Comunidade Zooplanctônica de Águas Doces
Emanuela C. de Freitas
(Mestre em Ecologia e Recursos Naturais)
O zooplâncton é o termo genérico para um grupo de animais de diferentes espécies,
tendo uma característica comum à coluna de água como seu habitat natural. Atualmente
sabe-se que o zooplâncton possui um papel central na dinâmica de um ecossistema
aquático, especialmente na ciclagem de nutrientes e no fluxo de energia.
Ao contrário do fitoplâncton (algas), cuja diversidade na água doce é maior do que
no ambiente marinho, o zooplâncton de água doce caracteriza-se pela baixa diversidade de
espécies.
Nas águas doces encontra-se, com frequência, maior diversidade de espécies na
região litorânea (Figura 1).
Figura 1: Divisão dos lagos em regiões. Retirado de: www.dern.ufes.br/limnol/zonaslago.jpg
A comunidade zooplanctônica é constituída principalmente por protozoários (Figura
2), rotíferos (Figura 3), cladóceros, copépodos (Figura 4) e larvas de insetos da família
Chaoboridae (Figura 5).
Figura 2: Algumas espécies de protozoários do gênero Arcella. 1-7: Arcella vulgaris; 8-13: Arcella angulosa;
14-38: Arcella discoides.
Figura 3: Diferentes espécies de rotíferos. A) Brachionus calyciflorus; B) Synchaeta sp; C) Notholca sp; D)
Polyarthra platyptera; E) Hexarthra mira; F) Brachionus falcatus; G) Brachionus calyciflorus; H)
Asplanchna sp; I) Concchilus sp (colônia); J) Filina sp; K) Brachionus angularis; L) Keratella cochlearis; M)
Keratella quadrata
Figura 4: Diferentes espécies de cladóceros e copépodos. 1) Sida sp; 2) Diaphanosoma sp; 3–4) Daphnia sp;
5) Moina sp; 6) Bosmina sp; 7) Chidorus sp; 8) Nauplio de Cyclops sp (larva); 9) Cyclops sp com ovos; 10)
Cyclops sp sem ovos.
Figura 5: Espécie de inseto Chaoborus sp que faz parte da comunidade zooplanctônica.
A maior parte das vezes os copépodos representam a maior biomassa dentre todos
os outros grupos zooplanctônicos de água doce. Menos frequentemente podem ser
encontrados vermes (turbelários, alguns tremátodos), cnidários (medusas) e as larvas de
moluscos.
Protozoários
Os protozoários são seres cujo tamanho pode variar entre 2 e 1000 μm (1 μm é igual
a 0,000001 m) são organismos exclusivamente unicelulares, ou seja, formados por uma
única estrutura celular.
Na maioria dos lagos é frequentemente observada, pelo menos em certas épocas do
ano, a dominância dos protozoários. Estes animais apresentam regime alimentar
diversificado, podendo ser bacteriófagos (aqueles que se alimentam de bactérias),
detritívoros (aqueles que se alimentam de matéria orgânica particulada), herbívoros (que se
alimentam de algas ou vegetais) ou carnívoros.
Eles têm papel fundamental na transferência de energia em ecossistemas lacustres
pelo fato de ser alimentarem de partículas que, devido ao reduzido tamanho (menores que 1
μm), não são assimilados pelo zooplâncton maior (cladóceros e copépodos). Desta maneira,
os protozoários transformam a matéria orgânica de tamanho muito pequeno em biomassa,
permitindo que sejam ingeridas por rotíferos, cladóceros e copépodos.
Rotíferos
Os rotíferos pertencem ao grupo de animais multicelulares do grupo dos
asquelmintes (mesmo grupo das lombrigas). O tamanho dos rotíferos varia de 50 a 2000
μm. Eles habitam os mais diferentes tipos de ambientes aquáticos e os mais diferentes
habitats de um lago. Os que são verdadeiramente planctônicos, ou seja, que vivem na
região limnética de um lago (Figura 1), pertencem a um pequeno número de famílias da
classe Monogononta.
Entre os rotíferos, encontra-se um dos fenômenos mais interessantes do reino
animal: o número de células constituintes do corpo de um indivíduo de uma determinada
espécie é igual para todos os indivíduos desta espécie. Além disso, quando um indivíduo
nasce ele já dispõem de todas as células que um indivíduo adulto terá.
Os rotíferos apresentam os mais diferentes hábitos alimentares, variando de
onívoros (são ao mesmo tempo herbívoros e carnívoros), herbívoros e carnívoros.
Entre os rotíferos é comum observar grande variação de tamanho e formas dentro de
uma mesma espécie. Este fenômeno é conhecido como ciclomorfose e, muitas vezes,
dificulta a identificação de uma espécie. Não se sabe ainda o que desencadeia esta
modificação da forma de uma espécie de rotífero, mas acredita-se que possa estar
relacionado com a temperatura e a predação (animais que se alimentam dos rotíferos). No
caso da predação, a formação de espinhos e prolongamentos dificultaria o ataque por outros
animais que se alimentariam deles.
Em regiões temperadas têm-se encontrado uma relação entre lagos pobres em
nutrientes (oligotróficos) e aqueles que são ricos em nutrientes (eutróficos) com as espécies
de rotíferos. Por exemplo, em lagos oligotróficos têm sido consideradas como típicas as
seguintes espécies: Synchaeta oblonga, Synchaeta tremula, Keratella cochlearis,
Asplanchna priodonta, Conochilus unicornis, entre outras. Para lagos eutróficos são
citadas: Euchlanis dilatata, Trichocerca cylindrica, Brachionus angularis, Keratella
quadrata, etc. No entanto, para regiões tropicais, ainda não foi encontrada nenhuma relação
entre os rotíferos planctônicos e o estado trófico de um lago. As espécies mais frequentes
em lagos tropicais são Keratella vaga, Keratella tropica, Filipina opoliensis, muitas
espécies do gênero Brachionus, Anuraeopsis e Hexarthra.
Quando levantamentos da comunidade zooplanctônica são feitos em um
determinado lago, os rotíferos são os que apresentam, de modo geral, a maior diversidade
em espécies. Sua importância no ecossistema se deve ao fato de sua biomassa apresentar
alto valor nutritivo. Em termos de peso seco, a biomassa dos rotíferos compõe-se de 40%
de proteínas, 40% de carboidratos (açúcares), 15% de lipídeos e 5% de cinzas. Esta
constatação assume grande importância considerando que os rotíferos são fundamentais na
alimentação dos peixes no seu estágio larval.
Cladóceros
A maioria das espécies de cladóceros vive preferencialmente na região litorânea dos
ecossistemas de água doce (Figura 1). Nem todos eles são planctônicos. Por exemplo, a
família dos Macrothricidae não tem representantes no plâncton.
O tamanho dos cladóceros varia de 0,2 a 3 mm e os mais frequentes em água doce
pertencem às famílias Sididae (Diaphanosoma sp), Daphnidae (Daphnia sp e Ceriodaphnia
sp), Bosminidae (Bosmina sp) e Chydoridae (Chydorus sp, Alona sp), embora esta última
família frequentemente são encontrados fazendo parte da comunidade que vive no fundo
dos lagos (comunidade bentônica).
Os cladóceros são por excelência filtradores, portanto sua alimentação básica se
constitui de fitoplâncton (algas) e detritos. Somente algumas poucas espécies são
carnívoras.
Como no caso dos rotíferos, nos cladóceros também ocorre o fenômeno de
ciclomorfose e isso traz sérias dificuldades na identificação destes animais.
Outro fenômeno interessante entre os cladóceros é que diferentes espécies ocupam
diferentes posições na coluna de água de um lago. Por exemplo, há grupos que ocupam
preferencialmente a camada superficial, ou seja, os dois primeiros metros (Bosminopsis
deitersi e Diaphanosoma sarsi). Outros ocupam preferencialmente as camadas mais
profundas, como os adultos de Ceriodaphnia cornuta, Daphnia gessneri e Ceriodaphnia
reticulata. E outros ainda podem habitar tanto a superfície quanto as camadas mais
profundas (Moina reticulata e Bosmima chilensis). Isso proporciona que ocorra
transferência de energia para outros organismos (peixes, por exemplo) tanto na superfície
quanto nas camadas mais profundas de um lago.
Copépodos
Os copépodos habitam os mais diferentes ambientes aquáticos, tais como água doce,
salobra, salgada e mesmo em terras úmidas. Algumas espécies são parasitas de peixes. As
formas planctônicas são, na grande maioria, de tamanho pequeno (< 1 mm até poucos
milímetros).
No desenvolvimento dos copépodos há a existência de uma fase larval conhecida
como naúplio, os juvenis são conhecidos como copepoditos e a forma adulta é bem típica
com todas as partes do corpo bem desenvolvidas.
Os principais grupos de copépodos representantes no plâncton de água doce são:
Calanoida (essencialmente planctônicos); Cyclopoida (representantes planctônicos e
bentônicos); e Harpacticoida (maioria bentônico).
Os calanóidas são essencialmente filtradores de algas e, às vezes, utilizam os
detritos. Os ciclopóidas são preferencialmente carnívoros. O alimento destes copépodos
inclui cladóceros, larvas de dípteros e oligoquetas.
As espécies carnívoras são geralmente maiores do que as herbívoras. Não raramente
observa-se que os copépodos, no curso de seu desenvolvimento, apresentam grande
diversidade de hábitos alimentares.
Pelo fato de que os copépodos apresentam diferentes estágios de desenvolvimento
(naúplios, copepoditos e adultos) seu papel no ecossistema lacustre pode se tornar mais
relevante do que os dos cladóceros. Esta relevância diz respeito, principalmente, ao fluxo
de energia no ecossistema, visto que grande número de espécies de copépodos são
herbívoros em todos os estágios de desenvolvimento. Desta maneira, constitui-se em um
importante elo na transferência de energia entre os produtores primários (algas) e os outros
organismos. Este papel assume maior relevância, visto que na maioria dos lagos os
copépodos apresentam maior biomassa, em relação aos demais grupos.
Ao contrário do que se observa para rotíferos e cladóceros, os copépodos não
apresentam ciclomorfose.
É frequente observar-se entre os copépodos diferenças na distribuição ao longo da
coluna de água de uma lagoa. Os naúplios e copepoditos pequenos em geral ocupam a
superfície; os copepoditos maiores têm ocupação irregular e a última fase de copepodito e
adulto ocupam as camadas mais profundas.
Larvas de inseto
Ao contrário dos crustáceos que são amplamente representantes no plâncton da
região limnética (Figura 1), os insetos planctônicos são muito raros. Somente alguns grupos
de Diptera na fase larval têm representantes no plâncton, dentre estes a larva de Chaoborus
(Figura 5) é a mais importante. Uma das características mais importantes é a alternância
diária de habitat: à noite são planctônicos e durante o dia são bentônicos.
Download

Comunidade Zooplanctônica de Águas Doces