Mar / 2015
Desembaraço
Informações da indústria como você nunca viu
Ian Bremmer, presidente da Eurasia, escreveu um artigo para a revista Time em que
afirma que o Brasil vive a “tempestade perfeita”. Ele elencou cinco motivos que nos
levam à beira do precipício, mas destes vamos falar especialmente de um – a seca.
Pena essa “tempestade perfeita” estar aplicada no sentido figurado e não contribuir
para o abastecimento de nossos reservatórios.
Vale lembrar que a crise hídrica não traz só efeitos negativos.
Empresas melhoram a eficiência na gestão dos processos para mitigar os efeitos e
pessoas começam a rever seus hábitos de consumo e com isso passam a utilizar o
recurso de forma consciente.
A psicologia classifica esse fenômeno como “resiliência” - uma espécie de fenômeno
evolutivo que nós, seres humanos, possuímos e que permite melhorarmos quando
nos deparamos com situações adversas.
A DesembarAço deste mês busca identificar possíveis consequências da maior crise
hídrica já vivida no Brasil.
Superar a Crise hídrica
é o desafio atual para
as empresas
“Nove em cada dez economistas, de todas as tendências, acham que o maior desafio
da economia brasileira, para voltar a crescer, é recuperar a indústria, que perdeu
exportações e o próprio mercado nacional para os concorrentes estrangeiros” disse
Benjamin Steinbruch – diretor-presidente da CSN.
De fato a indústria precisa viver uma fase de renascimento. Mas se as chances de
tornar real essa necessidade já pareciam remotas em uma conjuntura menos
desfavorável, quão grande deve ser o desafio agora que a região sudeste,
responsável por 58,2% do PIB industrial nacional, passa por sua maior crise hídrica
dos últimos tempos?
A crise no abastecimento traz efeitos individualizados para os diferentes setores da
indústria. Por outro lado, determinados setores produtivos têm esses
efeitos intensificados devido à maior exposição de seus fornecedores
à crise.
É o caso do setor automotivo que em 2014, segundo dados da
ANFAVEA, produziu 3.0 milhões de unidades de veículos leves.
A FECOMÉRCIO estima que sejam necessários 5.600 litros de água
por unidade produzida, isso quer dizer que só o setor automotivo
consumiu o equivalente a 1,7% (16 bilhões de litros) do volume útil
do Sistema Cantareira na produção de veículos leves.
Considerando o uso da água em toda a cadeia de suprimentos que
compõe um veículo - aço, plástico e borracha, alumínio, vidro
e outros como couro e tecido, esse último o mais exposto a crise
hídrica - o volume de água utilizado é entre 147 mil e 400 mil
litros por unidade produzida.
O quadro abaixo mostra o volume de água utilizado para a produção dos insumos
citados acima:
Consumo Típico
Produto
[Litros]
Em Toda a Cadeia
de Suprimentos
Aço (1kg)
235
Plástico (1kg)
189
Borracha (1kg)
25
Alumínio (1kg)
88
Vidro (1kg)
7
Tecido (1kg)
7.152
Fonte
www.waterneutral.org
www.waterwise.org.uk
www.uol.com.br
Há tempos grandes players do setor automotivo, como é o caso de montadoras
alocadas na região do ABCD, investem no contingênciamento para diminuirem a
dependência de recursos hídricos externos. O plano tem ações como a reutilização da
água usada na pintura das carrocerias, a captação e armazenamento de água das
chuvas e a construção de poços artesianos.
Os riscos que empresas correm ao deixarem de investir em ações para conter a crise
vão além de problemas nas fases de produção. Podem surgir problemas relacionados
a reputação, por conta de interesses público e com as comunidades locais e regulatório.
O desabastecimento dos reservatórios, por outro lado, traz outra preocupação, talvez
ainda mais grave para o setor automotivo: o possível racionamento de energia.
Com uma matriz predominantemente hidrelétrica, as chances de termos racionamento
são reais.
Para se ter ideia, os níveis atuais dos reservatórios já são inferiores se comparado
com os níveis da época do racionamento de 2001.
Vale lembrar que no período mais crítico daquele racionamento, a indústria automotiva
teve queda de 8% da produção no segundo semestre se comparado ao mesmo
período do ano de 2000.
Hoje temos uma indústria com equipamentos mais eficientes no consumo de energia,
montadoras com PCH - Pequenas Centrais Hidrelétricas – como é o caso da
Volkswagen - equipamentos LED, mais econômicos, porém um problema no
fornecimento de energia criaria um obstáculo a mais para um setor que prevê um
aumento de 4,1% na produção com relação a 2014, ano em que a produção de
autoveículos foi 15,3% menor em relação a 2013, muito em razão dos feriados da
Copa do Mundo.
Por outra ótica, se pensarmos que as montadoras não estão operando com total
capacidade instalada, talves os efeitos de um possível racionamento de energia
possam ser minimizados.
Indústria brasileira
andando às cegas
Segundo dados da CNI, o índice de confiança do empresário industrial (ICEI)
registrado em março é de 37,5 pontos, o menor da série histórica iniciada em 1999,
período que antecede a crise energética. Comparado a março do ano passado, a
confiança do empresariado teve queda de 28,6%.
ICEI - Índice de Confiança do Empresário Industrial
58,6
58,4
média histórica: 56,5
Queda de quinze pontos em
doze meses
53,3
52,5
50,0
49,9
44,4
46,4
40,2
37,5
mar
2012
jul
nov
mar
2013
jul
nov
mar
2014
jul
nov
mar
2015
Esse comportamento é reflexo
do fraco desempenho da
indústria, da expectativa de que
o ajuste fiscal vá impactar no
crescimento, da preocupação
com a crise hídrica e o risco
que ela traz para o setor
energético.
O Brasil tem hoje uma das
energias mais caras do mundo.
É o que mostra o quadro abaixo,
elaborado pela Firjan.
Fonte: CNI
Dentre 27 países selecionados, o Brasil tem a terceira tarifa de energia elétrica mais
cara para a indústria, atrás apenas de Índia e Itália.
Comparando com o custo médio dos países selecionados a nossa tarifa é 93,8% maior.
Custo da Energia Elétrica para a Indústria - Países selecionados - 2015
57,63
97,81
120,14
128,23
129,87
275,74
150,35
198,61
188,08
201,48
202,77
216,05
249,5
250,5
253,11
268,76
290,18
200
274,26
318,61
323,56
323,2
391,66
395,16
534,28
414,1
408,91
400
459,38
Valores R$/MWH
600
536,14
596,96
800
Fonte: Firjan
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0
Países
Média Internacional
O impacto do custo da energia elétrica varia de acordo com o setor e o nível
tecnológico de cada unidade produtora. No segmento de alumínio a energia representa
cerca de 35% do custo da produção. A produção do alumínio primário é uma atividade
eletrointensiva e os altos custos da energia do país fizeram com que a Alcoa
suspendesse, no fim de março, as atividades de sua usina de alumínio em São Luís,
no Maranhão. A Alumar era um dos maiores complexos do mundo para produção de
alumínio primário e alumina e o ajuste na linha de produção fará com que a Alcoa deixe
de produzir aproximadamente 740 mil toneladas métricas anuais, o equivalente a 21%
de sua capacidade de produção do metal.
O custo da energia elétrica para a siderurgia é de 15%, o setor prevê queda de 5% na
demanda em 2015, podendo chegar a 10% em caso de racionamento. Segundo o Valor
Econômico, o custo da energia elétrica no setor automotivo é de apenas 1% - mas por
ser um segmento dependente de grande variedade de insumos da indústria o impacto
no custo deve ser maior. No setor de máquinas a compra de energia elétrica e de
combustíveis representam 1,3% do custo total, por outro lado o setor sente os efeitos
da desaceleração do setor de óleo e gás, que representa 15% dos 80 bilhões de reais
em faturamento anual, segundo a Abimaq.
Com o cenário deteriorado, a estimativa para a atividade da indústria brasileira é de
queda de 2,42%, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central. Já a projeção
para o PIB no ano, até o momento, é de retração de 1%.
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Edição de Março 2015