Em uma presença ativa em iniciativas econômicas
para o bem comum, que gerem empregos e respondam
às necessidades não satisfeitas das pessoas e da comunidade.
Na partilha das próprias receitas e dos próprios recursos com o próximo que se encontra necessitado, num
relacionamento de igual dignidade.
No empenho concreto pela melhoria do âmbito social
no qual as organizações atuam, não ficando alheias ao
bem comum e às necessidades urgentes das pessoas
menos favorecidas com as quais entram em contato.
No estabelecimento de relações de abertura recíproca
e de confiança entre consumidores, fornecedores,
concorrentes, entre a comunidade local e a administração pública, tendo a atenção voltada para o interesse
geral.
Na vivência e na promoção do pleno respeito pela
ética e pelo ambiente.
Quadro 1: Expressões da cultura da partilha em nível pessoal e organizacional
Fonte: Elaborado pelas autoras, adaptado de Serafim (2001) e Menegassi (2007)
Em suma, a racionalidade que orienta a Economia de Comunhão é chamada por Bruni
(2002, p. 59) de racionalidade de comunhão 6, a qual possui algumas características bem
delimitadas, dentre outras: universalismo, relacionalidade, racionalidade expressiva e nãocondicionalidade:
universalismo. [...] uma racionalidade de comunhão supera a lógica de grupo [...]. No agir de
comunhão, ser parte de determinada comunidade caminha pari passu com a idéia de fraternidade universal. O ‘nós’ na comunhão alarga-se até abranger a humanidade inteira. A terça parte dos lucros que as empresas doam para a formação de uma cultura do dar é expressão desse
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Cabe reforçar que este espírito de partilha não pode ser confundido com filantropia. De acordo com Abbagnano
(1999), filantropia nos dias atuais possui a significação de ajuda. Este "ajudar" não garante que as intenções e
motivações sejam para benefício próprio (daquele que ajudou) ou uma real preocupação com o bem comum.
Declarações do tipo "responsabilidade social hoje não é mais uma questão de opção, mas de sobrevivência
corporativa a longo prazo" (VASSALO, 1999) mostram bem essa questão. Suas reais intenções e motivações são
de ordem estratégica para sua organização, para sua sobrevivência em um mercado em competição. Sua lógica
continua sendo a do auto-interesse, sendo a responsabilidade social um meio para seu próprio benefício.
Diferentemente desta lógica, a proposta de Economia de Comunhão não visa vantagens competitivas de qualquer
ordem; se essa surgir, será contingencial (SERAFIM, 2001, p. 73; grifos do autor).
universalismo. Relacionalidade. A pessoa sempre é vista numa relação construtiva com o outro. [...] Não se trata de substituir o eu por um nós, mas um sujeito-ilha por um sujeito em relação com um outro, o indivíduo pela pessoa. Racionalidade expressiva. [...] indica uma atração econômica regida por uma lógica não primariamente instrumental, mas pelo desejo de ‘exprimir’ com esse comportamento algo da própria personalidade ou dos próprios valores. Não
condicionalidade. [...] a ela é inerente um elemento de gratuidade: a retribuição do outro não é
condição prévia do meu comportamento (grifo nosso).
3.1 CONSEQUÊNCIAS DA “CULTURA DO DAR” NO CONTEXTO DA EMPRESA DE
ECONOMIA DE COMUNHÃO
No tópico anterior discutiu-se, respectivamente, a visão ideal acerca da centralidade do
homem na dinâmica da Economia de Comunhão, bem como a racionalidade que sustenta a
lógica da “cultura do dar”, seu “dever ser”. No intuito de aproximar tais realidades ao dia-adia das empresas que aderem à proposta, cabe apresentar alguns resultados de estudos que
analisaram a relação entre a EdC e as consequências práticas deste novo modo de agir econômico no contexto produtivo (ou seja, na empresa).
Menegassi (2007, p. 55) reuniu as conclusões de alguns estudos que se dedicaram em
analisar o desdobramento das relações existentes entre os diversos membros – gestores e funcionários - de empresas de EdC:
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existe proximidade e relação de confiança entre os dirigentes e os empregados;
de maneira geral, as empresas pesquisadas oferecem qualidade de vida aos seus funcionários;
os funcionários trabalham satisfeitos e não consideram suas atividades desinteressantes,
até mesmo porque o modo de realização dessas tarefas permite um maior nível de autonomia de seus executores;
os empregados participam das decisões da empresa, pelo menos daquelas que lhes concernem;
o sistema de controle é indireto;
existe comunicação e troca de idéias entre os membros da empresa;
há uma preocupação com o funcionário e também com relação a sua família;
o sentido de equipe e o trabalho em grupo;
o sentimento de camaradagem, solidariedade e um bom nível de confiança entre os funcionários e entre estes e seus dirigentes;
o reconhecimento do esforço que as pessoas fazem pela organização;
a reciprocidade entre o interesse da empresa pelos problemas dos seus funcionários e destes com os problemas da empresa.
Também foi possível observar, afirma Menegassi (2007, p. 56), que a adoção da abordagem da EdC sobre a gestão das empresas estudadas proporcionou:
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ambientes mais saudáveis de trabalho;
comprometimento recíproco entre diretores e funcionários; e
em algumas empresas se observou aumento de produtividade;
procuram manter uma relação saudável com seus funcionários;
pagam salários justos;
preocupam-se com sua qualidade de vida;
proporcionam um ambiente seguro e saudável de trabalho;
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permitem que os funcionários conheçam o processo produtivo e se envolvam nele.
Um ponto crucial a ser destacado é que, para que estes aspectos possam ser concretizados, a Economia de Comunhão envolve, primeiramente, o empresário, primeiro protagonista na economia de mercado. É fundamental que parta do empresário, porque é seu modo de
ver que molda a empresa, definindo seus comportamentos e prioridades (FERRUCCI, 1998).
Em consequência disso, as atitudes dos administradores das empresas de EdC para com seus
funcionários procura abranger diversos aspectos de sua vida por meio do conhecimento de sua
vida familiar, do pagamento de salários justos, do envolvimento daqueles na vida da empresa,
informação, incentivo à capacidade criativa e todas as atitudes que se fazem necessárias de
acordo com cada realidade (MENEGASSI, 2007).
Contudo, este ambiente favorável à sociabilidade não é imune a conflitos. Bruni
(2005, p. 144) ressalta que “até uma empresa que visa à fraternidade sabe que terá de administrar conflitos e precisará desenvolver procedimentos, fórmulas organizativas, instituições, etc.
adequados para administrá-los sem ‘causar grande danos’”. E continua:
um aspecto que me parece muito importante é “dar espaço a quem protesta”, e não induzir
quem expressa posições problemáticas a sair da empresa. O primeiro passo na solução de uma
crise é garantir, em nível de governança, o direito à cidadania do protesto e das diferenças de
ponto de vista capaz de assegurar a convivência na pluralidade de sensibilidades e opiniões,
mesmo porque, nas organizações com fins ideais, os que protestam são os mais interessados na
qualidade intrínseca (BRUNI, 2005, p. 144).
Ainda a respeito da gestão nos momentos de crise, Molteni (2002) explica que é normalmente neste momento que se ampliam as divergências latentes na organização, até se tornarem divisões e conflitos. Segundo o autor, “é quando se multiplicam as tentativas de ‘abandonar o navio’” (p. 93). Porém, ele acredita que nas empresas de EdC “a crise evidencia a
força da unidade e da coesão existente entre todos os colaboradores nos diversos níveis; a
confiança e a estima conquistadas [...] suscitam nestes últimos comportamentos de lealdade e
até mesmo de solidariedade”(MOLTENI, 2002, p. 94).
Essa e outras características da EdC, que foram apresentadas até aqui, parecem sugerir
uma lógica interna não comum ao meio empresarial da atualidade. Aparentemente, a lógica
desse modelo parece não ser determinada primariamente por uma expectativa de resultados
utilitários, por fins calculados, de que fala Weber (FERREIRA, 2004). Logo, é oportuno destacar, contudo, que essa tentativa de conciliar competitividade e promoção da pessoa e da
sociedade é assinalada, nas empresas de Economia de Comunhão,
por uma dupla tensão: antes de mais nada, uma tensão para identificar e aproveitar todos os
espaços existentes, no interior do ambiente econômico e social tal como ele se apresenta, a fim
de realizar simultaneamente a dupla ordem de objetivos; em segundo lugar, a tensão que recai
sobre o contexto geral circunstante para criar regras de funcionamento do sistema que ampliem
a possibilidade de atingir – de maneira conjunta e sinergética – competitividade/rentabilidade e
sociabilidade (MOLTENI, 2002, p. 91; grifo nosso).
Portanto, o questionamento central que aqui assumiu-se enfrentar é: de que forma os
membros (administradores e administrados) de empresas vinculadas à proposta da Economia de Comunhão lidam com a tensão ética entre as racionalidades?
4 DELINEAMENTO DA PESQUISA
Para fazer face à questão-problema exposta acima, foi realizada uma pesquisa exploratória, de caráter qualitativo (MINAYO, 1994; RICHARDSON, 1999; TRIVIÑOS, 1987;
GODOY, 1995), em uma empresa de Economia de Comunhão no intuito de descrever e analisar os diversos aspectos emergentes e relevantes face ao estudo, de acordo com os objetivos
propostos, a saber:
a)
identificar quais são as principais características de uma empresa ligada à Economia de
Comunhão e que, numa perspectiva de totalidade, se tornam paradigmáticas relativamente
ao que se define como sendo uma empresa de “motivação ideal”;
b) analisar o que a experiência da EdC ensina sobre “como” sistematizar uma tentativa empresarial capaz de conjugar competitividade e promoção da pessoa e da sociedade;
c) apontar quais são os principais desafios a que se expõem, na perspectiva dos sujeitos pesquisados, as empresas que deliberadamente aderem à EdC, apresentando-se, desse ponto
de vista, como imperativos para se manter e se desenvolver na fidelidade ao ideal que começou a dar forma ao seu modelo de empresa.
Cabe lembrar que, conforme menciona Godoy (1995, p. 58), na pesquisa qualitativa o
pesquisador parte de focos de interesse amplos, que vão sendo definidos à medida que o estudo avança. Para este autor,
envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo
contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando entender o fenômeno segundo a perspectiva dos sujeitos [...] (grifo nosso).
A estratégia de pesquisa aplicada à realização deste trabalho foi o Estudo de Caso que,
segundo Yin (2005), permite analisar o fenômeno dentro de seu contexto de realidade, quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto em que ele se insere não são claramente definidas, e no qual são utilizadas várias fontes de evidência.
Por tratar-se de pesquisa qualitativa, as técnicas usualmente adotadas para a coleta de
dados são as de entrevista e observação participante (MERRIAN, 1998). Para tornar a coleta
de dados mais adequada aos objetivos, este estudo combinou: as possibilidades oferecidas
pela observação participante (GIL, 2007; BRANDÃO, 1985); a realização de entrevistas com
roteiros semi-estruturados (NOGUEIRA, 1975; SELLTIZ, et al., 1987) com os responsáveis
hierárquicos e empregados de áreas distintas na empresa pesquisada, embora a coleta tenha
ido além, conforme será esclarecido posteriormente; e, por fim, o uso da análise documental
(CELLARD, 2008; GIL, 2007), visando retirar desta documentação informações dinâmicas e
fidedignas que suportem e especifiquem, sob este ponto de vista, o que é peculiar ao fenômeno em estudo. Os documentos utilizados foram o vídeo institucional, o folder comercial e as
informações disponibilizadas no website da empresa.
O estudo foi desenvolvido na Metalsul, indústria de pequeno porte, situada em Joinville, Santa Catarina. A empresa foi fundada em 1º de junho de 1996 e é especializada na fabricação de ferramentas para profissionais da indústria metalmecânica, construção civil, marce-
narias e serviços em geral. Os principais processos produtivos são: usinagem, pintura e modelagem. Em 2002 a Metalsul passou a contar com sua fundição própria, a Fundição Bom Sucesso, sediada em Garuva (cidade que fica cerca de 30 Km de Joinville), em Santa Catarina.
Atualmente a empresa conta com o total de 50 funcionários (incluindo-se os funcionários da
Fundição Bom Sucesso) e o faturamento médio anual gira em torno de 800 mil reais.
Dois aspectos principais motivaram a escolha dessa empresa: o primeiro, devido ao fato de que a mesma aderiu à Economia de Comunhão no ano de 1999, três anos após a sua
fundação, e hoje é considerada uma das principais empresas de Economia de Comunhão em
nível nacional. O segundo, deriva da observação feita por Dellagnelo e Machado-da-Silva
(2000), que sugerem que é mais fácil se encontrar a racionalidade substantiva presente em
organizações de segmentos alternativos e pouco competitivos. Logo, o ramo de negócio escolhido mostrou-se oportuno para este estudo, já que a Metalsul está inserida em um ramo de
atividade industrial, de alta competitividade e de mecanicidade e precisão elevadas.
Os participantes da pesquisa foram selecionados numa perspectiva de transversalidade, sendo as pessoas entrevistadas portadoras de conhecimentos e informações singulares,
porém diversificadas sobre o tema proposto. Outro critério concerne o tempo de empresa,
buscando perceber o impacto deste na compreensão de especificidades relativas à proposta da
EdC.
Para a realização das entrevistas, elaborou-se um roteiro semi-estruturado (não se reduzindo a perguntas e respostas fechadas), sendo que a maior parte da coleta de dados foi feita
por meio de gravações e transcrição, das quais decorreram a análise e interpretação dos dados.
Neste caso, foram entrevistados [e os nomes são fictícios], os dois sócios da Metalsul (Carlos
e Roberto) e o sócio da Fundição Bom Sucesso (Daniel), duas funcionárias de nível administrativo (Joana e Maria), uma funcionária responsável pela limpeza e serviços gerais (Betina),
três líderes de equipe (Adriano, Leandro, Márcio), e quatro representantes do nível operacional (Tiago, Jonas, Gabriel, Lucas), além de uma fornecedora (Tânia) e o contador (Marcos) funcionário de uma empresa terceirizada. Isto perfaz um total de quinze entrevistas, com duração aproximada de seis horas no total.
Cabe lembrar que, o intuito inicial era realizar apenas nove entrevistas. Porém, a partir
das próprias entrevistas, surgiram outros nomes de pessoas que mereceram ser entrevistadas.
A idéia foi a de trabalhar com o princípio da saturação teórica, no qual a coleta só se encerra
quando novas entrevistas não acrescentarem dados novos, ou seja, quando o pesquisador já
dispõe dos dados necessários ao estudo (SERAFIM, 2001). Contudo, devido a limitações de
tempo para realizar a análise dos dados coletados, foram escolhidas oito entrevistas para serem analisadas – aquelas que continham informações mais significativas em relação ao tema
em estudo.
Também houve casos onde pessoas não foram entrevistadas, mas, por meio de conversas informais e não gravadas, contribuíram de forma significativa, para o entendimento do
fenômeno, manifestando, nesse sentido, suas opiniões e percepções sobre a realidade estudada. Portanto, tais impressões foram igualmente levadas em consideração na coleta e na análise
dos dados, sendo estes relatos registrados no caderno de notas.
A avaliação aplicada neste estudo foi a transversal, onde os dados são coletados em
um determinado ponto no tempo (RICHARDSON, 1999). A coleta dos dados foi efetuada no
período de 03 a 05 de maio de 2011, na própria empresa. Para a interpretação dos dados coletados, utilizou-se a análise de conteúdo.
Por fim, é oportuno ressaltar algumas facilidades e dificuldades observadas na coleta
dos dados, pois tais contingências impactam diretamente na análise dos dados obtidos. O aspecto positivo diz respeito à total disposição, tanto dos dirigentes quanto dos funcionários da
empresa pesquisada, para serem entrevistados. Quer dizer, todos (sem exceção) os que foram
convidados pela pesquisadora para participarem da entrevista mostraram-se dispostos a colaborar, fornecendo as informações solicitadas durante as entrevistas.
O aspecto negativo suposto é que, em alguns casos, o fato de a entrevista estar sendo
gravada possa ter sido causa de “intimidação” por parte de alguns entrevistados. Isso ficou
evidente quando, ao término de algumas entrevistas (portanto, logo após desligar o gravador),
o entrevistado relatou histórias e outras informações valiosas que acabaram por não ser registradas. A decisão de não retomar a gravação deveu-se ao fato de que, conforme defende Gil
(2007) a utilização desses instrumentos [gravadores, caderno de notas] é contra-indicada,
quando pode comprometer de forma definitiva a naturalidade da conversa, perturbando assim
a confiança da pessoa entrevistada em relação ao entrevistador. Nestes casos, no intuito de
“salvar” tais informações, recorreu-se a anotações, feitas no caderno de notas, no momento
posterior à conversa.
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
A partir de agora serão apresentados, de forma sintética, a análise e a interpretação dos
dados de campo pesquisados na empresa Metalsul. Inicialmente, descreveu-se a trajetória da
empresa com base em seu contexto histórico, bem como o modo com ela está estruturada hoje. Posteriormente, foram descritas e analisadas as relações dos funcionários e dos sóciosgerentes com o ambiente interno da organização, tendo como foco a tensão ética nos termos
anteriormente contextualizados.
5.1 AS ORIGENS DA EMPRESA: A VISÃO DO FUNDADOR
A trajetória profissional de Carlos, fundador e um dos atuais sócios da Metalsul, começou quando ele transferiu-se de uma cidade do interior de Santa Catarina para Joinville, já
com vinte e um anos, após deixar o trabalho na roça. Até então tinha estudado até o quinto
ano do ensino fundamental, e foi em Joinville que concluiu o colégio e depois cursou pedagogia. Neste ínterim, trabalhou três anos e meio na construção civil (como servente, pedreiro),
um ano e meio nos Correios, dez anos em um banco privado e, posteriormente, abriu seu próprio empreendimento, no ramo financeiro e que, após alguns anos, foi à falência.
A Metalsul nasceu há exatos quinze anos (em 1996) após a já referida situação de falência financeira ocorrida na vida de Carlos. Na época, um de seus antigos clientes havia perdido tudo e não tinha dinheiro para pagar sua dívida com Carlos. Contudo, esta pessoa tinha
anteriormente uma empresa que fabricava os mesmos produtos que a Metalsul comercializa
hoje e, por esse motivo, fez-lhe uma proposta: ao invés de saldar sua dívida em dinheiro, o
“pagamento” seria por meio de seu conhecimento.
Contudo, essa “parceria” não durou muito tempo. Carlos afirma que ele não tinha uma
“intenção reta” nesta sociedade que ele tinha proposto construir:
o que aconteceu, quando a coisa começou a deslanchar? Nos finais de semana ele fazia produto, vendia e não me pagava e começou a agir de uma forma não legal com a gente. E então
quando chegou num ponto assim, com isso começaram a surgir as dificuldades financeiras [...]
ele [veio] me dizer que eu era incompetente, que eu tinha de ter quebrado de novo, que eu re-
almente não sabia administrar, que ele ia colocar a mulher dele pra administrar comigo; começou uma situação muito delicada [...] (Carlos, fundador e sócio da empresa).
Foi nesse contexto, três anos após a fundação da empresa, que Roberto (cunhado de
Carlos) tornou-se sócio da empresa, comprando a parte que cabia a essa pessoa. Relata Carlos:
[...]meu concunhado tinha um dinheiro que eu precisava pra comprar a parte daquele que era
pra não cobrar a mão-de-obra, pra mim tirar ele fora da jogada; mas não é que eu quisesse isso,
ele forçou uma barra que tinha, ou ele tocaria a empresa, ou nós; não tinha condição de ficar
com ele porque ele não tinha a intenção de construir uma empresa séria e fazer um trabalho e tal, ele não tinha essa intenção (Carlos, fundados e sócio da empresa; grifo nosso).
Nos primeiros anos, havia apenas três pessoas trabalhando na empresa, as quais eram
responsáveis pelos processos de usinagem, montagem e pintura, incluindo o próprio Carlos,
que dividia seu tempo entre a parte comercial e as atividades produtivas; três anos após este
recomeço já eram oito pessoas. Em 2002, a Metalsul comprou a Fundiforte (na época, a principal fornecedora de peças), que passou a se chamar Fundição Bom Sucesso e que operava
então com vinte e oito funcionários. Atualmente, a empresa conta com um total de cinquenta
trabalhadores somando-se todas as pessoas que trabalham na Metalsul e Fundição (e excluindo-se os representantes comerciais, espalhados pelo Brasil, que trabalham como autônomos,
que são cerca de quarenta pessoas).
Do ponto de vista estrutural, a empresa possui poucos níveis hierárquicos e, por tratarse de uma empresa de pequeno porte, o trabalho não é dividido por departamentos ou setores.
Atualmente, a empresa está assim organizada: Carlos trabalha mais focado na parte comercial
(atendimento a fornecedores, clientes, análise e acompanhamento das tendências de mercado,
etc.); Roberto (o outro sócio-gerente) cuida do RH e da parte administrativa; Joana é auxiliar
financeira e administrativa; Maria controla os lançamentos dos pedidos e o faturamento; Jonas
administra as contas a pagar, contas a receber, faturas, lançamentos, etc; Betina é auxiliar de
limpeza e, nas horas vagas, também ajuda na produção com trabalhos manuais simples; Marcos trabalha na contabilidade (é funcionário de uma empresa terceirizada); Adriano e Leandro
são os líderes de produção; e por fim há quinze funcionários que operam as máquinas e ocupam-se da fabricação das ferramentas em si. Na fundição Bom Sucesso, Daniel é o sóciogerente (divide a sociedade com Carlos e Roberto apenas na divisão da fundição) e Márcio é o
líder de produção. Os outros vinte funcionários trabalham na parte operacional da empresa.
A seguir serão descritos e analisados algumas situações onde foram identificados alguns aspectos envolvendo a tensão ética entre as racionalidades, partindo do ponto de vista
dos entrevistados, precisamente, sobre o modo como essas pessoas lidam com tais situações.
Recorreu-se às categorias expostas no referencial teórico. Além disso, o foco limitou-se ao
ambiente interno da empresa.
5.2 DESCREVENDO E INTERPRETANDO ELEMENTOS DA REALIDADE PESQUISADA
O primeiro contato de Carlos e Roberto com a Economia de Comunhão aconteceu em
1999, quando os dois participaram do Bureau Internacional 7 e, desde então, ambos se dispuseram a aderir à EdC. Carlos relata que, para ele, o encontro com uma proposta de tal magnitude
foi, antes de tudo, uma “conversão interior”, um momento de rever toda sua trajetória profissional, admitir os erros que tinha feito nas experiências anteriores [principalmente, naquela
situação de falência] e desde aí recomeçar. Foi um “novo passo”, como ele próprio afirma,
que teve o apoio de Roberto, que também se entusiasmou com a ideia.
Neste sentido, nota-se claramente que a proposta é, antes de tudo, dirigida aos empresários, que devem ser os primeiros a identificarem-se e aderirem à EdC, não sendo esta uma
condição sine qua non para o ingresso de um funcionário na empresa. Isso pode ser verificado
quando, na realização da pesquisa de campo, vários entrevistados sequer tinham conhecimento da existência da Economia de Comunhão.
Contudo, ficou muito evidente face ao conjunto de entrevistas realizadas que, os funcionários percebem uma diferença de tratamento na empresa, o que os leva a questionar sobre
este "algo mais" existente no ambiente de trabalho. É nessas ocasiões que surge a oportunidade para estes de conhecerem a proposta (quando lhes é explicado sobre o que se trata a EdC,
ou quando são convidados a participar de Congressos sobre a Economia de Comunhão, etc.)
e, na liberdade, possam também eles participar, conforme pode ser observado nas falas a seguir:
[...]na verdade [conheço] muito pouco [sobre a EdC], assim, eles fazem algumas formações fora, assim, convite não falta, realmente, na verdade é falta de oportunidade [...] mas é muito
pouco mesmo que eu conheço assim, nunca fui diretamente numa formação dessas que eles fazem, eu realmente não fui em nenhuma (Maria, auxiliar administrativa).
[...] pelo pouco que a gente aprendeu no congresso assim, eles tentam ser justos para ambas as
partes, tanto o empresário quanto o funcionário, tanto é que eles têm lá, dividir o lucro em três
partes, empresários, formação de homens novos e funcionários, então conhecer um pouco sobre isso aí e tentar aplicar aqui dentro da empresa. Não é todo o pessoal que adere a isso. A
empresa tá voltada pra economia comum, mas não obriga os funcionários a participar, mas no
dia-a-dia a gente tá conseguindo ver isso, passando pra eles. Muita coisa que acontece eu fico
admirado, porque muitas empresas normais eu não consigo ver isso (Adriano, líder de produção).
A maioria dos entrevistados demonstrou sentir-se muito satisfeita em trabalhar na Metalsul, principalmente no aspecto relativo ao modo como os sócios-gerentes tratam o funcionário, fato observável nos relatos abaixo:
[...] o ambiente familiar, porque a gente não tem distinção, como funcionários são vistos nas
grandes empresas como peões, aqui eles tratam igual, não tem diferenciação, o tratamento bem
padrão mesmo, não é porque o fulano é gerente que vai ter distinção (Maria, auxiliar administrativa).
Ah, não, aqui, excelente empresa de trabalho, de relacionamento entre patrão empregado! Eu
pra mim em todas as que trabalhei, nessas empresa que trabalho fiquei sete anos na [...], depois
7
O Bureau Internacional da Economia e Trabalho, realizado na Mariápolis Ginetta [sede nacional do Movimento
dos Focolares], em Vargem Grande Paulista/SP, que teve por tema “Economia de Comunhão e Movimento
Econômico: desenvolvimento e perspectivas”, reuniu pesquisadores, empresários, trabalhadores, políticos,
estudantes e profissionais de diferentes áreas, provenientes de vinte e dois estados do Brasil e do exterior:
Áustria, Escócia, Alemanha, França, Holanda, Itália, Colômbia e Argentina (NERONE, 2005, p. 1).
no Paraná, e agora onze anos nessa que pra mim é a melhor [...] como disse, o relacionamento e o tratamento como ser humano[...] e aqui não, o ser humano não é feito em cima de
marca, de número, então assim, no momento atual do mundo que vivemos, como você sabe,
ter uma empresa desse tipo é uma realidade fora da realidade trabalhar numa empresa assim,
não é fácil, é difícil, porque é trabalho e é amor ao próximo. Às vezes dá uma intriga, mas
normal (Tiago, operário; grifo nosso).
Eu me sinto bem em trabalhar aqui, sempre um ambiente bom, não é aquela pressão [...] só pra
quem trabalha aqui que sabe, assim (Joana, auxiliar financeira e administrativa).
Ainda no que se refere ao relacionamento “patrão-empregado”, dois entrevistados Tiago, funcionário que trabalha há onze anos na empresa (atualmente o mais antigo) e Jonas,
que está há sete anos na Metalsul - relataram que nem sempre foi assim. Ambos contam que
houve uma mudança no modo de agir de Carlos em relação aos seus subordinados no decorrer
do tempo:
[...]acho que ele se converteu então mudou. Hoje o pessoal obedece ele mais por amor do que
por respeito, antigamente por respeito, por medo, e hoje - era mais medo do que amava, hoje
mais ama do que tem medo -, ele tá diferente, era mais autoritário, mas era, sabe, mais assim,
hoje não. Então acho que é melhor você amar e gostar do que ter medo” (Tiago, operário,
grifo nosso).
[...] já tem um relacionamento diferente, quando eu entrei era um relacionamento diferente, era
mais assim de patrão-empregado e isso depois foi desenvolvendo e vejo assim mais como uma
amizade (Jonas, expedição).
Um aspecto bastante recorrente nas falas dos entrevistados foram a autenticidade, a
autonomia e a liberdade, elementos típicos da racionalidade substancial, facilmente identificados nas interações interpessoais:
[...]bom, a empresa assim é, eu gosto muito de trabalhar aqui, me sinto muito bem, pelos relacionamentos de todos, igual assim pra todos, funcionários proprietários da empresa, assim, temos um relacionamento muito bom...acho que aqui a gente tem coisas legais, a gente só aguça
o que agente aprendeu, a gente pode viver os valores que a gente aprendeu em casa aqui
na empresa, tratar bem as pessoas e isso a gente recebe em troca aqui (Jonas, expedição; grifo
nosso).
Aqui é uma empresa que, sei que não é por nada, nunca trabalhei numa empresa assim que, assim, eles dão bastante atenção, eles compreendem se a gente errou, se precisa sair, tudo assim,
a gente pede pra sair eles liberam numa boa, sabe, não pergunta por que, sabe, e eu trabalho
aqui a vontade, eles não ficam em cima da gente. Pra mim isso é bom, porque a gente trabalha
até mais contente, não tem ninguém no pé da gente (Betina, auxiliar de limpeza).
Se existe verdade existe amor, se eu posso entrar na sala brincando e chamando ele de coisa,
da mesma forma ele me trata, me respeita. Mas existe também essa liberdade entre nós, entre
todos, funcionário e patrão, existe amor com todos (Tiago, operário; grifo nosso).
A satisfação por trabalharem na empresa não elimina, contudo, o fato de as pessoas terem objetivos pessoais diferentes daqueles da própria organização. Jonas e Lucas, por exemplo, relatam que, mesmo estando satisfeitos em fazer parte da Metalsul, pretendem crescer
profissionalmente; porém, o modo como a empresa está estruturada hoje não lhes permite
alcançar um crescimento profissional expressivo:
Profissionalmente eu não vejo muito futuro aqui, assim, numa empresa pequena. Já to aqui há
sete anos assim, a gente vê que é isso que ela produz, não tem mais muito pra onde crescer, a
não ser que dê uma guinada que comece alguma exportação nesse sentido, e eu vejo assim, estar num emprego melhor, né [...] é difícil assim se não tem um plano de carreira, é muito difícil
a pessoa mudar o que, a gente sabe que é uma empresa pequena, mas eu acredito que dá pra
fazer, a pessoa começa em tal setor, subi de cargo até pra motivar as pessoas, porque eles pedem bastante, eles motivam bastante pra estudar, tem até escola aqui e tal, mas daí o pessoal,
mas não vê pra onde que eu vou, eu gosto de trabalhar na Metalsul, mas vou ficar a vida toda
fazendo isso, tem gente aqui vários anos, porque gostam de trabalhar aqui se relacionam bem e
tal, mas chega uma hora que o quê eu vou fazer aqui? Você entra naquela função e continua ali
sempre. Acho que eles deveriam organizar assim: saiu um daquela máquina, vou mudar ele pra
lá, vou dar uma gratificação a mais, pra motivar assim (Jonas, expedição).
[...] não, isso é um, né, eu vou estudar, acho que uma hora eu vou ter que sair, mas vai demorar, até se formar, eu pretendo (Lucas, operário).
Conscientes da ausência de uma política de carreira, e no intuito de proporcionar o
crescimento e desenvolvimento das pessoas que ali trabalham, já há alguns anos os sóciosgerentes da Metalsul iniciaram um programa de educação para adultos na própria empresa.
Carlos identificou que um dos maiores empecilhos para que o funcionário “cresça” é o baixo
nível de escolaridade (a maioria não havia sequer concluído o ensino fundamental) e, por conta disso, foi feito um acordo com a escola local para que os funcionários tivessem acesso gratuito a este tipo de qualificação nas dependências da própria empresa:
[...] eu fiz uma pesquisa interna com os funcionários que tinha baixa escolaridade a gente começou a fazer um trabalho de motivação pra eles irem à escola. Como eles não foram à escola,
como eles não ouviram o conselho e tal - porque [eles] ach[am] que você quer tirar uma certa
vantagem, por que quer que eles tirem pra produzir mais e melhor e dar mais lucro à empresa -,
a gente trouxe a escola; como eles não foram a gente trouxe a escola pra empresa e tudo funciona aqui. Então eu tô muito feliz com isso (Carlos, fundador e sócio da empresa).
O convite foi feito a todos os funcionários e estendeu-se até mesmo às esposas deles
(muitas eram donas de casa e igualmente tinham um baixo nível de escolaridade). Vários deles retomaram os estudos depois de muitos anos de afastamento da mesma. Cabe ressaltar que
a adesão à proposta era livre – e a prova está em que, dentre os inscritos, houve alguns que
começaram o curso, mas acabaram desistindo:
[pesquisadora] o pessoal é obrigado a fazer esse curso? Não, vem quem quer. Tem uns que
começaram e desistiram (Joana, auxiliar financeira e administrativa; grifo nosso).
Eles dão espaço, que nem agora eu não estudava, eu tinha feito, mas há muitos anos, eu já tinha feito, mas já faz muito tempo. Agora tô fazendo o segundo grau (Betina, auxiliar de limpeza).
No caso de Jonas, que já havia terminado o ensino médio, foi-lhe oferecido um auxílio
financeiro para que cursasse uma faculdade. Jonas reforça: “eles sempre me incentivaram a
estudar, mas em relação ao curso eu que busquei”. Aqui é interessante observar que existe
uma “tensão positiva” onde, se por um lado, Jonas não se sente “confortável” com o fato de
não ver um horizonte de crescimento dentro da empresa, por outro é perceptível que a empre-
sa preocupa-se com sua emancipação, seu progresso individual sem gerar uma relação de
dependência.
Roberto (outro sócio-gerente) admitiu que para ele é difícil saber que a empresa não
tem como prover cargos e salários mais altos para seus funcionários – mesmo sabendo que a
média salarial da Metalsul supera a média oferecida por outras empresas que atuam no mesmo
ramo. Contudo, ele acredita que uma forma de valorizá-los é investir em sua formação e estimulá-los a procurar outras oportunidades melhores no mercado de trabalho. Roberto afirmou
que, do ponto de vista de uma empresa capitalista, esse modo de agir não é comum – ou seja,
é irracional, na ótica da racionalidade instrumental e racional na perspectiva da racionalidade
substantiva – pois se está investindo recursos (capital, tempo) em uma pessoa que, saindo da
empresa, não trará resultados e lucros maiores para a própria organização, podendo, inclusive,
ir mais bem preparado para a concorrência. Este modo de agir deve-se, principalmente às motivações intrínsecas dos sócios-gerentes, que sentem-se responsáveis com o compromisso de
transformação da sociedade, indo muito além das obrigações legais da empresa:
[...]a gente tem uma relação com pessoas muito simples, tanto é que eu mostrei pra você que
nós temos escola aqui dentro, então assim porque eu não posso ser um agente, como indústria, de transformação da sociedade? Se eu contratar só pessoas capacitadas, onde é que
elas vão se capacitar? E se eu tenho hoje condições de capacitá-las, porque não oferecer a
minha estrutura pra melhorar a sociedade? (Carlos, fundador e sócio da empresa; grifo nosso).
Ainda dentro dessa lógica, chama a atenção um dos critérios utilizados para a contratação dos funcionários. Tanto Carlos quanto Roberto afirmam que cerca de 90% das pessoas
que trabalham na Metalsul foram indicadas ou por funcionários ou por terceiros (pessoas ou
organizações não envolvidas diretamente com a atividade da empresa), dentre elas, a organização Essência da Vida . Neste caso, trata-se de uma comunidade terapêutica que tem como
missão dar condições a ex-dependentes químicos de se reinserirem na sociedade. Em diversas
oportunidades, a Metalsul, em parceria com essa ONG, contratou ex-depentes químicos, ou
até mesmo ex-presidiários, no intuito de dar-lhes uma oportunidade de trabalho. Carlos explica:
[...] nós não temos um critério preestabelecido [para contratação de funcionários] nós temos
feito experiência aqui que, talvez, pro mundo de negócio pode parecer loucura: nós contratamos aqui dependentes químicos, por exemplo, que eu acho que para a sociedade seria loucura - eu não quero alguém que use ou que já usou drogas, ou que já roubou, ou que já foi preso, dentro da minha empresa -, e nós fizemos essas loucuras. E digo pra ti que não é por isso,
mas eu acredito firmemente que devido a isso nós também temos sucesso [...] Então se eu fosse hoje pra fazer uma seleção dos funcionários que trabalham aqui hoje na Metalsul [...]se eu
contratasse um consultor pra fazer uma avaliação do conhecimento profissional do que
nós precisaríamos aqui dentro, talvez a conclusão do consultor seria assim, ou você muda
teus funcionários ou você quebra, eu vejo exatamente o contrário, por que cada um de
nós tem, dentro de si, um potencial que precisa ser desenvolvido e quando eu acredito no
outro, quando eu aposto no outro, quando eu motivo o outro, quando eu me coloco no lugar do
outro pra ele também crescer e ter oportunidade ele se torna um gigante ao teu lado, então é essa forma que a gente trás aqui no nosso RH” (Carlos, fundador e sócio da empresa; grifo nosso).
Novamente, neste caso fica claro que os sócios-gerentes têm consciência de que a lógica assumida pela empresa contraria a lógica do mercado. Todavia, isso não impede que seus
gestores emitam julgamentos éticos e, consequentemente, ajam baseados em seus próprios
valores e princípios, ou em outras palavras, ajam por convicção. Um ponto crucial para que
esse tipo de atitude ocorra de maneira harmoniosa diz respeito também ao nível de abertura,
entendimento e consciência ética dos demais funcionários, no que tange ao modo como ocorre
a inserção de um ex-dependente químico no dia-a-dia da empresa:
assim, quando entra uma pessoa desse tipo o [Carlos] me chama, já pra prestar um auxilio especial, a gente prepara todo o grupo pra receber de um modo especial, receber bem, mas
já sabendo como tratar, o que se pode falar pra uma pessoa normal e pra uma pessoa especial, então assim, o esforço é dobrado [...] se você convida outro funcionário pra ir tomar
uma cervejinha no final de semana esse não pode ir, tratar muito bem, trazer a família
dele, desenvolver, trazer a família dele pra ter contato com a nossa família pra se sentir
amado e valorizado, normalmente essa pessoa, esses valores ai, família, trazer os filhos dele,
vamos ver sem diferença, filho de um negão alto, ex-dependente químico, foi preso, o filho dele tem que ter o mesmo tratamento que o filho do [Carlos]... (Tiago, operário; grifo nosso).
Em relação às rotinas de trabalho, o funcionário ex-dependente químico executa exatamente o mesmo tipo de atividade dos demais funcionários, não há nenhum tipo de facilidade, “privilégio” ou estabilidade de emprego garantida. Em alguns casos, essas pessoas se mostram mais produtivas do que as demais; em outros, no entanto, apresentam um rendimento de
trabalho abaixo da média (tendo em vista que a natureza do trabalho exige elevado esforço
físico):
[...] igual, eram cobrados que nem os outros normal, talvez um era mais fraco” (Tiago, operário).
Lógico, a gente contrata, acompanha, tem um período de experiência, a pessoa é livre pra dizer que não quer trabalhar, agente deixa livre, coloca pra ele, diz qual é a lógica, qual é a gestão que existe dentro da empresa e se ele se adaptar ou se adequar ele é convidado a participar...(Carlos, fundador e sócio da empresa).
[...] não, assim, normal como você eu somos diferentes, você tem um ritmo eu tenho outro, tínhamos um ali, que trabalhava por dois, ele dominava ali, dava conta do serviço, tanto é que
ele saiu foi botado outro no serviço e não dava conta no serviço dele, eram pessoas normais.
Tínhamos outro que era mais lento, pode dizer por causa das drogas, mas nunca foi falado isso,
o único problema foi que ele caiu, foi quando eles caíram nas drogas eles começaram a faltar
ao emprego, não vinham mais, ai começou a prejudicar o profissional, prejudicar dentro da
empresa, então a gente desligou eles (Adriano, líder de produção).
A maior dificuldade, como se pode concluir, foi lidar com as “recaídas”. Tanto os sócios-gerentes quanto os demais funcionários têm consciência de que contratar uma pessoa
com histórico de uso de drogas, ou com ocorrências criminais é sempre um risco. Não obstante as dificuldades que se apresentam, são inúmeras as tentativas que a empresa faz para resgatar essas pessoas e, apenas quando a situação chega a um nível extremo, é que se recorre à
demissão do funcionário (ou ainda, o pedido de desligamento parte da própria pessoa):
Tinha outro que trabalhava na minha área ele decaiu de tal forma, ficou três dias sem vir trabalhar [...]a gente procurou conversar e resgatar a pessoa, mas chegou num ponto que conosco
não tinha mais esse rapaz ele ficou três dias sem vir pra empresa, nós fomos lá onde ele mora-
va, chegamos lá o cara tava assim caído na cama de um jeito assim (Adriano, líder de produção).
[...] olha, eu vejo assim que aqui na Metalsul eles tentam até o último, se o funcionário não
está realmente se ele for pra rua é porque ele realmente não quis se ajudar. Quando ele tá com
problema, eu já vi eles chamarem o cara, eles tentar ajudar, olha tá acontecendo isso, será que
você não tá com problema em casa, será que é dinheiro, você precisa de folga, de férias, eles já
vi eles fazer isso e se o cara chegar nas últimas é porque ele não quis se ajudar, eu sou prova,
já aconteceu muitos casos ali que o cara tava lá no fundo do poço e os eles deram uma injeção
de animo pro cara voltar a ser o que era antes, tipo, isso que é o legal, o cara tá lá no fundo do
poço, não ta produzindo, rua, não eles levam em consideração todo o histórico do cara, tipo ele
nunca faltou, porque agora ele ta bebendo, quer se separar da mulher, então, tentam ir na casa
[...] (Tânia, fornecedora; grifo nosso).
Não apenas os sócios-gerentes sentem-se no compromisso moral de auxiliar essas pessoas, mas esse sentido de responsabilidade é também perceptível nas atitudes dos outros funcionários, que se esforçam para auxiliá-los em momentos de dificuldade. E nem sempre essas
experiências têm o desfecho “desajável”:
[...] é, depois fomos juntos, eu fui lá conversei com ele, vamos voltar, vamos recomeçar, daí
caiu no desespero, a gente tentou resgatar ele, mas não teve como, ele veio no primeiro dia,
depois começou a faltar novamente, ai começou com, vender as coisas pra comprar as drogas,
ai a gente viu que não tinha como, aí começa a criar um clima ruim nos funcionários, porque
eles começam, pô, toleravam, não vinha, depois vinha no outro dia, se tornava normal, mas
quando começa a ser repetitivo dá insatisfação, pô, mas eu venho todo o dia, não é justo, cumpro horário, então começou, antes que desanimasse o grupo a gente teve que desligar essa pessoa, os outros mesmo pediram pra sair, teve um que era pintor e no final pediu pra sair, começou a pegar dinheiro pra gastar com drogas, o que a gente desligou foi esse mesmo, porque não
tinha como segurar, ia acabar estragando o grupo todo. Assim foi outra experiência forte, eu
nunca tinha me deparado com uma situação dessas, o cara drogado, alcoolizado, no fundo da
cama literalmente, foi bem marcante (Adriano, líder de produção)
No que diz respeito ao aspecto produtivo em si – processos, matérias-primas, maquinário, técnicas de produção, etc. – os sócios-gerentes e os líderes de produção afirmaram não
haver diferenças significativas em relação a outras empresas do ramo. Isto é, para se fabricar
um torno de bancada, por exemplo, o processo de produção é muito similar ao da concorrência. Há uma grande preocupação com a qualidade dos produtos, que começa com um rígido
controle de matérias-primas, insumos, ferramentas e processos. Carlos afirma que, por
conta disso, os produtos fabricados pela empresa têm uma grande aceitação no mercado:
Nós temos uma relação muito próxima com o cliente também e o nosso produto depois desses
quinze anos tem uma credibilidade, uma aceitação no mercado, muito boa, e isso faz com
que a gente se sinta muito seguro com o nosso projeto, então nosso cliente também tem uma
satisfação muito grande (Carlos, fundador e sócio da empresa; grifo nosso).
Desta forma, mesmo defendendo que a organização preza o desenvolvimento humano
das pessoas, tanto os proprietários quanto os trabalhadores são conscientes que a empresa
precisa gerar lucro e admitem que, para que o trabalho seja eficiente e dê resultados,
faz-se necessário um certo nível de organização, controle e supervisão (elementos típicos
da racionalidade funcional).
Na perspectiva da empresa, explicitado na descrição de visão, missão e valores 8 da
Metalsul, a empresa acredita que é possível conjugar os objetivos do negócio com os objetivos de atualização pessoal e a harmonia social do grupo como um todo, esforço definido nos
termos abaixo (grifo nosso):
VISÃO: Ser a empresa mais atuante na fabricação e comercialização de ferramentas, de forma
sustentável, onde Deus, Homem e Capital possam trabalhar juntos em harmonia no desenvolvimento e construção de uma sociedade mais justa;
MISSÃO Oferecer soluções no mercado de ferramentas objetivando a satisfação dos clientes,
buscando tecnologia, inovação, desenvolvimento humano e social;
VALORES: ética (comunicação clara, autenticidade, verdade, honestidade, acessível, transparência); amor ao próximo (solidariedade, amizade, espiritualidade, equilíbrio, dignidade, compreensão, educação e respeito); qualidade (atenção, capricho, profissionalismo, disciplina,
formação, asseio pessoal, prestativo, habilidade, limpeza e organização); criatividade (iniciativa, sugestões, inovação, desenvolvimento); trabalho em equipe (ouvir, participar, empatia, opinar, decisão, disponibilidade, dinamismo, flexibilidade, consenso).
Segundo Carlos, tais propósitos foram elaborados por um grupo formado por representantes de todos os níveis hierárquicos da empresa. No intuito de avaliar se tal afirmativa era
congruente à perspectiva dos trabalhadores, os funcionários também foram questionados sobre quais eram os objetivos da empresa. De acordo com as respostas coletadas, percebeu-se
um forte alinhamento com o propósito descrito acima com relação ao ponto de vista destes,
como pode ser observado na fala dos próprios trabalhadores:
[...]a empresa tem objetivo do lucro, mas eles conseguem ver o lado do funcionários, não
só o deles, mas assim eles conseguem conciliar os dois (Adriano, líder de produção; grifo
nosso).
Nós temos uma empresa normal, temos uma empresa que visa lucro, pagar seus impostos,
pagar seus salários, pagar o fundo de garantia, então, logicamente nós temos, temos um concorrente ali de fora querendo nos destruir, se a concorrência é desleal, nem todos tem o mesmo pensamento que a gente, colocar o ser humano acima de tudo, a maioria quer colocar o
ser humano abaixo de tudo, passar por cima, então, ele tem que supervisionar, cobrança tem
que existir, tanto deles quanto de nós, acho que mais de nós, porque se é uma empresa
desse porte eu acho, sempre falo disso, a responsabilidade minha também aumenta, pra
esse projeto [de Economia de Comunhão] é muito importante pra esse projeto ir pra frente,
porque eu vejo assim essa importância, pra mim é muito, eu já tenho cinquenta anos, eu já não
vivo muito, um projeto tão bom, tão bonito como ele cunhou, mas não é fácil colocar um projeto assim em prática (Tiago, operário; grifo nosso).
O que se observa na fala de Tiago (acima) é que ele, enquanto funcionário, é capaz de
se dar conta das dificuldades que existem para, no âmbito empresarial, conciliar os aspectos
de competitividade, lucratividade e eficiência com os aspectos relativos ao desenvolvimento
pessoal e coletivo, incluindo o esforço de autorrealização. E ainda, ele se diz sentir-se comprometido em contribuir para que este modelo de empresa sobreviva e seja viável.
8
Fonte: site da Metalsul. Disponível em:
http://www.metalsul.ind.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=1&Itemid=3
Acesso em: 16/06/2011.
Cabe ressaltar que em nenhum momento as pessoas entrevistadas negaram a existência
de divergências, conflitos e dificuldades. Na opinião de um dos líderes de produção, por
exemplo, um aspecto que às vezes é difícil “dosar” é justamente este grau de liberdade que os
sócios-gestores dão aos funcionários que, em determinadas circunstâncias, pode prejudicar a
autoridade dos líderes de produção perante os operários, que passam a dirigir-se diretamente
aos proprietários, sem comunicá-los previamente. Nestes casos, os problemas relacionados à
hierarquia tendem a ser solucionados por meio do alinhamento entre os líderes de produção e
os sócios-gestores:
[...] às vezes até o modo deles [dos sócios-gestores], pode dar um mal costume nos funcionários, tratam tão bem, costumam dar tantas coisas pra eles que às vezes você não ta preparado
pra isso, às vezes confunde amizade com trabalho, eles são bons assim vou te ajudar nisso e
naquilo e as pessoas confundem não conseguem mais separar o trabalho da amizade [...] assim,
é que hoje o que eles precisam tem eu que sou o líder, depois tem eles, então eles deram uma
liberdade que eles vão direto neles, entendeu? Ah, tipo de precisar de dinheiro, um dinheiro a
mais eles vão direto neles, que geralmente na empresa tem a escala, fala comigo eu passo pra
eles, ou um aumento assim, então já conversam direto, então acho que isso tira um pouco nossa autoridade, pelo que aprendi tem a hierarquia que falam [...] às vezes eu fico, pô, mas se tem
eu aqui pra isso, eu entendo que essa foi a liberdade que deram pra eles, como eles são os gestores da empresa, às vezes a gente conversa vocês estão dando liberdade demais ai chega num
estágio que você não consegue voltar mais (Adriano, líder da produção; grifo nosso).
A proximidade dos sócios-gestores com o pessoal da produção tende, conforme referido, a gerar um ambiente de confiança, liberdade e ajuda mútua e, quando ocorrem dificuldades deste gênero, em geral o modo de resolver tais conflitos é por meio do diálogo e trabalho
em conjunto:
[...]desentendimento, acontece em tudo que é lugar, porque são pessoas com cultura diferente,
de lugares diferentes, então isso é impossível não ter opiniões diferentes [...] conversando, acho que tudo, conversando se resolve tudo (Lucas, operário; grifo nosso).
Perdão, voltar atrás e recomeçar, acho que todo lugar deveria ser assim, ainda mais aqui já
que nós falamos que aqui é família, família se briga normalmente, eu brigo com meu filho,
com minha mulher, recomeçar, pedir perdão. Recomeçar quando um tá lá bravo com o outro
você interceder, dizer você é legal ele é legal, mais tarde vocês conversam (Tiago, operário;
grifo nosso).
[...] muitas vezes tem que chegar e fazer o que eles sugerem pra mostrar que aquilo não
era a melhor forma, a outra forma era melhor, às vezes com diálogo você consegue convencer, mas às vezes tem que ir na prática pra mostrar que a forma que ele sugeriu não é a melhor a do outro é melhor...(Adriano, líder da produção; grifo nosso).
A gente nem dá o peixe, nem ensina a pescar, a gente pesca junto, a gente faz o trabalho junto, todos os dias eu tô com eles, então eles se sentem seguros com a gente e quando alguém tem dificuldade a gente senta e escuta e a gente corrige também, mas corrige dentro de uma linguagem não punitiva, nem talvez, nem de dizer que ele errou, mas que ele poderia fazer de uma forma diferente, isso tem que ser valorizado e não diminuído, que assim
quando você consegue ensinar que nesse caminho ele pode fazer mais e melhor usando menos
força física e tal, sem colocar ele numa situação de chegar e dizer a expressão que muitos dizem usando palavrão e tal...(Carlos, fundador e sócio da empresa; grifo nosso).
Uma situação pontual bastante significativa e que merece destaque é o modo como a
empresa enfrentou a crise mundial dos anos 2008/2009. Esta situação veio à tona espontane-
amente na maior parte das entrevistas e revela uma série de aspectos paradigmáticos na gestão
da Metalsul quando confrontados a práticas usuais e atinentes à lógica de mercado.
Em geral, em situações de crise, a primeira medida a ser tomada é reduzir custos, dado
que o volume de faturamento cai drasticamente. A Metalsul não estava imune a essa realidade. Tanto Carlos quando Roberto estavam vivendo um dilema: demitir parte dos funcionários
e garantir a sobrevivência da empresa, ou não demitir ninguém e assumir dívidas (por meio de
empréstimos), ou ainda, fechar o negócio e dispensar todos os funcionários. Algumas pessoas,
funcionários e fornecedora, relataram o modo como eles perceberam este momento de tensão:
Olha, acho que um dos problemas que a gente teve junto foi aquela crise de dois mil e nove,
pra eles foi bem, representou bastante, pra gente também baixou bastante as vendas, e a gente
trocava experiências de como sobreviver com os funcionários que a gente tinha, na época,
pagando os nossos custos com o faturamento caindo tanto. Ah, então reduzir custo, cortar uma
mensalidade de uma associação que não é tão significativa, ou reduzir despesas de telefone,
buscar, tipo assim trocar idéias pra ver o que dava pra reduzir nos nossos custos, funcionários,
tipo reduzir a carga horária em que eles fizeram isso aqui, colocar de férias, isso a gente foi
trocando figurinhas pra ter um jogo de cintura pra não, sabe, isso nesta época foi assim representou bastante, foi bem complicado (Tânia, fornecedora; grifo nosso).
Teve o momento de dois mil e nove que foi a crise financeira, teve que, não que teve, tinha que
no caso, tava faltando serviço, tinha que mandar funcionários embora, dispensar funcionários,
e a gente via assim a angústia deles, eu to aqui há sete anos e nunca vi eles mandarem
ninguém embora, e nem foi mandado, né, a maioria do pessoal que foi embora, pediu pra
ir embora, viu que a empresa não tava bem, que a empresa não respondia aquilo que ele estava esperando e surgia outras oportunidades fora, a pessoa pedia pra sair, então a gente via a
dificuldade que eles tem pra mandar embora, então quando foi avaliado se a tem outra renda
pra família não passar dificuldade (Jonas, expedição; grifo nosso).
Outros funcionários comentaram que, na época, os sócios-gerentes compartilharam,
inicialmente com os líderes da produção, de modo franco e transparente, qual era a real situação da empresa e fizeram de tudo para não ter que dispensar ninguém, colocando em prática
algumas medidas: deram férias coletivas, reduziram a carga horária de trabalho, fizeram cortes em custos administrativos em geral, entre outros. Contudo, tais ações não se apresentaram
como suficientes para manter o negócio viável e assim os proprietários informaram primeiramente aos líderes de produção e, posteriormente os funcionários, de que a empresa se encontrava em uma situação delicada. Comunicaram a eles que a empresa corria o sério risco de
fechar suas portas, e para que isso não ocorresse a única alternativa que ainda se apresentava
parecia ser a do desligamento de algumas pessoas.
O intrigante, neste caso, foram os critérios adotados para decidir quais funcionários
seriam dispensados por conta da situação de crise. Ou seja, ao invés de demitir os profissionais menos produtivos, o processo iniciou levando em consideração algumas possibilidades,
por exemplo, se a pessoa detinha algum outro tipo de renda complementar (um deles já era
aposentado, outro contava com um dinheiro extra que provinha do aluguel de alguns imóveis); se a pessoa era o principal provedor de renda para a sua família ou não (portanto, os que
eram casados e tinham filhos tinham prioridade para manter o emprego em relação aos solteiros). Assim,
aposentados, pessoal que tinha outra renda, então ele mandou aquele porque se acaso faltasse
ele tinha o aluguel (Tiago, operário).
Na época, algumas esposas de funcionários trabalhavam meio turno na empresa. Nestes casos, elas foram dispensadas, enquanto o emprego dos maridos foi preservado. Adriano,
líder da produção, viveu essa situação e conta em primeira pessoa:
a gente se reuniu eu e eles [...] a gente viu e conversou que a situação era essa e chegamos a
um acordo que isso seria o mais justo, né, ao invés de demitir um funcionário com dois filhos
pra ficar com a mulher, então foi um consenso que saiu isso ai [...] depois nós chamamos elas
[as esposas], conversamos com os maridos de cada uma, que a empresa ta passando por essa
dificuldade, que o mercado ta assim, então a empresa ta passando por isso e nós conversamos e
achamos melhor demitir as esposas, assim, não pode ser o contrário, porque é mais sensato e
foi feito. Claro, pra mim, minha esposa aqui dentro era como outra funcionária qualquer tem
ela como funcionária aqui dentro, mas na hora de desligar a pessoa não foi fácil dar a notícia,
inclusive ela no meio, mas é função de profissionais, temos que cumprir [...] ah, assim, de imediato elas ficaram triste, porque elas estavam aqui com seus maridos, tinham sua renda e
gostavam do trabalho, mas elas entenderam também, da mesma forma que a gente conversou
com os maridos a gente conversou com elas, a situação era essa e a gente por bem achou melhor tomar essa decisão, e elas aceitaram, ficaram tristes assim, com certeza, mas isso foi uma
experiência bem forte pra mim, pessoalmente, eu que tive que comunicar pra elas, isso ficou
bem marcado pra mim. Hoje continuo conversando com todos, então, no final das contas foi
bem explicado e elas entenderam o propósito disso da empresa (Adriano, líder de produção;
grifo nosso).
Outro fato curioso, nesse mesmo contexto, foi o caso onde alguns dos funcionários,
cientes da situação da empresa, tomaram iniciativas, no mínimo, “imprevisíveis”: alguns, sem
que os sócios-gerentes ou líderes pedissem, foram atrás de outras oportunidades no mercado
de trabalho e conseguiram uma realocação profissional. E outros, voluntariamente, manifestaram que estavam dispostos a deixar seu cargo para outro colega que, porventura, pudesse
estar precisando mais do que ele próprio daquele emprego. Alguns dos que tinham se oferecido para sair, no final, não precisaram ser desligados, como é o caso de Tiago:
é, eles seguraram até férias, uns três meses, depois foi demitindo pessoas, acho que uns trinta,
vinte, fazia banco de horas eles pagavam depois, e houve um fato interessante, demite ou não
demite? Eu, então me ofereci, mas chegou na hora, segunda-feira eles iam me mandar
embora, não me mandaram, reagiram dessa maneira [..] (Tiago, operário; grifo nosso).
No final das contas, dos cerca de vinte desligamentos da empresa, apenas duas pessoas
foram efetivamente demitidas. A conclusão que se pode tirar de uma situação dessas é que,
nos momentos de crise as dificuldades igualmente aparecem, contudo, conforme defende
Molteni (2002), a superação das mesmas ocorre coletivamente e o impacto (a tensão) tende a
ser menos traumático, além de revelar a coesão e a unidade do grupo:
Até teve umas pessoas que saíram, teve um que era solteiro, teve um que pediu, teve outro
que foi embora que também pediu, outro que tinha alternativa também pediu. Na verdade tiveram que mandar dois embora, ou três (Tiago, operário (grifo nosso).
Ao longo do processo de realização das entrevistas, surgiram diversas histórias relatando casos de ajuda financeira da empresa a funcionários. Em muitos casos, a iniciativa de
tomar alguma ação concreta para auxiliar alguma pessoa em momentos de dificuldade surgiu
dos sócios-gerentes.
Eles fazem o máximo que eles podem ajudar os empregados, [...]e os empregados já pegaram
isso também. Alguns anos atrás, incendiou a casa de uma pessoa que trabalhava aqui no escritório, e fizemos uma vaquinha pra ajudar (Joana, auxiliar financeira e administrativa).
Porém, ambos os sócios enfatizaram que há uma preocupação constante para que essa
ajuda não se transforme em uma atitude assistencialista e que gere dependência. Por isso, eles
acreditam que, para que esse ato se torne, de fato, comunhão, é preciso desenvolver uma
mentalidade onde aquele que recebe não é mero “beneficiário” ou “assistido”, mas sim agente
ativo da relação – conforme falava Araújo (1998) - na medida em que também “doa” a sua
necessidade. O reflexo disso é que, por meio de consenso com os donos da empresa, muitos
dos funcionários comprometeram-se em contribuir de alguma forma para retribuir às ajudas,
mesmo que a “contribuição” não corresponda, exatamente, ao valor que havia sido oferecido.
Além disso, a ajuda não restringiu-se apenas ao aspecto financeiro; conforme conta Tiago,
tanto os sócios-gerentes quanto os colegas de trabalho doaram seu tempo e seu trabalho para
construir sua nova casa:
[...] desde que eu sei, todos os funcionários que precisaram ajuda financeira todos, todos ganharam [...] eu tenho da experiência da minha casa, né, que eu passei, não me deram de graça, eu tinha mais uma casa velha, tinha de desmanchar aquela casa, que não tinha como reformar e tinha que construir. Aí até a diretoria da empresa fizeram uma comissão pra arrumar o
dinheiro, fizeram um acordo pra mim pegar o dinheiro e trabalhar, que o salário na família, a casa é o extra. Daí ele me emprestou dinheiro sem juro, pra pagar em hora [de trabalho]; ele deu na época três mil reais, foi mais ou menos esse três mil reais, então eles transformaram em hora então eu paguei em hora, então eu paguei metade, paguei com hora depois
do horário. Paguei tudo em horas, só assim, se transformou cinquenta por cento de hora extra,
então você devia cem e eu paguei cinquenta [...][pesquisadora: e a casa do senhor, você construiu?] sim, mutirão, foram os funcionários, o Roberto, eles foram também (Tiago, operário;
grifo nosso).
Interessante observar que também foram narrados fatos onde a iniciativa de prestar
auxílio não partiu da diretoria da empresa, mas sim dos próprios funcionários que, voluntariamente, se mobilizaram para ajudar colegas que estavam vivendo alguma situação particular
de dificuldade. Foi o caso de Lucas, um operário de vinte anos (e que trabalha há quatro na
Metalsul) que teve sua moto roubada alguns dias após tê-la comprado. Ele conta que alguns
colegas se reuniram e se propuseram a ajudá-lo a pagar as demais parcelas do financiamento
da moto.
[...]um ano atrás, roubaram uma mota minha, tipo eu comprei fiquei uma semana e, tipo, me
roubaram. Era financiada ainda e todo mundo se reuniu e, tipo, me ajudaram, cada um com dez
reais, quinze pra me ajudar. Foi ali, tipo eu não tinha [...] eles me ajudaram até terminar as parcelas, porque eu tinha dado um valor e financiei o restante, então o restante dessas parcelas eles me ajudaram até o final (Lucas, operário).
E esses tempos um rapaz aqui comprou um moto e pagou a primeira prestação e roubaram, daí
também arrecadamos um pouquinho pra ajudar e o Celso disse assim: o que precisa de algum
funcionário, tiver dificuldade eles vem aqui falam e na hora eles ajudam o funcionário (Joana,
auxiliar financeira e administrativa).
O estímulo a uma cultura da partilha, ou seja, de comunhão, no que tange aos gestores
não se restringe apenas ao aspecto material e financeiro. Roberto relembra que, certa vez, disponibilizou-se a “doar” o seu tempo para ajudar um outro empresário que necessitava reavaliar o modo como estava gerindo a própria empresa. Então, gratuitamente, Roberto revisou a
situação financeira e administrativa da empresa, identificou uma série de problemas na gestão
de seu fluxo de caixa e lhe sugeriu algumas ações no intuito de salvá-la da falência. Esta é a
dimensão do “doar-se”, fundamento de empresas de comunhão, sobre a qual falavam Bruni
(2005) e Araújo (1998).
No que se refere à divisão do lucro 9 em três partes – conforme a proposta da Economia de Comunhão - Carlos afirmou que não há uma regra pré-estabelecida (tanto nas políticas
da empresa quanto da comissão central de EdC), no que diz respeito às quantias que devem
ser destinadas a cada uma das três partes, nem em relação à periodicidade em que ela deve
ocorrer. Percebe-se, neste caso, que existe um real respeito ao princípio de liberdade do empreendedor no que tange à decisão de colocar ou não o seu lucro em comum e em que momento isso deve ser feito.
Este sócio-gerente relembra que em muitas fases do desenvolvimento do negócio não
foi possível fazer a divisão (e a respectiva destinação) do lucro em três partes. Os motivos,
segundo ele, foram a necessidade de a empresa focar seus recursos para o reinvestimento na
própria empresa – principalmente no início da Metalsul, no intuito de manter o negócio viável. Outro fato crucial concerne as muitas dívidas herdadas, por Carlos, daquela sua situação
de falência, anterior à Metalsul, conforme foi mencionado no início da análise. Ele afirma que
foram necessários mais de dez anos para que elas fossem totalmente quitadas.
Como a empresa veio de uma situação de falência, a Metalsul passou cerca de dez anos saldando dívidas antigas [...] além disso, o lado humano também fala...às vezes eu sou tentado a
não colocar em comum parte do meu lucro...nem sempre é fácil. Mas aí em penso nos
meus valores, no que eu escolhi pra mim e pra minha empresa ‘por que um empresário,
interessado no lucro, vai querer colocar em comum o seu dinheiro?’ quem que faz isso
hoje em dia? [...] pra mim uma coisa difícil é ser coerente...eu não posso dizer pros meus
funcionários que a empresa tá com dificuldades financeiras e tal...e depois aparecer aqui de
carro novo...e eu acho que muitas pessoas ficam com medo de aderir à EdC, porque é difícil
ser coerente...ficam próximos da gente, nos “rondando”...mas não entram de cabeça (Carlos,
fundador e sócio da empresa; relato registrado no caderno de notas; grifo nosso).
Ele declara que a empresa passou a contribuir financeiramente de modo mais expressivo após este período. A crise financeira mundial de 2008/2009 abalou profundamente a empresa, como foi comentado anteriormente e, também por esse motivo houve, segundo ele, uma
interrupção na destinação do lucro à formação de homens novos e aos pobres, medida que
procurou atender às necessidades urgentes de reduzir custos e garantir a sobrevivência da própria organização.
Outro fato importante a ser observado é que, considerando que a empresa possui dois
sócios, a decisão de doar ou não parte de seus lucros à Economia de Comunhão nem sempre
9
Um esclarecimento importante a respeito do lucro: este valor trata-se da parte excedente da receita, depois de
subtraídos os custos e os impostos. Legalmente, este é o valor que o empreendedor tem o direito de recolher para
si.
foi fácil. Roberto afirma que houve muitas vezes em que ele questionou Carlos se era realmente o caso de doar este lucro à EdC, tendo em vista que muitos funcionários de sua própria
empresa poderiam estar passando por dificuldades e, portanto, esse dinheiro poderia servir a
este propósito. Carlos, porém, sempre teve presente que o “um terço” dedicado aos pobres
ligados à Economia de Comunhão é de vital importância para a manutenção e viabilidade da
EdC em todo o mundo. Logo, a alternativa encontrada nestes casos foi o diálogo entre os sócios-gerentes, até chegarem a um consenso sobre como deveriam agir. Ambos mostraram-se
satisfeitos com o modo como vêem resolvendo este tipo de impasse.
O Roberto nem sempre concorda em colocar tudo em comum, porque ele acredita que antes de
ajudar os outros, ele precisa garantir uma qualidade de vida mínima para os próprios funcionários...Por exemplo, ele fica incomodado com o fato de que a Metalsul não consegue pagar plano de saúde pros funcionários...mas daí nesses casos a gente conversa, entra num consenso. E
nesse sentido sempre conseguimos nos resolver (Carlos, fundador e sócio; relato registrado no
caderno de notas)
Por fim, cabe trazer aqui a percepção das pessoas envolvidas em relação ao futuro da
empresa. Mesmo cientes das dificuldades que a organização vive, há uma grande esperança de
um futuro promissor:
[...] olha até pelo contato que a gente tem com os clientes, que a gente vê os representantes fazer assim, acho que ela tem um futuro bem promissor. Acho que obviamente como a gente recebe os elogios vêm as críticas. Não é fácil agradar a todo mundo, mas acho que, não vejo assim como uma empresa que daqui alguns anos, vamos fechar a porta porque não vai dar certo.
Pelo que os clientes passam pra gente assim, até nas regiões onde a gente não tem representante [...] a gente vê que é bem vista (Maria, auxiliar administrativa).
Da nossa estrutura hoje como empresa Metalsul, eu me sinto, só pra concluir, que esse processo, como vocês viram, que começou de alguém que ficou devendo e tinha problemas financeiros, e outro que tinha problemas financeiros e não tinha como resolver a questão, dois quebrados se juntaram e nasceu uma empresa que hoje me parece muito promissora [...] nosso projeto
e eu vejo uma empresa muito maior do que ela é hoje (Carlos, fundador e sócio da empresa).
Realizado este percurso, é momento de retomar as principais ideias, retomando-as à
luz dos conceitos e dos achados concernentes à realidade pesquisada (sempre na perspectiva
dos sujeitos), no intuito de dar uma resposta elucidativa quanto possível sobre a questão de
pesquisa: de que forma os membros (administradores e administrados) de empresas vinculadas à proposta da Economia de Comunhão lidam com a tensão ética entre as racionalidades?
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A primeira observação a ser feita remete ao fato de que a empresa pesquisada caracteriza-se formalmente como uma organização econômica, exposta, em razão disso, à lógica do
livre mercado. Logo, neste contexto, a modalidade da razão prevalente é, sem sombra de dú-
vida, a racionalidade funcional ou instrumental, em que a ação racional está voltada para o
cálculo, no intuito de maximizar resultados e gerar lucro. No entanto, é inegável que a adesão
da Metalsul à Economia de Comunhão provocou uma série de mudanças no modo de conceber e gerir a empresa, principalmente no que tange ao resgate da finalidade da empresa sob
uma nova ótica, a qual, na visão dos seus próprios donos, passaram a enxergá-la como “agente, enquanto indústria, de transformação da sociedade”.
Aqui reside a primeira e, talvez, a principal manifestação da ocorrência de uma tensão
ética entre racionalidades: trata-se de uma empresa fundada na racionalidade substantiva e,
por conseguinte, na ética da convicção que, por seu conteúdo, fornece uma orientação valorativa, mas que ao mesmo tempo se encontra situada no seio de uma sociedade que já lhe oferece um modelo geral, as diretrizes de base e a lógica das ações, todos esses elementos de uma
racionalidade instrumental (SERAFIM, 2001).
Tendo em vista que os funcionários integrantes da pesquisa também percebem a Metalsul como uma organização que está preocupada com o desenvolvimento humano e social, é
possível afirmar que a ética da convicção, sob a égide da racionalidade substantiva, tem
seu espaço na organização. A prova disso é que tanto administradores quanto administrados
acreditam que a empresa consegue conciliar os aspectos de eficiência e lucratividade com os
objetivos de desenvolvimento social.
Uma situação em particular retrata com clareza o agir por convicção: a disposição
dos empresários em “abrir as portas” para ex-dependentes químicos e/ou ex-presidiários, por
meio da oferta de emprego, não ficando submetida a sua permanência ao estrito critério de
produtividade. E neste acolhimento também são envolvidos o superior imediato, e os próprios
colegas de trabalho. Se tais medidas forem analisadas sob o ponto de vista da racionalidade
instrumental, esta é uma atitude considerada totalmente irracional, tendo em vista que, em
geral, essas pessoas são portadoras de um histórico desfavorável, motivo pelo qual dificilmente seriam aceitas no mercado de trabalho.
Também observou-se que os valores que movem a atuação dos responsáveis pela empresa pesquisada encontram-se em sintonia com os que sustentam a proposta da Economia de
Comunhão e, consequentemente, com os valores relacionados aos anseios humanos em geral.
Nesse sentido, houve uma grande convergência entre as conclusões a que chegaram outros
estudos realizados em empresas de EdC, a exemplo dos relatados por Menegassi (2007), com
a realidade vivida na Metalsul, a saber: proximidade e relação de confiança entre os dirigentes
e os empregados; participação dos funcionários nas decisões da empresa, pelo menos daquelas
que lhes concernem diretamente; comunicação e troca de idéias entre os membros de áreas
distintas da empresa; preocupação constante com o funcionário também com relação a sua
família; a presença de um sentido de equipe e reconhecimento da importância do trabalho em
grupo; o sentimento de camaradagem, solidariedade e um bom nível de confiança entre os
funcionários, e entre estes e os seus dirigentes; a reciprocidade entre o interesse da empresa
pelos problemas dos seus funcionários e destes com os problemas da empresa, dentre os mais
importantes.
Também chamou a atenção o alto nível de comprometimento dos funcionários para
com as questões relacionadas à empresa. Conforme defendia Guerreiro Ramos (1983), verifica-se que ocorre, de fato, a integração do indivíduo na organização por meio de uma deliberada autorracionalização da conduta, em alto nível de consciência e compreensão, supondo
a existência da ética da responsabilidade. Ao fazer a seguinte afirmação, “a gente só aguça o
que a gente aprendeu, a gente pode viver os valores que a gente aprendeu em casa aqui na
empresa”, o funcionário confirma que, de fato, a liberdade individual é respeitada no ambiente organizacional. Portanto, pode-se dizer que o ajustamento do indivíduo à organização
ocorre de “maneira mais inteligente e humanamente positiva”, como diria Guerreiro Ramos
(1983), o que significa dizer que, em sua autonomia, o sujeito se convencerá, por si mesmo,
se deverá ou não tomar como critério de conduta de suas ações os valores da empresa (SERAFIM, 2001).
Esta mesma liberdade e autonomia é ainda mais perceptível quando ocorrem conflitos.
Na percepção dos funcionários, há espaço para que sejam discutidos os problemas que ocorrem na empresa, independentemente de estarem diretamente relacionados às atividades de
trabalho ou aos relacionamentos interpessoais em sentido mais geral. Na empresa, normalmente os conflitos são resolvidos por meio de diálogo, consenso e até mesmo através de atitudes pessoais como o perdão face ao erro, ficando praticamente nulas quaisquer ações punitivas. Além disso, a inexistência de sistemas rígidos de controle (onde, inclusive, a hierarquia é
muitas vezes “contornada”), somado à ausência de códigos formais de conduta, confirmam
que o ambiente organizacional na Metasul assegura condições favoráveis ao ser humano ali
inserido para agir, por escolha e deliberação, como um sujeito portador de uma conduta
ética.
Este fato não garante, porém, que o indivíduo aja eticamente, mesmo fazendo parte de
uma organização que preza por isso. Vale ressaltar que, nem por isso, a pessoa está agindo
contrariamente a princípios éticos. Por exemplo, foram constatados casos onde alguns funcionários da empresa pesquisada restringem-se a realizar suas atividades de trabalho formalmente, sem expressar um engajamento maior com a proposta da empresa, segundo os fundamentos da EdC. Isso prova, aliás, que se lá estão, se conduzindo deste modo, a empresa permite o
exercício da liberdade de consciência, caso contrário, poder-se-ia falar em doutrinação e não
em ética da convicção.
Outra situação envolvendo a existência de uma tensão ética entre racionalidades pode
ser constatada quando da ocorrência de uma forte crise que atingiu e empresa entre 2008 e
2009. O modo com que ocorreu o gerenciamento da empresa, nesta situação de crise, revelou
claramente a existência de uma forte coesão grupal, marcada por valores de compromisso
mútuo e solidariedade. Por parte da empresa, foram inúmeras as tentativas feitas visando preservar os empregos. Mas, em virtude da situação de emergência com a qual se encontravam,
os sócios se viram confrontados a ter que recorrer ao que definem como a “última alternativa”, subsequentemente a outras – tais como, diminuir a carga horária de trabalho, dar férias
coletivas aos funcionários, etc. –, e esta consistia em dispensar pessoal, ou seja, aproximadamente vinte pessoas.
A solução pelos sócios-gerentes para o impasse consistiu em comunicar abertamente a
situação aos funcionários e, posteriormente, definir juntos critérios que minimizassem o impacto gerado pela perda de emprego às famílias dos envolvidos. Além de esta medida confirmar a decisão de encontrar medidas consideradas as mais justas para o caso, revelam também
uma preocupação real de parte dos administradores para com a condição humana. Ademais, o
modo como este processo foi conduzido pelos responsáveis provocou o desencadeamento de
medidas da parte dos funcionários que, proativamente, buscaram soluções para o fato, seja na
procura por outro emprego ou, já tendo outra fonte de renda, deixando por sua iniciativa o seu
posto de trabalho e colocando-o à disposição dos colegas que dele dependiam para sobreviver
e manter suas famílias. Cabe lembrar que, na época, vinte pessoas saíram da empresa, restringindo-se a dois o número de demitidos. A registrar, ainda, que a decisão de reduzir o quadro
de funcionários não se deu com o intuito de maximizar o lucro, mas sim de efetivamente garantir a sobrevivência da empresa.
As experiências relatadas a respeito da cultura da partilha, principalmente no aspecto relativo à ajuda financeira aos empregados, mas não limitando-se a isso, também foram
bastante representativas. Este é o caso de Tiago, por exemplo, que deparado a uma situação de
dificuldade recebeu tanto ajuda financeira quanto “braçal”, através de um mutirão realizado
pelos seus colegas e também pelos sócios-gerentes, e que consistia em ajudá-lo a reconstruir a
sua casa, inabitável e sem condições de receber reformas. Revela-se, neste fato, aquela dimensão onde a cultura da partilha não se restringe apenas ao doar, mas que também solicita o “doar-se”, quer dizer, a solidariedade para com o próximo, uma das características essenciais da
EdC. Cabe destacar que os sócios-gerentes têm uma preocupação contínua no sentido de assegurar-se para que este tipo de ajuda não adquira um caráter meramente assistencialista e,
muito menos, que venha a gerar uma relação de dependência por parte daqueles que receberam alguma ajuda. Com vistas a isso, eles procuram estimular a participação ativa dos funcionários na busca pela solução de suas próprias dificuldades.
Pode-se dizer, por tudo isso, que a cultura da partilha vivida e materializada em circunstâncias diversas na empresa em estudo gerou uma condição importante que é o espírito de
reciprocidade, seja na crise ou fora dela. No caso relatado por Lucas, funcionário que teve
sua moto roubada, a iniciativa de ajudá-lo a quitar as parcelas do financiamento não foi algo
que partiu dos donos da empresa, mas sim dos próprios colegas de trabalho. Isso leva a crer
que os exemplos dos sócios-gerentes tendem a desencadear nas outras pessoas um certo nível
de protagonismo, de modo que também elas passam, livremente, a agir segundo uma lógica
de comunhão.
O aspecto relativo à formação de homens novos pode ser evidenciado a partir da iniciativa da empresa de estimular e proporcionar aos seus funcionários condições para o seu
retorno aos estudos. Ou seja, ao identificarem o baixo nível de escolaridade de seus empregados, perceberam que isso poderia ser um empecilho para que eles se desenvolvessem humana
e profissionalmente. Os custos são assumidos pela empresa e, atualmente, já houve a primeira
turma de funcionários que concluiu o ensino fundamental, os quais, no momento, estão em
fase de conclusão do ensino médio.
Cabe ressaltar que os sócios-gerentes têm consciência dos limites a que a empresa se
defronta, e isso lhes gera uma tensão diária. Como exemplo, eles citam a impossibilidade da
empresa de oferecer plano de saúde aos trabalhadores, a ausência de um plano de carreira
sólido para os mesmos e, também, face ao desejo manifesto de passar a contribuir com um
volume maior de recursos à EdC. Há duas principais razões, segundo eles, para ficarem aquém do pretendido: a primeira, surge como decorrência do fato da empresa ainda estar realizando esforços para se recuperar dos efeitos da crise financeira global que, em 2008 e 2009,
abalou fortemente o seu ramo de atuação; a segundo razão decorre das necessidades constantes de reinvestimentos na empresa para que o negócio se mantenha viável.
Um ponto fundamental levantado por Carlos, sócio-gerente, e, ao que tudo indica, um
motivo iminente e gerador de forte tensão para um dirigente, diz respeito ao desafio permanente que é falar e agir com coerência. Isto significa agir de modo que a vida particular e a
vida organizacional não estejam em contradição, ou ainda, que discurso e prática estejam em
sintonia. Para ele, este é o aspecto mais difícil a ser preservado, e exige uma “reescolha” diária face aos seus valores e convicções vividas e declaradas, e em última instância constituindo
um compromisso. E a percepção dos trabalhadores é unânime sob o aspecto de que a empresa,
representada pelos sócios-gerentes, de fato, fala e age de modo consistente.
Os resultados desta pesquisa corroboram especificidades encontradas no estudo realizado por Serafim (2001), onde ele afirma que para que a ética possa se tornar pensável no
espaço de produção é necessário, primeiramente, que ocorra a transformação do espaço organizacional, de modo que a racionalidade substantiva passa ser contemplada e exercida (superando seu caráter meramente econômico) e, consequentemente, que abra-se a possibilidade
para que ocorra o aperfeiçoamento moral do indivíduo, implicando na reativação de sua capacidade de deliberação. Em diversas situações, conforme relatado, isso pode ser confirmado na
empresa pesquisada, principalmente no que se refere à dimensão relacional, mais do que à
dimensão estrutural da organização.
Desta forma, a questão de pesquisa “de que forma os membros (administradores e administrados) de empresas vinculadas ao projeto Economia de Comunhão lidam com a tensão
ética entre as racionalidades?” pode ser, mesmo que provisoriamente, respondida da seguinte
forma: a empresa - ao adotar os princípios da EdC como modelo de referência para o agir pessoal e empresarial - permite aos membros da organização conduzir-se no mercado de
forma ética. Isto não significa dizer, contudo, que a tensão ética entre racionalidades é eliminada; de fato, os resultados da pesquisa confirmam os pontos de vistas apresentados no decorrer do trabalho de que ambas as racionalidades coexistem em relações de tensão. No entanto,
possibilitar a reativação da capacidade de agir do sujeito, é o que dá condições para que o
mesmo consiga minimizar a tensão ética entre as racionalidades, orientando-se de modo a
conciliar os objetivos do negócio com os objetivos pessoais, relacionados à autorrealização e
à liberdade.
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