Práticas escolares dos professores do
Grupo Escolar Paula Rocha - Sabará - 1939-1944
Fernanda Cristina Campos da Rocha.∗
Francisca Izabel Pereira Maciel.∗
RESUMO: O conteúdo deste trabalho insere-se no campo temático da História das
Instituições Educacionais. Tem como tema as questões relativas à história da
instituição do campo pedagógico no processo de escolarização da sociedade
sabarense, constituída no tempo, através de diferentes práticas e alguns personagens
voltados para a organização escolar. A fonte principal deste trabalho são as Atas das
Reuniões Pedagógicas do GEPR (1939-1944), além da Legislação da “Instrução
Publica” do período, os jornais em circulação na época, os textos originais citados nas
atas e o depoimento de professoras do GEPR que lecionaram nesse período.
Palavra-chave: História das Instituições, práticas escolares, reuniões pedagógicas.
ABSTRACT: The contents of this job is inserted in the theme History of the
Educational Institutions. The job has as subjects questions related to the history of the
institution regarding to the teaching of the process of creation of schools in Sabará,
constituted through different practices and some characters responsible for the
school organization. The main resources of this job are the documents of the
pedagogical meetings of GEPR (1939-1944), besides the law of the Public Instruction
of the period, the newspapers of that years, the original texts of the documents
mentioned and the statement of the teachers of GEPR who taught in that time.
Key words: history of the institutions, school practices – pedagogical meetings.
∗
GEPHE (Grupo de Estudos e pesquisas em História da Educação) / Faculdade de Educação/
UFMG/ Bolsista de Iniciação Científica/ [email protected]
∗
GEPHE (Grupo de Estudos e pesquisas em História da Educação)/ Faculdade de Educação/ UFMG/
Professora Doutora/ [email protected]
1
Esta comunicação insere-se no Projeto Integrado de Pesquisa intitulado:
“Escolarização, culturas e práticas escolares: investigações sobre a instituição do
campo pedagógico em Minas Gerais (1750-1950)” que vem sendo desenvolvido pelo
Grupo de Estudos e Pesquisas em História da Educação – GEPHE – da Faculdade de
Educação/ UFMG.
O conteúdo deste trabalho insere-se no campo temático da História da
Educação, mais especificamente relacionado à História das Instituições Educativas. A
investigação é um recorte referente ao Grupo Escolar Paula Rocha – Sabará. A
delimitação temporal se reporta ao período politicamente chamado de República,
mais especificamente 1939-1944.
O trabalho que ora apresentamos tem sido desenvolvido no esforço de
compreender o movimento de paulatina afirmação e institucionalização do processo
de escolarização da sociedade sabarense, constituída no tempo, através de diferentes
práticas e alguns personagens (professores (as), alunos (as), diretores (as)) voltados
para a organização escolar.
Os tempos que se seguiram à Proclamação da República frustraram
expectativas: a instabilidade econômica e política se materializavam pelas ruas da
cidade, sendo visível na miséria e na presumida ignorância da população,
principalmente aquela mais pobre. Tais questões fortaleceram a crença de políticos e
intelectuais de que a constituição de uma nova Nação, nos moldes dos ideais
republicanos dependia, em boa medida, de se lançar mão da escola como um recurso
civilizatório. Dessa maneira, o cenário da educação sofre algumas mudanças e Minas
Gerais não estaria fora.
A pretensão exigia um novo modelo escolar, não mais pautado nas escolas
isoladas. FARIA FILHO (1996) afirma que a representação dos grupos escolares foi
construída tendo como uma de suas bases a produção das escolas isoladas como
símbolo de um passado que deveria ser ultrapassado, quando não esquecido. Este
desejo começou a se configurar com a Reforma do Ensino primário de 1906: A
Reforma João Pinheiro. Esta traz uma grande novidade: a instalação dos Grupos
Escolares, visto como a possibilidade de preparar os sujeitos dentro da nova
realidade que se instaurava: a vida republicana.
A criação dos Grupos Escolares, trouxe um novo modelo de escolarização.
Esse novo molde escolar foi determinante para a constituição paulatina de seu campo
disciplinar. Para tanto concorreram, dentre outros motivos, a introdução do ensino
seriado, com quatro anos de duração; a constituição de turmas com alunos de idade
homogênea; a conformação e prescrição de um programa de ensino; a definição de
horários específicos e a previsão de construção de espaços para a sua realização.
Nesse movimento, aparece também uma discussão inicial, que envolve os agentes
escolares, sobre a pertinência de se ter um professor(a) especificamente responsável
pela série. A escola, muito mais do que ensinar a ler, escrever e contar, deveria impor
novos hábitos culturais às crianças e também prepará-las para o trabalho (FARIA
FILHO,1996).
É necessário dizer que essa mudança não ocorreu de forma simples e
harmônica. Em Minas Gerais, a escola não se impôs com facilidade, prova disso é a
2
baixa freqüência que se via nos grupos, como relatavam os inspetores escolares.
Porém, apesar das tensões é preciso ressaltar que a Reforma João Pinheiro inaugura
um forte movimento de afirmação da escola que se estende por todo século XX.
Oliveira e Gatti Junior (2002) afirmam que as investigações no campo da
História da Educação têm passado por algumas mudanças nestes últimos tempos.
Entre essas mudanças destaca-se a possibilidade de se ter um olhar mais abrangente
sobre os espaços que são destinados à educação escolar e, ao mesmo tempo, permite
buscar as especificidades e as singularidades existentes em cada instituição
educativa.
Conhecer as singularidades da Instituição Educacional em questão – Grupo
Escolar Paula Rocha da cidade de Sabará/ MG – é dar visibilidade aos vários atores
que estão envolvidos nela e investigar o que se passa em seu interior. Porém, é
necessário levarmos em consideração, as relações desta instituição com a
comunidade sabarense.
Além disto, este trabalho busca uma interligação das especificidades da
instituição às questões maiores da História da Educação Brasileira. Segundo Oliveira
e Gatti Junior:
Historiar uma instituição educativa tomada na sua pluridimensionalidade, não
significa laudatoriamente descrevê-la, mas explicá-la e integrá-la em uma realidade
mais ampla, que é o seu próprio sistema educativo. (...) Neste sentido, é significante
privilegiar as novas interpretações que realçam a História Regional, objetivando fazer
a ponte entre a totalidade e a singularidade.(...) Assim, historiar uma instituição
educativa carece não perder de vista sua especificidade, mas, ao mesmo tempo,
compreender sua totalidade. (2002, p.74)
Temos como proposta fazer uma pesquisa sobre uma instituição educativa que
contemple as conflitualidades internas da instituição em questão e suas práticas
cotidianas. Compartilhamos com a idéia de Peres (2000) quando diz que as práticas
escolares são todas as vivências, as experiências e as ocorrências escolares, ou seja,
todas as práticas cotidianas construídas no interior da escola, entretanto mantêm
uma relação direta com o mundo exterior. A autora também destaca as dificuldades
para o pesquisador que se propõe a fazer um estudo que contemple essa perspectiva,
isto é, o interior das escolas, o universo da sala de aula está rodeado de silêncios.
Neste sentido, os arquivos escolares são de grande importância na tentativa de
(re) construir o cotidiano escolar, e por isso merecem uma atenção especial. Eles
guardam uma documentação significativa sobre a história da escola.
Para conhecermos o interior do Grupo Escolar Paula Rocha e a sua
importância frente à sociedade sabarense, estamos realizando um levantamento de
toda a documentação alocada nesta instituição, dentre os quais destacam-se: livro de
matrícula, livro de ponto, termos de visitas, livros de posse, inventários, termos de
exames, termos de instalação dos trabalhos do grupo.
Uma pesquisa é mais rica e confiável quanto maior for a quantidade e tipos de
fontes a que se recorre e com quanto maior rigor tenha sido feito o trabalho de
cruzamento e confronto entre elas. Quanto maior o número e diversidade de
3
documentos, maior a possibilidade de explorá-las, entendê-las e assim produzir o
conhecimento sobre o tema proposto. O cruzamento entre as fontes é importante na
medida em que ajuda a controlar a subjetividade do pesquisador. (LOPES &
GALVÃO, 2001).
Além desse acervo, estamos inventariando os documentos que se encontram
na Casa Borba Gato, da cidade de Sabará. A localização de fontes para a pesquisa
estende-se para o Arquivo Público Mineiro (APM), localizado em Belo Horizonte.
Nele estão guardados 18 relatórios produzidos pelos diretores do Grupo Escolar
Paula Rocha, do período de 1907 a 1918, já inventariados.
Ao levantarmos a documentação encontrada nos arquivos do Grupo Escolar
Paula Rocha, encontramos um caderno que nos chamou muito a atenção: O livro de
atas das reuniões quinzenais do pessoal administrativo e docente do Grupo
Escolar Paula Rocha. É esta fonte que iremos privilegiar neste trabalho que tem
como objetivo fazer uma análise das reuniões pedagógicas do grupo. Esta ainda será
parcial, visto que, este trabalho está apenas iniciando.
Problematizar as atas das reuniões pedagógicas do Grupo Escolar Paula Rocha
justifica-se para que se reflita sobre as características, a formação e aperfeiçoamento
do professor que atuava nos grupos escolares, bem como indagar sobre as
qualidades que se esperava de um bom professor no período analisado, além de
possibilitar a reflexão sobre as relações discursivas do pedagógico e as práticas
docentes no Grupo Escolar Paula Rocha. Outra possibilidade é pensar na
interferência do Estado (Estado Novo) nas práticas escolares do Grupo Escolar Paula
Rocha.
Um estudo desta natureza também nos aproxima do cotidiano de um
importante grupo mineiro, permitindo conhecer seus impasses, problemas e
encaminhamentos feitos pelo corpo docente no que diz respeito, por exemplo, à
disciplina e a caixa escolar, além de valorizar sujeitos históricos que tradicionalmente
vinham sendo ocultados e de consolidar um campo que ainda foi pouco explorado
que é a História das Instituições Escolares. Assim este trabalho pretende ser uma
contribuição para uma história das práticas pedagógicas da escola primária mineira.
A História do Grupo Escolar Paula Rocha:
A precariedade em que se encontravam as cadeiras da cidade de Sabará antes
da criação do grupo era freqüentemente debatida e relatada em diversas fontes
analisadas, entre elas jornais locais e relatórios de inspetores técnicos. A necessidade
de se criar um grupo escolar na cidade de Sabará era motivo de discussões políticas e
mobilizava a sociedade sabarense. As cadeiras isoladas que não tinham instalações
adequadas e o fato de haver um único professor para atender aos diferentes níveis de
ensino dos alunos, estavam entre as dificuldades apontadas.
A seguir apresentamos um fragmento do relatório encontrado no Arquivo
Público Mineiro, que data de 4 de maio de 1907, antes da inauguração do grupo, em
4
que o inspetor técnico José Ferreira D’ Andrade, descreve as dificuldades
encontradas pelas professoras para ministrar o ensino nas escolas isoladas e afirma
ter conhecido o local onde o Grupo funcionaria e diz que com a criação deste, que era
ansiosamente esperada pela população da cidade, as dificuldades encontradas nas
cadeiras isoladas desapareceriam e que o grupo seria convenientemente instalado,
sendo vastos seus salões.
Comecei a inspecção pela cadeira regida pela Exma. Snra. D. Maria José de
Azeredo Coutinho, cujo ensino fora há pouco restaurado e que foi installado a 21 de
março. Escola suburbana, do bairro denominado Lagôa Secca, funcciona na sala
principal da casa de residencia da professora, com as dimensões de 5m x 4,50.(...) A
mobilia escolar consta de quatro bancos e a mesa da professora emprestada pela
Comarca Municipal. O único utensilio é o quadro-negro. No dia seguinte, isto é, a 23
de abril fui ao bairro de N.S. do Ó, visitar a escola mixta regida pela Exma. Sra. D.
Anna Camilla do Nascimento. (...) A mobilia, deficiente, também consta de duas
carteiras isoladas e 6 bancos lisos. No dia 25 fui visitar a escola mixta da Ponte
Grande, regida pela Exm. Sra. D. Francisca de Assis Gomes Baptista. Por falta de uma
sala conveniente no bairro da Ponte Grande, com auctorisação do Inspector Municipal,
a professora mudou a escola para um vasto salão, no pavimento inferior do edificio em
que funccionou a Escola Normal e que está sendo adaptado para o Grupo Escolar de
Sabará. A sala estava insufficientemente mobiliada. Aproveitei o ensejo e nesse dia fui
conhecer a parte superior do edificio que está sendo preparada para o Grupo Escolar. O
sr. Luiz Candido Pereira, intelligente operario, incumbido de executar as modificações,
conforme a planta do digno Engenheiro o Sr. Dr. José Dantas, mostrou-me os vastos
salões e mais dependencias e tive prazer verificando que o Grupo vae ficar
convenientemente installado. (...) Felizmente com a creação do Grupo Escolar que é
anciosamente esperada pela população desta cidade, desapparecerão estas difficuldades.
Será mais um beneficio prestado pelo benemerito Governo a esta velha cidade,
digna do auxilio dos poderes publicos. Sabará, 4 de maio de 1907. José Ferreira
D`Andrade Inspector techinico da 1a circunscripção.1
O Grupo Escolar de Sabará, criado em 22 de junho de 1907, foi o terceiro
grupo a ser criado em Minas Gerais, no Governo João Pinheiro, sua criação se deu
com a reunião de seis cadeiras existentes na região. Segue o decreto N. 2040 que cria
o grupo:
O Presidente do Estado de Minas Geraes, de conformidade com o disposto no
artigo 22, combinado com o artigo 45 do regulamento que baixou com o decreto n.
1960, de 16 de dezembro de 1906, considerando que é necessária a diffusão do ensino
publico primário de accôrdo com os novos methodos adoptados, resolve, para execução
do artigo 4° da lei n. 439, de 28 de setembro daquelle anno, crear o Grupo Escolar da
cidade de Sabará.
Palacio da Presidencia do Estado de Minas Geraes, em Bello Horizonte, 22 de junho de
1907.
João Pinheiro da Silva.
Manoel Thomaz de Carvalho Britto.2
No dia 8 de julho de 1907 o tão esperado Grupo Escolar de Sabará foi
inaugurado. O corpo docente constava de oito educadores permanentes: o diretor
5
Sr. Francisco Antunes de Siqueira e as professoras Rita Cassiana Martins Pereira,
Maria da Conceição Moreira, Maria Ursula de Vilhena Moraes, Emilia Luiza de
Lima, Francisca de Assis Gomes Baptista, Maria José de Azeredo, Maria Luiza de
Menezes e o Sr. José Augusto Rocha. A matrícula registrava o número de 340
alunos em dezembro do mesmo ano.
O Grupo Escolar de Sabará teve este nome por pouco tempo. Em um relatório
de 1911, já encontramos o nome Grupo Escolar Paula Rocha, em homenagem ao
professor Séptimo de Paula Rocha.3
É interessante observar que no mesmo ano em que ocorreu a inauguração do
Grupo Escolar, as instalações estavam sendo alvo de críticas por parte dos
inspetores e da diretora, com a ressalva de que o grupo havia sido fundado a
pouco. Os inspetores de ensino que o visitavam, afirmavam que o prédio
precisava de reforma, para atender os requisitos de um grupo escolar. As
observações críticas centravam-se, principalmente, nas questões higiênicas, na
falta de ventilação e na falta de espaço para o número de alunos, importantes
aspectos na época. Os trechos abaixo, retirados de dois relatórios de dezembro de
1907 – do inspetor técnico Arthur Queiroga, encontrados no Arquivo Público
Mineiro, comprovam a afirmação:
O edificio escolhido, se não satisfaz as exigencias architetonicas prescriptas pela
hygiene escolar, constantes do art 1o do Regim. Interno, é todavia toleravel até novos
trabalhos de adaptação, por ser um dos melhores da cidade, em situação e dimensões.‘É
tolerável até novos trabalhos de adaptação’, dissemos acima, porque há a se fazer em
seus salões, em o lado posterior, concertos que consultão com a necessidade superior do
arejamento e illuminação.4
Não implicão affirmação absoluta os termos com que aprecio a vida do grupo. A
apreciação está feita sob o ponto de vista do tempo e das condições delicadas do
organismo, fundado hontem, pode-se dizer, por determinação de urgencia indicada a
cura do meio educativo mineiro.Carece de muita cousa ainda para attingir o ponto dos
desejos geraes: - a perfeição com os melhores modelos.5
Porém, no final de 1911, as reclamações feitas à arquitetura do grupo ainda
persistiam, a diretora do grupo neste ano, a professora Maria José dos Santos Cintra,
em um de seus relatórios, enviado ao Secretário do Interior, afirmava que o edifício
escolar não oferecia as condições higiênicas e pedagógicas exigidas no período, pois
os salões da parte inferior do grupo, em que funcionavam algumas das salas de aula,
não eram ventiladas e possuíam pouca iluminação. Segue o trecho do relatório em
que a diretora reclama do edifício escolar:
Antiquissimo e construído segundo os velhos processos architectonicos, não
offerece o edificio do Grupo as condições hygienicas e pedagogicas, que possam
corresponder cabalmente as exigências modernas (...), carecendo em tanto de alguns
retoques e de uma limpeza geral. Para esse fim mandei orçar, por um profissional, os
concertos de que carece os quaes em officio de 30 de dezembro findo, submetti a
apreciação de V. Ex e solicitei a necessaria auctorisação para a execução dos respectivos
trabalhos.6
6
Essas reclamações a respeito do prédio escolar onde funcionava o grupo
permaneceram por muitos anos. Encontramos em vários relatórios reclamações sobre
o edifício e pedidos de verba para alguns reparos e consertos. O Grupo Escolar Paula
Rocha funcionou como Escola Anexa da Antiga Escola Normal Delfim Moreira até
1925, ano em que foi transferido para um novo prédio, onde até hoje funciona sua
sede. A partir de então, as reclamações passaram a ser menos freqüentes.
Hoje, com o nome “Escola Estadual Paula Rocha”, possui farta documentação
guardada desde a época de sua inauguração. No desenvolvimento do trabalho como
bolsista pude constatar que ele possui um acervo de documentos preciosos para a
história da educação mineira, cuidadosamente guardados ao longo do tempo. A
começar por sua arquitetura — já ela mesma um patrimônio a revelar o movimento
educativo que nos interessa, lá encontramos em uma bela Sala – denominada no
período abordado de Salão Nobre – objetos de inestimável valor: mobiliário e
utensílios escolares do início do século XX (dentre outros: mesas, carteiras, cadeiras,
piano, escrivaninhas, quadros, mapas, fotografias de diretores, escarradeiras de
lousa, etc), além de documentos produzidos pelo corpo docente do Grupo (livros de
registro das solenidades de início e encerramento de cada ano letivo; atas de
reuniões; livro de assinatura de ponto de professores, estagiários e funcionários; livro
de registro de visitas; livro de notas; livro de registro de atividades escolares; livro de
atas de provas, etc). Manusear essas fontes certamente possibilitará uma nova
aproximação da cultura escolar que se instituiu em Minas, e em especial, nesta
escola.
Considerações Parciais.
Como já dissemos anteriormente apresentaremos neste trabalho uma análise
do livro de atas de reuniões pedagógicas do Grupo Escolar Paula Rocha no período
de 1939-44. Utilizando os trabalhos mais recentes da História das instituições e
leituras que remetem à História Cultural é que pretendemos fazer a análise das atas.
Trabalhar com a História Cultural traz a possibilidade de trabalhar com fontes não
oficiais, na tentativa de reconstruir as práticas escolares cotidianas do Grupo Escolar
Paula Rocha, como as reuniões pedagógicas. Esta abordagem é de extrema
importância na medida em que com essa nova linha de pesquisa é possível
considerar “a ‘experiência’ dos homens, em seu tempo e lugar, crucial para o
entendimento dos processos sociais” (Gomes,1998). Analisar as atas das reuniões
pedagógicas do Grupo Escolar Paula Rocha nesta perspectiva possibilita-me observar
as práticas sociais de um Grupo Escolar, sem perder de vista a totalidade, visto que o
individual não se opõe ao coletivo e sim está inserido neste. Na História da Educação
é necessário ter um olhar que permita conhecer a singularidade das diferentes
práticas educativas.
A perspectiva da História Cultural, principalmente os trabalhos de Chartier
nos coloca a possibilidade de pensar a relação entre as imposições dos discursos
7
pedagógicos presentes no período analisado e a forma de apropriação destes pelas
professoras do Grupo Escolar Paula Rocha.
O conceito de apropriação é central para o nosso estudo, uma vez que coloca o
seguinte questionamento: como as professoras do Grupo Escolar Paula Rocha
recebiam as imposições e as ordens vinda do (a) diretor (a) e como elas tratavam
essas imposições em sua prática cotidiana, no interior das salas de aula? Sabe-se que
um conjunto de imposições pedagógicas é determinado, tendo em vista um projeto
social e a construção de um determinado sujeito, porém, através do conceito de
apropriação, é possível investigar se as professoras levavam a efeito essas
imposições. É também conhecer as mediações que as professoras faziam entre as
imposições da diretoria/inspetoria e os espaços da sala de aula.
No processo da pesquisa de campo o livro de Reuniões Pedagógicas de
professores do GEPR foi localizado no arquivo da Escola Estadual Paula Rocha
(nome atual do grupo). Na realidade, trata-se de um caderno de capa dura, pautado,
com todas as folhas rubricadas pelo diretor e assinadas pela professora responsável
por secretariar a reunião do dia. Possui 51 atas, sendo a primeira registrada em
03/06/1939 e a última em 02/09/1944. Apesar de encontrarmos na capa do caderno,
o título “Atas das Reuniões Quinzenais do Pessoal Administrativo e Docente do
Grupo Escola Paula Rocha”, as reuniões não aconteciam de quinze em quinze dias.
Muitas vezes elas eram realizadas mensalmente, como mostra o quadro geral das
reuniões realizadas no período de 1939-1944, que apresentaremos a seguir:
8
Ano Jan
/
mês
1939
1940
1941
1942
1943 x
1944
Total 01
Fev
x
01
REUNIÕES NO GEPR – 1939-1944
Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out
x
x
x
xx
xxx
08
x
x
x
xx
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
04
04
05
05
xx
x
x
xx
xx
xx
07
xx
x
x
x
x
06
x
x
xx
xx
xx
08
Nov Dez total
xx
02
06
09
10
10
12
04
51
Ao encontrar bem como analisar essa fonte deparamo-nos com vários
questionamentos, entre eles destacamos: quais seriam as razões para a realização
dessas reuniões? Ainda estariam em vigor as recomendações propostas no
Regulamento Primário de 1927, e nesse caso porque não encontramos no Grupo as
Atas anteriores referentes aos anos 30? No Regulamento Primário de 1927, capítulo I,
artigo 436, parágrafo 6 – dos deveres dos diretores de grupos e escolas reunidas traz
a determinação: “organizar e dirigir o dia da leitura dos professores, instituído no art. 437,
n.11, abrindo e encerrando o livro de ponto” e no art.437, n.11, que trata dos deveres dos
professores:
Observar o dia de leitura, às quintas-feiras, reunindo-se na bibliotheca do
grupo ou na sala que for designada, dedicando-se, no mínimo duas horas, a leituras,
particularmente relativas a methodo de ensino e outras matérias indispensáveis à
cultura magisteri”.
Ao analisar a legislação de 1927 e o teor das atas das reuniões do Grupo
Escolar Paula Rocha encontramos muita semelhança, pois as reuniões em 1937
seguem a mesma lógica do que foi exigido no regulamento de 1927, porém com
algumas modificações. Como já foi dito, as reuniões passam a acontecer
quinzenalmente, além disto, estas reuniões passam a ter um caráter também
administrativo, além das leituras pedagógicas feitas pelas professoras e a discussão
destas – buscando a formação do professor – o diretor aproveitava para ler circulares
do Governo, cobrar os cadernos de planos de aula e discutir problemas internos do
Grupo como: disciplina, pontualidade dos professores, caixa escolar, freqüência,
exames de alunos, festas escolares, religião (catecismo), uso de uniformes pelos
alunos, dentre outros assuntos.
Com a intenção de qualificar/ aperfeiçoar as práticas docentes e de divulgar
as propostas didáticas é que no início das reuniões pedagógicas, uma das professoras
ou mesmo o diretor do grupo fazia a leitura oral de um trecho ou texto de assuntos
diversos: leitura, escrita, educação moral, aritmética, desenhos, Educação física,
dentre outros. Após a leitura, muitas vezes a professora responsável pela
apresentação, ou o diretor ou ainda, alguma outra professora fazia um comentário
sobre o assunto lido. Esta prática também foi comum no Rio Grande do Sul, como foi
9
possível observar com a leitura da tese de Peres (2000), o que dá indícios de que isto
pode ter sido um fenômeno nacional e não somente mineiro.
Alguns impressos pedagógicos foram importantes “veículos” de divulgação
de propostas didáticas em Minas Gerais. Sem dúvida, a Revista do Ensino de Minas
Gerais foi o de maior penetração entre as professoras do GEPR. Assim, os textos lidos
e discutidos nas reuniões eram em sua maioria retirados desta revista e, entre os
autores dos textos destaca-se o professor Firmino Costa.
Pode-se dizer, dessa forma, que a Revista do Ensino de Minas Gerais e os
comunicados/circulares do Governo foram os mais significativos suportes matérias
de divulgação e difusão das propostas pedagógicas presentes nas reuniões. Estas
foram, sem dúvida, uma importante experiência de leitura como estratégia que fazia
circular entre as professoras do GEPR as idéias pedagógicas presentes no período.
Por fim, podemos dizer, ainda que com uma análise superficial das atas, que o
perfil da professora competente está relacionado com a capacidade desta manter a
disciplina em sala de aula, ser pontual, moralizada e gozar de boa fama (ou seja, ser
escrupulosa, sem vícios, que possua valores que sirvam de modelo para os alunos).
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FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Dos Pardieiros aos palácios: forma e cultura
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1998.
10
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História da Educação em Minas Gerais, Uberlândia/MG, 6 a 9 de maio de 2003.
1
Arquivo Público Mineiro/ Secretaria do Interior. Códice: 3270. Relatorio de Inspecção
techinica/ 1a circunscripção a 6a, maio de 1907.
2
Arquivo Público Mineiro/ Collecção das leis e decretos do Estado de Minas Geraes/ Bello
Horizonte, Imprensa Official do Estado de Minas Geraes, 1907/ Decreto N. 2040, de 22 de
junho de 1907.
3
Séptimo de Paula Rocha foi um ilustre professor que lecionou em escolas sabarenses e teve
um colégio particular com internato, onde funciona hoje o Museu do Ouro. Ele era professor
de latim, literatura, francês e português. Foi também presidente da Câmara Municipal em
1910 a 1913 e fiscal do governo federal.
4
Arquivo Público Mineiro/ Secretaria do Interior. Códice: SI 3270. Relatorio de Inspecção
techinica/ 1a circunscripção a 6a, dezembro de 1907.
5
Idem.
6
Arquivo Público Mineiro/ Secretaria do Interior. Códice: SI 3412. Papeis findos dos grupos
escolares de Sabará 1912 (6ª secção).
11