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Argumentos na balança
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária descontentou associações e conselhos
médicos ao banir do país drogas emagrecedoras da classe das anfetaminas e ao restringir
ainda mais a venda da sibutramina, um remédio para perda de peso que age no cérebro.
O argumento que a Anvisa apresenta para justificar as suas decisões é correto como
princípio: os benefícios produzidos por uma droga qualquer devem superar os seus
riscos. A questão é que essa é uma conta quase impossível de fazer sem considerar cada
paciente individualmente.
As evidências em que a Anvisa se baseou para rever a situação da sibutramina, o
chamado estudo Scout, não são conclusivas. O que o trabalho apontou foi o aumento de
10% para 11,4% no risco de eventos cardiovasculares não letais em pacientes com mais
de 55 anos, doença cardíaca ou diabetes e que fizeram uso prolongado (3,4 anos, e
média) da droga. São pessoas que, pela bula, nem sequer deveriam tomar o remédio. É
temerário extrapolar esses achados para outros perfis de pacientes.
Vários estudos mostram que tomar remédios para emagrecer, em geral, acarreta redução
média de peso modesta e de curta duração. Como essas drogas apresentam risco
ponderável de efeitos adversos, utilizá-las seria sempre arriscado.
O problema é que a conclusão não é sempre válida para todos os grupos de pacientes. É
muito frequente haver uma categoria de doentes para a qual o remédio traz mais
benefícios do que riscos.
Pode ser uma fatia pequena, mas, desde que a classe exista, não há razão para privá-la
da droga. Nesse contexto, faz pouco sentido reduzir o arsenal terapêutico à disposição
dos médicos.
Essas considerações bastariam para resolver a disputa em favor dos médicos. Mas o
presidente da Anvisa, Dirceu Barbano, em entrevista à Folha trouxe um argumento que
transcende a avaliação de riscos e benefícios. Para Barbano, os médicos prescrevem
drogas emagrecedoras de forma "abusiva, muito alta, e crescente ao longo dos anos".
Assim, as novas limitações seriam menos um controle de medicamentos e mais um
controle sobre os profissionais de saúde brasileiros. Não chega a ser uma novidade
constatar que existem médicos despreparados, mas não é todo dia que uma agência de
governo sugere medidas para proteger a população dos médicos, muitos dos quais
contratados pelo próprio poder público.
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