Anexo 4 – Tema 2015: O meu, o seu, o nosso.
(Texto retirado parcialmente do capítulo IV do livro: Liberdade para aprender. Carl
Roger. Ed.Massangana,2010.)
O relacionamento interpessoal na facilitação de aprendizagem
Embora possa parecer de minha parte, impróprio dizê-lo, gosto muito deste capítulo, porque
exprime algo das mais profundas convicções que sustento, relativamente dos que trabalham no campo da
educação. Sua parte essencial constituiu, de começo, objeto de uma conferência na Universidade de
Harward, mas foi revista e ampliada para este livro.
Quero começar este capítulo com uma afirmação de que pode parecer surpreendente a
uns e, talvez, ofensiva a outros. É simplesmente esta: ensinar, a meu ver, é função
exageradamente supervalorizada.
Dito isto, corro ao dicionário para ver se realmente tem significado o que afirmei. Ensinar
significa “instruir”. Pessoalmente, não estou muito interessado em instruir o outro sobre o que
deveria saber ou pensar. “Comunicar conhecimento ou habilidade “– minha reação é: por que não
ser mais eficiente, usando um livro ou uma aprendizagem programada? “Fazer saber” - aqui, fico
com cabelo arrepiado; não tenho vontade de fazer ninguém saber coisa nenhuma. “Mostrar, guiar,
dirigir” – parece-me que se tem mostrado, guiado e dirigido a gente demais. Assim, chego á
conclusão de que tem significado o que eu disse. Ensinar é, a meu ver, atividade relativamente
sem importância e enormemente supervalorizada.
Mas há mais do que isso, na minha atitude. Reajo negativamente ao ensino. Por quê?
Porque, penso eu, ensinar suscita questões todas elas falsas. Assim que focalizamos o ensino,
surge a questão: ensinar o quê? Que é que, do nosso ponto de vista superior, uma outra pessoa
precisa saber? Admiro-me de que, ainda hoje, nos justifiquemos com a presunção de que somos
uns sábios, em relação ao futuro, ao passo que os jovens são uns tolos. Estamos realmente
seguros a respeito do que eles deveriam saber? Aí, aparece o ridículo problema da extensão: que
é que o curso abrangerá? Essa noção de extensão baseia-se na suposição de que o que é
ensinado é aprendido; o que é apresentado é assimilado. Não sei de suposição tão obviamente
errada. Para evidenciar sua falsidade, não é preciso pesquisar; basta conversar com uns poucos
estudantes.
Mas eu me pergunto: “terei tanto preconceito contra o ensino ao ponto de não descobrir
situação em que ele valha a pena?”. Imediatamente, penso nas minhas experiências na Austrália,
não há muito tempo. Interessei-me principalmente pelos indígenas australianos. Trata-se de um
grupo que, por mais de 20.000 anos, tem vivido e sobrevivido num ambiente desolado, em que um
homem moderno pareceria dentro de poucos dias. O segredo da sobrevivência dos aborígenes tem
sido ensinado. Transmitiram-se aos jovens todos os detalhes de conhecimento sobre o modo de
obter água, como seguir o rastro da caça, matar o canguru, encontrar o caminho através do
deserto sem trilhas. Tal conhecimento é transmitido aos jovens como meio de comportar-se e
qualquer inovação é desaprovada. Claro que tal ensinamento lhes proporciona o modo de
sobreviver, num meio hostil e relativamente imutável.
Agora estou mais perto do x do problema que me excita. Ensinar e transmitir
conhecimento tem sentido num meio imutável. Eis por que essa tem sido a sua função
inquestionada, durante séculos. Mas, se há uma verdade a respeito do homem moderno é que ele
vive num meio continuamente em mudança. Uma coisa de que posso ter certeza é que a física
ensinada a um estudante de hoje estará superada dentro de uma década. O ensino da Psicologia
estará certamente ultrapassado daqui a 20 anos. Os chamados “Fatos da História” dependem,
amplamente, da disposição e da índole das atuais culturas. A Química, a Biologia, a Genética, as
Sociologias passam por um fluxo tal que uma sólida afirmação feita hoje estará quase certamente
modificada ao tempo em que os estudantes atinjam o estágio dentro do qual possam usar seu
conhecimento.
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Enfrentamos, a meu ver, situação inteiramente nova em matéria de educação, cujo
objetivo, se quisermos sobreviver, é o de facilitar a mudança e a aprendizagem. O único homem
que se educa é aquele que aprendeu como aprender; que aprendeu como se adaptar e mudar; que
se capacitou de que nenhum conhecimento é seguro, que nenhum processo de buscar
conhecimento oferece uma base de segurança. Mutabilidade, dependência de um processo, antes
que de um conhecimento estático, eis a única coisa que tem certo sentido como objetivo da
educação, no mundo moderno.
Assim, e agora com algum alívio, volto a uma atividade, a um propósito, que realmente me
anima – facilitar a aprendizagem. Quando eu tenha sido capaz de transformar um grupo – e aqui
me refiro a todos os membros do grupo, incluindo eu – numa comunidade de aprendizes, o
estímulo será quase incrível. Libertar a curiosidade; permitir que as pessoas assumam o encargo
de seguir em novas direções ditadas por seus próprios interesses; desencadear o senso de
pesquisa; abrir tudo a indagação e a análise; reconhecer que tudo se acha em processo de
mudança – eis uma experiência de que nunca me poso esquecer. Nem sempre é isso realizável
nos grupos com que tenho tido contato, mas quando o é, parcial ou amplamente, torna-se, então,
experiência de grupo dessas de fato inesquecíveis. De tal contexto emergem verdadeiros
estudantes, aprendizes reais, cientistas, eruditos e profissionais com capacidade criadora. Aquela
espécie de pessoas que podem viver num delicado mas sempre mutável equilíbrio entre o que hoje
se conhece e os fluentes, móveis, alteráveis problemas e fatos do futuro.
Eis aí um objetivo a que me dedicarei com todo o entusiasmo. Vejo a facilitação da
aprendizagem como fim da educação, o modo pelo qual desenvolveremos o homem entregue ao
estudo, o modo pelo qual podemos aprender a viver como pessoas em processo. Vejo-a como a
função capaz de sustentar respostas construtivas, experimentadas, mutáveis, em processo, ás
mais profundas perplexidades que assediam.
Mas sabemos como atingir esse novo objetivo da educação ou isso é um fogo-fátuo que
ora aparece ou não, só nos dando, assim, precária esperança real? Minha resposta é que
possuímos conhecimento bem considerável das condições que, em relação à pessoa como um
todo, estimulam a aprendizagem auto iniciada, significativa, experimental, em nível de
profundidade. Não é frequente vermos tais condições levadas a efeito, porque elas importam em
verdadeira revolução no nosso modo de acesso à educação, e as revoluções não são para tímidos.
Podemos, entretanto, como vimos nos capítulos anteriores, encontrar exemplos dessa revolução
em ação.
Sabemos – o que se evidenciará na breve descrição que faremos – que a iniciação de tal
aprendizagem não se baseia nas habilidades de ensinar de um líder, no seu conhecimento erudito
do campo, no planejamento do currículo, no uso de subsídios audiovisuais, na programação do
computador utilizado nas palestras e aulas expositivas, na abundância de livros, embora tudo isso
possa, uma vez ou outra, ser empregado como recurso importante. Não, a facilitação da
aprendizagem significativa baseia-se em certas qualidades de comportamento que ocorrem no
relacionamento pessoal entre o facilitador e o aprendiz.
Chegamos a tais descobertas, no campo da Psicoterapia, mas a sua aplicação nas salas
de aula vai se tornando, por igual, cada vez mais evidente. É mais fácil pensar que o
relacionamento intensivo entre terapeuta e o cliente possui aquelas qualidades; vamos, porém,
descobrindo que também podem elas existir nas incontáveis interações (cerca de 1.000 por dia,
como Jackson mostrou em 1966) entre o professor e os seus alunos.
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Qualidades que facilitam a aprendizagem
Quais são essas qualidades, essas atitudes, que facilitam a aprendizagem?
Descrevê-las-emos, muito brevemente, com ilustrações tiradas do campo de ensino.
Autenticidade do Facilitador de Aprendizagem
Talvez a mais básica dessas atitudes essenciais seja a condição de autenticidade.
Quando o facilitador é uma pessoa real, se se apresenta tal como é, entra em relação com o
aprendiz, sem ostentar certa aparência ou fachada, tem muito mais probabilidade de ser eficiente.
Isto significa que os sentimentos que experimenta estão ao seu alcance, estão disponíveis ao seu
conhecimento, que ele é capaz de vivê-los, de fazer deles algo de si, e, eventualmente, de
comunicá-los. Significa que se encaminha para um encontro pessoal direto, com o aprendiz
encontrando-se com ele na base de pessoa-pessoa. Significa que está sendo ele próprio, que não
se está negando.
Considerando desse ponto de vista, sugere-se que o professor pode ser real, nos contatos
com seus alunos. Será entusiasta ou entediado, interessado nos alunos ou irritado, será receptivo
ou simpático. Se aceita tais sentimentos como seus, não precisa impô-los aos alunos. Pode gostar
ou não do trabalho do estudante, sem que isso explique ser, objetivamente, bom ou mau professor
ou que o estudante seja bom ou mau. Simplesmente diz o que pensa do trabalho, sentimento que
existe no seu interior. É, assim, para seus alunos, uma pessoa, não a corporificação, sem feições
reconhecíveis, de uma exigência curricular, ou o canal estéril através do qual o conhecimento
passa de uma geração à outra.
(...) Confio em que estou evidenciando que ser autêntico nem sempre é fácil, nem atingível
de uma só vez, mas é básico para a pessoa que quer se tornar aquele indivíduo revolucionário –
um facilitador de aprendizagem.
Apreço, aceitação, confiança
Há outra atitude a realçar nos que empreendem, com êxito, a facilitação de aprendizagem.
Observei-a. Experimentei-a. Como, porém, é difícil saber que termo a designa, usarei diversos.
Penso num como apreço ao aprendiz, a seus sentimentos, suas opiniões, sua pessoa. É um
interessar-se pelo aprendiz, mas um interesse não-possessivo. É a aceitação de um outro
indivíduo, como pessoa separada, cujo valor próprio é um direito seu. É uma confiança básica – a
convicção de que essa outra pessoa é fundamentalmente merecedora de crédito. Designada como
apreço, aceitação, confiança, ou algum outro termo, essa atitude se manifesta de vários modos
observáveis. O facilitador que a possui em grau elevado pode aceitar, inteiramente, o temor e a
hesitação do aluno, quando este se acerca de um novo problema, tanto quanto a sua satisfação ao
ter êxito. Tal professor pode aceitar a ocasional apatia do estudante, suas aspirações caprichosas
de atingir, por atalhos, o conhecimento, tanto quanto os seus disciplinados esforços de realizar os
mais altos objetivos. Pode aceitar sentimentos pessoais que, a um tempo, perturbam ou promovem
a aprendizagem – rivalidade com um companheiro, aversão a autoridade interesse por sua própria
adaptação. O que estamos descrevendo é o apreço pelo aprendiz como ser humano imperfeito,
dotado de muitos sentimentos, muitas potencialidades. O apreço ou aceitação do facilitador em
relação ao aprendiz é uma expressão operacional da sua essencial confiança e crédito na
capacidade do homem como ser vivo. (...)
Compreensão empática
Elemento ulterior, que estabelece clima de aprendizagem auto iniciada, experimental, é a
compreensão empática. Quando o professor tem habilidade de compreender as relações intimas
do aluno, quando tema percepção sensível do modo como o aluno vê o processo de educação e
de aprendizagem, então, cresce a probabilidade de aprendizagem significativa.
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Essa espécie de compreensão é nitidamente diferente da que se verifica na compreensão
avaliativa usual segundo o modelo: “Compreendo o que há de errado com você”. Quando há
empatia sensível, ao contrário, a reação do aprendiz obedece a um padrão que se exprimiria
assim: “até que enfim alguém compreende o que se sente e o que pareço ser sem querer analisarme ou julgar-me. A gora, posso desabrochar, crescer e aprender”.
A atitude de estar na situação do outro, de ver pelos olhos do aluno, quase não se
encontra numa salada de aula. Pode-se dar atenção a centenas de interações de uma sala de aula
usual, sem deparar com uma instância de compreensão empática, claramente comunicada,
sensivelmente exta. Mas quando essa ocorre, verifica-se um enorme efeito de libertação.
(...) Outros exemplos citados mostram como os alunos ficam profundamente reconhecidos
ao serem apenas compreendidos – não avaliados, nem jugados, compreendidos simplesmente do
seu, não do ponto de vista do professor. Se qualquer professor tomar para si a tarefa de empenharse em dar uma resposta empática, não-avaliativa, mas de aceitação, por dia, aos sentimentos
demonstrados ou verbalizados pelos alunos, creio que descobriria o potencial desse tipo de
compreensão, de ordinário quase inexistente.
Quais as bases das atitudes de facilitação?
Uma perplexidade
É natural que nem sempre se assumam as atitudes que acabamos de descrever. Alguns
professores levantam o problema: “Mas se não me sinto empático, se, em dado momento, não
tenho apreço, nem receptividade ou estima pelos meus alunos! Que ocorrerá?”. Respondo que a
autencidade é a mais importante das atitudes que mencionei e não foi por acaso que comecei
minha exposição por essa atitude. Assim, se alguém tem escassa compreensão do mundo interior
do aluno, não gosta dele ou de seu comportamento, é quase certamente mais construtivo ser real
do que pseudo-empático ou do que exibir a máscara de quem interessa por ele.
Mas isso não é tão simples quanto parece. Ser autêntico, ou honesto, ou congruente, ou
real, significa ser dessa maneira em relação a si próprio. Não posso ser real para com o outro,
porque não sei o que é real para ele. Só posso dizer – se quero ser verdadeiramente honesto – o
que se passa em relação a mim. (...)
Alonguei-me um pouco no esclarecimento desse ponto, por que sei, por experiência, que
acentuar o valor de ser real, de apropriar-se cada um de seus sentimentos, muitas vezes se toma
como licença para formular juízos sobre os outros, para projetar nos outros todos os sentimentos
tidos como “próprios”. Nada poderia ser tão oposto ao que quero significar.
Na verdade, atingir a qualidade de real é, as mais das vezes, difícil e, mesmo quando se
quer ser, de fato, autêntico, isto só raramente ocorre. Não é, certamente, mera questão de palavras
e não ajudará muito alguém considerar judicioso o uso de uma fórmula verbal, que soa como
participação de sentimentos. Tratar-se-á, exatamente, de outro aspecto de disfarce, de falta de
autenticidade. Só aos poucos aprenderemos a ser verdadeiramente reais. Antes de tudo, importa
sermos precisos em relação aos nossos sentimentos, capazes de ter consciência deles. Então,
devemos concordar em assumir o risco de evidencia-los tais como são, em nosso íntimo, não os
disfarçando, nem atribuindo-os a outras pessoas. Eis por que admiro tanto a maneira como a
senhorita Shiel expôs sua zanga e frustração, sem, de modo algum, disfarçá-las.
Confiança no Organismo Humano
Seria de todo improvável pudesse alguém assumir as três atitudes descritas ou aventurarse a ser um facilitador de aprendizagem se não começasse por ter uma profunda confiança no
organismo humanos e nas suas potencialidades. Se desconfio do ser humano, antes devo
empanziná-lo de informações da minha própria escolha, a fim de que não tome um caminho
errado. Mas se acredito na capacidade de cada um desenvolver sua potencialidade individual,
proporcionar-lhe-ei todas as oportunidades e lhe permitirei a escolha de vias próprias e sua direção
pessoal na aprendizagem.
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Viver a Incerteza da Descoberta
Creio ser preciso dizer que essa visão do homem, basicamente confiante, assim como as
mencionadas atitudes em relação aos alunos não surgem subitamente, de algum modo miraculoso,
no facilitador de aprendizagem. Ao contrário, dependem de riscos a assumir, da ação a exercer
sobre hipóteses experimentais. Isto está bem claro no capítulo em que descrevemos o trabalho da
senhorita Shiel; atuando sob hipóteses de que não estava segura, arriscando-se incertamente por
novas vias de relacionamento com seus alunos, acabou descobrindo que os novos processos se
confirmavam através do que ocorreu na sua sala de aula. Estou convencido de que o professor
Faw passou por idêntico tipo de incerteza. Quanto a mim, só posso afirmar que iniciei a minha
carreira com a firme convicção de que as atitudes descritas, com a confiança nos indivíduos nelas
implícitas, foi apenas porque as considerei, mais que outras quaisquer, capazes de gerar
aprendizagem e produzir mudança construtivas. Daí aminha crença de que só correndo o risco de
novos caminhos pode o professor descobrir por si mesmo, se é ou não eficiente se aquele novo
caminho lhe convém ou não.
Chegarei, assim, a uma conclusão, com fundamento nas experiências dos diversos
facilitadores e de seus alunos até esta altura mencionados. Quando um facilitador cria, mesmo em
grau modesto, um clima se sala de aula caracterizado por tudo que pode empreender de
autenticidade, apreço e empatia; quando confia na tendência construtiva do indivíduo e do grupo;
descobre, então, que inaugurou uma revolução educacional. Ocorre uma aprendizagem de
qualidade diferente, um processo de ritmo diverso, com maior grau de penetração. Sentimentos –
positivos, negativos, difusos – tornam-se uma parte da experiência de uma sala de aula.
Aprendizagem transforma-se em vida, e vida mais existencial. Dessa forma, o aluno, com
entusiasmo, ás vezes, relutantemente, em outros casos, comporta-se como alguém que está
passando por uma aprendizagem, por uma certa mudança. (...)
O efeito sobre o professor
Voltar-me-ei, agora, para uma outra dimensão que me estimula. Tenho falado do efeito
sobre o aluno de um clima que me encoraja a aprendizagem significativa, autoconfiante, pessoal.
Mas nada disse ao efeito reciproco sobre o professor. Quando este se torna agente da libertação
de tal aprendizagem auto iniciada, verifica que ele próprio mudou, tanto quanto o aluno. (...)
Idealista demais?
Alguns leitores podem achar que o modo global de encarar o tema deste capítulo – a
convicção de que os professores podem relacionar-se, como pessoas, com seus alunos – é
irremediavelmente irrealista e idealista. Podem ver que, em essência, se trata de encorajar tanto
professores quanto alunos a serem criativos no seu relacionamento uns com os outros e com a
matéria em estudo e acham que atingir tal objetivo é praticamente impossível. Nesse modo de ver
não estão sozinhos. Já ouvi especialistas de importantes escolas de ciência e eruditos de
importantes universidades argumentarem que é um absurdo tentar estimular todos os estudantes a
serem criativos – precisamos é de uma multidão de técnicos e de trabalhadores medíocres e, se
uns poucos cientistas ou artistas emergem, isto já será o bastante. Pode ser o bastante para eles.
Pode ser o bastante para convir com estes ou aqueles. Quero ir ao extremo de afirmar que não é
bastante para mim. Quando me capacito do inacreditável potencial do estudante comum, quero
tentar a sua libertação. Estamos trabalhando, duramente, para liberar a incrível energia do átomo e
do núcleo do átomo. Se não dedicarmos tal esforço – sim, e igual dinheiro – a libertação do
potencial de cada indivíduo, então, a enorme discrepância entre o nosso nível de recursos da
energia física e dos recursos da energia humana fadar-nos-á uma universal e merecida destruição.
Lamento não poder ser friamente cientifico a esse respeito. O problema é urgente demais.
Só posso ser apaixonado na minha afirmação de que a pessoa humana tem de ser levada em
conta, que relações interpessoais importam muito, que sabemos algo sobre a libertação do
potencial humano, que podemos aprender muito mais, e que, se não dermos atenção intensamente
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positiva ao lado humano interpessoal do nosso dilema educacional, a nossa civilização estará a
caminho da exaustão. Melhores cursos, melhores currículos, abrangência mais ampla, melhores
mecanismos de ensino jamais resolverão o nosso dilema, na sua base. Somente as pessoas
atuando como pessoas no seu relacionamento com os alunos, podem eventualmente começar a
produzir certa abertura no mais urgente problema da moderna educação.
Sumário
Tentemos expor, um tanto mais calma e sobriamente, o que dissemos como tal emoção e
arrebatamento.
Afirmei que é mais infeliz a maneira como educadores e o público pensam e focalizam o
ato de ensinar. Isto os leva a uma multidão de questões, irrelevantes umas, absurdas outras, no
que se refere a educação real.
Disse que se focalizarmos a facilitação de aprendizagem – como, porque e quando os
alunos aprendem, e como a aprendizagem parece ser e é sentida como vinda de dentro –
poderíamos estar no caminho mais certo.
Sustentei que possuímos algum conhecimento e poderíamos obtê-lo ainda mais sobre as
condições que facilitam a aprendizagem, e que uma das mais importantes dessas condições é a
qualidade da atitude assumida no relacionamento interpessoal do facilitador e do aprendiz. (Há
outras condições, a mais, que tentarei evidenciar posteriormente.)
Tais atitudes, que se afiguram eficazes no promover aprendizagem, podem ser descritas.
Antes de tudo, a transparente autenticidade do facilitador, a disposição de ser uma pessoa, de ter e
de viver os sentimentos e as ideias do momento. Quando essa autenticidade inclui um apreço, uma
solicitude, uma confiança e um respeito pelo aprendiz, o clima favorável à aprendizagem se
intensifica. Quando inclui uma sensível, cuidadosa, empatia capacidade de ouvir, então, existe, na
verdade, um clima de liberdade, uma aprendizagem e um progresso estimulantes e autoiniciados.
Confia-se no desenvolvimento do aluno.
Tentei deixar claro que as pessoas que assumem tais atitudes, e têm coragem suficiente
para agir com fidelidade a elas, não modificam simplesmente, os métodos de ensinar – na verdade
os revolucionam. Quase não exercem as funções de professores. Já não conviria mais chamar-lhes
professores. São catalizadores, facilitadores que proporcionam, aos alunos, liberdade, vida,
oportunidade de aprender.
Evidenciei, através de sucessivas pesquisas, a sugestão de que as pessoas que assumem
tais atitudes são consideradas mais eficientes, na sala de aula; que os problemas que lhes dizem
respeito são os de fazer com que se liberte a potencialidade dos seus alunos, não os que se
referem ás deficiências destes; que eles parecem criar situações, nas salas de aula, nas quais não
há crianças a quem se admire e crianças de quem se desgoste, mas em que a afeição e a estima
constituem uma parte da vida de cada criança; que nas classes em que vigora tal clima psicológico,
as crianças aprendem mais matérias convencionais.
Mas, intencionalmente, fui além dos achados empíricos, para tentar fazer com que se
entre na vida íntima do aluno – dos cursos primários, universitários ou de pró- graduação – que têm
a sorte de viver e de aprender em tal relacionamento interpessoal com facilitadores, a fim de que
se veja a aprendizagem é sentida, quando ela é livre, auto iniciada e espontânea. Tentei mostrar
como se modifica até mesmo a relação aluno para com aluno – tornando-se mais consciente, mais
cuidadosa, mais sensível, ao mesmo tempo em que se expande a aprendizagem autorrelacionada
de matéria provida de significação. Referi-me á mudança que também se processa no professor.
Em síntese, tentei indicar que se queremos ter cidadãos capazes de viver,
construtivamente, no presente mundo em mudança caleidoscópica, só o teremos se nos
dispusermos a fazer dele aprendizes auto estimulantes e auto iniciados. Finalmente, foi o meu
propósito mostrar que essa espécie de aprendiz se desenvolve melhor, tanto quanto o sabemos
num relacionamento pessoa a pessoa que promova, que facilite o crescimento.
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Anexo 4 – Tema 2015: O meu, o seu, o nosso. O relacionamento