Discurso da vereadora Vânia Galvão, responsável pela indicação da Ministra
Luiza Bairros para receber a medalha Zumbi dos Palmares
Poderia começar a minha fala nesta Sessão Solene, que visa a conferir a
Ministra da Promoção da Igualdade Racial da República Federativa do Brasil,
Dra. Luiza Bairros, a medalha Zumbi dos Palmares, fazendo um breve registro
curricular. O que, de certo, não seria breve, em face da extensa e substanciosa
trajetória política e profissional.
Fazendo esta tentativa, melhor dizendo, este importante apontamento acerca
da vida de nossa homenageada, referencio esta gaúcha de Porto Alegre, na
verdade, baiana por adoção mútuas – o povo da Bahia tomou-a por
conterrânea, assim como Luiza adotou a Bahia – como detentora de um
currículo acadêmico-profissional invejável Fez sua graduação em
Administração pública e Administração de empresas, no sul, e pós-graduação
em Sociologia, na Michigan State University, nos Estados Unidos. Moradora de
Salvador há mais de 30 anos, tornou-se pesquisadora associada do Centro de
Recursos humanos/ CRH, da universidade Federal da Bahia (UFBA) e fundou,
em parceria com a Conferência Nacional de Cientistas Políticos Negros (uma
organização norte americana), o Projeto Raça e Democracia nas Américas,
que promove a troca de experiências entre estudantes de pós-graduação afrobrasileiros e pesquisadores afro-norte-americanos. Luiza também foi
professora de Sociologia da Faculdade de direito da universidade Católica do
Salvador (UCSAL).
Como socióloga, tanto na Bahia, na Secretaria do Trabalho e Ação Social do
Estado da Bahia gerenciando programas de apoio ao trabalhador autônomo e
participando em pesquisas e estudos sobre o mercado de trabalho na Bahia e
Região Metropolitana de Salvador; como mais tarde, em Brasília, no período de
2001 a 2003 no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento/PNUD
na coordenação de ações interagenciais e de projetos no processo de
preparação e acompanhamento da III Conferência Mundial Contra o Racismo;
de 2003 a 2005 com o Ministério do Governo Britânico para o Desenvolvimento
Internacional – DFID, na pré-implementação do Programa de Combate ao
Racismo Institucional para os Estados de Pernambuco e Bahia; e de 2005 a
2007, como consultora do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento – PNUD, para questões de gênero e raça e coordenadora do
PCRI, em experiências deste programa na Prefeitura da Cidade do Recife, na
Prefeitura Municipal de Salvador e no Ministério Público de Pernambuco.
Em 2008, trouxe para o Estado da Bahia toda a sua experiência na luta contra
o racismo e o seximo, a frente da Secretaria de promoção da Igualdade, criada
em 2006. Agora, Luiza Bairros compõem a equipe da Presidenta Dilma
Roussef, na condição de Ministra da Igualdade Racial do Brasil.
Poderia dizer tudo isso, na verdade, já disse! Mas a centralidade da minha fala
– e da homenagem que o povo de Salvador e da Bahia prestam à Luiza nesta
noite – não reside em seu currículo digno de nota.
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Luiza Bairros, Mulher Negra! Mulher Luiza Negra Bairros que, vivendo e se
(re)conhecendo na luta permanente por espaço, respeito e igualdade de
direitos, dedicou, com paixão, um ativismo político reconhecido
internacionalmente pelo resgate histórico da condição de mulher negra; pela
reafirmação da história de resistência das mulheres negras, em detrimento da
cruel invisibilidade que o machismo e o racismo lhes/nos impuseram.
O racismo, indubitavelmente cruel, tenta colocar todas as mulheres negras em
seu “devido lugar”. Não tenho dúvidas que, ao longo de sua vida, a vigilância
diária para se defender e às demais mulheres, pela redução das desigualdades
raciais e a reconhecimento e efetivação de direitos, fosse uma constante.
Exigindo-lhe, inclusive, muito mais da Luiza Mulher Negra Bairros, que de
outras mulheres negras.
À Luiza Mulher Negra Bairros, dedico, a minha sincera admiração, externada
nesta estrofe do poema “A Noite não Adormece nos Olhos das Mulheres”, da
poeta negra Conceição Evaristo:
“A noite não adormece
Nos olhos das mulheres
Há mais olhos que sono
onde lágrimas suspensas
virgulam o lapso
de nossas molhadas lembranças”
Luiza Bairros ativista visceral, à raiz de suas convicções. Luiza Ativista Raiz!
Para ela, combater o racismo é princípio! Nada de princípio morto, princípio de
gaveta, princípio retórico, nada disso! Em suas palavras e na sua prática,
combater o racismo é um dever militante! Em sua trajetória, sua visceralidade e
coerência prática deve ter desagradado a bastante gente, é certo. Mais
possibilitou, juntamente com a ação de um número significativo de homens e
mulheres, registro, que o Movimento Negro brasileiro consagrasse-se,
cumprisse e continuasse cumprindo o seu importante papel de fazer com que a
democracia brasileira reconheça o peso estruturante do racismo em nossa
sociedade e aja pela adoção de medidas, políticas, ações que assegurem, para
além do respeito, a dirimição das elevadas desigualdades raciais que ainda
imperam em nosso país.
À Luiza Ativista Raiz, meus votos de “força na luta”. E a ela dedicou também
alguns versos. Desta vez do poema MNU, da poeta negra paulista Miriam
Alves:
“Eu sei:
Surgiu um grito na multidão
Um estalo seco de revolta
Surgiu outro
Outro
e outros
aos poucos, amotinamos exigências
querendo o resgate
sobre nossa forçada
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miséria secular”
Em cena, outra Luiza! Conhecida! Reconhecida! Credenciada! Trata-se da
pesquisadora detalhista e substanciosa em relações raciais. Da especialista de
alto gabarito que, ao escrever, projetar e, principalmente, externar o seu
raciocínio lógico através da fala, faz com que o povo negro reconheça,
nitidamente, a importância do (seu) ativismo acadêmico como um caminho
importante e a possibilitar mudanças. Academia, não academicismo.
Pensamento e ação acadêmica para impactar na vida real, nas necessidades
cotidianas das pessoas. Para isso, a sua postura de levar o dia a dia e as
vivências, aparentemente mais simples, de homens e mulheres negras para a
observação e a investigação introduziu um diferencial que, ainda hoje, marca o
ativismo negro acadêmico.
À Luiza Especialista Bairros Griot, um agradecimento coletivo e um pouco de
prosa. Agora, de Néia Daniel, que busquei em um artigo de Luiza bastante
conhecido, o “Lembrando Lélia Gonzalez”. É assim:
“E ela, como um antigo “griot”, contava e contava as suas histórias
(...) o que ela queria, todo o tempo, era passar para o povo da aldeia o
entendimento que eles viam a seu redor. O tempo lhe contava a perspicácia
dos caminhos que outras tribos percorreram. Ela transmitia CONHECIMENTO.
A idéia de liberdade passada por esta amazona, de torço estampado de
esperança, montada em seu cavalo negro, como nossa ancestralidade era
tanta, que várias outras aldeias, tribos, estados pararam para ouvi-la.”
Em sua ação política, a nossa homenageada se mostrou profundamente plural,
mantendo uma coerência político ideológica digna de nota. Várias Luizas,
muitas Luizas! Enumerei algumas, sabendo que, aqui mesmo nesta Sessão
Solene, um número significativo de amigos, amigas, admiradores/as, ativistas,
apaixonados/as políticos/as conhecem tantas outras faces desta personalidade
negra totêmica.
Particularmente, externo os meus sinceros agradecimentos pelo seu aceite.
Todos e todas sabemos o quanto você, Luiza, é avessa ao culto à
personalidade. Na sua compreensão, o que compreendo e respeito, as
laureações são incabidas quando se trata de um dever.
Esquecendo, por um segundo apenas, que o povo negro no Brasil e no mundo
sempre esteve por sua própria conta (parafraseando Steve Biko), gostaria de
lhe dizer que você é merecedora do nosso carinho, do nosso respeito, da
nossa admiração, do nosso reconhecimento.
Hoje, dia 17 de novembro, no mês que celebramos a Consciência Negra, a
Câmara Municipal de Salvador tem a honra de entregar a medalha Zumbi dos
Palmares, a uma mulher exemplar: ativista do movimento negro, feminista,
intelectual, pesquisadora, ministra de estado da Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial, LUIZA HELENA DE BAIRROS.
Parabéns, Luiza Zumbi Bairros Palmares!
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Muito obrigada!
Vânia Galvão
Vereadora PT – Salvador/BA
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