ID: 60323868
27-07-2015
Tiragem: 33183
Pág: 20
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Diária
Área: 25,70 x 31,00 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 2
“A ligação às empresas é um activo
importante” da Porto Business School
Ramon O’Callaghan A concorrência na formação de executivos é cada vez maior.
O novo director da Porto Business School vê a internacionalização como prioridade,
e as empresas associadas e a Universidade do Porto como aliados nessa batalha
Entrevista
Victor Ferreira (texto)
Paulo Pimenta (fotografia)
Ramon O’Callaghan nasceu e
cresceu em Barcelona, o apelido é
de origem irlandesa e casou-se com
uma holandesa. Enquanto aluno
estudou em Espanha e doutorouse nos Estados Unidos (Harvard)
e, enquanto profissional, já dirigiu
escolas de negócios em Espanha, na
Holanda (onde tem a família) e na
Ásia, em concreto no Cazaquistão,
onde ajudou a criar uma escola
nova de raiz. Em Maio, aterrou no
Porto, aos 61 anos, para liderar a
Porto Business School (PBS).
Não tem sido a aventura de A
volta ao mundo em 80 dias, de Júlio
Verne, que escolheu um dia como
uma das suas obras favoritas, mas
é com um olhar virado para o
globo que o novo “dean” da PBS
apresentou, na semana passada
- e viu aprovada -, a sua proposta
de plano estratégico. Na sala
de reuniões do terceiro piso do
edifício de 15 milhões de euros que
a PBS inaugurou há ano e meio,
O’Callaghan descreve ao PÚBLICO
as apostas: embora queira atrair
o talento nacional, também quer
combater o risco de a PBS ser vista
como uma escola regional.
O Fundo Monetário
Internacional (FMI) disse, em
Março, que Portugal deveria
“rever a eficácia e amplitude
dos programas para promover
as competências de gestão em
Portugal”. Essa declaração, que
consta num relatório sobre o
estado do país, após a saída da
troika, foi entendida como uma
crítica à falta de qualidade dos
gestores portugueses. É esta
a ideia que tem dos gestores
portugueses?
Portugal tem empresas muito
boas e que são muito bem geridas.
Poderia dar-lhe diversos exemplos,
sobretudo na área do Porto e Norte
de Portugal, onde há grandes
empresas que começaram por ser
pequenas empresas familiares e
hoje são líderes nos respectivos
sectores, no mercado nacional,
europeu e algumas até em termos
mundiais.
E que características tem um
bom gestor?
Temos de pensar nos factores
que parecem estar sempre
presentes neste século XXI. Um
deles é a permanente incerteza,
e as aptidões têm de se ajustar
a um ambiente de mudança
permanente. A liderança do
tipo “comandar e controlar”
talvez funcione melhor em
ambientes mais estáveis como
naquelas indústrias em que é
preciso controlar muitas linhas
de produção e em que o factorchave é a eficiência. Mas nos
ambientes de maior incerteza,
trata-se de adaptabilidade e não
de eficiência. Aí é preciso tentar
prever e preparar para o que é
quase imprevisível, ter a agilidade
para enfrentar o inesperado.
O espírito empreendedor é
fundamental, não ficar pelas
oportunidades actuais e
identificar as capacidades de que
vamos precisar no futuro. Para
países com mercados pequenos,
como Holanda ou Portugal, é
obrigatório saber pensar global,
ser capaz de gerir diferenças
culturais, ter uma atitude aberta,
ser menos arrogante. E, no fim,
obter resultados.
O FMI talvez não esteja a pensar
nos gestores das grandes
empresas quando pede mais
qualidade na gestão.
Sim, talvez essas constituam
o topo da pirâmide. Muitas
empresas de média dimensão
estão a tentar internacionalizar-se,
porque o mercado português tem
uma dimensão limitada. Talvez
algumas necessitem de melhorar
a qualidade da gestão até porque
querem abraçar desafios maiores.
Para uma escola de negócios como
a PBS, isso é uma oportunidade.
Isso está na estratégia que
propôs ao Conselho Geral da
escola?
Sim. As escolas parecem todas ir
atrás das grandes empresas, do tal
topo da pirâmide, mas talvez haja
mais oportunidades no segmento
das empresas de pequena e média
dimensão.
Que importância dá a esse
segmento?
É exactamente uma das
prioridades. O plano define linhas
gerais e apresenta iniciativas
concretas para alcançar os
objectivos. Queremos trabalhar
mais com este mercado de
empresas que ainda não fazem
parte do topo da pirâmide e que
estão em Lisboa e no Porto, mas
não nos podemos limitar a essas
cidades. Temos de ir a outras,
como Coimbra e Braga, que
integram o que eu chamaria o
nosso mercado natural.
Parece fácil de dizer. Como é
que se faz isso?
Aí entramos noutros temas
importantes do nosso plano.
Proporcionamos formação
especificamente orientada para
as empresas e outra que é aberta
a toda a gente. Em relação à
formação específica, temos de
identificar as pequenas e médias
empresas (PME) e visitá-las, tal
como fazemos com as grandes.
O que significa que teremos
de aumentar aquilo que numa
empresa normal se chamaria a
equipa comercial. Por outro lado,
outras empresas hão-de vir ter
connosco. Mas para isso teremos
de ter maior visibilidade. Sabemos
que temos de ser melhores a
comunicar quem somos, o que
fazemos e que valores defendemos,
o que nos diferencia de outras
escolas de negócios, o que significa
que o nosso marketing, em geral,
“Os nossos alunos
do MBA Executivo
eram enviados
pelas empresas em
que trabalhavam.
Mas com a crise
as empresas
começaram a
cortar a torto
e a direito e
o orçamento
para educação e
formação foi um
dos que foram
cortados”
tem de melhorar, e essa é outra das
nossas linhas prioritárias.
A PBS tem problemas de
visibilidade?
Quando visitei empresas em
Lisboa, algumas disseram-me
“estamos dispostas a trabalhar
convosco, mas o problema é que
nós não sabemos em que é que
vocês são bons”.
E em que é que a PBS é boa?
Qual é a sua proposta de valor?
Uma coisa é a proposta de valor,
outra é aquilo por que queremos
ser reconhecidos. Nós dizemos
que “mudamos vidas” [“To change
lives”, slogan da escola] e o que
queremos dizer com isso é que
fornecemos ferramentas e abrimos
caminho para o desenvolvimento
pessoal e de carreira. E fazemos
isso com pessoas e também com
organizações.
Mas é preciso haver evidências
de que o que fazem dá
resultado.
Quarenta por cento do nosso
trabalho são programas
especificamente desenvolvidos
para empresas. Portanto, o
nosso negócio é o de ajudar
empresas a transformarem-se e
temos metodologias específicas
para medir o impacto daquilo
que fazemos - o ROE, Return on
Education [retorno da educação].
Uma das coisas em que a
qualidade da PBS é reconhecida
é o chamado follow up, que é o
nosso compromisso de continuar
a acompanhar e seguir os nossos
clientes. Preocupamo-nos em
saber como estão, se estão a usar
as ferramentas e competências
que adquiriram enquanto estavam
num dos nossos programas.
Não é possível ser bom em tudo.
A PBS quer ser conhecida por
ser boa em quê?
O que lhe disse faz parte da nossa
proposta de valor e daquilo que
nos diferencia de outras escolas.
A questão que coloca pode ser
traduzida assim: quais são as
áreas ou temas em que vamos
ser conhecidos por sermos dos
melhores? Será a Logística?
Finanças? Ou é algo sectorial, por
exemplo, algo único que sabemos
fazer e que interessa muito a uma
determinada indústria, como
ID: 60323868
27-07-2015
Tiragem: 33183
Pág: 21
País: Portugal
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Period.: Diária
Área: 25,70 x 30,82 cm²
Âmbito: Informação Geral
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“Talvez algumas
[empresas de média
dimensão] necessitem de
melhorar a qualidade da
gestão até porque querem
abraçar desafios maiores”
por exemplo o sector têxtil?
Claramente, somos bons nos
programas para empresas e no
follow up dos nossos alunos.
Voltamos à importância do meio
empresarial e da qualidade da
gestão, mas também da marca PBS
e da forma como ela é vista.
Há temas, no Norte, por exemplo,
muito relevantes, como o
empreendedorismo e os negócios
familiares. A maneira de nos
distinguirmos sem perder de vista
as necessidades dessas empresas
pode ser a criação de um centro
de excelência para negócios
familiares. Seria algo único em
Portugal e que iria no sentido do
que considero importante que é
reforçar a marca PBS e definir um
posicionamento no mercado que a
torne relevante e reconhecida.
Parece que falta à PBS o
mesmo de que precisam muitas
empresas.
Correcto. Qual é a nossa história?
Qual é o nosso elevator pitch
[abordagem de venda em menos
de um minuto]? São questões
relevantes e temos muito trabalho
de casa para fazer.
A PBS tem dois programas
de MBA (Master in Business
Administration). Em termos
gerais, estes programas estão a
“perder a magia”, como dizia
um artigo no Financial Times,
recentemente? E nos cursos
da PBS, há alguma mudança
fundamental a acontecer?
O MBA tem sido visto como o
bilhete de entrada para a gestão,
tal como o curso de Medicina
de que se precisa para se ser
médico, mas tem havido muito
debate sobre se um MBA é mesmo
preciso. A Europa continental
começou a importar o conceito e
os programas praticados nos EUA
e no Reino Unido. Há algumas
décadas, um MBA era algo único e
com valor porque dava às pessoas
uma formação que a maioria não
tinha. Mas hoje o diploma diz que
as pessoas têm o básico e o valor
profissional vem da experiência
de cada um, não necessariamente
adquirida no curso. Nesse sentido,
para as escolas hoje em dia é
mais difícil captar o interesse das
empresas em financiar um MBA
a trabalhadores. Há mais cursos e
deixaram de ser exclusivos.
Compensa fazer um MBA?
Para os candidatos, especialmente
se estão a fazer um MBA a tempo
inteiro, a compensação é menos
nítida em especial no momento
de iniciar o curso. Em Portugal
não, mas basta olhar para o custo
astronómico de um MBA de dois
anos nos EUA, por exemplo.
Facilmente se chega aos 150 mil
dólares (136 mil euros), nalgumas
escolas de topo. E depois não é
garantido que haja no mercado
um emprego e um salário elevado
à espera do candidato, como
havia antigamente. Esta tendência
alimenta um debate que já vem
de longe, mas não podemos
esquecer que este é só um dos
lados da equação. No outro lado
temos aquilo que se aprende
efectivamente e que é valorizado
pelo mercado de trabalho.
O quê, por exemplo?
Tenho visto resultados de
inquéritos recentes que sugerem
que no topo da lista do que
as empresas esperam de um
candidato com MBA estão as
chamadas soft skills. Todas as
escolas perceberam que o mercado
não quer apenas os fundamentos
das Finanças, da Contabilidade,
Gestão da Produção e Estratégia
e que quer gestores que sabem
como comunicar, como ouvir,
como exercer a liderança, como
negociar.
O perfil dos candidatos a fazer
um MBA também está a mudar.
A crise financeira de 2008 é uma
das razões mais fortes para essa
mudança que se está a verificar
sobretudo nos programas de MBA
Executivo [programa em part time
para quem está a trabalhar ao
mesmo tempo]. Normalmente, os
nossos alunos do MBA Executivo
eram enviados pelas empresas
em que trabalhavam. Era uma
forma de acrescentar valor ao
trabalhador e à empresa. Mas com
a crise as empresas começaram
a cortar a torto e a direito e o
orçamento para educação e
formação foi um dos que foram
cortados. Só que este cenário, que
parecia ser justificado com a crise,
já não é temporário e parece ter-se
tornado definitivo.
Consegue quantificar quantos
são hoje enviados por
empresas?
No passado, em termos gerais, e
não estou a falar especificamente
do MBA Executivo da PBS, 80%
dos candidatos eram apoiados pelas empresas e 20% pagavam o seu
MBA. Hoje esse rácio virou-se ao
contrário, e será algo como 20% de
candidatos enviados por empresas
e 80% assumem todos os custos
com o curso. Os números podem
variar de escola para escola, conheço casos na Holanda em que
talvez seja um rácio 30%-70%, haverá outras em que será 40%-60%.
O que é inegável é que a tendência
actual mudou por completo o que
era verdade no passado.
O que é que isso significa para
a PBS?
Antigamente havia como que
uma Grande Muralha da China a
separar os programas de MBA a
tempo inteiro e a tempo parcial,
no sentido em que os serviços de
carreira que a escola prestava aos
alunos a tempo inteiro - que em
princípio estariam sem emprego e
precisariam de ajuda na colocação
no mercado de trabalho - hoje
não pode ser negado aos alunos
dos programas a tempo parcial
que pagam o seu próprio curso.
E se alguns se encontram na
infeliz circunstância de estarem
desempregados, como já tem
acontecido, então eles estão na
mesma posição dos candidatos que
frequentam o MBA a tempo inteiro.
E é isso que estamos a fazer.
Com um foco mais
internacional, criaram o
Magellan MBA, a tempo inteiro,
para atrair estrangeiros. Quais
são os resultados?
Uma das coisas que me
surpreenderam é que há cada
vez mais portugueses a optar por
esse curso, apesar de todo ele
ser dado em inglês. Precisamos
de fortalecer o nosso marketing
internacional se quisermos evitar
sermos conhecidos como uma
escola regional. Vamos criar uma
equipa de projecto que proponha
soluções para aumentarmos a
nossa atractividade internacional.
Há alguma coisa que o tenha
supreendido pela positiva
quando chegou ao Porto?
Sim, de facto considero que esta
ligação ao meio empresarial
não existe em muitas escolas no
mundo. É um activo importante
que nem todos têm.
Isso é importante para os
alunos?
Deveria ser e no entanto não é
referido. Devemos medir o nosso
sucesso por aquilo que fazemos
enquanto escola e por aquilo
que fazem ou fizeram os nossos
alumni. Quem passou pela PBS
obteve sucesso na sua organização.
Por que não usamos isso como
uma forma de comunicar a nossa
escola e a cidade, que está a tentar
posicionar-se como uma cidade de
inovação e empreendedora?
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entrevista completa - Porto Business School