ANDREA MARCIA DE TOLEDO PENNACCHI
A GUERRA FRIA E A POLÍTICA CONTENCIONISTA DE GEORGE KENNAN NO
ESTUDO COMPARATIVO DE UMA ELITE DO PODER
(1945-1950)
ASSIS
2011
2
ANDREA MARCIA DE TOLEDO PENNACCHI
A GUERRA FRIA E A POLÍTICA CONTENCIONISTA DE GEORGE KENNAN NO
ESTUDO COMPARATIVO DE UMA ELITE DO PODER
(1945-1950)
Tese apresentada à Faculdade de Ciências e Letras
de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista,
para a obtenção do título de Doutor em História
(Área de Conhecimento: História e Sociedade)
Orientador: Prof. Dr. Milton Carlos Costa
ASSIS
2011
3
Ficha Catalográfica elaborada pela
Biblioteca “Visconde de São Leopoldo” de Presidente Prudente
P461g
Pennacchi, Andrea Marcia de Toledo.
A guerra fria e a política contencionista de George Kennan no
estudo comparativo de uma elite do poder (1945-1950) / Andrea
Marcia de Toledo Pennacchi. Assis, SP : Universidade Estadual
Paulista, 2011.
161f.
Orientador: Prof. Dr. Milton Carlos Costa.
Tese (Doutorado) - Universidade Estadual Paulista.
Bibliografia: f.144-161
1. Doutrina de Contenção. 2. Elite do Poder. 3. George F.
Kennan. 4. Guerra Fria. 5. Política Externa Norte-Americana. I.
Costa, Milton Carlos. II. Universidade Estadual Paulista. III Título.
CDD 909.829
4
ANDREA MARCIA DE TOLEDO PENNACCHI
A GUERRA FRIA E A POLÍTICA CONTENCIONISTA DE GEORGE KENNAN NO
ESTUDO COMPARATIVO DE UMA ELITE DO PODER
(1945-1950).
Tese apresentada à Faculdade de Ciências e Letras
de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista,
para a obtenção do título de Doutor em História
(Área de Conhecimento: História e Sociedade)
Orientador: Prof. Dr. Milton Carlos Costa
Assis, 25 de fevereiro de 2011.
_________________________________________________
Prof. Dr. Milton Carlos Costa
________________________________________________
Prof. Dr. Clodoaldo Bueno
_________________________________________________
Prof. Dra. Karina Anhezini Araujo
__________________________________________________
Prof. Dr. Francisco Assis de Queiroz
__________________________________________________
Prof. Dr. Angelo Priori
5
AGRADECIMENTOS
É muito difícil expressar em algumas linhas sentimentos de gratidão a todos aqueles que,
cada qual à sua maneira, contribuíram para o processo de criação que culminou neste
trabalho.
No topo da lista, coloco meus pais, Marlene e Milton, os primeiros a incentivar a curiosidade
de uma criança que adorava contar histórias e viver cercada de livros. A meu pai,
especialmente, pelas histórias que descreviam os tesouros de Tutancâmon e a guerra de Tróia,
povoando meu imaginário infantil com heróis da Antiguidade, obrigada!
A meu marido José Roberto e a meus filhos Gabriela, Fabiana e Eduardo, testemunhas fiéis e
vítimas pacientes dos esforços, ansiedades, inseguranças e insaciável sede de conhecimento,
obrigada, sempre.
Aos primeiros professores, Irmã Theolinda, D. Dulce e Prof. Caetano, que me apontaram os
melhores caminhos para conhecer a História, quando ainda mal sabia distinguir as lendas e
mitos de realidades e fatos, muito, muito obrigada.
Ao Prof. Dr. Clodoaldo Bueno, que há mais de sete anos atrás generosamente me acolheu e
me ajudou, nem sempre da forma mais fácil, a distinguir a ciência da ficção e a buscar a
excelência acadêmica em tudo o que procurasse escrever, nunca poderei ser grata o suficiente.
Ao meu querido Prof. Dr. Milton Costa, herói e modelo na sala de aula que, vibrando de
entusiasmo e paixão por aquilo que faz, agradeço por ter-me feito rever a todas as correntes
do pensamento histórico, redescobrindo seu fascínio. Com calma e perseverança, ele resgatou
em mim o amor incondicional pela História que ficara dividido por tanto tempo com outras
ciências irmãs e, por seu incentivo, orientação e amizade, muito obrigada, mestre!
Ao meu cunhado enciclopédico, Prof. Dr. Sérgio Tibiriçá Amaral, por sua infindável
disponibilidade, mesmo nos momentos de maior aperto, para atender às dúvidas e ansiedades
que me assaltavam sobre metodologia, lógica e consistência acadêmica – tanto no mestrado,
quanto no doutorado - e por todas as sugestões preciosíssimas que fez para melhorar a
apresentação e qualidade deste trabalho, não tenho palavras para expressar gratidão eterna.
À profa. Dra. Tania Regina de Luca, minha mestra brilhante, tão exigente e tão sensível às
necessidades de seus alunos sedentos de saber, meu perene reconhecimento pelos
ensinamentos de sala de aula e, principalmente, por todas as críticas e sugestões que fez
durante a qualificação desta tese, acrescentando muito à sua clareza e definição de objetivos.
6
A meu amigo Prof. Dr. José Arthur Teixeira Gonçalves, pelo apoio histórico, pela paciente
leitura do texto e por todas as sugestões que tão pertinentemente contribuíram para este
trabalho, muito obrigada!
À Iria Okuda Dalbem e à Zelia Maria Sousa Barros, por toda atenção dada ás minhas
frequentes visitas à Secretaria atrás de documentos, matrículas e informações e pela amizade e
carinho que demonstraram ao longo desses últimos longos anos, obrigada!
Finalmente, à Diretoria Acadêmica das Faculdades Integradas ―
Antonio Eufrásio de Toledo‖,
à qual tenho a honra de participar do corpo docente, pelo incentivo material e acadêmico que
sempre ofereceu para a qualificação profissional e pessoal de seus professores, meu
reconhecimento.
7
PENNACCHI, Andrea. A Guerra Fria e a política contencionista de George Kennan no
estudo comparativo de uma elite do poder. (1945-1950). 2011. 161p. Tese (Doutorado em
História) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Assis, 2011.
RESUMO
A proposta deste trabalho é examinar comparativamente a trajetória política de um grupo de
agentes dos Departamentos de Estado e da Defesa dos Estados Unidos, descrevendo seu papel
na gênese da Guerra Fria, entre 1945 e 1950. Na primeira parte, é proposta uma discussão
conceitual do tema e a configuração do contexto sócio-político, destacando o mercado de bens
simbólicos em torno dos quais foi criada a Doutrina de Contenção de George F. Kennan. Em
seguida, é feita a construção
das origens e das trajetória de um grupo específico de
intelectuais que deram suporte à referida Doutrina para, finalmente, comparar a evolução
social, política e econômica de cada um a partir do papel que exerceram na conformação da
Guerra Fria. Como fonte histórica, adotar-se-á a produção intelectual disponível de George F.
Kennan e obras historiográficas, bibliográficas e documentos oficiais do Departamento de
Estado, além de trabalhos biográficos e de memórias.
Palavras Chave: Doutrina de Contenção. Elite do Poder. George F Kennan. Guerra Fria.
Política Externa Norte-Americana.
8
PENNACCHI, Andrea. Cold War and George Kennan`s containment policy on a power
elite comparative study (1945-1950). 2011. 161p. Thesis (PhD in History) – Faculdade de
Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Assis, 2011.
ABSTRACT
This work intends to compare the political trajectories of some US State and Defense
Departments’ officers related with Cold War’s genesis (1945-1950). Divided in three parts,
the first one discusses the theoretical views that shaped the period social-political background,
the power elite concepts and the symbolical market created around George Kennan`s
containment policies. Then, the origins and trajectories of a group of officials and intellectuals
who gave support to the referred policies will be described, to finally explore their social,
political and economic backgrounds, as well as their role in shaping a new foreign policy for
their country. George Kennan’s intellectual production was the chief historical source of this
work, but historiographical and bibliographical volumes related to the period were also
examined, along with official documents from State and Defense Department, biographies
and memories written by the researched.
Key words: Cold War. Containment Policies. George F. Kennan. Power Elite. US Foreign
Policy.
9
LISTA DE SIGLAS
CENTO - Central Treaty Organization (Organização do Tratado Central ou Pacto de Bagdá)
CIA – Central Intelligence Agency (Agencia de Inteligencia Central)
ERP – European Recovery Program ( Programa de Recuperação Européia ou Plano Marshall)
FDR – Franklin Delano Roosevelt
GATT – General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral de Tarifas e Comércio)
IBRD – International Bank for Reconstruction and Development (Banco Internacional de Reconstrução e
Desenvolvimento
IMF – International Monetary Fund (Fundo Monetário Internacional)
KGB - Komite Gosadarstvennoy Bezopasnosti (Comitê de Segurança Estatal)
NARA – National Archives and Records Administration (Administração de Arquivos e Registros Nacionais
NATO – North Atlantic Treaty Organization (Organização do Tratado do Atlântico Norte)
PPS – Political Planning Staff (Gabinete de Planejamento Político)
SEATO – Southeast Asia Treaty Organization (Organização do Tratado do Sudeste da Ásia)
USAF – United States Air Force (Força Aérea dos Estados Unidos)
10
SUMÁRIO
Introdução .......................................................................................................................... 14
1.
Historiografia e Guerra Fria...................................................................................... 24
2.
George Kennan e a doutrina de contenção................................................................ 35
3.
Origens, trajetórias e capitais simbólicos da elite do poder ...................................... 44
3.1 Servidores legais ....................................................................................................... 46
3.2 Servidores burocratas e servidores políticos.............................................................. 60
4.
O mercado de capitais simbólicos no governo Truman ............................................ 96
5.
A elite do poder e a doutrina de contenção ............................................................. 106
5.1 Vocação pública e o Establishment .......................................................................... 116
6.
Conjuntura econômica, política e social da Guerra Fria ........................................ 123
Conclusão ......................................................................................................................... 134
Referências Bibliográficas ............................................................................................... 144
11
(…) Os russos ainda acreditam em conceitos como a maldade básica do capitalismo, na inevitabilidade de sua
destruição e na obrigação do proletariado em apoiar essa destruição e tomar o poder. O primeiro desses
conceitos é o antagonismo inato entre capitalismo e socialismo e vimos o quão profundamente ele se inseriu nas
bases do poder soviético (...) implicando que nunca poderá haver, da parte de Moscou, um compromisso
sincero, ou objetivos comuns, entre a União Soviética e as potencias vistas por ela como capitalistas. (...) Se o
governo soviético ocasionalmente assinar documentos que indicam o contrário essa ação não passará de uma
manobra tática visando lidar com o inimigo (que não tem honra) e portanto, deve ser assumida no espírito de
“caveot emptor”. Basicamente, o antagonismo permanece (...) e dele fluem muitos dos fenômenos que nos
perturbam na forma que o Kremlin conduz sua política externa: a secretividade, a falta de franqueza, a
duplicidade de comportamento, as suspeitas permanentes e a ausência de propósitos amigáveis. Esses
fenômenos não mudarão em curto prazo (...) Quando houver alguma coisa que os russos desejem de nós, uma
ou outra de suas características políticas pode ser temporariamente encobertas e quando isso acontecer, sempre
haverá americanos que se adiantarão – satisfeitos - anunciando que “os russos mudaram” e alguns deles ainda
tentarão levar o crédito por tais “mudanças”. Mas (...) as características da natureza soviética fazem parte da
natureza intrínseca de seu poder e estarão sempre presentes entre nós – implícitas ou explicitamente. (...) Como
a Igreja, eles lidam com conceitos ideológicos de longa duração e podem dar-se ao luxo de ser pacientes. (...)
Cuidado, circunspecção, flexibilidade e mentiras são qualidades que eles valorizam (...) e o Kremlin não tem
qualquer reserva em recuar diante de forças superiores. (...) Sua maio preocupação é garantir a utilização de
qualquer meio válido, ou escuso, para obter o poder mundial; se encontrarem barreiras intransponíveis à sua
frente as aceitarão filosoficamente e se acomodarão a elas. (...) Essas considerações fazem a diplomacia
soviética ser, ao mesmo tempo, mais fácil e mais difícil de lidar que a diplomacia de outros líderes agressivos,
como Napoleão ou Hitler. De um lado, os russos são mais sensíveis às forças contrárias e estão mais
preparados para render-se em setores específicos da diplomacia quando a pressão que receberem for forte
demais e portanto, são mais acessíveis à lógica e à retórica do poder. Por outro lado, não podem ser facilmente
derrotados, ou desencorajados, com uma simples vitória de seus oponentes e a paciente persistência que os
anima significa que só serão efetivamente contidos - não por atos esporádicos que representem o desejo
momentâneo da opinião pública – se forem confrontados por políticas inteligentes e de longo prazo adotadas
por seus adversários, políticas com objetivos não menos persistentes e não menos variada e cheia de recursos
em sua aplicação. Nessas circunstancias, fica claro que o principal elemento de qualquer política dos Estados
Unidos em relação à União Soviética deve ser a contenção de longo prazo, paciente, mas firme e vigilante, das
tendências expansionistas de seu adversário(...)”
George Kennan, Origens da Conduta Soviética,
In Foreign Affairs, Junho, 1947
12
“As mudanças fundamentais no posicionamento das nações no cenário internacional causadas pela guerra,
mudaram completamente a política do mundo (...). Quanto mais a guerra fica no passado, mais distintas se
tornam as duas tendências predominantes da política internacional que dividem as forças políticas operantes
na arena internacional em dois campos distintos: o campo dos imperialistas anti-democratas de um lado e do
outro, o campo dos anti-imperialistas democratas. A principal força do campo imperialista são os Estados
Unidos, aliados à Grã Bretanha e à França e também sustentados por países colonialistas; por países de
regimes anti-democráticos e reacionários e por países politica e economicamente dependentes dos Estados
Unidos, como os do Oriente Próximo, América do Sul e a China. A proposta principal do campo imperialista é
fortalecer o imperialismo, tramar uma nova guerra imperialista, combater o socialismo e a democracia e apoiar
regimes e movimento pró-fascistas reacionários e anti-democráticos em todas as partes do mundo. Para atingir
esses objetivos, eles estão preparados para confiar em forças reacionárias e anti-democráticas - e a dar apoio a
seus antigos adversários contra aliados do tempo da guerra. As forças anti-fascistas compreendem o segundo
campo, que é baseado na União Soviética e nas novas democracias, além de países que tenham rompido com o
imperialismo e se colocado firmemente no caminho do desenvolvimento democrático, como a Romênia, a
Hungria e a Finlândia; a Indonésia e o Vietnam; a Índia, o Egito e a Síria. O campo anti-imperialista está
apoiado por movimentos operários e democráticos e pelos fraternais partidos comunistas em todas as nações;
pelos que lutam pela libertação das colônias em países independentes; por todas as forças progressistas e
democráticas do mundo. Seu objetivo é resistir à ameaça de novas guerras e á expansão imperialista, é
fortalecer a democracia e extirpar todos os vestígios do fascismo. O fim da Segunda Guerra confrontou todas as
nações amantes da liberdade com a tarefa de assegurar uma paz democrática e duradoura que selasse a vitória
sobre o fascismo. Na tentativa de levar a cabo essa tarefa fundamental, a União Soviética e sua política têm um
papel de liderança que faz parte da própria natureza dos Estados Socialistas Soviéticos, a quem motivos de
agressão e exploração são totalmente estranhos e cujo maior interesse é criar as condições mais favoráveis a
uma sociedade comunista. Uma dessas condições é a paz externa. Ao representar um sistema social novo e
superior, a União Soviética reflete em sua política externa as aspirações de uma humanidade progressista, que
deseja uma paz duradoura e não tem nada a ganhar com uma nova guerra engendrada pelo capitalismo. A
União Soviética é um campeão declarado das liberdades de todas as nações e um inimigo da opressão nacional
e racial, bem como da exploração colonial em qualquer forma ou modelo. A mudança no alinhamento geral de
forças entre o mundo capitalista e o mundo socialista trazido à superfície pela guerra tende a ampliar ainda
mais o significado dessa política externa do estado soviético e aumentar o alcance de suas atividades na arena
internacional. O sucesso e o crescente prestígio internacional do campo democrático não são bem visto pelos
imperialistas. Mesmo durante a Segunda Guerra, forças reacionárias na Grã Bretanha e nos Estados Unidos
foram ativadas para evitar uma ação coordenada entre os poderes aliados e com a finalidade de prolongar a
guerra para sangrar a União Soviética e salvar os agressores fascistas da mais profunda derrota. Enquanto a
guerra esteve em andamento, os círculos reacionários e americanos não se aventuraram a vir à tona claramente
contra a União Soviética, ou contra os países democráticos, pois perceberam que estes tinham a simpatia
incondicional das massas por todo o mundo. No entanto, a situação começou a mudar nos últimos meses da
guerra e os imperialistas americanos e britânicos já começaram a demonstrar má vontade em respeitar os
interesses legítimos da União Soviética e dos países democráticos, como o ocorrido na conferencia tripartite de
Potsdam em 1945. A política externa da União Soviética e dos países democráticos, nesses dois últimos anos,
tem trabalhado de forma consistente para manter os princípios democráticos dos acordos pós guerra. Os países
do campo anti-imperialista têm, leal e consistentemente, se empenhado na implementação desses princípios, sem
desviar-se deles em nenhuma circunstancia. Consequentemente, o maior objetivo da política externa soviética
do pós-guerra tem sido o de uma paz democrática, a erradicação dos vestígios do fascismo e a prevenção contra
a ressurgência de uma agressão imperialista fascista, o reconhecimento do princípio de igualdade das nações e
o respeito por sua soberania, além da redução geral de todos os armamentos e o banimento das armas mais
destrutivas destinadas a massacres em massa da população civil. Os esforços conjuntos da diplomacia soviética
e dos outros países democráticos em assegurar a redução de armamentos e o banimento do mais destrutivo de
todos eles - a bomba atômica – portanto, são de enorme importância. A política externa soviética parte do
princípio de que haverá longa convivência entre os dois sistemas – capitalista e socialista. Disso segue que a
cooperação entre a União Soviética e os países de outros sistemas deve ser possível desde que o princípio de
reciprocidade seja respeitado e que as obrigações ora assumidas sejam honradas. Todos sabem que a União
Soviética sempre cumpriu as obrigações que assume e que tem demonstrado permanente vontade e desejo por
cooperação”.
Andrei Zhdanov, Chanceler Soviético.
In Relatório da 1ª. Conferencia do COMINFORM (International Communist Information Bureau), em Setembro, 1947.
13
“Nos últimos trinta e cinco anos o mundo vivenciou duas guerras mundiais de enorme violência. Viu
acontecerem duas revoluções – a Russa e a Chinesa – de enorme abrangência e intensidade. Assistiu também ao
colapso de cinco impérios – o otomano, o austro-húngaro, o germânico, o italiano e o japonês – e o declínio
drástico de duas potencias imperialistas, a Grã-Bretanha e a França. Em uma geração, a distribuição
internacional do poder foi alterada na base de suas estruturas. Por muitos séculos nenhuma nação foi bem
sucedida em adquirir uma força tão preponderante, que a coligação de forças de outras nações não pudesse
enfrenta-la. O cenário internacional sempre foi marcado por períodos recorrentes de guerra e violência, mas
um sistema de estado soberanos e independentes sempre se manteve e sobre ele, nenhum estado foi capaz de
exercer hegemonia. Dois conjuntos de fatores básicos alteraram essa histórica distribuição de poder. Primeiro,
a derrota da Alemanha e do Japão e o declínio dos impérios britânico e francês interagiram com o
desenvolvimento dos Estados Unidos e da União Soviética de tal forma, que o poder passou a gravitar,
crescentemente, em torno desses dois centros. Em seguida, a União Soviética, ao contrário dos demais
aspirantes à hegemonia e movida por um novo fanatismo contrário ao nosso, procurou impor sua autoridade
absoluta sobre o resto do mundo. O conflito tornou-se, portanto, endêmico e vem sendo alimentado pela União
Soviética por métodos que variam entre a violência e a diplomacia, de acordo com o exigido em cada
circunstância. Com o crescente desenvolvimento de armas aterrorizantes de destruição em massa, todos os
indivíduos enfrentam a possibilidade sempre presente de aniquilação, se o conflito entrar na fase de guerra
total. De um lado, a população mundial anseia libertar-se da ansiedade crescente gerada pelo risco de uma
guerra atômica. De outro, qualquer ampliação da área controlada pelo Kremlin poder aumentar a possibilidade
de não existirem coalisões suficientemente adequadas para confrontá-los com a maior força que poderia ser
reunida. Nesse contexto, esta República e os cidadãos que dependem de sua força estão vivendo seu momento de
mais profundo perigo. Os fatos que estão diante de nós envolvem o crescimento ou a destruição, não apenas
desta República, mas da civilização como um todo. São fatos que não esperarão que deliberemos. Com
consciência e resolução este governo e o povo que ele representa deverão agora tomar novas e terríveis
decisões. (...) Nos próximos quatro ou cinco anos, a União Soviética terá a capacidade militar de deslanchar um
ataque atômico de surpresa de tal envergadura, que para evita-lo ou sobreviver à uma investida inicial e prover
uma razoável segurança a seus cidadãos, os Estados Unidos devem ter sua força militar substancialmente
ampliada em termos aéreos, terrestre e marítimos, bem como de sua potencia atômica e das defesas aéreas e
civis para continuar a perseguição de seus objetivo. (...)”
Paul Nitze, NSC-68. Abril, 1950.
In Naval War College Review. Vol. XXVII (mai-jun) pp.51-108
14
Introdução
A proposta do presente trabalho é fazer um estudo comparativo das trajetórias sócio-políticas
de um determinado grupo de oficiais do Departamento de Estado e da Defesa que atuou na
elaboração da política externa nos Estados Unidos nos primeiros anos da Guerra Fria (19451950), com a finalidade de identificar o papel que o grupo desempenhou em sua gênese.
Seu objetivo principal é, por meio da comparação de suas origens e trajetórias, identificar os
fatores que levaram à formação da equipe. Os primeiros anos da Guerra Fria serão
reconstruídos a partir de homologias 1 estruturais e funcionais existentes no período,
avaliando, comparando e, na medida em que a história dos personagens o permitirem,
cruzando a atuação e as características específicas de cada um.
Para discutir como a estrutura social do período foi incorporada por esses agentes, serão
levadas em consideração:
a) as trajetórias e estratégias adotadas pelo grupo para atingir objetivos de ascensão ou de
manutenção de poder e
b) a Doutrina de Contenção de George F. Kennan, na forma do Longo Telegrama enviado
ao Departamento de Estado em 1946 e do artigo ―
As origens da conduta soviética‖
publicado na revista Foreign Affairs2 em junho de 1947, documentos históricos que
criarão os vínculos sociais e políticos entre o grupo, imbricando-os a partir das atividades
de intervenção que exerceram no cenário internacional.
Envolvendo vários processos biográficos cujos agentes interagem intensamente com os
movimentos históricos, a análise comparativa que está sendo proposta será dividida em três
partes.
A primeira relaciona-se às concepções teóricas e conceituais do período e tem a finalidade de
situar o leitor no contexto da Guerra Fria. Em seguida, as propriedades das várias frações do
1
Por homologia, um conceito utilizado por Pierre Bourdieu, entende-se o estudo de estruturas de diferentes
organismos sociais que possuem a mesma origem, mas que podem ou não ter a mesma função. De maneira
geral, implicam estruturas sociais que possuem relação de semelhança de posição entre suas partes.
BOURDIEU, Pierre. O campo intelectual, In Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990, p. 169-80
2
A título de esclarecimento, a autora informa que as palavras grafadas em itálico ao longo deste trabalho têm
duas funções. A primeira é a de identificar termos, nomes de escolas, cidades, empresas ou organismos norteamericanos que não soam bem aportuguesados. A segunda função das palavras em itálico é de, por iniciativa
da autora, enfatizar a argumentação.
15
campo social às quais pertencem os atores sociais objeto dessa pesquisa serão sintetizadas em
quatro Quadros de síntese, nos quais se procurará levantar os fatores de inserção social
vinculados à posição familiar, acadêmica e profissional e política3 de cada um dos
pesquisados, além de suas atuações profissionais e políticas durante a Primeira e Segunda
Guerra Mundial e trajetórias seguidas para atingirem os centros de poder durante a Guerra
Fria.
Finalmente, como o enfoque tradicional da História (fundamentado exclusivamente em fontes
escritas ou orais) pode ser insuficiente para a reconstrução do universo dos pesquisados se
baseada exclusivamente nas duas fontes primárias intimamente interligadas - a saber, o Longo
Telegrama e o artigo As Origens da Conduta Soviética produzidos por Kennan, origem
intelectual da Doutrina de Contenção - procurar-se-á recompor, igualmente, o sistema de
relações políticas e sociais que vigoravam, se não entre todos, ao menos entre alguns dos
principais os agentes que interagiram com Kennan, ajudando-o a estruturar e aplicar suas
propostas.
O número de agentes que participaram da política de contenção à expansão soviética ao longo
de quase cinco décadas é incalculável e evidentemente, seria impossível abarcar neste estudo
todos aqueles que, efetivamente, estiveram vinculados à ela. Por isso, procurou-se privilegiar
aqui alguns critérios de escolha:
a) O período da pesquisa ficou restrito aos anos iniciais da Guerra Fria, ou mais
precisamente de 1945 a 1950, marcados pelo fim da parceria que prevalecera durante a
guerra entre norte-americanos e soviéticos, de um lado, até a saída de George Kennan do
Gabinete de Planejamento Político, de outro.
b) Com exceção dos dois Presidentes, todos os pesquisados fizeram parte do alto escalão do
Departamento de Estado e do Departamento da Defesa no período em estudo e atuaram,
tanto na elaboração da política externa que gerou a Guerra Fria, quanto em sua aplicação.
c) De uma forma ou de outra, todos estavam direta e pessoalmente vinculados às propostas
de George F. Kennan e às políticas de contenção ao expansionismo soviético emanadas do
Gabinete de Planejamento Político.
d) Os vínculos que esses agentes mantiveram entre si tinham origem em suas relações
sociais, profissionais ou universitárias e na identificação comum com o ideário
internacionalista e contencionista de Kennan.
3
BOURDIEU, Pierre. A Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1987.
16
e) Todos apresentaram fontes primárias - além de documentos oficiais, entrevistas,
reportagens e referências historiográficas - ou seja, algum tipo de biografia autorizada ou
relatos de próprio punho pertencentes ao domínio popular.
f) Todos vivenciaram o pico de suas carreiras nos primeiros anos da Guerra Fria e ocuparam
posições centrais no campo político durante a década de 1940 e/ou nos primeiros anos de
1950.
É preciso esclarecer ainda que, pela necessidade de racionalizar os dados e em nome da
objetividade, deixou-se de aprofundar o estudo sobre a trajetória de muitos agentes que
também foram relevantes do processo da contenção ao comunismo soviético, como Loy
Henderson; Harvey, McGeorge e William Bundy; Dean Rusk; Clark Clifford; Paul Nitze;
William Donovan; além de outros membros igualmente importantes do Departamento de
Estado, mas espera-se que essas lacunas possam ser preenchidas por outros pesquisadores do
tema no futuro.
Além dos critérios relacionados acima, também é importante comentar alguns dos conceitos
que serão utilizados ao longo dos próximos capítulos, qual seja, os de isolacionistas e
internacionalistas4; os de servidores eleitos; servidores de carreira (burocráticos), servidores
de confiança e militaristas (políticos), e finalmente, os de poder e dominação e os de elite do
poder e Establishment.
Por isolacionistas5 entendem-se norte-americanos – políticos, formadores de opinião ou
grande massa – que, voltados exclusivamente para a expansão interna, crescimento industrial
e contraposição à influencia inglesa no continente, praticavam ou aprovavam uma política
4
Isolacionismo e internacionalismo serão descritos no texto de acordo com seu significado padrão, mas é
preciso que se observe que para George Kennan, ambos os termos são inadequados e imprecisos. Ele
constatou bem cedo que a proposta internacionalista de Wilson - de salvar o mundo por meio da democracia era tão ilusória e perigosa quanto a crença na onipotência da América, com sua tentação de envolver-se em
todo e qualquer canto do mundo. No entanto, o isolacionismo populista e nacionalista dos anos 1920 também
não o atraía - como não atraíra muitos americanos sensatos e inteligentes - por causa de sua crença frívola de
que os americanos seriam o Povo Escolhido, pela estreiteza de seus horizontes e por ignorarem
voluntariamente o resto do mundo. In LUKACS, John. George Kennan: a Study of Character. New
Haven: Yale University, 2007.
5
Até a virada do século a prática isolacionista orientou os governos norte-americanos que, voltados para si,
recusaram-se a intrometer-se nos negócios europeus e afirmaram sua indústria, expandiram seu território e
identificaram a América Central como uma extensão de seu território. O isolacionismo só foi abandonado
definitivamente ao longo de duas gerações de políticos internacionalistas que governaram o país entre 1900 e
1945. Dentre eles, destacam-se, fundamentalmente, os presidentes Theodore Roosevelt (1901-1909),
Woodrow Wilson (1912-1920) e Franklin Roosevelt (1932-1945). Eles representavam uma nova geração de
políticos que viam na decadência do Império Britânico uma excelente oportunidade para seu país se adiantar e
ocupar o vácuo que se abriria na manutenção da ordem internacional. KENNEDY, Paul. Ascensão e queda
das grandes potências. Rio de Janeiro: Editora Campus.1988, p. 342-344)
17
externa que tinha o firme propósito de não interferir nos assuntos europeus e que igualmente,
não aceitava ingerência estrangeira sobre seus próprios assunto ou territórios.
Por internacionalistas entende-se um grupo de empresários, banqueiros e advogados de Wall
Street que - tendo viajado para a Europa na infância; se encontrado profissionalmente em
clubes masculinos de Londres, Paris e Berlim para entabular os melhores negócios para suas
empresas; aprendido várias línguas e convivido com diversas culturas nesse processo entreviram na Europa destruída pela guerra um mercado maduro para absorver os excedentes
de sua produção material e financeira 6.
Todos os pesquisados deste trabalho foram considerados servidores públicos por fazerem
parte de uma administração democrática, qual seja, por exercerem suas funções a partir de
uma procuração popular, para servir à sociedade que direta ou indiretamente, lhe outorgou
poderes.
Por servidores legais, entendem-se os dois presidentes escolhidos por voto popular que,
apesar de detentores do poder e do acesso à violência legalizada para governarem os Estados
Unidos durante um período específico, são servidores pois dependiam de processo eletivo
para servir seus liderados como dirigentes e seu mandato era temporário. Ambos lideraram o
país durante a década de 1940 e foram incluídos neste trabalho por dominarem a posição
central no campo político como fonte intrínseca de poder.
Por servidores de carreira ou burocratas7,entendem-se os trabalhadores intelectuais
especializados e não comprometidos diretamente com partidos políticos, que se colocaram a
serviço da máquina administrativa do Estado por meio de concurso público para,
funcionalmente e de forma apartidária e racional, auxiliar os governantes a administrá-lo.
6
Estimulado por despesas de guerra, o PNB norte americano, em dólares constantes de 1939, passou de US$
88,6 bi para US 135 bi em 1945. Os recursos e a mão de obra que haviam sido subutilizados durante o New
Deal passaram a ser devidamente explorados e a produção de guerra passou de 2% do PNB em 1939 para
40% em 1943. A produção de produtos não bélicos também aumentou, de modo que o setor civil da economia
não foi prejudicado com a guerra, como aconteceu com os outros países envolvidos no conflito. Com o
desaparecimento das grandes potências tradicionais, criava-se um vazio que poderia ser ocupado por
exportadores norte-americanos. Os internacionalistas defendiam o argumento de que ―
o comércio livre
provocava a paz‖ e os interesses das industrias de exportação, que tinham receio de que uma depressão do
pós-guerra pudesse seguir-se ao declínio dos gastos governamentais e exigiam que novos mercados além mar
fossem abertos para absorver os frutos da maior produtividade da América. Havia, concomitantemente, um
forte interesse em garantir a defesa - militar, se necessário – de matérias primas estratégicas, como petróleo,
borracha e minérios metalíferos. KENNEDY, Op.cit. p. 344,345)
7
De acordo com Max Weber, a principal distinção entre os funcionários de carreira e os funcionários políticos é
que os ―
políticos‖ podem ser colocados em disponibilidade, enquanto os ―
de carreira‖ seriam ―
inamovíveis‖.
WEBER, Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 76.
18
Como burocratas concursados, eram inamovíveis, ou seja, sua permanência na estrutura
administrativa ocorria independentemente da vontade específica do governante ou dos
partidos; suas funções os imbricavam à máquina administrativa do Estado e é por ele que
velavam, independentemente de quem o capitaneasse.
Os servidores políticos, por outro lado, seriam os funcionários de confiança do governante.
Podiam ser trazidos da iniciativa privada sem concurso e serem deslocados á vontade em
cargos públicos, ou serem colocados em disponibilidade quando seus serviços não fossem
mais necessários - ou
quando houvesse mudança na direção do Estado. Os servidores
políticos pesquisados neste trabalho vinculavam-se ao Departamento de Estado e da Defesa
podem ser divididos em diplomatas e militaristas.
Os servidores políticos diplomatas tinham a confiança da Presidência para exercerem
funções diplomáticas e para representarem os interesses de seu país perante as demais nações
do concerto internacional por meio de acordos, tratados e negociações em geral. Cabia-lhes,
igualmente, elaborar política externa e determinar o grau de relacionamento dos Estados
Unidos com as demais nações.
Por servidores políticos militaristas, identificam-se os servidores políticos que, tendo
exercido funções militares e/ou administrativas nas Forças Armadas dos Estados Unidos antes e durante a Segunda Guerra e dado baixa do Serviço a seu término - mantiveram-se
vinculados às altas camadas governamentais por meio de nomeações políticas e que atuaram
em cargos funcionais voltados principalmente, às questões relacionadas à segurança nacional
e aos efeitos da influência soviética no mundo pós-guerra.
Como servidores legais vinculados às origens, elaboração e aplicação da Doutrina de
Contenção no período escolhido, colocam-se os dois presidentes da Republica envolvidos no
processo, Franklin D. Roosevelt e Harry C Truman; dentre os servidores de carreira ou
burocratas, optou-se avaliar as trajetórias de George Kennan e de Charles Chip Bohlen;
dentre os servidores políticos de confiança, William Harriman, Dean Acheson, John McCloy
e Robert Lovett e finalmente, dentre os servidores políticos militaristas, George Marshall e
James Forrestal. Outros atores importantes, apesar de atuarem em papéis secundários, serão
citados ao longo dessa narrativa, mas, para privilegiar a clareza e objetividade dos dados
levantados, optou-se por não aprofundar o estudo de sua atuação.
É necessário, ainda, configurar o termo elite do poder, que será amplamente utilizado ao
longo desta pesquisa, para que não pairem dúvidas sobre seu sentido. Por elite do poder,
19
entende-se um pequeno grupo de pessoas de grande influencia política e econômica que
guardam identidade entre si por terem afinidades sociais, culturais e psicológicas, apesar de
seus membros serem oriundos de camadas sociais distintas. Essa elite não é uma aristocracia
tradicional, qual seja, não é um grupo político dominante baseado exclusivamente no poder da
tradição ou dos costumes; nem em pequenos círculo de grandes famílias cujos membros
poderiam ocupar – e ocupavam - as mais altas posições nos círculos superiores. Tampouco
foi formada por indivíduos que pertencessem a todas as camadas sociais norte-americanas.
Com raras e honrosas exceções, a maioria de seus membros era oriunda das classes superiores
e das camadas profissionais e comerciais mais elevadas; eram americanos natos, filhos de pais
americanos e oriundos de áreas urbanas predominantemente do Leste. A maioria frequentou
Yale, Harvard e Princeton – ou Amherst e West Point 8.
Utilizando-se de capitais simbólicos e financeiros pessoais para ascender e se consolidar nas
estruturas burocráticas civis e governamentais, esses membros da elite se posicionaram de
forma hegemônica na sociedade, integrando o Establishment9 que dominou a sociedade e a
política norte-americana durante os últimos anos da década de 1940 e por todos os anos 1950.
Instituição meritocrata, mais do que classista, o Establishment que gerou a elite do poder
citada neste trabalho tinha Harry Truman, George Kennan, James Florestal, John McCloy e
Dean Acheson como membros eméritos, pois, originários das camadas médias ou inferiores
da sociedade, conseguiram ocupar posições significativas nas camadas superiores do campo
político e/ou econômico por mérito próprio – por acúmulo de conhecimento ou de prestígio.
Franklin D. Roosevelt, Averrel Harriman, Charles Bohlen, George Marshall e Robert Lovett,
por outro lado, nascidos no seio das camadas dominantes do sistema, investiram suas origens,
além do mérito pessoal, para ascenderem ou se consolidarem no poder.
8
MILLS, Charles Wright. The power elite. New York: Oxford Press Inc, 1956.
9
Establishment é um termo que se relaciona com a ordem ideológica, política e econômica que configura a
elite de uma sociedade ou um Estado. Originariamente, o termo relacionava-se a uma aliança entre a
burguesia urbana e grupos da aristocracia rural britânica que, tradicionalmente, concentravam em suas mãos
os meios de ação do país. Ambos os grupos eram pouco abertos a inovação em todos os campos e
extremamente hostis no compartilhamento do poder com outras facções políticas ou sociais. O termo foi
popularizado em 1955, por um artigo escrito pelo jornalista Henry Fairlie, que descreve o círculo de homens
poderosos que dominavam o Reino Unido naquela época. Seis anos mais tarde, Richard Rovere escreveu
outro artigo, parodiando o anterior e intitulando-o como ―
Notas sobre o Establishment na América‖, no qual
ele cutucava habilmente os que levavam o conceito a sério, criticando-os de forma sagaz. In ISAACSON,
Walter & THOMAS, E. The Wise Men: Six Friends e the World They Made. New York: Simon &
Shuster Paperbacks, 1986, p. 28.
20
Fixado o cenário e esclarecidos os fundamentos dos conceitos que aqui serão utilizados na
primeira parte deste trabalho e determinadas as origens e trajetórias dos atores na segunda, a
terceira parte deste trabalho implicará no processo comparativo da movimentação social,
econômica e política de George Kennan e dos demais atores relacionados à Doutrina de
Contenção - seja no campo social, seja na estrutura da classe dirigente - procurando identificar
as propriedades sociais, políticas e culturais específicas que motivaram e provocaram a
intersecção de suas trajetórias.
O que se pretende comprovar por meio dos argumentos levantados ao longo dos capítulos em
referência é que:
a) A Guerra Fria não foi consequência apenas de uma disputa por esferas de influência
política e econômica, mas também da necessidade política de legitimar o domínio de
uma elite emergente nos Estados Unidos que objetivava ampliar sua ação além das
fronteiras nacionais.
b) As camadas médias ascenderam em maior proporção ao poder por meio do acúmulo
de capital simbólico (prestígio ou conhecimento),
oportunizando para tanto as
rupturas políticas causadas pelas transformações sociais ocorridas durante a década de
1930, a fragilidade dos grupos de poder tradicional em razão da crise do capitalismo e
a ameaça representada pela expansão da ideologia soviética, apoiando-se nos
argumentos de segurança nacional produzidos por George Kennan.
c) A vacância do poder burocrático no Departamento de Estado, ocorrido com a morte de
Roosevelt e de Harry Hopkins em 1945 abriu espaço para a ascensão de um grupo
moderado de internacionalistas que utilizaram sua influencia sobre o Presidente
Truman para estabelecer novas regras na relação com Kremlin.
d) A morte de James Forrestal e a queda de prestígio de George Kennan do Gabinete de
Planejamento Político, em 1950, de outro, promoveram conflitos de orientação,
choque de disputas pessoas e concorrência entre as facções da elite do poder, fechando
o ciclo de poder dos internacionalistas moderados e abrindo espaço para a ascensão
de um grupo mais radical aos cargos-chave do Departamentos de Estado e Defesa –
grupo que apoiava o NSC-68 e que concentrava, definitivamente, os objetivos da
Guerra Fria em um militarismo bem mais acentuado do que o proposto por Kennan e
seus associados.
As fontes para esta pesquisa foram encontradas tanto na ampla produção simbólica de George
F. Kennan, quanto na historiografia da Guerra Fria (John Lewis Gaddis, Walter LaFeber,
21
Melvin Leffler, Arthur Schlesinger Jr e William Williams, dentre outros). Os quadros
descritivos da trajetória dos pesquisados foram levantados a partir de trabalhos biográficos e
de memória (George Kennan, Dean Acheson, Charles Bohlen, William Harriman, Robert
Lovett, dentre outros). Também foram consultadas fontes primárias disponíveis no Historical
Office do Departamento de Estado, no Congressional Research Service da Biblioteca do
Congresso, no National Security Archive, em vários projetos acadêmicos mantidos por
Universidades Americanas (como o The Harvard Project on Cold War Studies) e em
relatórios internos do Gabinete de Planejamento Político liberados recentemente para a
pesquisa histórica sobre a Guerra Fria, abrangendo as operações de guerra política mantidos
pelo National Archives and Records Administration (NARA).
Em tempo, o critério para a escolha dos diplomatas ou servidores públicos e militares em
questão foi a existência de memórias e biografias publicadas, bem como a disponibilidade de
diários pessoais ou memorandos, entrevistas e correspondência pessoal, além de relatórios e
despachos oficiais relativos à Administração Roosevelt e Truman, disponíveis nos arquivos
do NARA.
Para minimizar os riscos de reducionismo que se poderia incorrer com a utilização de fontes
biográficas e memorialísticas num estudo comparativo, procurou-se analisar principalmente
as propriedades sociais dos pesquisados, privilegiando o processo de consagração que os
caracterizou e considerando que suas trajetórias variaram conforme as diferentes posições que
ocuparam no campo ao longo do período.
Esclarecendo a priori os conceitos ―
memória‖ e ―
biografia‖, também convém lembrar que
biografias são obras geralmente dedicadas tanto a personagens dominantes no campo de sua
projeção enquanto ainda vivos, quanto àqueles que se viram consagrados postumamente.
Memórias, por outro lado, constituem estratégias de resgate utilizadas por intelectuais que, em
formas variadas procuram justificar, idealizar ou eufemizar as circunstâncias que, numa dada
conjuntura do campo, lhe foram desfavoráveis 10.
As Memoirs de George Kennan11 e ―
Present at the Criation‖ de Dean Acheson12,
especialmente, se enquadram nesse perfil. O primeiro, por sua aversão à interpretação
10
MICELI, Sérgio. Intelectuais à brasileira. São Paulo: Cia das Letras, 2001, pg. 17
11
As memórias de George Kennan, cujo primeiro volume abrange o período de 1925 a 1950 e o segundo
volume, de 1950 a 1963, oferecem ao leitor uma visão pessoal e fascinante desses anos na diplomacia dos
Estados Unidos. Baseadas em sua experiência pessoal no serviço diplomático norte-americano, essa obra
indica o posicionamento de Kennan em muitos dos mais importantes eventos ocorridos no período. Pontuada
22
militarista dada às propostas contencionistas dispostas no Longo Telegrama de 1946 e por
suas tentativas em eximir-se do epíteto de ―
pai intelectual‖ da Guerra Fria e das
responsabilidades nefastas que lhe foram imputadas pela corrida armamentista nela implícita.
O segundo, por defender-se contra as acusações que lhe foram dirigidas, enquanto Secretário
de Estado, por membros radicais da imprensa e do Congresso, por ter ―
perdido‖ a China para
o comunismo.
Convém informar, no entanto que a análise desses dois tipos de fontes pode fornecer ao
pesquisador informações bem distintas 13. Ao reconstituírem vidas exemplares num registro
apologético, biografias correm o risco de dissimular idealmente os mecanismos reais que
movimentam as trajetórias sociais e intelectuais dos biografados e esse recurso só deve ser
utilizado com o cruzamento de dados com outras fontes, para não distorcer a realidade do
biografado.
As memórias, por outro lado, tenderiam a desvelar mais abertamente o jogo de que seus
autores participaram. Por sofrerem as consequências diretas de seus atos, os memorialistas
sentiam-se mais qualificados do que eventuais biógrafos para compreender e discorrer sobre
os motivos que levaram aos conflitos no campo e aos fatores que acreditam terem sido
responsáveis por alijá-los de suas gratificações mais importantes.
O gênero memórias, no entanto, foi mais consultado pela autora que o biográfico, pois quanto
menor o grau de consagração relativa do memorialista, ou mais forte a crítica popular à sua
atuação no campo, observa-se que ele se encarregará de consagrar a si mesmo ou de defenderse dos que o detratam. Os que não se sentem à vontade quanto à essa auto-consagração ou
auto-crítica, mesmo ansiosos por expor os fatos sob o seu ponto de vista, tendem a adiar post
por muitos insights de como ele acreditava que a política externa dos Estados Unidos deveria ser formulada,
observa-se que a maioria deles ainda são aplicáveis aos dias de hoje. A obra recebeu o National Book Award
e o Pulitzer Prize de Biografias em 1968. KENNAN, George F. Memoirs: 1925-1950. Little Brown &
Company, 1992.
12
As memórias de Dean Acheson estão registradas em livro no qual, como secretário de Estado de Truman e sob
o seu ponto de vista, ele descreve o tom e a direção dados à política externa adotada pelos Estados Unidos em
relação aos soviéticos, no início da Guerra Fria. O livro versa sobre as decisões que ele tomou e como as
políticas delineadas por ele foram aplicadas, explicando como foi sua participação em todo o processo
relacionado, principalmente, à Revolução Chinesa e à Guerra da Coréia. ACHESON, Dean, Present at the
Creation: my years in the State Department, WW. Norton & Co. 1987.
13
MICELI, Op. cit. 2001, p.21
23
mortem a publicação de suas memórias - ou de parte delas - por temerem interpretações que
não lhes sejam favoráveis14.
Como este trabalho tem a função de estabelecer mecanismos relativamente invisíveis na
trajetória de seus objetos de estudo, haverá enfoque maior na análise das fontes
memorialísticas, quando disponíveis, muito mais do que nas biografias, procurando-se não
descuidar do cruzamento constante de informações de caráter pessoal com documentos
oficiais, numa tentativa de recriar, da forma mais real possível, o inter-relacionamento dos
atores objetivados.
Isso não impede, no entanto, que o estudo do campo delimitado pelo Establishment desse
período seja uma tarefa escorregadia e nesse ponto, solicitamos a compreensão dos que nos
lêem. A amplitude e diversidade de contendores no campo, bem como dos dados que foram
levantados, podem dificultam a tarefa de análise e síntese, principalmente no que tange à
movimentação de cada agente no campo. Tentaremos fazê-lo delineando da forma mais clara
possível os vínculos sociais que os imbricavam a um projeto de mundo comum – a doutrina
de contenção – e, ao identificar as relações oficiais travadas entre eles no interior da
Administração, situar da melhor forma possível as posições que ocuparam nesse processo.
14
MICELI, Idem, p. 18
24
1. Historiografia e Guerra Fria
Contenção à expansão soviética é um termo geralmente utilizado para caracterizar a política
externa norte-americana em relação a seus antigos aliados após a Segunda Guerra. Seu
principal objetivo consistia em prevenir ou evitar que a União Soviética utilizasse o poder e a
posição que conquistara naquele conflito para remodelar a ordem internacional de acordo com
sua visão socialista de mundo, uma perspectiva que parecia, ao Ocidente, tão perigosa quanto
a que Japão e Alemanha ofereceram durante a guerra.
Apesar de George Kennan ter cunhado em 1947 o termo Contenção no sentido em que o
conhecemos hoje, ao sugerir a seus superiores uma ―
contenção vigilante e paciente, de longo
prazo, às tendências soviéticas de expansão‖ esse conceito não era original e já havia sido
manifesto anteriormente na obra do geopolítico Nicholas Spykman (1893)15, relacionada ás
necessidades de expansão estratégica e marítima dos Estados Unidos por questões de
segurança.
Spykman acreditava que a política externa das maiores potências tinha o poder de afetar o
alinhamento das demais nações do contexto internacional e que a mobilidade marítima, por
meio da criação de impérios além-mar, seria o melhor caminho para se construir uma eficiente
estrutura geopolítica. Partindo da interpretação geopolítica de Sir Halford Mackinder (1861)16
15
Nicholas J. Spykman (1893-1943) foi um geo-estrategista holandês, conhecido como o ‖avô‖ da doutrina da
contenção. Como cientista político, foi um dos fundadores do realismo clássico das relações internacionais,
introduzindo o pensamento político da Europa Ocidental nos Estados Unidos. Lecionou no Instituto de
Estudos Internacionais na Universidade de Yale e uma de suas maiores preocupações foi tornar seus alunos
versados em geografia, pois não acreditavam em geopolíticos que não tivessem absoluta compreensão
estratégica dessa ciência. Influenciado pela Teoria da Heartland de Mackinder, ele publicou dois livros de
relações internacionais. O primeiro, America´s Strategy in World Politics foi publicado em 1942 pouco antes
da entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra e tratava de questões relacionadas ao equilíbrio do poder.
Nele, Spykman afirmava que o isolacionismo baseado na proteção dos oceanos para proteger os Estados
Unidos (defesa hemisférica) era ineficiente e em seus argumentos, procurou mostrar os problemas em que o
país incorreria se se isolasse novamente após a Segunda Guerra, como fizera após a Primeira. No segundo
livro, The Geography of the Peace, publicado em 1945, ele demonstra sua geoestratégia, argumentando como
o equilíbrio de poderes na Eurásia afetava diretamente a segurança dos Estados Unidos. MELLO, Leonel I..
Quem tem medo de Geopolítica? Edusp e Hucitec: São Paulo, 1999, p.98-102.
16
Sir Halford J. Mackinder (1861-1947) foi um geógrafo inglês considerado um dos fundadores da geopolítica
e da geoestratégia. Em 1904, em uma conferencia na Royal Geographical Society em Londres, ele mencionou
pela primeira vez sua Teoria da Potência Terrestre (Heartland Theory), lançando a pedra fundamental da
Geopolítica como um campo de estudo. Em 1919, publicou Democratic Ideals and Reality: a study in the
politics of reconstruction, apresentando sua teoria da Heartland, afirmando que quem controla a Europa
Oriental comanda a massa terrestre central (Heartland) e que quem controla a Heartland comanda o anel
oceânico (World Island) e o resto do mundo. Sua mensagem tinha a finalidade de convencer os estadistas da
Conferencia de Paris sobre a importância estratégica da utilização dos estados da Europa Central como um
cinturão de proteção para separar a Alemanha da Rússia. Seu conceito foi levado em consideração pelos
25
a respeito do Heartland (potencia terrestre) 17, Spykman desenvolveu sua teoria sobre a
influência da geografia nas disputas globais.
Entre o Heartland e as fronteiras marítimas que separavam as nações umas das outras,
Spykman identificava uma região intermediária (Rimland), uma espécie de zona anfíbia
colocada entre potencias marítimas e terrestres, importante por seu peso demográfico, suas
reservas naturais e desenvolvimento industrial. Esses territórios intermediários que
constituíam o Rimland, no entanto, viam-se perenemente forçados a defender-se contra
eventuais invasões das potencias que os circundavam e por isso, constituíam-se em
permanente foco de insegurança.
Spykman também defendia – opondo-se a Mackinder - que, como os aspectos geográficos das
nações seriam determinantes na distribuição do poder mundial, seu detentor não seria quem
dominasse o Heartland, mas quem conseguisse cercá-lo - ou contê-lo, como os Estados
Unidos se propuseram a fazer durante toda a Guerra Fria – assim controlando seu Rimland18.
De acordo com a visão de Spykman, constata-se que durante a Segunda Guerra Mundial
estados antifascistas - potências navais (Estados Unidos e Inglaterra) e territoriais (União
Soviética) - haviam se aliado para lutar contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Após a
vitória, no entanto, a aliança se desfez e a estratégia americana passou a ser a contenção da
URSS dentro dos limites do Heartland, ou seja, em termos de política externa, a Teoria da
Conteção que posteriormente seria advogada por George Kennan, implicaria na tentativa de
impedir que os soviéticos controlassem o Rimland e tivessem saída para mares abertos, de
onde poderiam projetar mundialmente suas forças.
Para dar suporte a essa estratégia, Spykman propunha que os Estados Unidos, enquanto
potência naval com supremacia incontestável na América do Norte e hegemonia nas
Américas, estabelecessem uma rede de alianças com as demais potências navais como a
negociadores, apesar de ter-se provado ineficiente em 1939. Mackinder era imperialista e anti-bolshevista.
Como Alto Comissário para o Sul da Rússia em 1910 e 1920, defendeu que o Ocidente deveria continuar
apoiando as forças dos Russos Brancos para evitar a vitória dos Vermelhos. KILPINEN, John T. Valparaiso
University. Disponível em http://www.valpo.edu/geomet/histphil/test/mackinde.html. Acesso em 27/02/2001.
17
Para Mackinder, Heartland seria um território localizado no centro da Eurásia e que se estendia do Volga ao
Yangtzé e do Himalaia ao Ártico, controlada historicamente pelo Império Russo e posteriormente, pela União
Soviética. Idem.
18
O conceito de Rimland, para Spykman, implicava a área da Eurásia no entorno do Heartland, cujo papel é
central. Esta região seria a chave das disputas geopolíticas mais importantes da Eurásia, pois quem a
dominasse, decidiria o futuro da Eurásia. Ibidem.
26
Inglaterra, a Oceania, a África e a América do Sul, e que, paralelamente, impedissem que os
adversários formassem alianças contrárias aseus interesses.
Como se pode observar, Spykman influenciaria de forma significativa a estratégia norteamericana no início da Guerra Fria. Suas idéias e de MacKinder levariam George Kennan a
formular o conceito do ―
cordão sanitário‖ ou ―
cinturão de segurança‖ no entorno da União
Soviética, com a finalidade de conter a expansão do comunismo.
O padrão defensivo desse ―
cordão sanitário‖ proposto no Longo Telegrama de 1946, no
entanto, por uma série de razões que serão analisadas ao longo desse trabalho, perdeu essa
característica preventiva e passou a ter um caráter ofensivo quando, a partir de 1949,
começaram a se formar várias alianças militares entre os Estados Unidos e países do Rimland,
a saber, a NATO19, a SEATO20 e o Pacto de Bagdá21 que, aliás, também seriam fruto das
ideias do geoestrategista holandês.
Apesar de importantes, as teorias geopolíticas de Mackinder e de Spykman não foram as
únicas a relacionar-se com a política externa do pós guerra e com a Guerra Fria e várias
correntes historiográficas surgiram ao longo das últimas décadas para identificar as origens
desse conflito.
Apesar de não haver intenção de debater, ou questionar a validade de cada uma dessas
correntes, pretende-se nos próximos parágrafos, formar um panorama geral sobre algumas das
mais importantes relacionadas ao tema, visando situar o leitor no contexto das discussões e
permitir-lhe um melhor entendimento das linhas adotadas pela autora.
19
A North Atlantic Treaty Organization (NATO ou OTAN), também conhecida como Aliança Atlântica, é uma
organização de colaboração militar estabelecida em 1949 em suporte ao Tratado do Atlântico Norte, assinado
em Washington a 4 de abril de 1949. Seus membros fundadores foram Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados
Unidos, França, Islândia, Itália, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal e Reino Unido. Grécia e
Turquia aderiram em 1952, Alemanha Ocidental em 1955 e Espanha em 1982. Com o fim da Guerra Fria,
outros países do leste Europeu se agregaram ao Tratado: Alemanha Oriental reunificada com Alemanha
Ocidental (1990), República Checa e Polônia (1999), Bulgária, Eslováquia, Eslovênia, Estônia, Lituânia e
Romênia (2004) e finalmente, Albânia e Croácia (2009). NATO. Disponível em
<http://www.nato.int/cps/en/natolive/index.htm> Acesso em 27/02/2011.
20
A Southeast Asia Treaty Organization (SEATO) foi uma versão da NATO no Sudeste Asiático, criada com o
objetivo de não permitir a expansão comunista naquela região. Firmado em 1955 e dissolvido em 1977, foi
formada por oito países: Austrália, França, Nova Zelândia, Paquistão, Filipinas, Tailândia, Grã-Bretanha e
Estados Unidos. SEATO Disponível em< http://www.britannica.com/EBchecked/topic/556523/SoutheastAsia-Treaty-Organization-SEATO>. Acesso em 27/02/2011.
21
O Pacto de Bagdá ou a Central Treaty Organization (CENTO), também foi uma aliança militar criada durante
a Guerra Fria nos moldes da NATO. Fundada em 1955 e desfeita em 1976, foi composta por Irã, Iraque,
Paquistão, Turquia e Reino Unido. Pacto de Bagdá. Disponível em <http://www.dwworld.de/dw/article/0,,778420,00.html> Acesso em 27/02/2011.
27
As primeiras análises historiográficas sobre as origens da Guerra Fria ocorreram durante os
anos 1950 e em parte dos anos 1960.
Foram desenvolvidas por historiadores norte-
americanos considerados ortodoxos porque naquele momento22, representavam a visão
corrente de mundo:
uma sociedade fortemente influenciada internacionalmente pela
dissolução da aliança militar russo-americana feita durante a guerra, pela expansão soviética
na Europa Oriental, pela ―
perda‖ da China para o comunismo e pela Guerra da Coréiaenquanto domesticamente, a histeria macarthista se propagava.
Nesse contexto, historiadores ortodoxos como Herbert Feis23e Arthur Schlesinger Jr.24
identificaram a expansão da URSS na Europa Oriental e em outras partes do mundo como o
motivo óbvio que desencadeou a Guerra Fria: aos Estados Unidos, como parte desafiada,
coube apenas reagir à provocação. Pontualmente voltados para um ponto de vista norteamericano, os autores ortodoxos não aprofundaram a avaliação das ações soviéticas, nem as
consideraram resultantes de um moderno imperialismo russo ou de uma expansão ideológica
exigida pela revolução russa de 1917.
A interpretação da história de Arthur Schlesinger Júnior foi descrita por Craig Calhoun25
como a ―
versão oficial‖ da Guerra Fria, pois representava uma visão favorável ou uma
justificativa ideológica às políticas de contenção que faziam, inclusive, o uso da força.
Durante os anos 1960, no entanto, o envolvimento dos Estados Unidos na Guerra do Vietnam
e a desilusão de muitos historiadores quanto à eficácia e viabilidade da política de contenção
22
Apesar de ter perdido seu papel dominante de interpretação histórica por causa das discussões acadêmicas
surgidas no fim dos anos 1960, a visão ―
ortodoxa‖ das origens da Guerra Fria continua a ter muito influência
sobre a historiografia, conforme Jonathan Nashel em "Cold War (1945–91): Changing Interpretations" The
Oxford Companion to American Military History. John Whiteclay Chambers II, ed., Oxford University
Press 1999.
23
Dentre as obras de Feis sob o enfoque ―
ortodoxo‖ podem-se citar Churchill-Roosevelt-Stalin: The War
They Waged and the Peace They Sought (1957) e From Trust to Terror: The Onset of the Cold War
(1970).
24
Arthur Schlesinger é um historiador norte americano e critico social. Detentor do Prêmio Pulitzer de História
por The age of Jackson (1945), Schlesinger participou da OSS durante a Segunda Guerra e sua obra está
voltada para a análise de líderes liberais norte-americanos como Franklin D. Roosevelt, John F. Kennedy e
Robert F. Kennedy, sobre quem escreveu extensivamente. Foi assistente especial e ―
historiador da corte‖
durante a administração do Presidente Kennedy(1961 e 1963) e em A Thousand Days, escreveu sobre esse
governo desde o período de transição até o funeral do presidente. Popularizou o termo ―
presidencialismo
imperial‖ durante a administração Nixon, ao escrever um livro sob esse título. Suas impressões sobre as
origens da Guerra Fria foram publicadas na revista Foreign Affairs, 46, October, 1967, pp. 22-52, sob o título
Origins of the Cold War. MARTIN, Douglas. Arthur Sclesonger, Historian of power, dies at 89. The New
York Times. Disponível em. <http://www.nytimes.com/2007/03/01/washington/01schlesinger.html>. Acesso
em 27/02/2011.
25
Vide o verbete "Cold War" do Dictionary of the Social Sciences da Oxford University Press.
(ISBN 0195123719)
28
praticada por seu país, levou ao aparecimento de uma corrente revisionista que passou a
identificar as origens da Guerra Fria com questões econômicas, qual seja, com um choque de
interesses produtivos envolvendo as duas potências querelantes.
Esses revisionistas ou historiadores da nova Esquerda responsabilizavam mais os Estados
Unidos pelo conflito, do que a União Soviética, argumentando que a ação expansiva dos
russos na Europa Oriental para criar um cinturão de segurança em torno de seu território, teria
sido semelhante à adotada por qualquer grande potência que se preocupasse com a própria
segurança, principalmente após terem sofrido duas invasões alemãs em menos de trinta anos.
Apesar de a nova escola ter-se dividido em várias vertentes, a maioria dos trabalhos
revisionistas se reportavam à The Tragedy of American Diplomacy, de William A. Williams26
publicada em 1959. Contestando a visão ―
ortodoxa‖ da historiografia, Williams classificou a
política externa norte-americana do pós guerra como imperialista e afirmou que os Estados
Unidos, tendo dominado os mercados da Europa Ocidental durante a Segunda Guerra e
pretendendo repetir o feito na Europa Oriental, provocaram, dessa forma, a reação dos russos.
Seguindo essa linha de pensamento, historiadores revisionistas responsabilizaram os Estados
Unidos pela quebra da paz no pós-guerra, citando uma série de esforços daquele país no
sentido de isolar e confrontar a União Soviética - muito antes do fim da Segunda Guerra,
inclusive – pela necessidade que os produtores nacionais tinham de colocar além-mar o
excedente de sua produção e de controlar o acesso a matérias primas estratégicas, como
petróleo, borracha e minérios metalíferos.
Essa linha historiográfica defende que,
preocupados em manter o bom funcionamento do capitalismo internamente, os norteamericanos deram ênfase considerável à política das ―
portas abertas‖ – atendendo aos grupos
econômicos ligados aos governantes norte-americanos..
Ou seja, para revisionistas como Williams, como o desenvolvimento doméstico dos Estados
Unidos no pós-guerradependia, proporcionalmente, da consolidação de seu poder no cenário
internacional, a participação norte-americana na reconstrução da Europa e do Japão, por
26
Williams apoiou seus argumentos no polêmico trabalho do historiador Charles A. Beard ―
An economic
interpretation of the Constitution of the United States‖, que afirmava que o governo norte americano, apesar
de advogar a causa da democracia liberal desde sua fundação em 1776, só visava atender aos interesses
comerciais de sua elite burguesa. Além de William A. Williams, em The Tragedy of American Diplomacy
(New York, 1959, 1962 e 1972) e The Roots of the Modern American Empire (New York, 1969); a
historiografia revisionist também pode ser encontrada nos trabalhos de Gabriel e Joyce Kolko, The Limits of
Power: The World and United States Foreign Policy 1945-1954 (New York, 1972) e de Thomas G. Paterson,
Soviet-American Confrontation: Postwar Reconstruction and the Origins of the Cold War (Baltimore, 1973).
29
exemplo, não passou de uma iniciativa imperialista, voltado para as demandas do capitalismo
– mercados externos, investimentos e fontes de matéria prima – e esse imperativo, somado à
necessidade de manter controle sobre regimes políticos ao redor do mundo para proteger
interesses norte-americanos ali estabelecidos, tornaram-se o objetivo central da política
externa do país, chocando-se com a dos soviéticos.
A nova corrente historiográfica também contestou o conceito ―
ortodoxo‖ de que os líderes
soviéticos visassem expansão territorial no pós guerra, argumentando que a ocupação
soviética do Leste Europeu teve um caráter defensivo, qual seja, constituíra-se uma tentativa
de evitar que os Estados Unidos e seus aliados os isolassem em um cinturão inamistoso. Para
historiadores como Paul Kennedy em Ascensão e Queda das Grandes Potências, por
exemplo, uma União Soviética enfraquecida e arrasada economicamente após o fim da
Segunda Guerra jamais poderia representar uma ameaça concreta aos Estados Unidos, cujo
território não fora devastado por tropas inimigas, cuja economia só florescera durante o
período da guerra e que, naquele momento, detinha o monopólio sobre a energia atômica 27.
Eric Hobsbawn28, também revisionista, aponta para um equilíbrio desigual de poderes - no
qual os Estados Unidos tinham todas as vantagens, pois a União Soviética estava
completamente arrasada pela guerra - mas que é aceito por ambos, que contavam com o bom
senso do adversário para manter a paz, apesar do clima aparentemente agressivo e dos
discursos histriônicos de seus líderes.
Walter LaFeber, seguindo a linha de Williams em America, Rússia and the Cold War (1972),
argumentava que as origens da Guerra Fria não estariam no imediato pós guerra, mas em
disputas pré-existentes entre a Rússia e os norte-americanos no século XIX, por mercados e
influência sobre os países da Ásia Oriental. Esse historiador também acreditava que o que
desencadeou a Guerra Fria foi o empenho dos Estados Unidos, ao final da Segunda Guerra,
em assegurar que todos os países do globo estivessem abertos à sua influência e comércio.
Como essa política, evidentemente, se chocava com os interesses do comunismo soviético 29,
principalmente em relação ao ―
cinturão de segurança‖ representado para eles pelo Leste
Europeu, o confronto teria sido inevitável.
27
KENNEDY, Paul. Op cit. p.346-349
28
HOBSBAWN, Eric. A Era dos Extremos: o breve século XX. São Paulo: Cia das Letras, 2005, p. 223-230.
29
Vide comentários e discussões sobre o tema em Alan Brinkley, American History: A Survey. New York:
McGraw-Hill, pp. 798-799, 1986 e em Jonathan Nashel, op. cit, 1999.
30
Gar Alperovitz30, outro estudioso revisionista, não via a questão econômica como a origem da
disputa entre as duas potências, mas a decisão dos Estados Unidos em utilizar armas atômicas
contra Hiroshima e Nagasaki nos últimos dias da Segunda Guerra. Para ele, os norte–
americanos não as utilizaram contra o Japão, já derrotado, com a finalidade de vencer a
guerra, mas para intimidar os soviéticos, demonstrando que seriam capazes de usá-las para
reestruturar o mundo de acordo com os interesses nacionais. Esse ponto de vista se apoiava
em depoimentos biográficos de William Blum31 e de outros membros do Departamento de
Estado32 que relataram que o Japão tentou render-se antes de agosto de 1945, mas que os
Estados Unidos, desejosos de testar suas armas nucleares na guerra e mais importante, de
mostrar seu poder à União Soviética, ignoraram tais tentativas diplomáticas.
Thomas Paterson33 era um revisionista moderado que procurava conciliar a posição de seu
bloco com a dos historiadores ―
ortodoxos‖. Em Soviet-American Confrontation (1973), ele
30
In Atomic Diplomacy: Hiroshima and Potsdam (1965), apud Alan Brinkley, Op. cit. 1999
31
William Blum (1933) é um escritor e historiador norte-americano cujo trabalho critica veementemente a
política externa adotada pelos Estados Unidos no período pós-guerra. Atuou como oficial menor no Setor de
Informações do Departamento de Estado nos primeiros anos da década de 1960, quando ainda era anticomunista ferrenho e sonhava tornar-se diplomata, até desiludir-se completamente com a política externa de
seu país durante a Guerra do Vietnam. Em 1967, demitiu-se do Departamento e ingressou no jornalismo
alternativo. Em 1969, publicou uma denúncia revelando nomes e endereços de mais de duzentos agentes da
CIA e em meados dos anos 1970, trabalhou em Londres com o ex-agente da CIA Philip Agee e seus
associados em um projeto para expor o pessoal da CIA e suas ações interventivas em assassinatos e
conspirações para depor ou instituir governos onde interessasse ao governo dos Estados Unidos. Sobre o
tema de guerra política e práticas encobertas, vide também Tim Weiner, "U.S. Spied on its World War II
Allies," New York Times, Aug. 11, 1993, p.9, Legado de Cinzas, uma história da CIA, Rio de Janeiro:
Record, 2008 e Christopher Andrew, For the President´s Eyes Only, New York: Harper Perennial, 1995.
32
James Forrestal, Secretário da Marinha, Henry Stimson, Secretário da Guerra e Joseph Grew, Subsecretário de Estado aconselharam o Presidente Roosevelt, nos primeiros meses de 1945, a adotar uma
política menos radical com o Japão, de forma que aquele país pudesse se render sem ―
perder face‖. A
principal preocupação desses oficiais, e de Forrestal, em especial, não era um movimento de re-militarização
do Japão ou da Alemanha após a guerra, mas sim, a ameaça que o comunismo poderia exercer sobre as
sociedades desestabilizadas e dizimadas na Europa e na Ásia. Para Forrestal, era fundamental manter a União
Soviética fora da guerra contra o Japão. Ele acreditava tão firmemente em suas teorias que chegou a cultivar
algumas negociações unilaterais com autoridades japonesas nesse sentido. Muitos viram essa atitude de
Forrestal como uma espécie de insubordinação ao Presidente Roosevelt e ele foi desautorizado por seus
superiores, tirando qualquer efeito das negociações. ZACHARIAS, Rear Admiral Ellis M., em "How We
Bungled the Japanese Surrender," Look Magazine, June 6, 1950. Disponível em
http://ussslcca25.com/zach12.htm. Acesso em 20/03/2010. A atitude de Forrestal e a reação de Roosevelt
foram eventos que deram margem à vertente historiográfica liderada por Gar Alperovitz..
33
Thomas G. Paterson é professor emeritus de História na University de Connecticut . É autor de SovietAmerican Confrontation (1973), Meeting the Communist Threat (1988), On Every Front (1992), Contesting
Castro (1994), America Ascendant (com J. Garry Clifford, 1995), e A People and a Nation (com Mary Beth
Norton et al., 2001). Também é editor de Cold War Critics (1971), Kennedy's Quest for Victory (1989),
Imperial Surge (with Stephen G. Rabe, 1992), The Origins of the Cold War (com Robert McMahon, 1999),
Explaining the History of American Foreign Relations (com Michael J. Hogan, 2004) e Major Problems in
American Foreign Relations ( com Dennis Merrill, 2010). Com Bruce Jentleson, ele foi editor senior da
American Encyclopedia of International Relations (1997) e fez parte da junta editorial do Journal of
31
creditava a Guerra Fria tanto à hostilidade soviética, quanto aos esforços dos Estados Unidos
em dominar o mundo pós-guerra. Para ele, inclusive, o confronto resultou muito mais da
atuação desastrosa das lideranças daquele momento histórico, do que das falhas ou tendências
das estruturas e instituições vigentes, argumentando que caso Roosevelt não tivesse perecido
em 1945 e a linha de relacionamento com Stalin houvesse sido mantida, a Guerra Fria poderia
ter sido evitada ou amenizada. Em sua opinião, a impulsividade de Truman e o ímpeto
anticomunista da equipe que o assessorava 34, somados à agressividade e constante paranoia de
Stalin, é que se constituíram, na verdade, as principais determinantes de toda a tensão.
Em The Limits of Power: The World and U.S. Foreign Policy, 1945–1954 (1972), Joyce e
Gabriel Kolko, também revisionistas, argumentaram que a política externa norte-americana
era tanto anti-comunista, quanto anti-revolucionária, ou seja, que estava voltada não
necessariamente contra a influência soviética em si, mas contra qualquer ameaça às
prerrogativas econômicas e políticas que gozavam no mundo: para defendê-las usariam ações
militares, ou qualquer outro meio que julgassem necessário.
No sentido que lhe é dado pelos historiadores revisionistas, portanto, a Guerra Fria teria sido
menos uma história da rivalidade entre dois blocos ideológicos divergentes e mais a descrição
dos meios pelos quais os estados dominantes de cada bloco controlavam e disciplinavam sua
própria população e clientela e também sobre quem dava apoio e se beneficiava com a
crescente produção de armas e com a ansiedade política criada a partir da percepção de uma
ameaça externa35.
Durante a década de 1970 e, principalmente nos últimos anos da década de 1980, uma
liberdade maior de produção intelectual permitiu o acesso de pesquisadores do Ocidente a
importantes arquivos soviéticos, oferecendo aos historiadores novas perspectivas sobre o
estudo das origens da Guerra Fria, mesmo que as fontes soviéticas, evidentemente, fossem
bem mais limitadas do que as ocidentais.
American History and Diplomatic History. Presidiu a Society for Historians of American Foreign Relations,
que em 2008 o homenageou com o Laura e Norman Grabner Award por sua atuação no ensino das relações
internacionais.
34 Referindo-se, no caso, a Dean Acheson, a George Marshall, a George Kennan e, em especial a James
Forrestal.
35 Vide mais sobre a historiografia revisionista em HALLIDAY, Fred. "Cold War". The Oxford Companion to
the Politics of the World. Oxford University Press Inc., 2001, page 2e.
32
É importante deixar claro que ainda existe uma quantidade considerável de documentos da
KGB36 relacionados à política externa, às atividades militares e ao Politburo37 russo que
permanecem tão secretos e inacessíveis quanto o foram na era de Stalin. Muitos dos
documentos liberados para o público acadêmico ao longo da última década foram retirados de
circulação quando se mostraram controversos ou ameaçaram os interesses da elite política
russa, mas, com o que havia disponível, a interpretação ―
revisionista‖ sofreu uma reação
crítica em seu próprio interior e originou uma terceira corrente historiográfica, denominada
pós-revisionista.
Os pós-revisionistas aceitavam boa parte dos preceitos revisionistas, mas negavam os que
colocavam exclusivamente sobre os Estados Unidos a responsabilidade sobre o conflito.
O trabalho pós-revisionista mais importante foi The United States and the Origins of the Cold
War – 1941-1947, publicado em 1972 por John Lewis Gaddis. Criando uma nova escola de
pensamento sobre a Guerra Fria, ele clamava sintetizar maior variedade de interpretações
sobre as origens do conflito, criticando estudiosos ―
revisionistas‖, como Williams, cujos
estudos apontando as influências da economia sobre a diplomacia americana ele reconhece
como importantes, mas falhos, ao subestimar outras forças igualmente formidáveis, como a
limitações de ação políticas decorrentes da democracia, a inércia burocrática e as
características pessoais dos líderes de ambos os bloco, além de ignorar que percepções
inadequadas ou incorretas sobre as intenções soviéticas, também afetaram a ação dos
funcionários do Departamento de Estado.
Em 1997, já sob a luz dos arquivos liberados pelos soviéticos, Gaddis escreveu um ensaio, We
know now: rethinking Cold War History, no qual se pergunta se em princípios de 1945 seria
36
KGB é o termo utilizado para a abreviação em russo de Komite Gosadarstvennoy Bezopasnosti ou Comitê de
Segurança Estatal. Foi a agência de segurança nacional da União Soviética entre 1954 e 1991 e sua principal
organização de segurança internacional, inteligência e polícia secreta durante esse período. Atualmente, é a
agência de Segurança Estatal da Republica de Belarus quem usa o nome russo de KGB. A maioria dos
arquivos da KGB russa continua secreta, mas há duas fontes online que disponibilizam documentos Uma
delas contém arquivos de Andrei Sakarov, Joshua Rubenstein e Alexander Gribanov, disponível em
http://www.yale.edu/annals/sakharov/sakharov_list.htm>, em russo e em inglês. O outro, está em
<http://psi.ece.jhu.edu/~kaplan/IRUSS/BUK/GBARC/buk.html> , e se relaciona a documentos do Partido
Comunista Soviético e da KGB, coletados por Vladimir Bukovsky.
37
Politburo é um acrônimo do russo Politicheskoe Byuro, contraído para Politbyuro, ou do alemão Politbüro.
Trata-se de um comité executivo de numerosos partidos políticos relacionado aos antigos partidos comunistas
do Leste Europeu e ao Partido Comunista de Cuba. Durante o período soviético, como era o Partido
Comunista que dominava a sociedade, o Politburo do Comitê Central do Partido Comunista da União
Soviética acabou se transformando, na época da Zastóia (Estagnação), na mais alta associação do país e seus
vinte e sete membros plenos
tinham o poder de decidir o futuro da nação. Disponível em
<www.britannica.com/EBchecked/topic/467548/Politburo>. Acesso em 27/02/2011.
33
possível prever que a aliança do período de guerra iria desintegrar-se em poucos meses,
deixando em seu lugar quase meio século de Guerra Fria. Ele conclui que não. Baseado
principalmente na ampla obra de George Kennan, seu mentor intelectual, Gaddis afirma que
geografia, demografia e tradição podem efetivamente ter contribuído para o confronto, mas
não o determinaram.
Apesar de não imputar a nenhum dos dois lados a total responsabilidade pelo conflito, o
historiador ―
pós-revisionista‖ argumentou em seu ensaio que os soviéticos tiveram maior
culpa sobre a forma que os problemas emergiram, pois Stalin tinha mais condições de se
comprometer com a paz, liderando um governo autocrático, do que Truman. O presidente
americano, à frente de um regime democrático, sofria a feroz oposição interna do
macarthismo -que influenciou as massas e boa parte das politicas mais radicais adotadas no
período - e tinha que lidar com ela da melhor forma possível para manter-se no poder.
Assim, de acordo com Gaddis, os homens no poder, respondendo de forma imprevisível às
circunstâncias, é que desencadearam o processo que levou ao conflito e Stalin, em especial,
com seu autoritarismo, paranoia e narcisismo, o selou de forma irreversível.
Três anos após ter escrito o ensaio citado acima, Gaddis o justifica em comentário feito no
prefácio da reedição de The United States and the Origins of the Cold War, afirmando que a
abertura dos arquivos soviéticos e o distanciamento dos fatos lhe haviam permitido ver os
acontecimentos, retrospectivamente, de forma bem mais clara que em 1972, mas reitera sua
opinião de que o Partido Democrata e os congressistas daquele período tiveram um papel
proeminente na configuração da política externa durante a Segunda Guerra e no início da
Guerra Fria.
Ele afirma ainda que na época da primeira edição do The United States and the origins of the
Cold War, sua maior preocupação era com arquivos, teorias, quantificações, metodologia e
historiografia, esquecendo-se de algo que, em nenhum momento, os Presidente Truman e
Roosevelt perderam de vista: que operavam limitados por um ambiente político doméstico
altamente contencioso e que tinham pouca margem para conduzir a política externa da forma
que gostariam.
Ou seja, os novos questionamentos levantados pelos pós-revisionistas, mostraram-se mais
sensíveis às nuances do processo e ofereceram mais destaque às ações e perspectivas dos dois
34
lados, com menor interesse em questionar quem dera início a ele38. Essa linha de pesquisa
examina como os atores da Guerra Fria sentiam e percebiam cada um dos eventos que
levaram a ela, bem como a incompatibilidade entre os dois lados impediu que
compreendessem adequadamente a evolução da aliança feita durante a guerra ou as disputas
que se seguiram após seu termino39.
Esta tese se encaixa principalmente na linha historiográfica pós-revisionista - apesar de
concordar com alguns dos conceitos revisionistas, como a questão da expansão dos mercados
externos - pois a pesquisa foi voltada, em especial, para a tentativa de compreender como
características pessoais de um grupo seleto de atores políticos poderia tê-los levado a atuar de
forma incisiva na aplicação da política de Contenção e como suas motivações e trajetórias se
cruzaram, determinando e sendo determinadas pelo processo que levou à Guerra Fria.
38
39
Vide mais concepções pós-revisionistas sobre as origens da Guerra Fria nas obras de John Lewis Gaddis e de
Melvin Leffler, comentadas em Peter Bastian, Interpreting the Cold War from Soviet Sources, Teaching
History, Vol. 35, No 4. December, 2001, pp.5-10. John Lewis Gaddis também recomenda a leitura de
Michael Hogan, Frank Costigliola, Elaine Tyler May, Marc Trachtemberg, Aaron Friedberg, Anders
Stephenson e Carolyn Eisenberg, entre outros, para compreender com maior profundidade o papel dos
Estados Unidos nos primeiro anos da Guerra Fria.
HALLIDAY, 2001. Op. cit.
35
2. George Kennan e a doutrina de contenção
Em fevereiro de 1946, as opiniões de Washington sobre o comportamento agressivo do
governo soviético em relação ao Leste Europeu eram muito variadas. Havia oficiais do
Departamento de Estado e da Defesa - como Dean Acheson, George F. Kennan e James
Forrestal - que tinham clara percepção das diferenças ideológicas existentes entre os dois
países e que se mostravam céticos em relação a compromissos definitivos com Moscou40. Por
outro lado, também havia políticos liberais norte-americanos - como o senador Henry
Wallace, ou o influente jornalista Walter Lippmann – que, influenciados pelo espírito
rooseveltiano que prevalecera durante a guerra, ainda se esforçavam para ver as coisas sob o
enfoque soviético, sem compreender porque estes se comportavam de forma tão beligerante
em relação ao Ocidente41.
Nesse clima, uma atitude do líder soviético acelerou a preocupação dos mais céticos quanto
á parceria americano-soviética. Em 09 de fevereiro de 1946, em campanha eleitoral, Joseph
Stalin declarou em palanque que a Segunda Guerra havia sido causada por contradições
inerentes ao capitalismo e que, apesar dos soviéticos e seus aliados ocidentais ―
amantes da
liberdade‖ terem lutado juntos por uma causa comum -
eliminar o nazismo -
as
―
hostilidades‖ do sistema internacional e o ―
cerco‖ que o capitalismo fazia aos países
soviéticos, criavam uma forte incompatibilidade entre
Comunismo e Capitalismo e,
42
eventualmente, poderiam levar a uma nova guerra .
Tal discurso foi identificado pela historiografia como o primeiro sinal de ruptura no clima de
boa vontade incondicional de Washington em relação aos soviéticos, mesmo entre os mais
40
Vide The Forrestal Diaries, p. 134-135; Gaddis, The US and the Origins of the Cold War, p. 299-301;
Acheson, Present at the Creation, p. 150-151.
41
Durante a guerra, internacionalistas como Cordel Hull argumentaram que a crise global dos anos 1930 havia
sido causada, em parte, pelo mau funcionamento da economia internacional: tarifas protetoras, concorrência
desleal, acesso irrestrito a matérias primas, políticas governamentais autárquicas, etc. Para evitar que esses
erros voltassem a ocorrer, os Estados Unidos decidiram comprometer-se com a criação de uma nova ordem
internacional, benéfica aos interesses do capitalismo ocidental. Daí a série de acordos internacionais firmados
entre 1942 e 1946 (FMI, BIRD e GATT). Os países que desejavam obter os recursos disponíveis para
reconstrução e desenvolvimento sob esse novo regime econômico, viram-se obrigados a aceitas as exigências
americanas de livre conversibilidade das moedas e a da livre concorrência (como fizeram o ingleses, a
contragosto) ou afastar-se totalmente do sistema (como fizeram os russos, quando perceberam a sua
incompatibilidade com os controles socialistas).
42
Discurso de Stalin em 03/01/1946 registrado em Vital Speeches. In ISAACSON e THOMAS 1986, p. 350
36
bem intencionados. Paul Nitze 43, futuro chefe do Gabinete de Planejamento Político (Political
Planning Staff – PPS) do Departamento de Estado, era um republicano realista que,
juntamente com outros companheiros no governo, como Charles Bohlen, James Forrestal,
William A. Harriman e Robert Lovett, mantinha-se em permanente alerta quanto a qualquer
movimento expansionista do comunismo em relação ao Ocidente.
Alarmado com o conteúdo implícito no discurso do ditador soviético, Paul Nitze contatou o
Sub-Secretário da Defesa, James Forrestal, no Pentágono, para lhe dizer que tais palavras
significavam uma declaração indireta de guerra aos Estados Unidos. Sem necessidade de ser
convencido, já que Forrestal também tinha sérias reservas quanto à possibilidade de uma
parceria produtiva entre americanos e soviéticos, o Secretário da Defesa encaminhou Nitze
para Dean Acheson, então Vice-Secretário de Estado.
Menos impulsivo e apesar de não acreditar que o problema tivesse a gravidade que Forrestal e
Nitze intuíam, Acheson solicitou a George Kennan - um brilhante, mas obscuro oficial
diplomático temporariamente encarregado dos assuntos russos na embaixada americana em
Moscou - uma análise política que explicasse ―asorigens da conduta soviética‖.
Diplomata de carreira e uma das mais conceituadas autoridades de sua era sobre os costumes,
tradições e cultura russa, George Kennan enviou a seu superior um longo telegrama
analítico44, expondo de forma clara e didática o seu ponto de vista sobre o tema e com isso
desencadeou um processo que afetaria a a política externa norte-americana por quase meio
século.
Para Kennan, pelo próprio caráter da ideologia marxista, os líderes soviéticos não
reconheciam qualquer oposição a seu sistema, não importando sob que mérito ou justificativa,
exceto, em teoria, ―
a que derivasse de forças hostis e incorrigíveis do capitalismo decadente‖.
43
Paul Nitze começou sua carreira política durante a 2ª. Guerra, no staff de James Forrestal quando esse militar
ainda era Assistente Administrativo do presidente Roosevelt. Haviam trabalhado juntos na Dillon, Read em
Wall Street. Nessa época, conheceu seu antecessor George Kennan no restaurante de um trem que ia para
Nova York. Após discutirem amigos em comum, como Charles Bohlen, Kennan partilhou com ele suas
opiniões radicais sobre o comportamento dos soviéticos e ambos perceberam que tinham muito em comum.
Com idéias ainda mais radicais que as do diplomata, Paul Nitze irá substituí-lo, em 1950, na chefia do
Departamento de Planejamento Político (Policy Planning Staff – PPS) . Nesse cargo, Paul Nitze tornou-se o
principal autor de um documento altamente secreto emitido pelo Conselho de Segurança Nacional, o NSC-68,
cujo objetivo era delinear as linhas estratégicas a serem adotadas pelos Estados Unidos para ―
conter‖ a
expansão armamentista dos soviéticos. Vide mais em NITZE, Paul. From Hiroshima to Glasnost: At the
center of decision. New York, Grove Press, 1989.
44
KENNAN, George F. The sources of Soviet Conduct. In American Diplomacy. Chicago: The University of
Chicago Press, 1951, 1979, 1984, p.107-128
37
Como qualquer oposição era vista pelos governantes russos como uma reação antagônica de
forças estrangeiras contra o poder soviético, para defender-se, eles passaram a enfatizar de
forma dramática a tese comunista original, qual seja, a da existência de um conflito estrutural
entre os mundos capitalistas e socialistas.
Essa prática tinha uma importante finalidade: manter em funcionamento e sob o firme
controle do governo órgãos de repressão como o exército e a polícia secreta, com a finalidade
de conservar as ameaças externas ao largo. Com o passar do tempo, o cultivo do semi-mito de
hostilidade estrangeira implacável ajudou a promover a expansão da máquina burocrática e
militar soviética e garantiu a segurança de seus governantes - por meio de uma disciplina de
ferro do Partido, da severidade e ubiquidade da polícia secreta e do descompromissado
monopólio econômico do Estado.
Em seu relatório, Kennan observou também que grande parte da estrutura de poder soviética
estava diretamente envolvida, ou com o aperfeiçoamento da ditadura de Stalin, ou com a
manutenção do conceito de que a Rússia vivia em permanente estado de sítio, com inimigos
se amontoando em torno de suas fronteiras.
Sob tal background histórico, ficava claro porque qualquer tentativa dos Estados Unidos em
reatar ou intensificar relações diplomáticas ou comerciais com os soviéticos seria vista por
eles sob um prisma de desconfiança. Por considerarem os objetivos e interesses do mundo
capitalista antagônicos aos seus, qualquer acordo firmado pelo Kremlin durante uma eventual
parceria com os governos ocidentais - como a que fizeram para derrotar Adolf Hitler - seria
considerado mera manobra tática, permissível apenas para lidar com um inimigo (que, sendo
inimigo, não teria qualquer honra e portanto, dispensava conflitos morais na quebra posterior
de qualquer compromisso).
Ou seja, para Kennan, a contínua manutenção do antagonismo ideológico pelos russos poderia
explicar, de certa forma, os fenômenos que tanto perturbavam os observadores ocidentais na
condução da política externa do Kremlin: o permanente segredo nas ações governamentais, a
constante falta de franqueza dos oficiais públicos, a duplicidade no discurso político de Stalin,
as inefáveis suspeitas de guerra e, principalmente, a falta de propostas basicamente amigáveis
no relacionamento entre os dois países.
Nessa perspectiva, no entanto, ele reconhece que apesar de ser muito difícil para os Estados
Unidos lidarem de forma adequada com os russos, aquele país havia sofrido muitas perdas
38
durante a guerra e não existia, em curto prazo, qualquer risco de revolução imediata que
ameaçasse subverter a ordem capitalista no Ocidente.
Ainda assim, Kennan recomendava a seus superiores uma política externa voltada para ―
a
contenção de longo prazo, firme e vigilante, das tendências expansionistas soviéticas‖. Na
prática, essa contenção significaria uma vigilância direta sobre o estado socialista, contraatacando pontualmente cada uma de suas manobras políticas e geográficas até que, por uma
série de circunstâncias internas - seja pela crueldade da ditadura, seja como fruto da desilusão
popular com o ideal socialista - o comunismo entrasse em colapso e se auto-destruísse.
Kennan sabia que meras atitudes diplomáticas em si, não seriam suficientes para apressar a
queda do poder soviético, mas acreditava que, estrategicamente aplicadas, algumas medidas
poderiam intensificar o stress sob o qual a política soviética operava, forçando o Kremlin a
agir com moderação e circunspecção bem maiores do que as apresentadas nos anos anteriores,
até que, eventualmente, os Estados Unidos encontrassem meios concretos para promover a
queda, ou a eventual dissolução do poder soviético.
Esse telegrama chegou a Washington num momento providencial para oficiais militaristas
que, como James Forrestal, lutavam para conscientizar os políticos e a opinião pública
isolacionista sobre as transformações que estava tendo lugar na governança internacional,
uma vez que seu conteúdo ecoava os temores dos defensores de uma linha-dura contra os
soviéticos: ―
o governo russo é impermeável à lógica da razão, mas altamente sensível à lógica
da força, (...) só retroagindo quando encontra forte resistência à sua frente‖.
Essa clara alusão à necessidade de uso militar para ―
conter‖ o expansionismo soviético - que
já se manifestava no Leste Europeu - era atraente demais para os militarista, chegando a
obscurecer
outras
recomendações mais moderadas feitas por Kennan, como o
desenvolvimento de programas de propaganda capitalista, ou de esforços conjugados na
reconstrução da vitalidade econômica e espiritual do Ocidente.
Kennan foi imediatamente chamado de volta a Washington45, iniciando uma trajetória política
apoteótica. Oficialmente, palestrava em universidades e academias militares norteamericanas, esclarecendo opiniões e fazendo um intenso trabalho de conscientização pública.
Extra-oficialmente, preparava as estruturas de uma agencia centralizada de inteligência - a
45
Quando escreveu o Longo Telegrama, em fevereiro de 1946, George Kennan ocupava o posto de Chargé
D`Affairs da Embaixada Americana em Moscou. KENNAN, Op. cit., 1992.
39
futura CIA - e planejava a implantação de uma série de medidas institucionais que visavam
fortalecer o capitalismo no ocidente, como o Plano Marshall ou o BIRD, enquanto acumulava
um poder simbólico extraordinário na cúpula do poder.
Ora, George Kennan era um funcionário público de longa data. Já havia exposto seu
pensamento de forma pragmática e alertado seus superiores sobre o perigo da leniência em
relação aos soviéticos em centenas de relatórios anteriores. Por mais de dez anos, suas
recomendações – as mesmas - encheram gavetas e gavetas do Departamento de Estado, sem
nunca terem chamado a atenção de ninguém. Por que, repentinamente, ele se transformou no
guru político da moda entre os membros no alto escalão governamental de Truman?
Porque, aparentemente, o que fez do Longo Telegrama um documento tão influente em
Washington, não foi o que Kennan expunha nele, mas o fato de seu conteúdo, naquele
momento, conter exatamente o que Washington queria ouvir. Ele deu voz e autoridade à uma
inquietude ainda inarticulada que começava a crescer entre alguns membros do governo e
unificou a proposta governamental de política externa sob uma única palavra: contenção.
Ou seja, a facção hegemônica que ascendera às camadas centrais do poder com Truman e que
pretendia impor sua visão internacionalista de mundo e afastar contendores, só lograria seu
intento em longo prazo se pudesse contar com o apoio das grandes massas e de seus
representantes no Congresso. Como esse apoio só lhes seria outorgado quando os populares se
identificassem com as políticas propostas, eles se viram instados a comissionar intelectuais
como Kennan para ―
criar‖ universalidades que atendessem a seus propósitos de dominação.
Nos Estados Unidos do pós-guerra, existiam duas forças antagônicas relacionadas à prática de
política externa. De um lado, distinguia-se um grupo tradicionalmente isolacionista,
interessado em solucionar os problemas internos do país sem envolver-se com as mazelas das
outras nações. De outro, posicionavam-se os internacionalistas, que ansiavam ampliar a
influência norte-americana mundialmente e evitar que a expansão de outras potências - no
caso, a União Soviética - ocupassem espaços que acreditavam seus de direito.
Apesar de adversárias na disputa pela hegemonia e co-dependentes do voto popular para se
manterem no poder, ambas eram facções de elites burocráticas ou tradicionais que tinham
plena consciência de que a unidade seria um pré-requisito fundamental para partilharem um
mesmo projeto de governo, principalmente em face da aparente ameaça externa que se
configurava com as ações da União Soviética no Leste Europeu.
40
Para os adeptos ferrenhos do internacionalismo que almejam mais espaço no governo, qual
seria a melhor forma de amenizar o confronto político internamente, incentivar a
internacionalização para dar vazão ao crescimento da produção interna e manter a hegemonia
das elites burocráticas e tradicionais sem rupturas?
Em primeiro lugar, incumbindo intelectuais de sua facção democrata e internacionalista de
conscientizar o outro lado do campo –republicano e isolacionista – da existência de interesses
comuns entre eles, garantindo o sprit de corps da elite contra forças sociais externas e
internas, representadas pelo comunismo. Para reforçar esse objetivo, Kennan foi
providencialmente trazido de Moscou para Washington para perorar contra o sistema
stalinista em toda e qualquer audiência de civis ou militares que tivesse formadores de
opinião. Mas a conscientização era apenas um primeiro estágio do processo.
O estágio seguinte seria criar e preencher cargos no aparato administrativo, cultural e
coercitivo do Estado de forma a assegurar o consentimento passivo das classes populares e de
seus representantes às novas práticas internacionalistas e militaristas que pretendiam colocar
em funcionamento. Isso também foi possível – sob a batuta de Kennan - com a criação do
Gabinete de Planejamento Político e posteriormente, de instituições como o Plano Marshall 46,
o BIRD47, a CIA48, a NATO49, etc.
Ou seja, quando o Longo Telegrama chegou a Washington, seu conteúdo ofereceu a
justificativa moral – defesa contra uma ameaça externa - que a facção no poder necessitava
46 O Plano Marshall foi o Programa de Recuperação Européia (ERP) criado em 1947 para a reconstrução
econômica dos países aliados, nos anos seguintes á Segunda Guerra. A iniciativa recebeu o nome do então
Secretário de Estado George Marshall. Informações e documentos relacionados ao plano estão em USAID,
disponível em http://www.usaid.gov/multimedia/video/marshall/. Acesso em 27/02/2011
47 O Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) se propõe a reduzir a pobreza em
países pobres promovendo desenvolvimento sustentável por meio de empréstimos, garantias, produtos de
gerenciamento de risco e serviços de analise e aconselhamento financeiro. Estabelecido em 1944 como uma
instituição do Banco Mundial, o BIRD está estruturado como uma cooperativa que pertence e é operada em
benefício
de
seus
187
países-membros.
In
WORLD
BANK.
Disponível
em
http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/EXTABOUTUS/EXTIBRD/0,,menuPK:3046081~pagePK:
64168427~piPK:64168435~theSitePK:3046012,00.html. Acesso em 27/02/2011.
48 A Agência Central de Inteligência (CIA) é uma agencia civil de inteligência do governo dos Estados Unidos
que se reporta ao Diretor de Inteligência Nacional e é responsável por promover inteligência de segurança
nacional aos políticos de alto escalão norte-americanos. A CIA também se envolve em atividades encobertas a
pedido do presidente dos Estados Unidos e foi criada pelo Ato de Segurança Nacional de 1947. In CIA.
Disponível em https://www.cia.gov/about-cia/history-of-the-cia/index.html. Acesso em 27/02/2011.
49 A Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), também chamada de Aliança Atlântica, é uma
organização internacional de cooperação militar estabelecida entre 28 países democráticos na Europa e
América do Norte, em suporte ao Tratado do Atlântico Norte assinado em Washington em abril de 1949. In
NATO. Disponível em http://www.nato.int/cps/en/SID-A04ADEA6-9DB793D1/natolive/57772.htm . Acesso
em 27/02/2011.
41
para construir a universalidade de interesses que desejava, provocando a adesão popular a seu
projeto de governo. Ao amplificar ainda mais as ameaças externas pré-existentes, Kennan
acentuou a necessidade de proteção pelo Estado e consequentemente, reforçou a legitimação
política de seus dirigentes.
Todo os oficiais convocados para colocar em prática a política de contenção à expansão
soviética – desde Forrestal, Marshall, Bohlen, Kennan, Acheson, McCloy e Lovett até o mais
insignificante oficial do Departamento de Estado – deveriam ocupar o aparato administrativo
da máquina política enquanto o Presidente Truman, apoiando-se habilmente em uma coalizão
apartidária,
lhes outorgaria poderes para amplificar os eventos que garantiriam a
―
universalidade‖ de propósitos de seu governo.
A estratégia de utilizar a produção simbólica de um grupo de acólitos para dar suporte à
hegemonia do grupo dirigente no pós-guerra, no entanto, gerou no médio prazo uma
consequência inesperada: permitiu a consolidação no poder da elite burocrática que emergira
durante o governo Roosevelt. Detentores de grande capital intelectual, alguns membros
oriundos de classes médias e desprovidos de capital financeiro ou político - como Kennan,
McCloy ou Forrestal – tiveram suas trajetórias intimamente entrelaçadas com os campos do
poder político e econômico.
É importante lembrar a essa altura que, à medida que novas estruturas liberais se
consolidavam, tendências isolacionistas e poder tradicional da riqueza hereditária se
dissipavam ao longo das décadas de 1940 e 1950, levando o domínio político no país a entrar
em rotatividade.
Ou seja, durante a década de 1930, paralelamente à emergência de novas instâncias de poder,
novas oportunidades de ascensão social foram oferecidas a egressos da classe média e
detentores de profissões especializadas, como o Direito, em cargos públicos criados na
máquina política por programas sociais e acordos relacionados ao New Deal.
Com frequência cada vez maior, membros periféricos do campo politico, apoiados em
grandes volumes de capital intelectual - como Harry Hopkins50, George Kennan, James
50 Harry L. Hopkins era filho de um pequeno comerciante e cresceu vendo sua mãe participar ativamente de
atividades assistenciais promovidas pela igreja metodista local. Influenciado por ela, logo após graduar-se em
Cornell, empregou-se em uma entidade assistencial do gueto do Lower East Side de Nova York. Em 1915,
sempre atuando em entidades voltadas para a criação de empregos, organizou um dos primeiros programas
públicos nesse sentido estabelecidos nos Estados Unidos e foi apontado pelo prefeito de Nova York, John
Purroy Mitchel, como secretário executivo no Bureau de Bem Estar Infantil, que administrava pensões para
mães com filhos dependentes. Foi gerente geral da Cruz Vermelha durante a 1ª. Guerra Mundial e a seu
42
Forrestal e John McCloy - passaram a galgar posições cada vez mais importantes nas esferas
da política ou da economia.
Truman, per si, é um modelo capitular desse perfil51. Originário das camadas inferiores e
tendo atingido o centro do poder burocrático legal por meio de várias estratégias pessoais
envolvendo capital social acumulado no período da 1ª. Guerra e fraternidades sociais, o
presidente procurou aconselhar-se sobre política externa, na medida do possível, com acólitos
com os quais se identificasse, qual seja, com os que tivessem origens, valores ou méritos
semelhantes aos seus sem, no entanto, desprezar os que vinham de boa linhagem e que
poderiam fazer-lhe a ponte com o poder emergente ou tradicional, como era o caso de
William Harriman, ou Robert Lovett.
Servidores políticos como Harriman, Lovett, Acheson e McCloy receberam cargos de
confiança do Presidente na área de política externa e, após outorgar-lhes poder político para
intermediar relações entre Administração e Senado, Truman raramente interferia em seus
projetos52.
término, passou a atuar em projetos de saúde pública. Diretor Executivo da Administração Emergencial de
Auxilio Desemprego (TERA) quando Roosevelt era governador de Nova York, chamou sua atenção por ter
administrado com eficiência os US$ 20 milhões destinados àquela agencia. Ao ser eleito presidente dos
Estados Unidos, Roosevelt atraiu Hopkins para sua equipe e este, devido a uma longa amizade com Eleanor
Roosevelt, pode fortalecer ainda mais seu papel em programas de alívio social. Durante a 2ª. Guerra, foi
enviado à Inglaterra como emissário extra-oficial do presidente e tornou-se o principal administrador do
Lend-lease, um projeto do governo norte-americano no valor de US 50 bilhões, que visava suprir
militarmente a Inglaterra para conter a invasão germânica. Posteriormente, por sugestão de Hopkins, a União
Soviética e a China foram incluídas no programa e Hopkins foi o oficial norte-americano que mais manteve
contatos diretos com Joseph Stalin. Atuou como conselheiro de Roosevelt em vários encontros com Churchill
e sua influencia individual era maior do que a de todo o Departamento de Estado. Após a morte do presidente
em abril de 1945, Hopkins tentou renunciar, mas Truman não aceitou sua demissão e o enviou para uma
última missão a Moscou, já que durante a Guerra, fora o mais importante oficial a contatar os russos, desde os
de graduação menos elevada até os mais graduados. Menos de um ano após a morte de Roosevelt, Hopkins
faleceu de câncer, em Nova York.
Disponível em Britannica Encyclopaedia. Disponível em
http://www.britannica.com/EBchecked/topic/271544/Harry-L-Hopkins. Acesso em 27/02/2011.
51 Ao contrário de Franklin D. Roosevelt, que era originário das camadas superiores da sociedade norteamericana, Harry Truman vinha de uma família humilde e viveu sua infância em precária situação
financeira. Impossibilitado de cursar a universidade como os jovens da elite, ele ingressou na vida profissional
com empregos variados, trabalhando desde bancário até agricultor. Nos primeiros anos da década de 1920,
ingressou no Partido Democrata e foi eleito juiz do Condado de Jackson por influencia de um cacique local.
Para poder fazer frente às suas novas responsabilidades, finalmente fez um curso noturno de Direito em
Kansas City e nas eleições de 1934 e 1940, foi eleito Senador pelo Kansas. Em 1944, chegou a vicepresidência da República na chapa de Franklin D. Roosevelt e com a morte do presidente em abril de 1945,
foi catapultado para o cargo máximo da política norte-americana. In White House Library e Truman
Library.
Disponível
em
http://www.whitehouse.gov/about/presidents/harrystruman
e
em
http://www.trumanlibrary.org/hst-bio.htm. Acesso em 27/02/2011.
52 ISAACSON & THOMAS, Op. cit. 1986, p. 452.
43
Servidores de carreira, como George Kennan e Charles Bohlen, por outro lado, exerciam
funções burocráticas especificamente técnicas no aparelho estatal, qual seja, elaboravam
políticas de recuperação econômica e tratados bilaterais com a Europa e com a Ásia,
estruturando organismos supra-nacionais e de ajuda humanitária.
Servidores militaristas, como George Marshall e James Forrestal, por sua vez, tinham cargos
também de confiança e lidavam com projetos e ações relacionados à defesa nacional, como a
elaboração do Plano de Segurança Nacional de 1947, a criação da NATO, a manutenção do
Projeto Manhattan, etc.
Dentre esses burocratas especialistas em política externa e em defesa - fossem eles de
confiança, de carreira, ou militaristas– havia muitos que dependiam materialmente de seus
cargos, como Kennan e Bohlen, mas também havia os que se colocavam à disposição dos
governantes por desejarem o poder e o prestígio pessoal deles emanado, como Harriman e
Lovett.
Para serem merecedores dos privilégios que recebiam, atuavam no convencimento das massas
e produziam os bens simbólicos que reforçavam a preponderância da facção que os
convocara. Igualmente, eram responsáveis pela criação das visões universais de mundo que,
além de submeter as classes subalternas à vontade das elites, facilitaria seu controle por meio
do aparato coercitivo do Estado.
Um estudo sobre as origens e trajetórias desses agentes sociais, delimitando os vínculos que
criaram entre si ao longo de suas carreiras profissionais e políticas e que os levaram a reunirse em torno de Harry Truman para colocara em prática um novo estilo de política externa para
os Estados Unidos, portanto, permitiria um enfoque único sobre as origens da Guerra Fria.
Por questões metodológicas, as informações contidas nos Quadros que serão apresentados a
seguir serão classificadas de acordo com as atividades que os pesquisados exerceram em
relação à Guerra Fria, qual seja, Roosevelt e Truman, como servidores legais; Kennan e
Bohlen como servidores burocráticos do Departamento de Estado; Harriman, Acheson, Lovett
e McCloy como servidores políticos do Departamento de Estado ou Defesa e Marshall e
Forrestal como servidores militaristas do Departamento de Estado e da Defesa.
É importante ainda recordar que os quadros apresentados a seguir são sínteses de origens e
trajetórias dos pesquisados e que, como seus dados foram levantados em biografias e
memórias, estão reduzidos aos limites viáveis implícitos a tal empreitada.
44
Origens, trajetórias e capitais simbólicos da elite do poder
Antes de proceder à discussão sobre origens e capitais simbólicos da elite do poder que será
descrita nos Quadros abaixo, seria importante recordar o significado de dois conceitos
importantes: poder e dominação. Por poder, entende-se a capacidade de induzir ou influenciar
o comportamento de outra pessoa, utilizando-se de coerção, manipulação ou de normas
estabelecidas.
Dominação (ou autoridade), por outro lado, comporta o direito adquirido de se fazer obedecer
e de exercer influência sobre um grupo, fundamentando-se a submissão em tradições e
costumes institucionalizados, nas qualidades excepcionais de determinados indivíduos, em
relações de afeto e de interesses, ou em regras estabelecidas racionalmente e aceitas por todos.
Weber considera a dominação como uma forma de se exercer poder, já que numa relação
entre dominador e dominado, existem bases jurídicas legitimando o domínio. A autoridade
legal seria, portanto, o estado que permite o uso de certo poder e em seu estado ideal, vinculase a uma estrutura social e a um meio administrativo diferente para cada um dos três tipos de
domínio para ser legitimada.
Definidos poder e dominação a partir da formulação weberiana, cabe agora determinar o
significado de elite do poder conforme os conceitos:
a) de divisão do poder entre governantes e governados emitido por Gaetano Mosca53
(1858-1941),
b) de luta das elites contra contendores no interior do campo político e econômico de
Vilfredo Pareto54 (1848-1923) e
c) da lei de ferro das oligarquias de Robert Michels 55 (1876-1936).
53
A teoria das elites surgiu com o filósofo e pensador político italiano, Gaetano Mosca que, ao publicar
"Elementi di Scienza Política" (1896), estabeleceu os pressupostos do elitismo ao salientar que em toda
sociedade, seja ela arcaica, antiga ou moderna, existe sempre uma minoria que é detentora do poder em
detrimento de uma maioria que dele está privado. Esse restrito grupo de pessoas que detêm a força política é
denominado por ele como classe dirigente. De acordo com esta teoria, as sociedades estão divididas entre
dois grupos: governantes e governados. Os governantes são menos numerosos, monopolizam o poder e
impõem sua vontade ao restante da sociedade valendo-se tanto de métodos legítimos, quanto arbitrários e
violentos. CANCIAN, Renato. O poder político monopolizados pelos governantes. In UOL Educação.
Disponível em http://educacao.uol.com.br/sociologia/ult4264u27.jhtm. Acesso em 27/02/2011.
54
PARETO, Vilfredo. Manual de Economia Política. São Paulo: Editora Nova Fronteira, 1990. 2 vol.
55
Robert Michels (1876-1936) foi um sociólogo alemão que analisou o comportamento político das elites
intelectuais. Tornou-se socialista quando lecionava na Universidade de Marburg, tendo se envolvido com a
ala radical do Partido Social Democrata alemão até 1907, quando o abandona, desencantado com a falta de
45
O conceito de elite do poder estabelecido por Mosca em 1896 não era uma ideia nova, já
tendo sido discutida no trabalho de filósofos e pensadores como Maquiavel, Montesquieu e
Marx, entre outros. A originalidade de seu enfoque, no entanto, se deve ao argumento de que
para ele, a classe dirigente, ou seja, dos governantes, se constituiria sempre em uma minoria
detentora do poder por ser mais organizada.
Ou seja, que a afinidade de interesses econômicos, de classe, ou de filiação ideológica,
permitiriam que grupos de elite – a elite do poder - criassem vínculos de homogeneidade e
solidariedade entre si e, assim fortalecidos, se vissem melhor aparelhados para apropriar-se de
instrumentos e recursos que lhes permitissem exercer dominação sobre o restante da
sociedade (um grupo bem mais numeroso, mas menos capaz de se articular).
Apesar de concordar com a teoria das elites de Mosca, Vilfredo Pareto mostrou-se
preocupado com a interação entre as diversas elites do poder e classificou as elites políticas e
as elites econômicas como as mais importantes na sociedade, além de ter destacado em seu
estudo que os vários grupos que as compunham também passavam por processos de ascensão
e decadência e, que por meio de luta interna, eles se sucediam uns aos outras no exercício da
dominação política. Ele considerava como ―
ordem natural‖
das coisas a existências de
desigualdades sociais em qualquer sociedade, acreditando que eram essas desigualdades que
contribuíam diretamente para o surgimento das elites econômicas e políticas.
Ampliando o pensamento de Mosca e Pareto, surgiu o trabalho de Robert que analisaria a
dinâmica da política democrática no interior de partidos políticos de massa. Baseado em
evidências empíricas, Michels demonstrou que mesmo em organizações partidárias
comprometidas com os princípios de igualdade e democracia - como partidos políticos de
massa, sindicatos, corporações e grandes organizações sociais - existiam fortes tendências à
elitização e à concentração de poder nas mãos de um grupo restrito de pessoas, por meio da
lei de ferro das hierarquias. Ele constatou que organizações, partidos políticos ou
movimentos sociais até poderiam surgir em decorrência de verdadeiros objetivos igualitários e
democráticos, mas que, com o tempo, a tendência à elitização também se manifestaria em seu
democracia no interior do partido. Em sua obra Partido Políticos: um Estudo Sociológico das Tendências
Oligárquicas da Democracia Contemporânea (1916) ele analisou a lei de ferro da oligarquização nos
sindicatos e partidos operários, e ao longo dos anos 20 e 30, escreveu sobre nacionalismo, socialismo e
fascismo italiano, o papel dos intelectuais e das elites, a mobilidade social, a história das ciências sociais. Foi
muito criticado por seu tom desiludido em relação á democracia e por sua tendência elitista. In Britannica
Encyclopaedia. Disponível em http://www.britannica.com/EBchecked/topic/380041/Robert-Michels . Acesso
em 27/02/2011.
46
interior e que um grupo sempre acabaria se sobrepondo aos demais para fazer valer suas
vontades.
Seria interessante que o leitor tivesse esses conceitos em mente ao fazer a leitura dos Quadros
abaixo, que procuram representar as principais características de uma elite de poder,
lembrando que fora do campo dos estudos acadêmicos, o termo elite também se refere aos
grupos hierarquicamente superiores em organizações burocráticas educacionais, sociais,
econômicas, religiosas ou militares.
3.1 Servidores legais
A construção do perfil de atores sociais que atingiram as mais altas posições do governo
norte-americano no período de 1945 a 1950 visa proporcionar um entendimento mais claro de
como história e biografia podem se combinar para modelar o curso da política, sempre
lembrando que cada época escolhe e forma seus representantes políticos e que, longo do
século XX e especialmente após a Primeira Guerra Mundial, o conteúdo e a importância das
instituições políticas nos Estados Unidos sofreram grandes alterações estruturais.
A partir do desenvolvimento industrial daquele país e da necessidade de um Estado permeável
aos interesses de uma nova classe emergente, a organização política dos Estados Unidos
precisou ampliar seu alcance e aproximar-se mais de quase todas as instituições sociais,
favorecendo a participação popular. Como as crises sistêmicas resultantes de tais
transformações estruturais não conseguiam mais ser solucionadas com medidas políticas
fundadas nas velhas bases locais e descentralizadas que haviam caracterizado o período préindustrial, a sociedade começou, lentamente, a se voltar para o Estado em busca de socorro.
A demanda centralizadora modificou e ampliou a forma e o poder do Estado, aumentando
igualmente a influencia dos grupos sociais que conseguiam conquistá-lo apropriando-se das
instituições políticas que o sustentavam. No período entre 1945-1950, o cargo da Presidência
foi ocupado por dois membros do Partido Democrata: Franklin D. Roosevelt, que em seu
quarto mandato consecutivo, o ocupou por pouco tempo, vindo a falecer pouco mais de três
meses depois da posse e por Harry Truman, seu vice, que se instalaria no cargo até o fim do
mandato, reelegendo-se posteriormente, até 1952.
47
Como se pode observar no quadro abaixo, durante ambos os governos, grandes
transformações no cenário externo, causadas pela crise de 1929, pela emergência dos estados
fascistas e pelos movimentos operários, deram à vitória dos Aliados na Europa em 1945 uma
dimensão muito maior e as decisões tomadas por eles configurariam uma nova ordem
internacional, determinando e consolidando a hegemonia dos Estados Unidos sobre o mundo
capitalista e ocidental.
Quadro I. Origens, Capitais Simbólicos e Trajetórias de Servidores Legais
Franklin D Roosevelt
Origem
 Fratrias
familiares e
sociais
(30/01/1882 a 12/04/1945)
Hudson Valley, New York
 Família rica e tradicional de ascendência holandesa e francesa.
Vivia na Costa Leste.
 Filho único.
 Mae o levava a viagens à Europa desde criança e exigia
cumprimento estrito de regras sociais.
 Casou-se com Eleanor Roosevelt, sobrinha do Presidente Theodore
Roosevelt, que a levou ao altar. Seis filhos.
 Membro do New York Civitan Club (1920), da Old Fellow Order
(1908) da fraternidade Alpha Delta Phi em Harvard e da
Maçonaria. (1911)
Harry S Truman
(08/05/1884 a 26/12/1972)
Lamar, Missouri
 Família humilde e com precária situação
financeira. Vivia no campo, no Meio Oeste.
 Mais velho de três irmãos.
 Muito ligado à mãe, que sempre o incentivou
à leitura e á musica, por seus problemas com a
vista o impedirem de atividades infantis.
 Casou-se com namorada de infância Bess
Wallace. Uma filha.
 Jacobson foi seu sócio e amigo de toda vida,
influenciando-o na decisão de reconhecer o
estado de Israel em 1948.
 Amizade com James Pendergast durante
treinamento na 1ª. Guerra e posterior
apadrinhamento político por John Pendergast.
 Maçonaria
 Gestão do
capital social
 Trabalhou como agricultor na adolescência.
 Aceito na Maçonaria em 1909. Em1940 era
Grão Mestre do Missouri.
 Colocou suas qualidades de liderança em
evidência durante 1ª. Guerra, como oficial.
 Viagens à Europa desde criança adquirindo fluência em alemão e
 Cursa Direito quando, após ingressar no
francês.
partido Democrata (1922), e ser eleito Juiz
 Na Universidade, foi presidente do diário Harvard Crimson.
Administrativo de Jackson por influencia da
 Teve poliomielite (1921) e usava ferro nos braços e quadril.
máquina partidária de John Pendergast, tio de
 Não se deixava fotografar em cadeira de rodas.
seu amigo James.
 Gregário e bem humorado, construiu redes de relacionamento em
 Diretor do Programa Federal de Empregos do
Groton e Harvard, usando amigos pessoais para apoio político.
National Reconstruction Administration, em
1933, por indicação de James Fairley em troca
dos votos obtidos em Kansas City por John
Pendergast para Roosevelt, nas eleições de
1932.
 Nesse cargo tem os primeiros contatos com
Harry Hopkins.
 Educação
 Groton School. (foi-lhe inculcado por Peabody o sentimento de
 Alfabetizado pela mãe.
dever cristão e de auxiliar os menos afortunados, bem como o
 Independence High School (escola pública
incentivo à participação no serviço público)
local)
 Harvard High School
 Cursou dois anos de Direito em Kansas City
 Columbia (Direito-1907) (abandonou o curso ao passar nos exames
no período noturno após a idade adulta.
da Ordem dos Advogados de Nova York).
 Fraternidades  Apha Delta Phi. (não foi aceito no Porcellian de Harvard)
acadêmicas
 Membro honorário (aos 60 anos) da Alpha
Delta Gama e da Lambda Chi Alpha de
Kansas City.
 Membro dos clubes masculinos Sons of
Revolution e Sons of Confederate Veterans
48
 Partido
Democrata
 Senador (1911 e 1912) pelo Partido Democrata (era wilsoniano).
Secretário Assistente da Marinha (1913) e um dos fundadores da
Reserva da Marinha. Participou de Intervenção na América Central
e Caribe (sob Pres. Wilson), auto imputando-se a Constituição do
Haiti.
 Forte vínculo com Marinha, advogando compra de submarinos
(McKinley e Spykeman) durante Primeira Guerra.
 1918: propões barreira de minas no Mar Norte e vai à Inglaterra e
França para inspecionar trabalhos, onde tem primeiro contato com
Churchill. Apesar de se opor ao desmantelamento da Marinha, foi
encarregado da desmobilização no fim da guerra.
 1920: Perde vice-presidência (com James Fox) para Warren
Harding e filia-se ao New York Civitan Club.
 Já paraplégico, vence pleito para Governador de Nova York em
1928 e desenvolve programas sociais aconselhado por Frances
Perkins e Harry Hopkins.
 Cargos e
funções antes
WWII
 Vence as eleições para a Presidência em 1932 pelo Partido
Democrata,
 Problemas econômicos dificultam escolha de gabinete: apoio em
acadêmicos (Raymond Molley, Cordell Hull e Henry Morgenthau:
Conselho Cerebral/ Brain Board)
 Ampliação de Programas Sociais e Econômicos elaborados por
Brain Board para criar emprego e alívio social (Harry Hopkins).
 Conferencia Monetária Mundial (1933) lhe dá livres poderes para
atuar na economia.
 Primeira administração sofre reflexos do isolacionismo na política
externa. Política da Boa Vizinhança com AL. Haiti, Cuba e
Panamá deixam de ser protetorados. Convenção de Montevidéu
(1933) retira direito norte-americano de intervir unilateralmente
nos países latinos.
 Substituição radical do Supremo Tribunal (8/11) e acesso de
Frankfurter ao poder.
 É contrario a Ato de Neutralidade (1935) que impedia embarque
de armas dos EUA para qualquer país, mas é voto vencido por
pressão pública e eleições próximas.
 Recondução à Presidência em 1936 com base eleitoral de pequenos
fazendeiros, Sul tradicional., máquinas políticas urbanas, uniões
sindicais, afro-americanos no norte, judeus, intelectuais e liberais.
 1937: planos secretos para construir submarinos contra Japão, mas
oficialmente, mantém discurso isolacionista.
 1938: Bullitt, recém chegado da Rússia afirma na França que seu
país estava unido a ela na guerra e na paz e é desautorizado por
FDR, mas este , em seguida, envia Hopkins, Acheson e Forrestal
em segredo à Inglaterra e França para tentarem burlar leis de
neutralidade..
 Correspondência secreta com Churchill, comandante do
Almirantado Britânico (1939)
 Em 1940 nomeia republicanos Henry Stimson (Estado) e Frank
Knox (Guerra) para ter apoio de adversários na reconstrução da
estrutura militar dos Estados Unidos.
 Dez 1940: América como Arsenal da Democracia . 50 destroyers
para UK em troca de bases no Caribe e Terra Nova. Início do
Lend Lease (1941) s/repayment. Objetivo era acabar com
 Cargos e
imperialismo e aplicar Open Door.
funções
 Harry Hopkins era principal conselheiro sobre assuntos de guerra,
durante WWII
em detrimento de Estado.
 Terceiro mandato em 1940 com Henry Wallace (ex-secretário da
Agricultura e tendências à esquerda) como vice.
 Apoio na Europa aos Aliados, firmado na Carta do Atlântico
(ONU, GATT, descolonização) com Churchill.
 Lidera reconstrução das forças militares nacionais com enorme
desenvolvimento econômico e geração de empregos.
 Demanda por mão de obra em centros produtores gera migração de
afro-americanos, pequenos fazendeiros e subempregados para
Democrata
 Durante treinamento para a 1ª. Guerra,
Truman conheceu Edward Jacobson e James
Pendergast de Kansas City. Ambos
influenciaram em seu direcionamento para a
política.
 Combateu na França. (1918) e mostrou
habilidades de liderança.
 Ingressou no Partido Democrata (1922)
 Foi eleito Juiz Administrativo, em Jackson
(1922 – 1926,1928) pela máquina política de
James Pendergast.
 1933: Diretor do Missouri do Programa
Federal de Desemprego
 1934: Nomeado Senador pelo Missouri pelo
Partido
Democrata,
derrotando
John.
Cochrane e Tuck Milligan nas primárias.
 Era conhecido como o ―
Senador de
Pendergast‖ e apesar aceitar o patroneio do
gangster, dizia votar sempre de acordo com
sua consciência. Ele sempre defendeu a
patroneio, dizendo que ao oferecer um
pouquinho, sempre seria possível guardar
muito mais.
 No Senado, luta contra a avidez corporativa e
alerta contra os perigos da interferência de
especuladores em Wall Street nos interesses
nacionais.
 Era ignorado por Roosevelt e suas ligações
não eram sequer retornadas.
 Nas eleições de 1940, Pendergast estava preso.
Robert Hannegan, cacique político de St.
Louis, apóia a nominação de Truman para o
Senado e este consegue ser reeleito. (Durante
a campanha, Truman foi eleito Grão Mestre da
Loja Maçônica do Missouri).
 Comissão Truman para investigar desperdício
de armamentos, expondo fraudes e má
administração de bens públicos.
 Robert Patterson (Secretário da Guerra) que
havia sido derrotado por ele nas eleições ao
Senado em 1934, pede a Roosevelt para
suspendera Comissão alegando que poderia
provocar queda no moral de guerra.
 FDR manteve a Comissão Truman, que
acabou poupando bilhões de dólares aos cofres
nacionais e salvou milhares de vidas,
colocando Truman no cenário nacional e em
sua primeira capa da Time em 1943.
 1944: Truman é lançado como Vice
Presidente de Roosevelt por indicação de
Robert Hannegan, escolhido entre Henry
Wallace (muito liberal) e James Byrnes (muito
conservador).
 Truman assume presidência ( abril 1945) e ao
49
grandes cidades, criando mudanças estruturais na sociedade.
 Henry Stimson (Guerra)e Albert Wedemeyer: Victory Program
(Projeto Rainbow Five): plano supersecreto de preparação de dez
milhões de soldados para retomar Europa é denunciado pelo
Chicago Herald Tribune em 04/12/41.
 Pearl Harbor (1941) e fim do isolacionismo. Discurso da Infâmia e
entrada na guerra em duas frentes: Europa (Hitler) e Pacífico
(Japão). Cerco aos alemães: Mediterrâneo, Mancha e Rússia.
 Intensos bombardeios em 1944. Dia D com D. Eisenhower (EUA),
Bernard Montgomery (UK) e Zukov (URSS) comandando tropas.
 Cairo (com Chiang Kay Check e Churchill - 1943)
 Teerã (com Churchill e Stalin- 1943).
 Novo mandato em 1944, com Harry Truman, pois Wallace era
considerado muito favorável aos soviéticos.
 Yalta ( Churchill e Stalin- 1945) para convencer Stalin a ajudar
contra Japão e a aderir a ONU.
 Em 1945, conferencia com Egito e países árabes para deliberar
destino do Oriente Médio no pós guerra.
 Faleceu em Warm Springs em abril de 1945.
 Como internacionalista, apóia a criação da
ONU e articula crescente linha dura nas
relações com URSS.
 Consegue apoio bipartidário para a Doutrina
Truman, que formalizava a doutrina de
Contenção de Kennan - e para o Plano
Marshall que reconstruiria a Europa.
 Ato de Segurança Nacional de 1947 merge
Departamento da Guerra e da Marinha em
Departamento da Defesa, cria Força Aérea e a
CIA.
 Apoio à Grécia e Turquia e intervenção
secreta na Itália.
 Fair Deal (prega assistência nacional à saúde,
repele Ato Taft-Hartley contra sindicatos e
propõe programa agressivo de direitos civis)
para ser reeleito em 1948.
 Reconhecimento Israel (1948) e reeleição.
 Intervenção militar na Coréia do Sul para
evitar invasão pela Coréia do Norte (1950),
 Comitê de Investigação de Atividades AntiAmericanas (MacCarthy).
 Retirou-se da política no fim do mandato.
 Faleceu em 26/12/1972 em Kansas City.
 Cargos e
funções
durante
Guerra Fria
 Parcerias,
Choques e
Honrarias
manter equipe de Roosevelt, afirma estar
aberto a seus conselhos, mas informa a todos
que seria ele quem tomaria as decisões e que
deveria ser apoiado.
 Stimson o coloca a par do Projeto Manhattan
imediatamente após a morte de FDR.
 Reúne-se em Potsdam (Churchill e Stalin)
para divisão da Alemanha (julho/agosto)
 Hiroshima e Nagazaki (agosto 1945)
 Parcerias
 1932: apoio político de William Hearst, Joe Kennedy e William G.
McAdoo, das camadas que privilegiara com programas de emprego
como governador de Nova York, dos sindicados, das minorias
étnicas e dos brancos do Sul.
 Vínculos pessoais com Churchill desde a Primeira Guerra.
 Harry Hopkins para assuntos externos e programas assistenciais.
 Honrarias
 Membro dos Civitan de Nova York, Maçonaria, Skull & Bones e
de vários clubes masculinos da costa Leste.
Parcerias:
 Edward Jacobson (sionista e sócio, em Kansas
City)
 James Pendergast (durante 1a. Guerra)
 Thomas Pendergast (cacique politico em
Kansas City)
 Robert Hannegan (Presidente do Partido
Democrata-1944)
Choques
 Lloyd Starck e Maurice Milligan (Senado sob
Democratas)
 Senador Henry Wallace ( inconformado por
não ser o presidente).
 General Douglas McArthur
 Senador Joseph McCarthy
Honrarias
 Nove capas da New York Times
 Advogado Honorário da Universidade de
Oxford
 Bolsa de Estudos Truman universidades
federais (1975)
50
 Bolsa de Estudos Truman em Ciência de
Segurança Nacional (2004)
 Truman, the Tiger (mascote da Universidade
de Missouri)
 Truman State University (Missouri) (1996)
 Harry Truman Building (quartel general do
Departamento de Estado)
 Estátua de Bronze no Hall of Famous
Missourians (1991)
 Selo de 20 centavos da série de Great
Americans
Fontes: HARRY TRUMAN LIBRARY & MUSEUM; HESS &FELIX, 1972; TRUMAN, 1945; BENNET, 1985; BERTHON, 2008;
BLACK, 2003; BROWNEL & BILLINGS, 1987; BUTLER, 2008; CURTISS, 1991; DONOVAN, 1966; DOWSON, 1959; FEIS, 1957;
GOODWIN, 1995; HALBERTAM, 1972; HECKSHER, 1980; KURZMAN, 1974; LASH, 1999; LEUCHTEMBURG,
1963;
MISCAMBLE, 2007; NARA; PATERSON, 1975 e 1988; PRESIDENTIAL MATERIALS; REAGAN, 2000, REINTER ; MILLER
CENTER PUBLIC AFFAIRS; SCHLESINGER, 1991; SHERWOOD, 2001; SMITH, 1972; SMITH, 2007; TROY, 1981; TRUMAN, 1955;
TRULY, 2005; WINKLER, 2006; ZACHARIAS, 1950.
A análise biográfica dos dois presidentes que governariam os Estados Unidos entre 1933 e
1952 aponta para origens familiares, fratrias56, escolaridade e estratégias pessoais muito
distintas, denotando como as mudanças estruturais ocorridas durante as décadas de 1930 e
1940 se refletiram em suas trajetórias.
Roosevelt cresceu em família economicamente estável e dotada de prestígio social, teve
oportunidades frequentes de desenvolver a intelectualidade e as relações de classe, cursar boas
escolas e nunca precisou executar trabalho braçal para sobreviver. Detentor de duplos laços de
parentesco com um Presidente da República e dono de considerável fortuna pessoal, ele
circulava com desenvoltura entre os altos círculos do poder econômico e político. Ou seja,
apresentava um perfil característico das elites que até então, haviam predominado nos postos
mais elevados do governo norte-americano.
Truman, por outro lado, cresceu em um ambiente pobre e instável economicamente, sob um
pai rústico e simplório e, apesar da mãe tê-lo incentivado a acumular capital de conhecimento,
não teve oportunidades de continuar seus estudos na juventude, nem de desenvolver
polimento social, por deficiência de recursos financeiros.
Enquanto Roosevelt criava na infância os primeiros laços fratriais que o alçariam ao poder tanto no ambiente sócio-familiar, quanto nas escolas preparatórias, nas fraternidades
universitárias e nos clubes masculinos que frequentaria desde a adolescência - Truman só iria
começar a criá-los em 1909, quando ingressou na maçonaria, desenvolvendo-os,
posteriormente, durante a 1ª. Guerra, quando fez nome como líder de seu batalhão de
56 Por relações de frátria, entendem-se neste trabalho as relações travadas entre membros de uma mesma
família ou clã, ou entre os associados de fraternidades sociais, universitárias ou profissionais. MICELI, Op.
cit. 2001.
51
irlandeses e firmou os primeiros vínculos simbólicos com Edward Jacobson e James
Pendergast.
Roosevelt cresceu na costa Leste (New York e Pensilvânia) em centros urbanos e aprendeu a
conviver com as camadas mais elevadas do poder civil e militar que desde muito cedo. A
distinção de longa data de sua família lhe transmitia segurança na relação com os outros
membros de sua fratria social e garantia o capital simbólico que o impeliria para a política.
Truman não era um sofisticado homem do Leste, que estudara em boas escolas e convivia
entre a elite. Ele crescera no centro oeste (Missouri e Kansas) em região rural e de imigração
europeia recente, em meio a pessoas simples e sem muitos recursos econômicos ou culturais.
Sua família era simples, sem nenhuma sofisticação ou capital simbólico consistente. Apesar
das origens sociais de sua mãe serem mais distintas que as de seu pai e dela ter incentivado os
filhos a desenvolverem habilidades como a leitura e o piano, a pobreza da família relegou os
jovens Truman à lide com a terra e à criação de gado até que a morte do pai os direcionasse a
outras formas de sobrevivência.
A carreira política de ambos também se formou de maneira bem distinta. Roosevelt usou seu
capital social e financeiro para eleger-se Senador57pelo Partido Democrata em 1910, um cargo
eletivo que lhe deu capital político para ser nomeado Assistente em 1913 do então Secretário
da Marinha, Josephus Daniels, amigo de sua família. Durante o período em que serviu no
Departamento, ele desenvolveu, além de forte vínculo com a Marinha, grande experiência
política na lide com líderes de comitês congressionais e de outros departamentos
governamentais para conseguir aprovar orçamentos. Foi também por intermédio das redes de
relacionamento criadas enquanto servidor nomeado do Departamento da Marinha e durante a
Primeira Guerra, que ele manteve os primeiros contatos institucionais com George Marshall e
James Forrestal - e com Winston Churchill, na Inglaterra.
Truman não teve as mesmas oportunidades e precisou desenvolver outras estratégias para
ascender ao campo político. Nunca pertenceu a fraternidades universitárias porque só
conseguiu matricular-se na Faculdade de Direito de Kansas City quando já tinha mais de
trinta anos e mesmo assim, em um curso noturno e apenas por dois anos. Seus clubes
57
Theodore Roosevelt, tio de Franklin em segundo grau, era Republicano, partido que defendia os interesses de
sua classe social. FDR tinha outras ideias a respeito e – por uma questão de menor concorrência e mais
vínculos políticos entre os Democratas – optou por eles ao lançar sua candidatura. In White House.
Disponível em http://www.whitehouse.gov/about/presidents/franklindroosevelt. Acesso em 27/02/2011.
52
sociais58 estavam posicionados em outra camada da população, apesar de também se
relacionarem às suas origens familiares. Sua rede de relacionamento só começou a se formar
em 1909, com a iniciação na loja maçônica de Belton, Missouri - reforçada dois anos depois
quando ajudou a fundar a loja de Grandview, da qual se tornou o primeiro Mestre59, mas sua
carreira política propriamente dita só teria início após a Primeira Guerra.
Durante o conflito, enquanto Roosevelt lidava com os altos escalões do Departamento da
Marinha e viajava para a Inglaterra com o Secretário da Marinha, Truman lutava nos campos
da França, liderando seu batalhão de irlandeses. Suas primeiras incursões na política
ocorreram em 1922, quando, por influência da máquina política de John Pendergast foi eleito
Juiz Administrativo de comarca de Jackson, Mississipi.
Os vínculos que manteve com a maçonaria tiveram influência primordial no fluxo de sua vida
política, principalmente em momentos como o das eleições de 1940 - quando concorreu à
reeleição para o Senado sem poder contar com o apoio de seu antigo padrinho, Thomas
Pendergast, o cacique político de Kansas City - e o de 1948, quando concorreu à reeleição
para a Presidência da República contra Thomas Dewey, um forte candidato do Partido
Republicano.
Roosevelt testou o capital político que acumulara na função de Sub-Secretário da Marinha em
1920, lançando-se como candidato à vice-presidência, mas foi derrotado.
Em 1928, no entanto, conseguiu eleger-se governador de Nova York e, graças à crise
econômica que se abateu sobre o Ocidente após a quebra da Bolsa de Nova York em 1929 e
aos programas sociais destinados a minimizar os problemas relacionados ao desemprego
adotados em sua gestão, conseguiu acumular capital simbólico suficiente para, em 1932,
arrebatar a nominação presidencial do Partido Democrata.
Apoiado em uma coligação formada tanto por membros da riqueza emergente, como William
Hearst (1863)60, Joseph Kennedy Sr (1888)61 e William Gibbs McAdoo (1863)62, quanto por
58
Harry Truman pertencia ao Clube dos Filhos da Revolução e dos Filhos de Confederados Veteranos, duas
entidades relacionadas às atividades militares exercidas por seus ancestrais durante a Guerra de
Independência e a Guerra Civil. In Truman Library. Disponível em http://www.trumanlibrary.org/hstbio.htm. Acesso em 27/02/2011.
59
Durante a Guerra, em 1940, quando se lançava candidato ao Senado, Harry Truman tornou-se Grão Mestre do
Missouri e em 1945, já presidente da República, foi nomeado Grande Inspetor Geral e Soberano e Membro
Honorário do Conselho Supremo de Washington. Idem. Acesso em 27/02/2011.
60
William R Hearst (1863-1951) foi um magnata da imprensa norte-americana. Em sua época áurea, foi
proprietário de 28 jornais e dentre eles, o San Francisco Examiner, o Chicago Examiner, o The New York
53
representantes do trabalho organizado, minorias étnicas, urbanistas e brancos do Sul,
conseguiu vencer as eleições e tomar o poder dos Republicanos.
A comparação de suas trajetórias e de suas peculiaridades biográficas permitiu a constatação
de que, como os homens da elite de outros setores da sociedade, políticos como Roosevelt e
Truman se motivavam para a política pelo aspecto técnico de suas atividades – campanhas,
conluios, posições burocráticas – e sentiam-se muito mais atraídos pelo prestígio e pelo poder
que o cargo público lhes proporcionava, do que pela remuneração, em si, que recebiam como
ocupantes do cargo.
Suas carreiras se desenvolveram no interior do Partido Democrata – que oportunizou a crise
do capitalismo para expulsar os republicanos do centro do campo político - e foram
consequência dos vínculos sociais e políticos que ambos criaram ao longo de suas trajetórias
públicas.
O primeiro posto de Truman foi eletivo - Juiz do condado de Jackson - mas sua prática era
administrativa e a experiência no Legislativo só veio com sua eleição ao Senado. Roosevelt
começou carreira pública no Legislativo, como Senador, foi indicado para um cargo
burocrático de Assistente no Departamento da Marinha e posteriormente, assumiu funções no
Executivo, como governador do Estado de Nova York, antes da Presidência.
Ou seja, as estratégias adotadas por Roosevelt para chegar à presidência foram, além do uso
de capital social e financeiro de sua família, fundadas principalmente nos projetos sociais de
reconstrução nacional colocados em prática por sua administração como governador de Nova
Journal e o Boston American; além de 18 revistas como a Cosmopolitan e a American Weekly. Possuía
também cadeias de rádio e uma produtora de cinema. É considerado um dos precursores da ―
imprensa
marrom‖. O filme Cidadão Kane, de Orson Welles foi provavelmente baseado em sua vida. In Notable
Biographies. Disponível em http://www.notablebiographies.com/Gi-He/Hearst-William-Randolph.html.
Acesso em 03/03/2011.
61
Joseph P Kennedy Sr, (1888-1969) foi um empresário e político eminente norte-americano. Pai do Presidente
John F Kennedy, do Procurador Geral Robert F. Kennedy , do Senador Edward Kennedy, do oficial da
marinha Joe Kennedy Jr, da co-fundadora dos Jogos Olímpicos Especiais Eunice Kennedy e da exembaixadora dos Estados Unidos na Irlanda Jean Kennedy Smith. Avô dos deputados Joe Kennedy II e
Patrick Kennedy. Foi uma das lideranças mais importantes do Partido Democrata e da comunidade católica
irlandesa nos Estados Unidos. Serviu como embaixador dos Estados Unidos na Inglaterra entre 1938 e 1940.
In
Virginia
University
XRoads.
Disponível
em
http://xroads.virginia.edu/~ug03/omaraalwala/jpkennedy.html. Acesso em 03/03/2011.
62
William Gibbs McAdoo Jr. (1863-1941)foi um advogado e líder político que atuou como Senador dos Estados
Unidos, como Secretário do Tesouro do Presidente Wilson (seu sogro) e como diretor da Administração das
Ferrovias dos Estados Unidos (USRA). Por seu posto como Secretário do Tesouro, em 1914 ele serviu como
um membro ex-office na primeira diretoria do Federal Reserve em Washington, DC. In Arlington
Cemetery. Disponível em http://www.arlingtoncemetery.net/wgmcadoo.htm. Acesso em 03/03/2011.
54
York, os quais além de implicarem em uma tentativa de solucionar os problemas sociais que
emergiram como consequência do desemprego e das falências, tinham o objetivo de projetar
os democratas nacionalmente.
Ao conquistar a Presidência e outros cargos eletivos importantes por seu intermédio, o Partido
passaria a exercer controle sobre o mercado de cargos - eletivos ou burocráticos – que seriam
disponibilizados ao vencedor e a partir desses cargos, poderia impor sua visão de mundo à
sociedade.
Truman, por sua vez, acumulou capital simbólico para ser lançado à vice-presidência com
Roosevelt em 1944 em virtude de suas atividades no Senado durante a Segunda Guerra,
quando protagonizou a Comissão que investigava uma série de irregularidades na produção e
distribuição de armamentos para os soldados que lutavam contra o Eixo na Europa e na Ásia.
O sucesso das investigações lhe deu enorme projeção nacional e favoreceu o acumulo de
suficiente capital político na máquina partidária para sobrepujar oponentes no campo, como o
Senador Henry Wallace (1888) 63, ou o Senador James Byrnes (1882)64, permitindo que fosse
indicado para concorrer à vice-presidência com Roosevelt 65.
A permanência de Truman na vice-presidência foi curta: em menos de três meses de mandato,
o presidente faleceu e ele assumiu como titular o primeiro posto político do país, com várias
crises internas e externas para administrar. Dentre elas, especialmente, a configuração de uma
política externa relacionada aos soviéticos e a elaboração da Doutrina que levaria seu nome e
que caracterizaria o novo equilíbrio do poder internacional.
63
Henry Wallace (1888-1965) foi o 33o. vice presidente dos Estados Unidos (1941-1945), Secretário da
Agricultura (1933-1940) e Secretário do Comércio (1945-1946). Nas eleições presidenciais de 1948, foi
nomeado como candidato pelo Partido Progressista.
In US Congress. Disponível em
http://bioguide.congress.gov/scripts/biodisplay.pl?index=w000077. Acesso em 03/03/2011.
64
James F. Byrnes (1882-1972) foi um estadista norte americano da Carolina do Sul. Durante sua carreira,
Byrnes serviu como Deputado (1911-1925), Senador (1931-1941), Juiz da Suprema Corte (1941-1942),
Secretário de Estado (1945-1947) e como Governador da Carolina do Sul (1951-1955). Tornou-se um dos
poucos políticos que passou pelos três poderes do governo federal e que também atuou no governo do estado.
Era amigo e confidente do Presidente Franklin D. Roosevelt e foi um dos mais poderosos homens nos Estados
Unidos relacionados com política interna e externa durante meados dos anos 1940. In US Congress.
Disponível em http://bioguide.congress.gov/scripts/biodisplay.pl?index=b001215. Acesso em 03/03/2011.
65
Não se deve desconsiderar o apoio que lhe foi dado pelo Senador Robert Hannegan, presidente do Partido
Democrata e proeminente membro da comunidade irlandesa na época de sua nomeação - o qual, à guisa de
agradecimento, recebeu o cargo de Procurador Geral em seu governo. In Truman Library. Disponível em
http://www.trumanlibrary.org/photographs/displayimage.php?pointer=21012&people=&listid=0. Acesso em
03/03/2011.
55
Em virtude de suas limitações pessoais para assumir uma prática administrativa autocrática –
como fizera Roosevelt, amplamente dotado para tanto – Truman teve o bom senso de, no
início de seu mandato, não promover alterações de monta no Gabinete que havia sido
escalado por seu antecessor. Na área de Política Externa, no entanto, Roosevelt não tinha
executivos de sua confiança pessoal, exceto Harry Hopkins e este, sofrendo de uma doença
terminal, não seria útil ao novo presidente por muito tempo.
Quando declarou sua absoluta ignorância66 em relação às necessidades diplomáticas de seu
país num momento em que decisões fundamentais deveriam ser tomadas em relação à política
externa do pós-guerra, Truman deu margem para que dados membros de seu partido ansiosos por fazer parte da estrutura executiva do poder, como Harriman – oportunizassem o
momento e se sobrepusessem aos demais, colocando-se imediatamente à disposição do
Presidente para aconselhamento e orientação técnica.
Harry Hopkins – que sempre fora favorável a uma aliança amigável com a União Soviética
para a reconstrução das nações afetadas pela Segunda Guerra - faleceu poucos dias após
Kennan ter redigido e enviado a Washington o Longo Telegrama - que originaria a Doutrina
de Contenção - e seu passamento marcou o poente e o nascente de dois períodos distintos na
relação do Departamento de Estado e do Gabinete da Presidência, em especial na relação com
a União Soviética.
Ou seja, não somente os fatos, mas também as características biográficas dos principais
envolvidos na elaboração de uma nova política externa para os Estados Unidos contribuíram
para o desencadeamento dos eventos que dariam origem á Guerra Fria.
Truman assumira o poder em 1945 decidido a dar continuidade à política adotada por seu
antecessor em relação aos soviéticos: vencer a guerra e assegurar a paz, mas as características
pessoais e de liderança dos dois governantes eram muito diferentes para que essa decisão
pudesse ser levada a cabo como desejado.
Acostumado desde o berço a circular entre o poder e a conviver com os poderosos, Roosevelt
lançara mão de suas habilidades carismáticas e de seus capitais simbólicos para estabelecer-se
66
Pouco após de ter feito o juramento de Presidente, Truman disse aos repórteres: ―
Rapazes, se vcs forem
religiosos, rezem por mim, agora. Eu não sei se algum de vocês já teve um fardo de feno caindo sobre suas
cabeças, mas quando me contaram o que aconteceu ontem (morte de Roosevelt), eu senti como se a lua, as
estrelas e todos os planetas tivessem caído sobre a minha...‖ In Thoughts of a President, 1945. Eye witness to
History. Disponível em http://www.eyewitnesstohistory.com/tru.htm. Acesso em 24/04/2010.
56
no centro do campo político. Quando atingiu seu objetivo, pode dar-se ao luxo de ser
manipulativo e conivente, tanto com pessoas, quanto com a opinião pública.
Truman, por outro lado, tinha origens humildes e seguira uma trajetória bem diferente. Para
galgar posição no partido, apoiara-se em capitais de prestígio com a comunidade irlandesa e
com fraternidades como a maçonaria; tendo se submetido à proteção política de gangsters
como Thomas Pendergast, tornara-se seu devedor.
Mas também tinha carisma próprio e
como conquistou capital político por meio de ações administrativas voltadas para o interesse
público, ele se comportava com objetividade quase agressiva. Roosevelt se munia de
diplomacia e condescendência para lidar com conflitos; Truman era suscetível a crises de
profunda indignação quando algo o contrariava.
Roosevelt tinha a característica de protelar decisões importantes, permitindo que as tensões se
elevassem no limite em seu círculo mais próximo, enquanto manipulava homens e ideias.
Truman, ao contrário, estava sempre atento a seus assessores e aprovava ou desaprovava
entusiasticamente suas sugestões, tomando decisões de maneira quase impulsiva.
Em relação à política externa, no entanto, observa-se a diferença mais significativa entre
ambos. Roosevelt era completamente personalista em relação às decisões que deveriam ser
tomadas na área externa, acessível, eventualmente, a sugestões de Harry Hopkins, mas
deliberadamente ignorando as opiniões técnicas de oficiais burocráticos - e mesmo dos de sua
confiança - no Departamento de Estado. Em Teerã, Yalta, ou na Casa Branca, ele poderia
prestigiar ou ignorar os relatórios que Kennan, Bohlen ou Acheson colocavam à sua
disposição e não se constrangia em, polidamente, deixar de lado a opinião de Secretários de
Estado, como Edward Stettinius ou Cordell Hull, para agir de acordo com o que,
pessoalmente, ele julgasse mais adequado aos interesses da Presidencia.
Truman não tinha a menor intenção de fazer o mesmo 67. Quando assumiu o governo em abril
de 1945, o mundo estava de pernas para o ar e logo em seu primeiro mês de governo, ele se
viu instado a tomar decisões que iriam marcar definitivamente a história contemporânea:
67
Logo após ter assumido a presidência, Truman confidenciou a um membro de seu gabinete: ―
Posso não ser
um sujeito muito brilhante, nem muito preparado, mas sou inteligente o suficiente para me cercar de pessoas
que o são e lhes dar a oportunidade de fazer o que sabem fazer bem melhor do que eu.‖ TRUMAN, Year of
Decisions. New York: Doubleday, 1955.
57
a) As tropas americanas e soviéticas estavam finalizando a liberação da Europa e a aliança
que fora feita durante a guerra estava para se dissolverem uma paz fria e complexa que
exigiria comprometimentos pouco familiares a seu país.
b) Vyachselav M. Molotov, ministro de Relações Exteriores da União Soviética, estava para
chegar a Nova York para exigir que os Estados Unidos reconhecessem o governo que
haviam colocado em Varsóvia e para participar da Conferencia de São Francisco, que
daria início aos trabalhos da ONU68.
c) A bomba atômica estava pronta e a Truman cabia tomar a decisão de se, quando e onde
lançá-la.
d) A guerra na Europa chegava ao fim e ele teria que determinar como deveria ser tratado o
inimigo conquistado e como ajudar os países europeus que haviam sido devastados pelo
conflito.
e) No topo de todos esses problemas, estava também a questão de saber se seria desejável
que a União Soviética participasse na guerra contra o Japão e, se esse fosse o caso, a que
preço.
Truman nunca se envolvera nas questões externas enquanto vice-presidente e não tinha a
menor idéia de como deveria agir. Para lidar com os problemas que lhe caíam sobre a mesa,
não teve a menor dúvida: atendendo às recomendações de Harriman e Acheson - que ele sabia
serem da confiança de seu antecessor - amealhou à sua volta um grupo de conselheiros que,
acreditava, poderiam ajuda-lo a manter as políticas prescritas por Roosevelt.
Esse pequeno grupo de elite, com ampla experiência pública e privada respondeu ao chamado
imediatamente, desejoso de aplicar os conhecimentos que haviam acumulado na área
financeira (Harriman, Lovett, McCloy e Acheson) ou na escola soviética do Serviço Externo
(Kennan e Bohlen) a serviço de seu país. Aproveitando a oportunidade única que se lhes
apresentava, propuseram-se a tutorar o novo Presidente e a auxiliá-lo a formatar os Estados
Unidos para o novo papel que deveria exercer no equilíbrio mundial do pós-guerra.
Os novos fatores se configuravam, um a um, para mudar os rumos da História. Truman era
um homem do campo - simples, direto e rude – e apesar de ter adquirido ampla experiência
68
Durante os primeiros contatos entre Truman e Molotov em maio de 1945, começaram a ficar claras as novas
tendências nas relações dos Estados Unidos com a União Soviética. Principalmente durante os encontros em
São Francisco, a imprensa e a opinião pública começaram a perceber as divergências que gradualmente,
tornariam insuportável as relações entre os Estados Unidos e seu antigo aliado da Segunda Guerra.
ISAACSON & THOMAS, Op cit, 1986, p. 262-268.
58
burocrática no cargo de Juiz administrativo, experiência parlamentar durante sua permanência
no Senado e experiência na manipulação de pessoas e interesses em sua convivência com
Pendergast, não tinha a menor ideia de como funcionavam as sutilezas diplomáticas ou as
estruturas de equilíbrio de poder no cenário internacional: enfurecia-se com as atitudes
adotadas por Stalin no Leste Europeu e nos projetos de reconstrução do mundo pós-guerra - e
não procurava fazer nenhum segredo disso.
James Byrnes – o conservador que substituíra Edward Stettinius Jr. no posto de Secretario de
Estado a título de consolação por ter perdido as primárias do partido para Truman - adotava
uma postura cautelosa, mas claramente desconfiada em relação aos soviéticos, partilhada e
influenciada pelos aliados britânicos com quem estava em permanentes negociações.
James Forrestal, Secretário da Marinha e responsável pela ampla divulgação do Longo
Telegrama, também não escondia seus temores obsessivos em relação aos ex-aliados da
Segunda Guerra.
Sob o ponto de vista prático da governança internacional, a Europa cobrava medidas urgentes
e a morte de Hopkins - que durante quase uma década e meia atuara como eminência parda
nas relações externas - abriu um enorme vácuo no campo, incentivando uma disputa de forças
na arena interna e a ascensão de uma nova facção política ao poder, com outra visão de
mundo, especialmente avessa aos soviéticos.
Truman não pertencia à elite tradicional, nem às elites emergentes da burguesia industrial,
mas emergira no campo político como resultado de acordos e alianças partidárias e portanto,
devia seu poder às forças internas do Partido Democrático e às massas que o haviam elegido.
Para se manter hegemônico por quatro mandatos consecutivos, o Partido Democrata assumira
alguns compromissos políticos com os que haviam contribuído financeiramente para isso – e
em especial, com as camadas emergentes da burguesia industrial que visavam expandir-se no
mercado internacional. 69
Na lógica simples do presidente, como os soviéticos poderiam apresentar entraves a essa
expansão, especialmente considerando suas vocações ideológicas e as condições sócioeconômicas degradadas do continente europeu no pós-guerra, predispondo os países
69
Após a Segunda Guerra os Estados Unidos eram o maior exportador de mercadorias e mesmo alguns anos
depois, forneciam um terço das exportações mundiais; devido à expansão maciça de seus estaleiros,
controlavam metade do transporte marítimo mundial. Em 1945, Washington detinha US$ 20 bi do comércio
internacional, quase dois terços do total mundial de US$ 33 bi. Economicamente, o mundo estava em suas
mãos. KENNEDY, Op. cit.,1989, p. 343
59
devastados a levantes populares, o comunismo deveria ser combatido e seus representantes,
tratados como inimigos e não como aliados.
As vozes que ecoavam essa lógica soavam bem mais alto do que as vozes dos que ainda
acreditavam na política de cooperação com os soviéticos, agora órfãos de Harry Hopkins e de
Franklin D. Roosevelt. Nesse contexto, o Longo Telegrama chegou a Washington,
esclarecendo didaticamente as origens do comportamento soviético e oferecendo algumas
propostas fundadas na realpolitik para solucionar o problema. Não surpreende que tenha
causado tanto alvoroço.
Nos quadro II e III, descritos e analisados no próximo ítem, é possível observar-se os fatores
históricos e biográficos que levaram George Kennan a acumular os capitais simbólicos que o
encaminharam à embaixada de Moscou para aprofundar sua percepção sobre o universo
soviético e tornar-se o principal responsável intelectual por uma política externa que iria
polarizar o mundo por quase cinco décadas. Demonstram também como o Presidente Truman
estruturou a elite burocrática – de confiança e concursada – que o assessoraria na condução de
uma nova política externa que consolidasse os louros que os Estados Unidos haviam
conquistado com a vitória contra Hitler, sem permitir que a União Soviética os reclamasse.
60
3.2 Servidores burocratas e servidores políticos
Na década de 1950, como consequência das medidas centralizadoras adotados por Roosevelt
durante a Grande Depressão e, posteriormente, durante a Segunda Guerra, o poder de
iniciativa e decisão das instituições políticas norte-americanas havia se transferido
gradualmente do Congresso para o Executivo 70 e para suas agencias e departamentos, que no
processo, tornaram-se palco dos muitos conflitos de interesses e de lutas pelo poder71, em
especial as relacionadas com o posicionamento das classes emergentes no centro do campo
político72.
Ora, as modificações institucionais introduzidas por Roosevelt na pirâmide política, - criando
instituições como o National Recovery Administration (NRA) para atender às necessidades de
sua política social, e consequentemente, abrindo centenas de novos cargos para serem
loteados no mercado partidário - tornaram ainda mais compensadores os novos postos de
comando político, principalmente porque – nomeados – dispensavam a passagem do
escolhido por instâncias municipais e federais, elevando-o a funções diretamente federais e
dando nova dimensão às carreira em ascensão.
Como esses os cargos, no entanto, não eram de caráter eletivo, como a presidência ou o
governo de Estado, multiplicaram-se os políticos que, ocupando posições de confiança - como
as que Dean Acheson, William Harriman, John McCloy e Robert Lovett iriam ocupar passaram grande parte de sua vida funcional fora de organizações rigorosamente políticas,
tendo sido levados a elas em dado momento de suas vidas, mas de forma esporádica, ou
intermitente.
Eles teriam formação não-política, sua carreira e vínculos se formaram em círculos nãopolíticos, voltados para outras áreas institucionais – de negócios, financeira ou jurídica - e
70
MILLS, Op. cit., 1956, p. 276.
71
Esse fenômeno pôde ser observado durante o governo Truman quando McCarthy, senador do partido
Republicano (cargo eletivo), se propõe a criticar a postura cautelosa de Dean Acheson (cargo nomeado) e do
Departamento de Estado em relação aos soviéticos e exige sua demissão. Truman, ciente de que o processo
desencadeado pelo senador anti-comunista tinha cores muito mais partidárias que ideológicas, não se deixou
envolver e, enfrentando a opinião pública e ignorando o clamor republicano, manteve seu secretário no cargo.
ISAACSON & THOMAS, Op. cit., 1986.
72
De 1789 a 1921, geração após geração, a proporção da elite política que atuou em cargos municipais ou
estaduais decresceu de 93% para 69%. Durante a administração de Eisenhower, essa proporção caiu para
57%. MILLS, Op. cit, 1956, p. 277-278.
61
apesar de geralmente serem considerados representantes ou agentes do mercado civil,
defendendo em alguma comissão governamental algum tipo de interesse, eram nomeados por
servidores democraticamente eleitos para exercerem funções políticas.
Geralmente, esses servidores nomeados eram detentores de capital próprio, não dependiam de
remuneração pública, nem eram, necessariamente, membros ativos de alguma organização
partidária republicana ou democrata. Por suas qualificações profissionais, ocupavam cargos
de confiança na estrutura funcional do governo e, não sendo concursados, não precisavam
submeter-se às regras de seleção do Partido.
Moviam-se livremente nos circulo mais íntimos do dirigente partidário - como consultores ou
conselheiros - e tinham acesso fácil a eles, gozando de sua confiança e deles dependendo para
manter o poder que exerciam.
Durante o século XIX, era comum que nos Estados Unidos um indivíduo chegasse à cúpula
por meio do voto popular: após passar por uma hierarquia de postos eleitos, seriam provados
capazes até atingirem o nível nacional mais elevado. Nas décadas de 1930 e 1940, no entanto,
numa época em que a administração pública se tornara mais burocrática e que o jogo dos
interesses políticos ficou mais acirrado, grande parte dos cargos mais elevados passou a ser
preenchida por pessoas nomeadas por pequenos grupos de pessoas eleitas.
Entre 1933-1953, por exemplo, na cúpula do poder público, somente 28% dos políticos no
alto escalão chegaram a seus postos de forma eletiva. Outros 62% , por outro lado, foram
nomeados para todos – ou pelo menos, para a maioria – de seus postos políticos antes de
chegarem à cúpula73, enquanto 9% tanto foram nomeados, quanto eleitos e 1% nunca havia
ocupado qualquer posição na política anteriormente.
Um dos sentidos mais comumente aceitos para o servidor burocrático ideal74 é o de um perito
que, por meio de concurso público em que suas habilidades sejam devidamente comprovadas,
desempenha um papel técnico e regular nas instituições públicas, dependendo da remuneração
de seu cargo para manter-se materialmente. Existem também outros servidores públicos que,
73
Todas as informações percentuais lançadas neste capítulo são consequência de uma pesquisa desenvolvida por
Wright Mills em relação à Elite Política dos Estados Unidos envolvendo 513 homens que, entre 1789 e junho
de 1953 ocuparam cargos de presidente, vice-presidente, presidente da Câmara dos Deputados, membros do
Gabinete e Juiz da Suprema Corte. Como os pesquisados neste trabalho ocuparam cargos na Presidência, na
Vice-presidência ou foram membros do Gabinete de Roosevelt ou Truman, as estatísticas também se
relacionam a eles. MILLS, Op. cit., 1956, p. 277-379.
74
WEBER, Max. Ciência e Política. São Paulo: Martim Claret, 2005. Pgs. 66-68.
62
nomeados para seus cargos em função da confiança dos dirigentes, tinham outras formas de
sobrevivência, não gozavam de estabilidade funcional e estariam isentos das regras válidas
para os servidores concursados.
O servidor burocrático, ao contrário do nomeado, progride em direção aos postos mais
elevados da hierarquia funcional de acordo com a meritocracia, ou com o tempo de serviço e
experiência. É disciplinado o suficiente para colocar em prática políticas determinadas por
seus superiores hierárquicos mesmo quando pessoalmente for contrário a elas e,
funcionalmente, tem suas funções limitadas ao cumprimento de tarefas específicas e
especializadas. Burocratas não são proprietários dos meios ou equipamentos necessários para
o cumprimento de suas obrigações e não têm qualquer autoridade pessoal: toda autoridade que
detêm é fruto do cargo que ocupam.
Um dos requisitos fundamentais para a manutenção da integridade funcional de um servidor
burocrata é a neutralidade política, pois este deverá servir qualquer nova administração com a
mesma lealdade com que serviu à anterior. Um burocrata, como tal, não toma decisões, nem
determina orientações: ele proporciona as informações importantes para tanto e sua principal
tarefa é a de colocar em prática a política oficial determinada por seus superiores. Seu quadro
é razoavelmente permanente e essa permanência é fundamental para garantir a continuidade
dos projetos públicos.
Nos Estados Unidos dos anos 1930-1950, as regras relacionadas à administração pública e à
burocracia não eram as descritas idealmente por Max Weber, pois muitos funcionários não
tinham estabilidade e suas funções podiam variar de acordo com mudanças de governo75. A
comprovação de habilitação funcional definida em um governo podia ser alterada no seguinte
com a criação de novas agencias e seus postos, podiam ou não estar sujeitos a exames de
qualificação.
Enquanto os postos inferiores eram ocupados por critérios meritocráticos, pessoas
inexperientes, ou favoritos políticos ou pessoais, eram colocados em cargos de cúpula a
cada mudança de administração, seja por pressões partidárias, seja por acordos pessoais dos
eleitos, impedindo promoções e desmoralizando o serviço, como George Kennan pode
75
MILLS, Idem, p. 287.
63
impacientemente constatar várias vezes ao longo de sua carreira no Departamento de Estado 76
e como se poderá observar nos Quadro II e III, demonstrados e analisados a seguir.
Quadro II. Origens, capitais simbólicos e trajetórias de servidores burocráticos
Data e local
de
nascimento
Fratrias
familiares e
sociais
Gestão do
capital Social
76
Charles Chip Bohlen
George F. Kennan
 30/08/1904 a 01/01/1974.
Grindstone Island, Clayton, NY
 16/02/1904 a 17/03/2005
Milwalkee, Winsconsin
 Segundo filho. Irmão mais velho, irmão menor.
 Pai (Charles Bohlen): herança modesta, mas confortável.
Bon vivant, gostava de corridas de cavalo, bebida e ópera.
 Mãe (Celestine Eustis Bohlen): família tradicional de New
Orleans, cujo avô fora Juiz da Suprema Corte da Louisiana
e o pai herói da Guerra Civil, Senador e primeiro
embaixador americano na França (1892). Viúvo, o
embaixador leva Celestine para Paris como sua hostess.
 Aparentado pelo lado paterno com Alfried Krupp von
Bohlen und Halbach, maior produtor de armas alemão
durante II Guerra
 Herança creole de Celestine intensifica nos filhos amor a
tudo o que fosse francês. Residência Bohlen: Grindstone
Island e residência de inverno em Aiken, Carolina do
Sul,(bem frequentado por famílias ricas).
 Em Ipswick, vilarejo próximo a Boston, Celestine recriou
hospitalidade de sua infância sulina e filhos adquiriram
desenvoltura social.
 Chip casou-se em 1935 com Avis Thayers) e tiveram três
filhos.
 Filha Avis foi diplomata em Paris, Bulgária e Secretaria
Assistente de Estado para Controle de Armas. Filha
Celestine foi correspondente do New York Times em
Moscou.
 Caçula, com três irmãs mais velhas. Meio irmão menor.
 Pai (Kossut Kennan) era jurista e falava várias línguas,
além de ser amante de musica e teatro alemão. Ambiente
familiar favorável às atividades intelectuais.
 Perde a mãe (Florence J. Kennan) recém nascido e é criado
por madrasta, professora.
 Morou na Alemanha quando criança e no Serviço Externo,
voltou a morar em Berlin para estudar Relações
Internacionais.
 Tio, George Frederick Kennan, era expert na Russia do
século XIX.
 Falava russo, alemão, francês, polonês, tcheco, português e
norueguês, alem do inglês.
 Sempre solitário e cheio de conflitos internos, mesclava
insegurança com arrogância, sensibilidade com frieza,
firmeza com timidez e só começou a ter maior auto-estima
quando se viu representante oficial dos Estados Unidos em
Genebra ((1927)
 Casou-se em 1929 com Annelise Sorensen, norueguesa que
conheceu em Berlim e teve duas filhas.
 Kennan, Bohlen e Henderson: influenciados por Robert
Kelley, chefe da Divisão de Assuntos da Europa Ocidental,
acreditavam haver pouca possibilidade de cooperação com
 Família tradicionalmente distinta, mas menos abonada que
a URSS, mesmo contra adversários potenciais.
outras, emergentes, como os Harriman..
 Tinha poucos amigos em Princeton e, por falta de recursos,
 Convivência com high society desde tenra infância.
não pertencia a nenhuma fraternidade, sentindo-se cada vez
 Viagens anuais à França quando criança e traquejo social
mais alienado.
intenso, por causa da família materna.
 Preenchia solidão lendo o que lhe caísse nas mãos.
 Não era estrategista incisivo nem advogado rigoroso, mas
tinha personalidade tranquila, carismática e sociável de um  Mente independente, combatia sentimento de inferioridade
e não demonstrava aspirações de ser visto como igual entre
diplomata (serviu seis administrações como especialista em
ricos e poderosos.
URSS e podia transitar em qualquer círculo)
 Não compareceu ás festividades de sua graduação, exceto à
 Casou-se com irmã de Charles Thayer, funcionário de
da outorga do diploma.
carreira de State e seu colega na embaixada em Moscou.
 Conheceu Loy Henderson e Robert Kelley na escola do
 Teve ações comuns com Nitze e Forrestal na Brown Bros,
Serviço Externo, quando estagiava na Divisão de Assuntos
de Harriman. Ambos eram da Dillon, Read e faziam
da Europa do Leste.
negócios comuns com a Paramount.
 Teve grande proximidade com seus professores na
 Usou experiências do cargo da 1ª. Guerra (bombardeio
Universidade de Berlim, emigrantes de educação esmerada.
intermitente) na 2ª. Guerra para lidar com armamentos e
aeronáutica.
 Bohlen e Henderson o indicam a William Bullit quando este
foi nomeado para chefiar a nova representação que seria
aberta em Moscou, em 1933.
As diferenças de Kennan com Joseph Davies na embaixada de Moscou, em fins da década de 1930, são um
exemplo desse processo. Davies era amigo pessoal de Roosevelt e, ao ser enviado para Moscou para substituir
James Bullit, não tinha a menor idéia de como lidar com os soviéticos. KENNAN, Op. cit. 1967, p. 84 e 85.
64
Educação
 St Paul`s School - anglófila, imitando Eton e Harrow, com
valores tão rigorosos quanto Groton. Maior que Groton,
seus alunos eram do eixo New York-Filadélfia. (Groton era
frequentada pelos Brahmins de Boston).
 Ambas escolas atendiam nova riqueza Industrial, clérigos
episcopais e a velha aristocracia que ainda mantivesse
conexões com o Establishment.
 Fraco academicamente, bem resolvido e rebelde, foi
expulso dois meses antes de formar-se, mas por tradição
familiar, conseguiu ir para Harvard.
 Em Harvard, graduou-se em Direito (1927), como pai, tio e
irmão. Não gostava de Direito, nem de Administração e
interessou-se pela Rússia por causa de John Reed.
 Junto com Ducky Harrison, companheiro do Yale Naval
Reserve Flying Corps (1ª. Guerra), inscreveu-se para o
Serviço Externo (atual Departamento de Estado) em 1919.
Fraternidades  Clube Porcellian (não premiava feitos extraordinários)
acadêmicas
 Só aceitava familiares de membros e gente simpática.)
Sua principal finalidade era beber.
 Partido
 Cargos e
funções antes
WWII
 Cargos e
funções
durante
WWII
 Cargos e
funções
durante
Guerra Fria
 St John´s Militar Academy (Delafield). Escola pequena e
rigorosa, onde se tornou um leitor ávido – e solitário.
 Princeton (1921-1925), onde o status dos clubes dominava a
vida dos estudantes
 Herança da mãe era insuficiente para que cursasse Direito e
ele optou por Serviço Externo do Departamento de Estado,
recentemente reestruturado em bases profissionais.
 Cursou Seminário Oriental sobre História, Cultura e
Lingua Russa na Universidade de Berlim, disciplina criada
por Oto Von Bismark e teve o primeiro contato com a
Realpolitik.
 Em Talin, Estônia (1928) procurou estudar remanescentes e
presença do que fora a Rússia uma década antes.
 Em Riga, Letônia também conviveu com hábitos e tradições
que um dia foram russos, pois a cidade lembrava St.
Petersburg
 Key & Seal (insignificante e sem prestígio)
 Republicano
 Republicano
 Ingressa no Departamento de Estado (1929).
 Treinamento na França como especialista em URSS.
 Moscou em 1934 com Bullitt, Henderson, Thayer e
Kennan.
 Washington em 1935, como expert em Rússia na Divisão
Oriental Européia
 Volta a Moscou em 1936 para substituir Kennan, que
voltara a Washington.
 Na embaixada de Berlim, (1939) recebe protocolo do
Pacto Russo Soviético uma semana antes de Alemanha
invadir Polônia.
 Formado no Serviço Externo, (1926), postos na Suíça,
Alemanha, Estônia, Latvia e Letônia.
 Universidade de Berlim (1929): aperfeiçoar conhecimentos
em historia, língua e politica russa
 1933: acompanha Bullitt à primeira embaixada em
Moscou, com Chip Bohlen, Charles Thayer e Loy W
Henderson, de onde acompanhou o Grande Expurgo de
Stalin em 1934.
 Conflito com sucessor de Bullit, Joseph Davies e é enviado
para Praga, após rápida passagem pela Divisão de Assuntos
Europeus, em Washington, onde irá ter o primeiro contatos
com Harriman, que fazia negócios com os soviéticos.
 Quanto Praga caiu, em 1938, foi renomeado para Berlin.
 Embaixada em Tóquio (1940-41). Fica em campo de
concentração por seis meses.
 Transferido para Departamento de Assuntos Soviéticos
durante a 2ª. Guerra, acompanhando Harry Hopkins como
interprete em todos os encontros com Stalin.
 Interprete de Roosevelt em Teerã (1943) e Yalta (1945)
 Em 1939,com início da guerra e para dar suporte a Lend
Lease, foi enviado à embaixada de Berlim, onde ficaria até
1941, quando, por os EUA entrarem na guerra, ficou retido
seis meses em campo de concentração.
 1942: Lisboa como conselheiro (administrar operações de
base e de Inteligência).
 1944: nomeado para Comissão de Aconselhamento
Europeu (Açores), para preparar política para Aliados após
a guerra até Averrel Harriman, recém nomeado embaixador
na Rússia, o nomear Chargé d`Affairs da Embaixada de
Moscou.
 Abarrota mesa de superiores com recomendações para
abandonarem cooperação com URSS e se concentrarem na
criação de uma esfera de influencia na Europa para reduzir
efeitos da proposta comunista sobre os trabalhadores
afetados pela guerra,
 Propõe criação de uma federação européia para conter
influencia soviética naquela região.
 Chargè D´Affairs e Vice Chefe da Embaixada de Moscou
de Maio 1944 a Abril 1946.
 Em Fev 46 envia Longo Telegrama para Sec Estado James
 Com Marshall em State, (1947) Bohlen torna-se conselheiro
Byrnes, para explicar ao Depto. Tesouro motivação do
de Truman.
governo russo contra FMI e Banco Mundial e nele, delineia
 Liberal, aceitava influência doméstica na governança.
nova estratégia sobre como lidar diplomaticamente com
Substitui Kennan em Moscou quando este se torna persona
URSS.
non grata (1952 - Eisenhower).
 É chamado de volta a Washington em Abril, para lecionar
no Colégio Nacional de Guerra comunismo (1946 – 1947) e
 Conflitos com autoridades russas e com John Foster Dulles.
fazer palestras a civis e militares s/ para formar entre eles
 Dispensado em 1957 e enviado para Filipinas, onde fica até
uma mentalidade mais realista em relação aos soviéticos
1959.
 James Forrestal(Sec. Marinha), que adotara seu ponto de
 Quando Democratas voltam ao poder em 1963, é enviado
vista e ajudara a trazê-lo de volta aos EUA, o influenciando
a publicar o artigo X na Foreign Affairs (jun/1947),
para a França como embaixador até 1968.
propondo política externa de contenção às tendências
 Aposenta-se em 1969.
expansionistas dos soviéticos por meio de pressão constante
65
em vários pontos geográficos e políticos, respondendo
manobras soviéticas que não pudessem ser dissuadidas pela
diplomacia.
 Em abril de 1947 foi nomeado Chefe do Gabinete de
Planejamento Político (PPS, do Depto. Estado sob George
Marshall, com carta branca para aplicar sua estratégia em
relação aos problemas mundiais..
 Doutrina Truman a partir de Longo Telegrama e artigo X
(1947)
 Recomenda a George C. Marshal (Sec State) Plano
Marshall, CIA, aproximação com Franco (fascista) para
garantir posição no Mediterrâneo (intensa cooperação
militar após 1950), a aumentar o cisma entre a Iugoslávia de
Tito e Moscou com ações encobertas nos Balcãs.
 Com,Dean Acheson (1949-50), entra outro time em State e
ele perde influencia, principalmente após suicídio de James
Forrestal.
 Acheson considerava a ameaça soviética mais militar do
que política (bloqueio de Berlim/1948, revolução Chinesa
(1949) e guerra da Coréia (1950)) e cria aliança militar
(OTAN) apoiada por armas militares e nucleares (NSC68/1950 de Paul Nitze).
 Kennan e Bohlen eram contra Bomba de Hidrogênio e
rearmamento da Alemanha (inclusos no NSC-68). Acheson
os ignora e radicaliza a questão, dando início formal à
Guerra Fria.
 Opuseram-se ao avanço americano além do paralelo 38 na
Coréia, chocando-se com MacArthur e Dean Rusk.
 Kennan se demite do PPS em dezembro 1949. Acheson o
substitui por Nitze, mais à vontade com o militarismo do
NSC-68..
 Robert Oppenheimer (diretor) convida Kennan para
professor visitante do Instituto de Estudos Avançados de
(IAS) em Princeton.
 1951: nomeado Embaixador em Moscou, com prioridade
de consolidar alinhamentos contra a Rússia e não de atenuar
as diferenças que encruaram. No ano seguinte, ao declarar
em Berlim que se sentia preso em Moscou como na
embaixada de Berlim no início da WWII, ofende Stalin que
o expulsa e considera-o persona non grata na URSS.
 Preside Operação Solarium (1953) Ike querida diminuir
gastos militares dos EUA, atuando apenas onde e quando
necessário, mas principalmente, onde e quando os EUA
pudessem.
 Embaixada na Iugoslávia (1961-63).
 Tornou-se professor no IAS - Princeton (1950) e seu nome
foi dado à cadeira National Security Strategy ali e no
National War College.
 Parcerias,
Choques e
Honrarias
Parceria
 George Kennan, Loy Henderson e Charles Thayer
(cunhado) desde Moscou (1934)
Choques
 Joseph Davies (sucedeu Bullit em Moscou) tinha visão
ingênua do processo soviético e, revoltado, Kennan
insubordinava-se sempre que podia.
 Walter Lippman, jornalista que condenará militarismo
implícito em ―
X‖ e que exigia retirada de tropas da Europa
 Acheson confiava menos em seu Staff que Marshall e
Kennan perde influencia, pois era considerado pouco ativo
pelo Secretário (conflito de classe).
 MacArthur.Dean Rusk e Foster Dulles (K não queria
invasão da Coréia do Norte, defendida por eles)
 Paul Nitze; companheiro de Kennan em State, mas era
militarista.
 John Foster Dulles. Secretario de Estado de Eisenhower:
divergências sobre ações noVietnam.
Parceria
 Charles Chip Bohlen.
 William Harriman
 Dean Acheson
Honrarias
 Freedom Award (1989)
66
 Pullitzer de História, Bancrof Prize, Francis Parman Prize
por ―
Eussia Leaves the War‖ (1956).
 Pullitzer e \national Book Award por suas Memórias (1968)
 State Dpt Testimonial of Loyal and Meritorious Service (1953)
 Woodrow Wilson Award for Distinguished achievement in
Nation´s Service (1976)
 Albert Einstein Peace Prize (1981)
 American Academy of Arts and Letters Gold Medal (1984)
 Franklin D. Roosevelt Foundation Freedom from Fear
Medal (1987)
 Presidential Medal for Freedom (1989)
 State Dpt Distinguished Service Award (1994)
 Library of Congress Living Legend (2000)
Fontes: AMERICAN EXPORT LINER EXCALIBUR, 1941; CLARE, 2009; CNN, 1996; GERGEN, 1996; KENNAN & LUCAKS, 1997; KENNAN, 1946, 1947,
1948, 1951-79-84, 1992, 1999, 2000a, 2000b.; NY TIMES, 1926, 1934, 1935a e 1935b, 1937, 1938, 1940, 1941, 1942. ATKINSON, 1947; CORKE, 2008. GADDIS,
1972, 1990, 1997, 2005, 2006; GARDNER, 1970; HARPER, 1995; HENDERSON, 1986; HIXSON, 1989; HOLBROOK, 2005; ISAACSON & THOMAS, 1986.,
JENSEN, 1993; KISSINGER, 1994; KROCK, 1947; LAFEBER, 2002; LEFFLER, 1994, 2006; LUKACS, 2007; MAYERS, 1990; MISCAMBLE, 1992, 2004; NARA;
REDDY, 1976. SMITH, 1972; THOMPSON, 2009; TROY, 1981; TRUMAN LIBRARY; US POSTAL SERVICES, 2006. US STATE DEPARTMENT; WEINER,
2008;
Quadro II – Servidores Burocratas
Na análise comparativa das origens do grupo de servidores burocráticos de confiança de
Roosevelt e Truman, alguns dados são recorrentes. No grupo descrito no Quadro II como
servidores burocráticos estão George Frost Kennan (1904) e Charles Eustis Bohlen (1904),
que tinham muitas coisas em comum, além de serem os maiores especialistas em assuntos
soviéticos de sua era, mas suas origens, como as dos presidentes descritos no Quadro I, eram
bem distintas.
Charles Bohlen cresceu em um ambiente familiar alegre e aristocrático, cercado de
privilégios; seu pai era uma pessoa despreocupada, amante de ópera, de boa bebida e de
caçadas. Não eram tão abastados quanto os Roosevelt ou os Harriman, mas viviam
confortavelmente e como segundo filho, Bohlen tinha maior liberdade que o irmão para
escolher uma carreira. Sua mãe era de uma família tradicional de New Orleans e passara boa
parte de sua juventude como hostess do pai na embaixada dos Estados Unidos em Paris 77. Do
lado paterno, os Bohlen tinham laços de parentesco com Alfried Krupp von Bohlen und
Albach, o maior produtor de armas alemão durante a Segunda Guerra.
77
Celestine Eustis Bohlen fazia parte de uma das famílias mais distintas de New Orleans, cuja riqueza
começara com o avô, respeitável Juiz Federal da Louisiana e tivera continuidade com o pai, James Eustis,
herói da Guerra Civil e senador, nomeado embaixador dos Estados Unidos na França em 1892. Informações
sobre a infância de Chip Bohlen e sobre sua família, em geral, podem ser encontradas em entrevistas feitas
por ISAACSON & THOMAS com os filhos do biografado, com seus amigos J Randolph Harrison,. Cecil
Lyon, Paul Nitze e com membros da família Eustis em New Orleans. Informações mais detalhadas e pessoais
sobre o tema também podem ser observadas na autobiografia de Bohlen (Witness to History).
67
George Kennan perdeu a mãe aos dois meses de idade e foi criado pelas irmãs mais velhas até
os cinco anos e posteriormente, por uma madrasta rigorosa que reforçou ainda mais as
tendências para a introversão e timidez que marcaram sua vida78. Kossuth Kennan79 era um
estudioso de leis e o ambiente familiar em que seus filhos cresceram era sério e intimidador.
Ao invés de conviver com pessoas em alegres resorts da moda, George Kennan conviveu com
livros, música clássica e longos serões familiares. Descendente de imigrantes irlandesesescoceses que sempre haviam se dedicado a atividades rurais, sua única referencia familiar de
distinção era um primo de seu pai, seu homônimo, que no século XIX, fora um expert em
Rússia.
Em termos de escolaridade, constatou-se que Charles Bohlen frequentou St. Paul e Harvard,
duas das escolas mais elitistas da Costa Leste, frequentada pela nata do eixo Nova YorkFiladélfia e apesar de ter sido
medíocre em termos acadêmicos, brilhou em qualquer
ambiente social onde circulasse.
George Kennan foi enviado aos doze anos de idade para a St. John, uma academia militar de
algum mérito acadêmico, mas nunca se destacou nos estudos, exceto em Literatura e História.
Socialmente, era introvertido e acanhado. Em Princeton, por onde graduou-se em História,
sua introversão ficou ainda mais acentuada pois, detentor de pouco capital social e financeiro,
ele não conseguiu integrar-se ao espírito princetoniano e o combatia, rebelando-se contra suas
estruturas ou ignorando-as.
Apesar de ter pensado inicialmente em continuar seus estudos com o curso de Direito, Kennan
logo abandonou a idéia por constatar que a pequena herança que a mãe lhe deixara não seria
suficiente para financiar seus projetos. Acabou decidindo-se pelo Serviço Externo, que
acabara de ser reestruturado com características burocráticas formais e que selecionava seus
78
Em sua premiada autobiografia, Memoirs, apesar de dedicar quase duas páginas à sua ancestralidade, George
Kennan faz poucas menções a seu núcleo familiar mais próximo. No entanto, detalhes sobre sua infância
podem ser encontrados na obra de John Lukacs : George Kennan, a study of character e na dissertação de
doutorado de Ben Wright: George Kennan: Scholar-Diplomat, Universidade de Wisconsin, 1972. Ambos
autores entrevistaram o biografado, membros de sua família e vários de seus colegas no Departamento de
Estado, além de – por terem criado vínculos pessoais com o mesmo - terem tido acesso às cartas que ele
enviava aos pais e às irmãs enquanto estava servindo no Exterior. ISAACSON & THOMAS, 1986, p. 73 e
LUKACS, 2007, p. 10-12.
79
Kossuth Kennan começou sua prática de Direito em 1878, em Milwakee e após 1882, especializou-se em
impostos, atuando por vinte anos como Comissário de Impostos para a Wisconsin Central Railway. Uma das
mais altas autoridades em legislação de Imposto de Renda de seu estado, Kossuth Kennan teve várias de suas
sugestões adotadas na Lei Fiscal do Wisconsin colocada em vigor em 1911. Nomeado Comissário Fiscal do
Estado naquela data, ele aposentou-se da vida pública dois anos depois e viveu em Milwakee até sua morte,
em 1933. ISAACSON & THOMAS, Op. cit., 1986,
68
candidatos por meio de um concurso público.
Durante o período que fazia um curso
preparatório em Washington para prestar o concurso do Serviço Externo, os resultados sociais
de seu diploma de Princeton se fizeram sentir pela primeira vez.
Numa época em que os Estados Unidos embarcavam em uma era de competitividade
financeira e industrial, a escolha de uma escola preparatória adequada era quase tão
importante para determinar o status social de um sujeito, quanto o seu nascimento em uma
família tradicional. Harvard, Yale e Princeton, particularmente, haviam se tornado grandes
instituições nacionais que davam acesso à riqueza e ao sucesso a jovens que para ali afluíam
de todas as partes do país e que se sentiam privilegiados e especiais por pertencerem a seus
clubes e a seu limitado grupo de elite. Os vínculos criados entre os alumni de Groton ou St.
Paul eram tão fortes, que estendiam raízes para suas vidas profissionais em Nova York, em
Wall Street - ou em Washington, ao redor da Casa Branca e, em especial, do Departamento
de Estado como já se pode observar na análise das trajetórias de Dean Acheson, Robert
Lovett, William Harriman e John McCloy.
Um ex-colega de Princeton, John Calbot, o convidou, juntamente com outro colega de classe,
para um jantar em homenagem a um ex-professor, Joseph Grew, oficial do Serviço Externo
que havia sido responsável por boa parte das mudanças burocráticas que estavam em
andamento naquele órgão. Essa experiência permitiu que Kennan constatasse a importância
da rede de relacionamentos proporcionada pela universidade e como esta poderia ter alguma
utilidade em sua carreira.
Bohlen, fez opção pelo Serviço Externo por sugestão de um amigo de St. Paul e Harvard,
William Castle, que naquele momento ocupava o cargo de Secretário Assistente do
Departamento de Estado. Academicamente melhor preparado do que Kennan e bem melhor
relacionado, Bohlen conseguiu ser aprovado nas provas seletivas da instituição com mais
facilidade.
Kennan e Bohlen fizeram um trajeto semelhante para chegar ao Serviço Externo:
frequentaram escolas de renome acadêmico e social e apesar de nenhum dos dois terem se
destacado em termos acadêmicos, conseguiram ser aprovados para seguir carreira
diplomática. Ambos vivenciaram experiências no exterior durante a infância. Chip Bohlen,
por influência da mãe que, francófila, o levava anualmente à França. George Kennan por ter
morado na Alemanha com a família na infância, tendo absorvido do pai a paixão pela cultura,
literatura e música alemã. Ambos eram poliglotas e, muito cedo, tiveram as portas e janelas de
69
seus mundos escancarados para o universo que existia além das fronteiras do Atlântico. Por
meio dessa experiência, perderam o espírito provinciano que caracterizava a maioria de seus
contemporâneos e desenvolveram o forte espírito internacionalista que os diferenciaria das
massas e os encaminharia para as funções que exerceriam no Departamento de Estado.
Bohlen sempre demonstrou boa desenvoltura social, qualidade que iria posteriormente, ser-lhe
fundamental como jovem oficial do Serviço Externo 80. Por natureza e por herança social, ele
não era um estrategista incisivo, como Marshall, nem um advogado rigoroso, como McCloy,
mas suas maiores aptidões estavam na personalidade tranquila e carismática que lhe
permitiriam servir como especialista em política soviética, sem conflitos, seis Presidentes, por
mais de quarenta anos. Em virtude do capital simbólico acumulado, ele transitava sem
dificuldade em qualquer circulo do poder e, apesar de Republicano, estava plenamente
preparado para atuar no consenso bipartidário que dominou a arena política norte-americana
do pós-guerra.
Nesse ponto do trabalho, seria importante aprofundar a análise do perfil e trajetória de George
Kennan, para determinar as origens do Longo Telegrama, uma vez que acreditamos que seus
escritos foram consequência da junção entre as experiências que vivenciou nos postos que lhe
foram destinados pelo Departamento de Estado e as características de sua própria
personalidade.
Kennan era um solitário por natureza, demonstrando, principalmente em sua juventude e
primeiros anos da idade adulta, enorme dificuldade em superar a timidez e suas
inseguranças81.
Seu sentimento contra qualquer socialização era tão forte que quando
finalmente se graduou, por rebeldia, timidez ou sentimento de não pertencer, não compareceu
a nenhuma das cerimônias universitárias de colação de grau, exceto na que lhe foi outorgado
o diploma. Leitor ávido, no entanto, procurava compensar suas precárias qualidades pessoais
e sociais ilustrando-se de forma quase obcecada; complementava com curiosidade intelectual
e com uma aguda mente analítica o que lhe faltava em habilidades sociais.
Quando o acúmulo desse capital intelectual se consolidou na idade adulta – principalmente
em relação a seu conhecimento sobre a União Soviética - e ele se tornou ciente de uma
superioridade novel em sua vida, Kennan tornou-se cada vez mais impaciente com as rotinas
80
Conforme ISAACSON & THOMAS em entrevistas com os filhos de Chip Bohlen, com J. Randolph Harrison,
Cecyl Lyon, Paul Nitze e com membros da família Eustis em New Orleans.
81
LUCAKS, John. George Kennan. Study of a character. New Haven: Yale University Press 2007, p. 7
70
do serviço burocrático, irritando-se com as morosidades do Serviço Externo e desprezando o
que ele considerava falta de visão política da maioria dos membros do Congresso e – bem
mais frequentemente, de seus superiores em Washington.
Por outro lado, era como se a superioridade intelectual sobre os demais em relação aos
soviéticos lhe desse a impertinência e independência mental de que necessitava para superar
suas deficiências sociais e, orgulhando-se delas, procurava sufocar o sentimento de
inferioridade que tinha por ser, ―
irremediavelmente e sem esperanças, um caipira do Meio
Oeste‖82.
Aparentemente, no entanto, não tinha interesse em imitar o modus vivendi ou em equiparar-se
socialmente a pessoas que ocupavam funções hierárquicas ou posições sociais mais elevadas
do que as suas, nunca tendo demonstrado ao longo da vida, aspirações em ser admitido como
igual na companhia dos ricos e poderosos, como Acheson, Forrestal ou McCloy o fizeram,
consciente ou inconscientemente.
Aliás, algumas vezes, é preciso que se diga, suas
demonstrações de relutância nesse sentido eram até um pouco exageradas.
Quando a equipe do PPS estava formulando o Plano Marshall e deliberando sobre as
estratégias necessárias para obter a aprovação no Congresso às suas propostas, muito
frequentemente George Kennan convidava seus colegas de equipe para passar o fim de
semana em sua pequena fazenda na Pensilvânia, mas alguns tinham horror a isso. A
propriedade estava constantemente precisando de reparos e - essencialmente prático - ele não
tinha qualquer problema em colocar os amigos para pintar cercas ou radiadores, nem de subir
no telhado para fazer consertos, quando necessário 83.
Esse comportamento lhe renderia alguns problemas no Departamento de Estado,
especialmente durante o período em que chefiou o Gabinete de Planejamento Político, pois
tinha grande dificuldade em aceitar as limitações práticas que lhe eram impostas pela política
e seu relacionamento com superiores burocráticos foi marcado por vários laivos de rebelião e até mesmo de desobediência.
Uma ocasião típica dessa ―
insubordinação‖ hierárquica foi em Moscou, em meados da década
de 1930, quando o embaixador William Bullit
foi substituído por Joseph Davies – um
servidor nomeado para o cargo por suas relações pessoais com o Presidente Roosevelt e que
82
KENNAN, George. Memoirs, Boston: Little, Brown & Company, 1967. Pg. 9
83
ISAACSON & THOMAS, Op. cit. ,1986, p. 434 e 435.
71
era completamente alienado da realidade soviética. As atitudes e o posicionamento naîve do
novo embaixador em relação aos expurgos de Stalin afrontavam sua equipe técnica que,
apesar de indignados, procuravam acatá-lo, exceto Kennan.
Incapaz de lidar com as exigências hierárquicas do sistema burocrático, ele foi tomado de tal
furor nessa ocasião, que se pôs a escrever uma série relatórios denunciando as medidas de
Stalin ao Departamento de Estado em Washington e insubordinando-se contra o Embaixador
sempre que podia. Resultado: foi demovido do cargo sob o argumento de ―
tratamento de
saúde‖, e como punição exemplar, foi enviado para Praga, após uma breve passagem por
Jerusalém e pela Divisão Russa da Europa Oriental, para a embaixada de Berlin por três anos
e posteriormente, para Lisboa quando os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra. Nesses
postos ele exercia atividades burocráticas regulares, ficando completamente afastado do
objeto de sua especialidade, que era a União Soviética, até 1945, quando o recém nomeado
embaixador William Harriman o requisitou de volta a Moscou como Chargé d´Affair da
Embaixada 84.
Ele se sentia desconfortável no mundo social em que Bohlen circulava com tanta
desenvoltura. Tomava como ofensa pessoal qualquer crítica a suas opiniões técnicas e se
amuava com facilidade. O forte vínculo que havia entre os dois burocratas era principalmente
intelectual e eles eram muito diferentes em termos profissionais. Enquanto Bohlen era mais
cordato e flexível às nuances ideológicas dos que se colocavam hierarquicamente acima dele,
submetendo-se profissionalmente às regras burocráticas de seu cargo e acatando ordens
superiores que contrariassem sua opinião técnica sem grandes pruridos, Kennan se sentia
pessoalmente afrontado quando contrariado e, por várias vezes, ameaçou deixar o Serviço.
No entanto, apesar de suas opiniões realistas relação aos soviéticos serem frequente motivo de
inquietude para seus colegas no Departamento de Estado, por afrontarem diretamente a
vontade do Presidente Roosevelt e de Harry Hopkins, gradualmente, ele começou a criar
renome entre eles, que o viam como um pensador intuitivo, com a rara capacidade de
verdadeiramente entender a complexidade da conduta soviética. 85
As ideias elaboradas por ele para explicar o comportamento dos soviéticos e que abundavam
em seus constantes relatórios para Washington, evidenciavam a) as linhas geoestratégicas de
84
LUKACS, Op. cit, 2007. p.1-20 e KENNAN, Op. cit. 1967, p. 81-82.
85
LUKACS, Idem.
72
Mackinder e Spykman; b) a prática da realpolitik aprendida em seus estudos na Universidade
de Berlim e c) um forte sentimento anti-soviético, herdado de Robert Kelley, do
Departamento de Assuntos da Europa Oriental.
Na questão geoestratégica, o determinismo histórico e geográfico de Mackinder e Spykman
pode ser apontado em sua análise de que o medo permanente de invasões estrangeiras sempre
provocara nos russos uma suspeita quase histérica em relação às demais nações. Essa
característica nacional, para ele, era resultado tanto da grande extensão territorial da Rússia,
que incentivava extremismos, quanto da insegurança nas fronteiras, que
impedia os
habitantes de se considerarem nativos de um território com limites bem definidos. Além da
questão geográfica, historicamente, ele acreditava que muitos séculos de invasões asiáticas
haviam produzido na Rússia um sistema de despotismo oriental e xenofóbico que, somado à
influencia da igreja bizantina, era marcado pela intolerância e por sistemas políticos de
intrigas e despotismo.
Quando à prática da realpolitik ou do realismo político, deve-se notar que o termo é utilizado
para conceituar uma política externa ou prática diplomática baseada principalmente na força e
em considerações práticas e materiais e não em noções ideológicas, morais ou éticas. Seus
maiores defensores foram Klemens Metternik e Otto Von Bismarck, que a aplicaram durante
a unificação da Alemanha, no século XIX. Modernamente, E.H. Carr descreve o realismo
político como a aceitação do que deve ser , argumentando que não existe dimensão moral sob
o ponto de vista de política externa, pois certo é o que é bem sucedido e errado, o que
fracassa.
A realpolitik se distingue do idealismo por não ter regras fixas, mas por ser
orientada a objetivos finais, limitada apenas por exigências práticas e sua principal finalidade
é garantir os interesses da segurança nacional, desfazendo-se, para tanto, de quaisquer
entraves morais que possam interferir em sua prática.
Um exemplo de como a realpolitik é praticada nos Estados Unidos - um país que
internamente defende os direitos humanos - é o fato de que, nos governos de Richard Nixon e
Ronald Reagan, vários governos autoritários latino-americanos que violavam esses direitos s
receberam apoio político e militar desses presidentes sob a justificativa de que, dessa forma,
os norte-americanos teriam garantidos não apenas a manutenção de seus interesses naqueles
países, mas também a estabilidade regional.
73
Finalmente, o sentimento anti–soviético que Kennan partilhava com Charles Bohlen e Loy
Henderson86, também especialistas em União Soviética, denota tanto a influencia do realismo
objetivo de Robert Kelley, seu superior na Divisão de Assuntos da Europa Oriental (Divisão
Russa), quanto o efeito que os expurgos de Stalin contra seus opositores exerceram sobre eles
durante sua estadia na Embaixada de Moscou na década de 1930. Cabe lembrar que a visão
realista desses oficiais de carreira
Roosevelt sobre os soviéticos,
conflitava frontalmente com a visão idealizada de
já que
o ponto de vista presidencial era, por sua vez,
influenciado por Harry Hopkins e por Eleanor Roosevelt, que partilhavam da mesma visão
romântica sobre o socialismo.
Kennan não acreditava na luta de classes ou na ditadura do proletariado e, durante sua
primeira estadia em Moscou nos anos 1930, perdeu quaisquer ilusões que pudesse ainda ter
em relação ao regime stalinista. Por trás do marxismo, ele percebia nos russos o medo
ancestral das diferenças humanas e do mundo exterior que explicavam parte das brutalidades
e desonestidades do regime 87. Para ele, a Rússia havia mudado o bolchevismo e não viceversa e essa opinião, que era partilhada por Loy Henderson e Charles Bohlen, seus
companheiros na Embaixada, estava a anos-luz de distancia em relação ao pensamento do
Presidente Roosevelt e dos que ele havia escolhido como conselheiros, como Harry Hopkins –
ou de embaixadores, como Joseph Davies - em relação aos soviéticos88.
Apesar de decepcionado com as políticas estabelecidas para lidar com os expurgos de Stalin,
Kennan permanecia ideologicamente fiel a seu país, baseado muito mais em princípios de
lealdade do que em identificação ideológica nacionalista, pois apesar de desiludido,
considerava-se um funcionário público por opção e via o Serviço como um dever que deveria
cumprir da melhor forma que conseguisse. 89
Da mesma forma que fazia críticas intelectuais ao comunismo, Kennan também se arvorava o
direito de criticar a ineficiência da democracia liberal e da dependência que os governantes
86 Loy Henderson (1892) entrou no Serviço Externo em 1922 e foi secretário da Embaixada de Moscou entre
1934 a 1938, participando, juntamente com George Kennan, Charles Bohlen e Charles Thayer da primeira
equipe estabelecida na Rússia após o reconhecimento do regime socialista pelos Estados Unidos. Também foi
chefe da Divisão dos Assuntos da Europa Ocidental, da Divisão do Extremo Oriente, além de embaixador no
Iraque e na Índia. TRUMAN LIBRARY. Oral History Interview with Loy Henderson. Disponível em
http://www.trumanlibrary.org/oralhist/hendrson.htm e HENDERSON, LOY. A Question of Trust: The
Origins of U.S.-Soviet Diplomatic Relations. New York: George W. Baer, 1968.
87
KENNAN, Op. cit., 1967, p. 70
88
KENNAN, Idem, p. 74.
89
KENNAN, Ibidem, p. 77
74
tinham da vontade popular. Durante um curto período que passou na Áustria em 1935, ele
chegou a impressionar-se com a forma que o regime autocrático de Viena lidava com os
problemas sociais: sem demagogias, sem discussões públicas ou debates com leigos, e sem os
apelos populistas que caracterizavam os regimes democráticos, atitudes que o levaram a
concluir, na época, que o despotismo esclarecido poderia ter
muito mais vantagens de
governança do que a democracia.
Sendo afastado de seu posto em Moscou, Kennan passou um período em Praga antes de ser
enviado para Berlim, em 1939, no início da guerra pois, aparentemente, seu talento para
escrever relatórios não passava tão desapercebido por Washington, como ele imaginava. Em
Berlim, mesmo testemunhando as vitórias do exército alemão, ele chegou à conclusão que o
nazismo não seria bom para a Alemanha em longo prazo, considerando que ―
nenhum povo
seria grande o suficiente para estabelecer e manter uma hegemonia mundial‖90.
Quando a Segunda Guerra estava terminando na Europa, Kennan esteve postado em Portugal
até ser chamado de volta a Moscou para dar assistência como ministro-conselheiro ao novo
embaixador, William Harriman, por indicação de Charles Bohlen que, na ocasião, atuava
como chefe da área russa na Divisão da Europa Ocidental. A princípio, Harriman e Kennan
tinham uma visão muito distinta quanto à guerra e ao papel da União Soviética nela.
Harriman sabia o quanto os Estados Unidos precisavam da Rússia durante o conflito contra
Hitler, portanto, sua perspectiva era mais próxima de Roosevelt do que de Kennan; ele
achava, inclusive, que a aliança era mais importante do que outros problemas relacionados à
natureza do governo soviético e acreditava que deveria haver cooperação entre os dois países
não apenas durante a guerra, mas também após seu término. Com o tempo, no entanto, seis
ou, no máximo, oito meses após a chegada de Kennan a Moscou, Harriman começou
gradualmente a interpretar as evidencias acumuladas do comportamento e ambições
soviéticos da mesma forma que seu conselheiro e em menos de um ano, já não havia mais
diferenças entre eles.
Em 1945, lentamente, as relações russo-americanas começaram a se deteriorar, prenunciando
a guerra fria e as definições da política externa norte-americana que se concretizariam dois
anos depois. Kennan não havia sido convocado para atuar como interprete, como Bohlen, nos
acordos de Yalta, São Francisco ou Potsdam, mas isso não fizera diferença para ele porque
90
LUKACS, Op. cit. 2007, p. 48. E KENNAN, Op. cit, 1967, p. 120-121
75
não acreditava nesse tipo de instituição: ele conhecia as limitações e a falta de sentido de
qualquer acordo com Moscou. Seu conhecimento de história e sua compreensão da natureza
humana sustentavam sua convicção básica de que interesses nacionais eram e continuariam a
ser mais poderosos do que qualquer organização internacional dedicada a assegurar a paz.
Por isso, em fevereiro de 1946, quando Kennan recebeu um telegrama de rotina do
Departamento de Estado, no qual o Departamento do Tesouro solicitava uma explicação para
o comportamento soviético, que não demonstrava interesse em aderir às propostas do Banco
Mundial e do Fundo Monetário Internacional, ele o respondeu com o Longo Telegrama. E o
efeito, como se sabe, foi rápido e sensacional: em poucos meses o documento havia circulado,
sido copiado, enviado e lido pelos secretários da Guerra e da Marinha e por todos os que
tinham, ou poderiam ter, quaisquer relações com a União Soviética.
Estava configurado um dos principais instrumento de mudança que originaria a nova política
dos Estados Unidos em relação à União Soviética e essa grande repercussão do Longo
Telegrama devia-se a uma nova configuração no cenário político.
a) o cordato e diplomático Roosevelt morrera e com ele, sua visão idealizada da União
Soviética. Truman ocupava seu lugar e certamente, guardava uma opinião bem diferente
de seus aliados da Guerra.
b) Harry Hopkins, gravemente enfermo, já não dirigia mais a política externa;
c) As atitudes autoritárias de Stalin em relação aos países da Europa Central começavam a
repercutir negativamente entre a opinião pública norte-americana;
d) James Forrestal, anti-comunista ferrenho, ascendeu ao posto de Secretário da Marinha por
morte do titular, o moderado James Fox;
e) William Harriman e Dean Acheson, internacionalistas declarados, também estavam,
naquele momento, ocupando postos-chave no Departamento de Estado e viram no
documento produzido por Kennan um instrumento ideológico, ou uma justificativa moral
adequada para configurarem uma nova ordem internacional.
Se enviado seis meses antes, provavelmente, a mensagem de Kennan teria sido recebida em
Washington com grande desaprovação ou com desinteresse. Se enviado seis meses mais
tarde, provavelmente teria soado como redundante, ou como uma espécie de pregação a
convertidos. Apesar da realidade descrita por Kennan no Longo Telegrama ser a mesma dos
últimos dez anos - permanecendo assim, aliás, por mais de meia década - o momento ideal
para que ela fosse alardeada chegara.
76
Analisadas as trajetórias dos servidores concursados, observa-se abaixo o quadro que
descreve as trajetórias dos servidores burocratas, seguido da análise comparativa do capital
social acumulado por eles.
Quadro III. Origens, Capitais Simbólicos e Trajetórias de Servidores Polítivcos
Data e local
de
nascimento
Gestão do
capital social
Fratrias
familiares,
sociais e
acadêmicas
William A Harriman
John McCloy
Robert Lovett
Dean Acheson
 15/11/1891 a 26/07/1986
 Nova York, NY
 31/03/1895 a 11/03/1989
 Philadelphia, Pensilvânia
 14/09/1895 a
07/05/1986
 Huntsville, Texas
 11/04/1893 a 12/10/1971
Middletown, Connecticut
 Forte influencia paterna
relacionada a trabalho,
dedicação ao país e
responsabilidade social
(noblesse oblige).
 Viagem ao Alasca com os
pais cientistas e geógrafos
aos oito anos.
 Em Groton, conheceu
Gracie Hall Roosevelt,
irmão de Eleanor. Amizade
por toda a vida.
 Sua casa de infância foi
doada à Columbia
University em 1951
 Filiou´se aos Democratas e
apoiou Roosevelt em 1932
´por suas idéias
internacionalistas.
 Irmã Mary no Conselho da
National Recovery
Administration´s Consumer
Advisory Commitee e ele
também tinha cargo
voluntário como
representante de NY na
Emergency Reimployment
Campaign (relações diretas
com Harry Hopkins), o que
vai interessá-lo em política.
Em 1934, assume Chefia da
NRA e deixa Wall Street.
 Aluno dedicado, fascinado
pelo grego.
 Favorito do treinador da
escola, aprende a jogar
tênis e futebol para ensinar
aos filhos de ―
gente bem‖.
 Low profile e habilidade
para lidar com seus
―
melhores‖
 Lewis Douglas – filho de
um mineiro que fez
fortuna no Arizona
(melhor amigo e cunhado).
Colega de Amherst.
 Alista-se na 1ª. Guerra
com Douglas e torna-se
assistente do Gal. Guy
Preston que no retorno, em
1919, tenta convencê-lo a
seguir carreira militar.
 Formado, vai para Wall
Street
 Longa associação com a
família Rockefeller,
originária de seus anos de
Harvard, quando ele
ensinava os dois jovens
irmãos Rockfeller a
velejar.
 Voou na 1ª. Guerra
com o Serviço
Britânico Aéreo Naval
e na França,
 Comandou esquadrão
aéreo dos EUA,
juntamente com dois
futuros Secretários
Assistentes da Marinha
para a Aviação,
Artemus Di Gate e
David Ingalls.
Brilhante em Hill
School, ele assumiu a
classe quando tutor de
Latim adoeceu,
 Anglófilo por influência dos
pais, fiéis súditos da Rainha
Vitória
 Desenvolve intelecto apurado
e devoção aos valores e ao
dever herdados do pai.
 Reverenciava os protocolos
do poder, inspirava profunda
confiança entre quem servia e
entre os que o serviam por
sua dedicação a altos
princípios e ao pragmatismo.
 Independente e atrevido, em
Groton criou uma espécie de
resistência emocional que o
ajudou a resistir à
agressividade de McCarthy
 Groton lhe ensinou a
confrontar diferenças de
status e nas férias, trabalhou
como operário na construção
da Grand Truck Pacific
Railway, onde descobriu que
também existiam hierarquias
de classe rígidas nas classes
inferiores e que o prestígio
era fundamental na lide com
grande volume de
trabalhadores ignorantes. .
 Influenciado por Felix
Frankfurter, professor de
Direito Administrativo em
Harvard, tornou-se estudioso
e interessado pelo Direito..
 Frankfurter, por sugestão de
McCloy, o recomenda como
estagiário ao Juiz Brandeiss,
seu associado e amigo
pessoal.
 Filho do meio (primeiro
homem) de Mary
Williamson Averell (1879),
herdeira de pequena ferrovia
ao norte de New York e de
Edward H Harriman (EHH)
 EHH: Office boy em Wall
Street aos 14 anos,
especulando na bolsa com
dicas de Jay Gould e de
Cornelius Vanderbilt.
Acumulou enorme riqueza e
presidiu Union Pacific e
Southern Pacific (Ferrovias).
Adversário e concorrente de
J P Morgan e e James Hill.
 Filho único, órfãos aos seis
anos.
 Mãe cabelereira, viúva,
pobre e de origem
holandesa da Pensilvânia.
Ambiciosa e tenaz,
procurou dar ao filho boa
educação e criar uma boa
rede de relacionamento à
sua volta. .
 Pai descendente de
escoceses-irlandeses,
Vendedor de seguros e
morrera quando McCloy
era criança.
 Trabalhou com entregador
de leite, professor de tênis,
 Filho único.
 Pai era Juiz e
Presidente do
Conselho da Union
Pacific Railway (da
família Harriman).
 Mãe era da aristocracia
de Huntsville, no
Texas
 Companheiro de
infância dos irmãos
Harriman, com quem
participou da Skull &
Bones em Yale e de
quem seria sócio,
posteriormente.
 Amizade com McCloy
 Primogênito, com dois irmãos
mais novos.
 Pai britânico, emigrante,
cursou Teologia no Canadá.
Era severo e moralista, mas
relacionava-se muito bem
com filhos e paroquianos,
não fazendo distinção de
classe. Seus sermões eram
voltados para a esperança,
caridade e trabalho do bem.
 Mãe era neta de um
importante destilador de
whisky de Toronto,
recebendo todos em sua casa,
mas era mais elitista e
arrogante que o marido.
77
 Educação
 Fraternida
des
Acadêmica
s
 Partido
 Cargos e
Funções
antes
WWII
 Desentendimento com Ted
Roosevelt. (por causa de
indicação política).
 Avô paterno era clérigo
episcopal de mineiros na
California até mudar-se para
Jersey City.
 Assumiu fortuna paterna aos
18 anos.
 Casou-se com Kitty Lanier
Lawrence, filha de um
banqueiro (divorcio 1936).
Tiveram uma filha, Mary.
 Segundo Casamento: Marie
Norton Whitney (exCornelius Vanderbilt
Whitney).
 Viuvez e terceiro casamento:
Pamela Churchill Hayward,
ex Randolph Churchill e
viúva de Leland Hayward,
(Broadway)
frescobol, handball e vela ,
no verão.
 Casou-se com Ellen
Zinsser, filha de um
industrial químico alemão
judeu
 Cunhado de Lewis
Douglas, , seu melhor
amigo de Amherst e sócio
em Wall Street.
durante a 2ª. Guerra,
sob Stimson (os
gêmeos divinos).
 Casou-se com Adele
Q. Brown, filha de
James Brown, da
Brown Brothers em
1919.
 Colega de quarto de Cole
Porter em Yale e Harvard.
 Casou-se em 1917 com Alice
Stanley, jovem pintora que
gostava de política. Tiveram
três filhos.
 Groton, Massachusetts (Eton
da Nova Inglaterra, dirigida
por Endicott Peabody)
 95% dos alunos eram elite e
cujos pais frequentavam
clubes como o Somerset,
Knickerbockers,
Philadelphia e Baltimore.
Gerou presidentes,
secretários de Estado,
governadores, senadores e
embaixadores., além de
muitos membros da OSS e
da CIA. A maioria dos
egressos optou por atuar no
mercado de ações e em
bancos governamentais
 Yale (1913)
 Peddle School, New Jersey
- 1907 (próximo a
Princeton)
 Amherst College – 1912
(Bolsa de Estudos)
Graduado cum lauda, mas
não foi aceito em Phi Beta
Kappa.
 Harvard - Direito 1916
(guerra) 1921
 Pós Graduação em
Stanford
 Hill School, N York
 Yale (1918) – diploma
in absentia
 Harvard (Direito e
Administração-1921)
 Abandonou faculdades
para acompanhar
amigos de Yale a Wall
Street.
 Governanta e ensino local até
nove anos.
 Em Hamlet Lodge em
Pomfre, , transitava
livremente em qualquer grupo
social, dando pouca
importância às diferenças de
classes.
 Groton: elemento e meio de
distinção social permitia
convivência entre filhos da
elite tradicional, dos grandes
magnatas comerciais e
financeiros e dos novos ricos,
mas além dos filhos da
fortuna, havia espaço para
filhos do clero episcopal,
como era o caso de Acheson.
 Yale (1912),
 Direito em Harvard (19151918)
 Psi Upsilon
 Skull & Bones
 Beta Theta Phi
 Phi Beta Kappa (mais
estudioso, mais
brilhante e mais
esforçado)
Skull & Bones
 Psi Upsilon
 Skull & Bones
 Democrata
 Republicano
 1922 abre WA Harriman
que, em 1927 se transforma
em Harriman Bros, com
adesão do irmão Roland.
 1931 – criação da Brown
Bros Harriman que teve,
entre seus diretores George
H. Walker e Prescott Bush .
 Proprietário Union Pacific
Railroad, Merchant
Shipping Corporation e
várias ações em outras
empresas de transporte ,
além da Polaroid
Corporation e da Soviet
Georgiam Manganese
Concessions.
 Trabalho em firma jurídica
que trabalhava com
ferrovias.
 Em 1925 recrutado pela
firma Cravath, Henderson
& de Gesdorff , que
recrutava os melhores de
Harvard, Yale e Columbia,
em New York, treinava-os
e depois tomava-os como
associado.
 Na Cravath, ele trava
amizade com Harriman e
Lovett, a quem se unirá
mais tarde na diretoria da
Union Pacific e relações
profissionais com James
Forrestal e Paul Nitze, da
Dillon, Read Co..
 Republicano
(Democrata)
 Oficial da Marinha,
voou com os ingleses
na 1ª. Guerra.
 Auxiliar
Administrativo (1919)
no banco do sogro.
 Posteriormente, sócio
e diretor na Brown
Bros. (1927) e
associado,
posteriormente, à
Brown Bros Harriman
(1930) e
 Democrata
 Democrata, Acheson
trabalhou na Covington &
Burlington em Washington
(indicado por McCloy) que
sempre lidava com problemas
legais internacionais.
 Sub-secretario do Tesouro
(1933) de FDR, não
concordou com planos de
mudança do preço do ouro,
ficou pouco tempo no cargo.
 Sub-secretário do Tesouro:
embargos de 1940 que
levaram à crise com o Japão e
ao subseqüente ataque a Pearl
Harbor em 1941.
 Anos mais tarde volta a ser
chamado por FDR para atuar
no State, onde desenvolveu
78
muito da guerra econômica
dos EUA contra o Eixo antes
de sua entrada formal na
WWII. (Lend-Lease).
 Caso Black Tom de 1916 o
projeta como advogado.
 Cargos e
Funções
durante
WWII
 Cargos e
Funções
durante
Guerra
Fria
 1941-43 – enviado especial
de Roosevelt à Europa para
representa-lo perante
Churchill e Stalin
 1943 - Carta do Atlântico
com FDR e Churchill
 1943-45 - Embaixador na
União Soviética
(presenteado com um cavalo
de troia para a Spaso House,
em Moscou.).
 1946 – Embaixador na
Inglaterra.
 1946-48 – Secretario do
Comercio substituindo
Henry Wallace
 1949 - Encarregado de
implantar o Plano Marshall e
de manter contato com
Irving Wallace (CIA)
 1951 – Teerã, para negociar,
com Loy Henderson os
problemas relacionados à
nacionalização da Anglo
Iranian Oil Company
 1954 – Eleito governador de
Nova York
 1952-56 – Candidato
democrata à nominação à
Presidência, mas perdeu
para Adlai Stenvenson por
ser considerado à esquerda,
ou muito liberal para o
Partido.
 1961–63 - Embaixador no
Laos e Secretario Assistente
para Assuntos no Extremo
Oriente.
 1961 - Acusado por Anatoly
Golitsyn de ser agente
soviético, é respaldado pela
CIA
 1963- 1965 - Sub Secretario
de Estado para Assuntos
Políticos
 1965 – Embaixador em Laos
e negocia paz em Paris
(Vietnan)
 Secretário Assistente de
Guerra de Stimson, foi
criticado por ter se oposto
ao bombardeamento de
estradas de ferro próximas
aos campo de Auschwitz e
às explosões atômicas em
Hiroshima e Nagasaki.
 Não aceitou pagar
compensações aos japoamericanos reclusos em
campos de internamento
durante a WWII.
 Presidente do Banco
Mundial,
 Alto Comissário dos
Estados Unidos para a
Alemanha .
 Conselheiro Presidencial.
 Atuou na Comissão
Warren.
 Membro do Establishment
que criou a política externa
do pós guerra.
 1953-60 - Presidente do
Chase Manhattan Bank
 1958-65 - Fundação Ford
 1946-49 e 1953-58 Conselheiro da Fundação
Rockfeller.
 1954-70 - Dirigiu o
Conselho de Relações
Externas (NY); sucedido
por David Rockfeller,
com quem havia
trabalhado no Chase
Manhattan.
 Membro do Comitê Draper
instituído em 1958 por Ike
Eisenhower.
 Conselheiro nas
administrações John
Kennedy, Lyndon
Johnson, Richard Nixon,
Jimmy Carter e Ronald
Reagan. (Democratas).
 Um dos principais
negociadores no Comitê de
Desarmamento
Presidencia.
 Após a guerra McCloy
tornou-se associado da
Milbank, Tweed, Hadley
& McCloy , firma de
advocacia vinculada aos
Rockfeller.
 Atuou para as ―
Sete
Irmãs‖ petrolíferas, como
a Exxon, em seu confronto
inicial com o movimento
de nacionalização na
Libia, bem como em suas
 1940 - Assistente
Especial para Assuntos
Aéreos de Stimson.
 (McCloy era
Assistente Assuntos
Gerais, Harvey Bundy
era Assistente Especial
e Forrestal era
Subsecretário de Knox
)
 Lovett supervisionou
expansão massiva da
US AF e Army.
 Lovett, McCloy e
Bundy renunciam em
1945
 Lovett retorna à
Brown Bros Harriman
.
 Em 1946, voltou ao
governo como sub sec
Defesa, com
Marshall.
Fundamental na
criação da CIA.
 Preocupado com
programa de
rearmamento a longo
prazo..
 Opôs- se a
reconhecimento de
Israel. Retorno a vida
privada em 49,
retornando à Defesa
em 1950, quando
Marshall assumiu o
Pentágono.
 Durante Guerra
Coréia, criou
programa de
rearmamento para
guerra e para
dissuasão e
mobilização futura.
 Defendia treinamento
militar universal para
construir força de
reserva, com
estabelecimento
militar regular menor.
 Forte defensor da
OTAN, encarregou-se
de armá-la.
 Propôs redefinição do
Supremo Comando
Militar , do Conselho
de Munição, do
Conselho de P&D .
 Preparou transição
ordenada para Charles
Wilson.
 Em 1953, retornou a
Brown Bros
Harriman.
 Oferta de qualquer
posto (Joe Kennedy)
em 1960 quando John
foi eleito, mas
declinou,
 Participou da Conferencia de
Bretton Woods em 1944
(formulação de diretrizes para
criação do FMI, Banco
Mundial e GATT) como
chefe da delegação do Dpto.
de Estado
 Toda a estrutura da economia
internacional do pós guerra
foi criada nesse encontro.
 Subsecretário de Estado
(1945-1949) sob Stettiniu,s
James Byrnes e George
Marshall.
 Papel decisivo na elaboração
da Doutrina Truman e do
Programa de Recuperação
Européia, em parceria com
Kennan, com cujas idéias
concordava plenamente.
 Secretario de Estado
(Truman-1949/1953)
antecedido por Marshall e
sucedido por Foster Dulles,
com a finalidade de aplicar a
política de contenção
formulada por Kennan
(Gabinete de Planejamento
Político).
 Atuou na OTAN, como
signatário dos EUA
 Secretário de Estado durante
Revolução Chinesa e Guerra
da Coréia.
 Dissuadiu Truman de enviar
ajuda às forças francesas na
Indochina, mas
posteriormente, aconselhou
Lyndon B. Johnson a
negociar a paz com
Vietcongs.
 Muito criticado por
McCarthy, juntamente com
Marshall (Defesa) por não
terem impedido comunismo
na China em 1949, foi
acusado de favorecer os
comunistas não os atacando
no exterior, nem
domesticamente. (―
ataque dos
primitivos‖)
 Em 1952, retornou à prática
privada de advocacia, mas
continuou influente na Casa
Branca.
 Liderou grupos democráticos
durante os anos Eisenhower e
com escritório no Park
Laffayette, do outro lado da
Casa Branca, foi conselheiro
79
negociações com a OPEP
e com a Arábia Saudita.
Parcerias
 Robert Lovett, desde a
infância
 Hall Roosevelt desde Groton
 Parcerias,
Choques e
Honrarias
Honrarias
 Presidential Medal of
Freedom (1969)
 West Point Militar Academy
Sylvanus Thayer Award
(1975)
Parcerias
 Germanófilo
(perdoou
vários
criminosos
de
guerra nazistas)
 Robert Lovett como amigo
pessoal (Heavenly Twins)
por toda a vida
Honrarias
 Cidadão honorário de
Rothemburg.
 Premio Sylvanus Thayer
de West Point (1963)
 Presidentia
Freedon
Award (1963)
 Incluído
no
US
Achievement Business Hall
(1977)
 Presidente do
Establishment norteamericanos, por sua
posição privilegiada no
mundo legal e longa
associação com
Rockefellers
argumentado
problemas de saúde,
 Indicou Dean Rusk
como Secretário de
Estado (Kennedy
queria Fullbright),
McNamara para
Defesa e Douglas
Dillon para Tesouro.
não oficial de Kennedy,
Johnson e Nixon.
 Participou do Crise de
Mísseis Cubana como
conselheiro do Executive
Commitee) de Kennedy.
Parceria:
Felix Frankfurter
Parcerias
 John McCloy
 George Kennan
 Dean Acheson
Honrarias
 Presidential Freedom
Award (1963) e
 Sylvanus
Tahyer
Award de West Point
 Cadeira de História
Naval e Militar de
Yale
,
em
sua
homenagem, ocupada
por
John
Lewis
Gaddis.
Choques:
 McCarthy o acusava
veementemente de leniência
com comunistas.
 Nixon queixou-se de seu
Colégio de Conteção
Covarde ao Comunismo.
 Protege Alger Hiss contra
McCarthy (espião comunista
comprovado mais tarde , pelo
Projeto Venona).
 1950: adversários tentam
removê-lo do cargo,
 Apóia Truman contra
MacArthur na Guerra da
Coréia. MacArthur queria
estender conflito á China e
Truman e Acheson queriam
limitá-la à Coréia.
Honrarias
 Presidential Freedom Award
(1964)
 Premio Pullitzer por
Memórias ―
Present at the
Creation‖ (1970).
FONTES: ACHESON, 1965, 1987; LIBRARY OF CONGRESS, J KENNEDY LIBRARY & MUSEUM; HARRIMAN & ABELL, 1975; HARRIMAN, 1960, 1971;
AMHERST COLLEGE ARCHIVES; BROWN, BROTHERS HARRIMAN & CO.; CRAVTH, SWAINE & MOORE LLP; COVINGTON & BURLING LLP;
GICKER, 2006: HALBERTAM, 1972; HARRIMAN, Roland, 1975. HECKSHER, 1980; HIGH BEAN, ISSACSON & THOMAS, 1986; JEWISH VIRTUAL
LIBRARY, HARRIMAN PERSONAL PAPERS; NITZE,1980,1989; PEARSON, 1949; ROBBINS, 2002; SKULL & BONES SOCIETY; TASK, 1985; US
DEPARTMENT OF DEFENSE; US POSTAL SERVICES; WORLD BANK ARCHIVES;
Considerando no Quadro III a posição de cada um dos servidores políticos na fratria familiar,
observa-se que havia dois filhos únicos (Lovett e McCloy) e dois primogênitos (Harriman e
Acheson). Em termos de escolaridade, os quatro fizeram seus estudos básicos e preparatórios
em escolas privadas, apesar de McCloy ter origens sociais bem inferiores às de seus
companheiros.
Harriman e Acheson frequentaram o ensino básico em Groton, uma escola de elite que dava
grande importância à hierarquia social. Lovett frequentou The Hill, que se destacava entre as
melhores da Costa Leste por dar mais valor à aprendizagem e ao conteúdo do que ao status
social de seus alunos e McCloy fez seus estudos preparatórios em Amherst, uma escola
presbiteriana de boa qualidade acadêmica que oferecia bolsas de estudo para jovens carentes e
esforçados.
80
Dos quatro, William Harriman era o que melhor se posicionava no campo econômico. Órfão
aos dezoito anos, ele recebeu um império na área de transportes como herança. Lovett e
Acheson, apesar de não serem tão abonados, tinham uma condição social confortável e
puderam frequentar a universidade sem se preocupar com as despesas de suas fraternidades,
ou com sua manutenção. McCloy teve que trabalhar durante todo o curso para manter-se e
que contentar-se a frequentar uma fraternidade menos menos onerosa.
Quanto às fraternidades universitárias, observa-se que Lovett, Acheson e Harriman
frequentaram Yale, onde foram aceitos nas fraternidades Phi Beta Kappa91, PsiUpsilon92 e
Skull & Bones93, respectivamente. McCloy, pertencente a um segmento social menos
privilegiado, tinha recursos limitados e só conseguiu ingressar na Beta Theta Nu, uma
fraternidade que, apesar de também valorizar a excelência intelectual, era menos prestigiosa
ou opulenta que a Phi Beta Kappa.
Acheson foi aceito na Psi Upsilon tanto por seu espírito gregário e sociável, quanto por sua
amizade com Cole Porter, pois em Yale ainda não era bom aluno, preferindo festas e garotas
aos livros. McCloy foi aceito somente na Beta Theta Nu porque, apesar de estar entre os
primeiros de sua turma, trabalhava para estudar e não tinha como financiar os eventos de uma
fraternidade muito rica.
91 A Phi Beta Kappa Society é uma sociedade de honra acadêmica cuja missão é celebrar e defender a
excelência nas artes liberais e nas ciências, atraindo para suas fileiras os mais extraordinários alunos de artes e
ciências nos principais colégios e universidades da América. In Phi Beta Kappa Society. Disponível em
http://www.pbk.org/infoview/PBK_InfoView.aspx?t=&id=8. Acesso em 03/03/2011.
92 A Psi Upsilon é uma fraternidade social que tem uma fundação que oferece bolsas de estudos a seus
membros nos Estados Unidos e Canadá, além de cursos de aperfeiçoamento. In Psi Upsilon. Disponível em
http://www.psiu.org/about.html. Acesso em 03/03/2011.
93 A Skull & Bones é a mais tradicional e disputada de todas as fraternidades seniores de Yale. Anualmente são
selecionados quinze alunos entre os calouros para se juntarem á sociedade. Tradicionalmente, a escolha recai
sobre os líderes do campus e sobre outras figuras notáveis em várias áreas. Grupos como a Delta Kappa
Epsilon Fraternity, a Yale Political Union e o Yale Daily News são muito bem representados, além de também
serem escolhidos os capitães de vários esportes, como futebol, basquete e remo. A Skull & Bones tem a
reputação de ter membros muito intimamente ligados à elite do poder, como é o caso, por exemplo, de Henry
L. Stimson (1888), Secretário da Guerra; Percy Rockefeller (1900), diretor da Brown Brothers Harriman, da
Standard Oil e da Remington Arms; George L. Harrison (1910), banqueiro; presidente do Federal Reserve
Bank of New York, antigo diretor do Conselho da New York Life Insurance Co. e consultor especial de Henry
L. Stimson; Averell Harriman (1913), empresário e sócio fundador da Harriman Brothers & Company e mais
tarde, da Brown Brothers Harriman & Co.; Embaixador dos Estados Unidos e Secretário do Comércio;
governador de New York; Diretor do Conselho e Diretor Executivo da Union Pacific Railroad, da Brown
Brothers & Harriman, e da Southern Pacific Railroad; Prescott Bush (1916), empresário, um dos sócios
fundadores da Brown Brothers Harriman & Co.; Senador por Connecticut (1952–1963), pai de George Bush
e avô de George W. Bush.; F. Trubee Davison (1918), Diretor de Pessoal da CIA; Robert A. Lovett (1918),
Secretário de Defesa e de Briton Hadden e Henry Luce (1920), co-fundadores da Time Life Enterprises,
dentre muitos outros, não menos distintos ou importantes. In Skull & Bones Society. Disponível em
http://www.skullandcrossbones.org/articles/skullandbones.htm. Acesso em 03/03/2011.
81
Harriman pertenceu à PSi Upsilon, como Acheson, além da Skull & Bones. Apesar de não ter
sido um aluno brilhante como Bob Lovett, nem uma estrela social como Dean Acheson,
destacou-se como capitão do time de remo, era muito rico e além de poder fazer grandes
doações à escola, tinha amizades certas nos círculos mais estritos e elevados, que certamente
lhe facilitaram a aceitação em várias fraternidades de prestígio.
Lovett foi aceito na Phi Beta Kappa por ser considerado o mais estudioso, o mais brilhante e
mais esforçado de sua turma em Yale. Além disso, por suas relações muito próximas com
Roland e Averrel Harriman e com o círculo de amizades dos dois jovens milionários, também
foi aceito na Skull & Bones.
Em suma, observar-se que Harriman e Acheson partilharam a Skull & Bones com Lovett e
que ambos também foram aceitos pela Psi Upsilon.
Em função da morte do pai e por ter que assumir seus negócios, Harriman não seguiu carreira
acadêmica após graduar-se em Yale em 1913, mas Lovett, Acheson e McCloy foram para
Harvard, para cursar Direito tão logo saíram de suas escolas preparatórias.
A Primeira Guerra afetou a vida acadêmica de Lovett e McCloy, que se alistaram e
interromperam a universidade, mas Acheson já havia se graduado em Direito em 1917,
quando se alistou na Marinha e Harriman, já casado, decidiu não pegar em armas, mas
construir navios para ajudar seu país a vencer a guerra.
Quando Lovett retornou da guerra, tentou cursar Administração em Harvard, pois não se
sentia atraído pelo Direito, mas após um ano sem conseguir motivar-se, abandonou a
universidade e foi juntar-se a seus amigos que já estavam atuando em Wall Street. McCloy,
sem fortuna e com um capital social ainda muito volátil,voltou para Harvard e terminou o
curso de Direito, antes de ir tentar a vida em Nova York.
Averell Harriman e Bob Lovett mantinham vínculos estreitos bem antes de atuarem juntos em
Wall Street, pois se conheciam desde 1904, em virtude do relacionamento profissional de seus
pais. Lovett era mais novo que Harriman e, a princípio, seu vínculo era maior com Roland
Harriman, que tinha aproximadamente a sua idade.
Acheson conheceu Harriman em Groton, quando este chefiava o time de remo e seu
relacionamento se firmou em Yale, quando ambos frequentavam os mesmos círculos
esportivos e sociais, com muitos amigos e fraternidades comuns.
82
McCloy nunca tivera contato social com Harriman, Lovett ou Acheson até Harvard, mas
posteriormente, os quatro se cruzarão em Wall Street por intermédio de seus escritórios de
advocacia.
Harriman e Lovett eram filhos de self made men que fizeram fortuna no fim do século XIX
com o boom das estradas de ferro, o que os situava nas camadas mais elevadas do estrato
social na Costa Leste e no Sul, respectivamente. Harriman pertencia à rica elite emergente e
Lovett, pelo lado materno, à elite tradicional empobrecida com a Guerra Civil. Dean Acheson
era filho de um pastor presbiteriano de recursos moderados, mas com grande capital social
entre seus paroquianos e John McCloy era órfão de pai, um imigrante irlandês de recursos
escassos.
Os pais de Harriman, Lovett e acheson casaram-se acima de sua classe: E H Harriman, com a
filha de um proprietário de estradas de ferro no Norte dos Estados Unidos, quando ainda era
filho de um ministro presbiteriano remediado; Robert S Lovett, já advogando, casou-se com
uma dama de família aristocrática do Sul e Robert Acheson, quando ainda cursava Teologia
para tornar-se ministro, com a neta de um destilador de uísque canadense.
Ou seja, as mães de William Harriman, Bob Lovett e Dean Acheson eram mulheres mais
finas, educadas e aristocráticas que seus maridos. E H Harriman e Robert Lovett eram
workaholics, mas nunca tiveram estudo formal e sua desenvoltura social era relativamente
limitada em relação às suas esposas. Robert Acheson, como pastor anglicano, era melhor
preparado intelectualmente, mas também não tinha o trânsito social de sua esposa. Por isso, a
influência materna sobre os filhos - sob o ponto de vista de traquejo social - foi tão importante
para suas futuras carreiras políticas, quanto a exercida pelos pais, nas questões de ambição
acadêmica e de postura moral.
Anna McCloy casou-se em sua classe, mas como ficou viúva muito jovem e o marido não lhe
deixou bens, teve que trabalhar para sustentar a si e ao filho. Além de Lavinia A. Lovett, que
era professora da Escola Normal de Huntsville, Anna foi a única a exercer trabalho manual
para sobreviver. Mary Averell Harriman e Eleanor Gooderham Acheson só exerceram
atividades domésticas próprias da elite, mas por terem recebido a educação refinada do último
período vitoriano, retransmitiram aos filhos os valores e os comportamentos sociais exigidos
pelas classes mais elevadas.
Durante o período escolar, todos os quatro rapazes criaram vínculos importantes para sua
futura vida profissional e política. Groton, frequentada pela elite da Costa Leste, unificou sob
83
a mesma filosofia Harriman e Acheson, ligando-os a figuras proeminentes da política e do
mercado financeiro por meio das fraternidades juniores a que aderiram e que posteriormente,
reforçaram suas redes de relacionamento em Yale.
Em Hill School, Lovett conheceu Artemus Gates e David Ingalls, os amigos que viveriam
com ele, posteriormente,
a experiência do Esquadrão de Reserva de Yale e que,
sucessivamente, seriam Secretários Assistentes da Marinha para a Aviação no governo
Roosevelt, antes dele. Ambos teriam grande influência no processo que o atrairia para a
máquina administrativa governamental.
Harriman foi o primeiro do grupo a casar-se, em 1915, com Kitty L Lawrence, filha de um
rico banqueiro de New York. Ao divorciar-se, ele escolheu as duas esposas seguintes em seu
círculo social94.
Lovett casou-se em 1919 com Adele Brown, filha caçula do Juiz James Brown. O casamento
lhe rendeu um emprego na Brown Brothers95 em 1921, estágio em Londres na Brown Shipley
& Co, um banco mercantil que havia sido fundado pelos Brown em Liverpool no século
anterior. Em 1926, sete anos após seu casamento, tornou-se sócio da Brown Brothers e passou
a fazer parte do comitê executivo e de diretoria da Union Pacific. Para ele, o casamento
significou um upgrade econômico, além ter sido muito conveniente sob o ponto de vista
social pois, como a 1ª. Guerra havia quebrado barreiras sociais para receber os novos-ricos da
indústria, ele pode mesclar-se livremente com o dinheiro patrício da sociedade tradicional,
como o dos Brown.
Dean Acheson casou-se em 1917, durante a guerra, quando ainda servia na Guarda Nacional,
com Alice Stanley96, uma jovem artista plástica que fora colega de quarto de sua irmã Margot
94
Em segundas núpcias, William Harriman uniu-se a Marie Norton Whitney, ex-mulher de Cornelius Vanderbilt
Whitney, com quem viveu até a morte dela, em 1970. Um ano depois, aos setenta e cinco anos, casou-se com
Pamela Churchill Hayward, ex-esposa de Randolph Churchill e viúva de Leland Hayward, um produtor da
Broadway. Viveu com ela até morrer, em 1986. BLAND, Larry I. Averell Harriman, the Russians and the
Origins of the Cold War in Europe: 1943-45. Australian Journal of Politics and History, 1977. 23(3): 403416.
95A Brown Brothers fundiu-se com a Harriman Brothers em 1931 e se transformou na bem sucedida Brown
Brothers Harriman & Co. que teve entre seus diretores George Herbert Walker e seu genro Prescott Bush,
avô de George W. Bush. ISAACSON & THOMAS. Op.cit,, 1986.
96 Alice Stanley Acheson tornou-se uma proeminente pintora de Washington, originária de uma família em que
os pais e os avós eram pintores. Ela expor seus trabalhos - óleos e aquarelas com cenas em Washington,
retratos e paisagens dos locais em que ela e seu marido visitaram enquanto ele era Secretário de Estado - em
galerias e museus em Washington e em outros locais por décadas. HIGH BEAN. Alice Stanley Acheson.
Disponível em http://www.highbeam.com/doc/1P2-761673.html . Acesso em 03/03/2011.
84
na Wellesley University. Ela não lhe agregou capital financeiro ou político, pois sua família
era, há algumas gerações composta por pintores e artistas plásticos, mas a estabilidade de seu
casamento deu a Harriman enorme segurança emocional para enfrentar os embates que teria
com McCarthy na década de 195097.
John McCloy casou-se em1930, com Ellen Zinsser, filha de um industrial judeu de origem
alemã que se estabelecera nos Estados Unidos em 1897 e fundara sua própria companhia de
produtos químicos. Por influência da esposa, ele desenvolveu um olhar menos preconceituoso
sobre o povo alemão do que a maioria de seus compatriotas, mesmo durante a 2ª. Guerra e
principalmente depois dela, quando foi nomeado Alto Comissário para a Alemanha.
William Harriman e Dean Acheson pertenciam ao Partido Democrata, mas McCloy e Lovett
eram republicanos. As nomeações de ambos eram consequência da estratégia apartidária
adotada por Roosevelt para convencer a oposição a aprovar suas medidas de auxílio aos
Aliados e mantida por Truman; foram atraídos ao governo pelo igualmente republicano
Henry Stimson98 quando este foi nomeado para o cargo de Secretário da Guerra em 1940.
97 ACHESON, Op. cit., 1969.
98 Henry Stimson pertencia a uma família rica e tradicional de Nova York, envolvida por muitas gerações com
o Partido Republicano. Estudou na Phillips Academy em Andover, Massachusetts e em Yale, onde foi iniciado
nas fraternidades Phi Beta Kappa e Skull & Bones, que lhe permitiram manter muitos contatos importantes
para o resto de sua vida. Graduou-se em Direito por Harvard em 1890 e juntou-se à firma Root and Clark em
Wall Street, onde conheceu Elihu Root, futuro Secretário da Guerra e de Estado, que se tornaria uma das
maiores influências e modelo em sua vida. Casou-se nesse mesmo ano com Mabel Wellington White, uma
tetra-neta de Roger Sherman, mas não tiveram filhos. Em 1906, Ted Roosevelt o nomeou Promotor de Justiça
para o distrito sul de Nova York e em 1911, o presidente William Taft o nomeou Secretário de Guerra, cargo
que ocupou até 1913, quando Wilson assumiu o poder. Em 1927 Calvin Coolidge o enviou para negociar a
independência da Nicarágua e em seguida, Governador Geral das Filipinas, cargo que ocupou até 1929,
quando o Presidente Hoover o nomeou Secretário de Estado. Nesse período, elaborou a Doutrina Stimson,
como resultado da invasão japonesa à Manchúria, na qual os Estados Unidos se recusavam a reconhecer
qualquer situação ou tratado que limitasse os direitos norte-americanos ou que fosse resultado de alguma
agressão. Tendo retornado à vida privada no fim do governo Hoover, Stimson advogava firmemente que os
Estados Unidos deveriam apresentar forte oposição às agressões japonesas. Durante a Segunda Guerra, para
formar um governo de coalisão em 1940, o presidente Roosevelt – Democrata – o chamou de volta para
chefiar o Departamento de Guerra. Durante a guerra, Stimson dirigiu a expansão das forças armadas,
conseguindo administrar a convocação e o treinamento de doze milhões de soldados e a compra e o transporte
para os campos de batalha de 30% de toda a produção nacional. Também foi encarregado do Projeto
Manhattan, supervisionando-o diretamente com o General Leslie Groves. Após a Guerra, ele se opôs
firmemente á desindustrialização da Alemanha e à sua divisão em vários pequenos estados. Como promotor
de justiça, ele insistiu, contra a vontade inicial de Roosevelt e de Churchill em promover um julgamento
formal contra criminosos de guerra. Tendo recebido a aprovação de Truman, juntamente com o Departamento
de Estado, elaborou a primeira proposta para a formação de um Tribunal Internacional que mais tarde levaria
aos Julgamentos de Nuremberg entre 1945 e 1946, que teriam significativa importância no desenvolvimento
do Direito Internacional. Com o fim da guerra e aos 75 anos, Stimson renunciou ao cargo e voltou à vida
privada. In US History. Disponível em http://www.u-s-history.com/pages/h1665.html. Acesso em
03/03/2011.
85
Antes da Segunda Guerra, as trajetórias desses internacionalistas se cruzaram em Wall Street:
Harriman havia criado a Brown Bros Harriman fundindo as duas empresas em 1931 e
consolidado materialmente os vínculos sociais que mantivera com Bob Lovett desde a
infância.
Acheson foi contratado pela Covington & Burlington99 por indicação de John McCloy – então
sócio na Cravath100 firma legal que lidava com problemas internacionais em New York, - e a
partir de vários casos comuns em que se confrontaram como adversários, ou como parceiros
legais, os laços de amizade firmados com Harriman em Groton e Yale por causa do time de
remo, foram reforçados.
A primeira participação de Dean Acheson no governo foi em 1933 quando, por indicação de
seu professor Felix Frankfurter101, foi nomeado Sub-Secretário do Tesouro.
Por ter
99
A Covington & Burling LLP foi fundada em Nova York em 1919 e atualmente é uma firma de direito
internacional com escritórios em Beijing, Bruxelas, Londres, Nova York, São Francisco, Vale do Silício, São
Diego e Washington. Seus advogados fazem aconselhamento jurídico a corporações multinacionais em
assuntos relacionados a transações de grande porte, litígios, regulamentação e políticas públicas. Está
classificada entre as 20 maiores do país, tomando por referencia as atividades pro bono, a satisfação de seus
associados e a diversidade de suas atividades. In Convington & Burling LLP. Disponível em
http://www.cov.com/about_the_firm/firm_history/. Acesso em 03/03/2011.
100
A Cravath, Swaine & Moore LLP (Cravath) é uma firma advocatícia com sede em Nova York e com uma
filial em Londres. É a segunda firma mais antiga do país e foi fundada em 1819, posicionando-se entre as
mais importantes do mundo. In Cravath Swaine & Moore LLP. Disponível em http://www.cravath.com/ .
Acesso em 03/03/2011.
101 Felix Frankfurter era judeu e austríaco. Emigrou com sua família para os Estados Unidos aos 12 anos,
instalando-se no Lower East Side de Nova York, onde teve seu primeiro contato com palestras políticas sobre
sindicalismo, socialismo e comunismo. Graduou-se pelo City College de NY, fazendo parte da fraternidade
Phi, Beta Kappa e foi para a faculdade de Direito de Harvard, onde criou vínculos de amizade com Walter
Lippman, tornou-se editor da Harvard Law Review e graduou-se com as melhores notas de sua turma. Após
formar-se, juntou-se à firma jurídica Hornblower, Bryne, Miller and Porter e em 1906, tornou-se assistente de
Henry Stimson, então Promotor do Distrito Sul de Nova York. Em 1911 o presidente William Taft indicou
Stimson para Secretário da Guerra, e este o nomeou como oficial jurídico do Escritório de Assuntos Internos,
onde se tornou assistente e confidente do Secretário. Suas opiniões progressistas impressionaram o diretor da
Faculdade de Direito de Harvard, que o convidou para ensinar Direito Administrativo. Na mesma época,
atuou como conselheiro da Liga Nacional de Consumidores defendendo causas progressistas, como o
estabelecimento de salários mínimos e a diminuição do horário de trabalho. Durante a 1ª. Guerra serviu como
assistente especial de Newton D. Baker, Secretário da Guerra, supervisionando como juiz geral as cortes
marciais do Departamento. Em 1917 o presidente Wilson o nomeou para uma comissão de mediação que se
propunha a resolver greves que estavam atrapalhando a produção de guerra. Seu trabalho lhe deu a
oportunidade de aprofundar conhecimento sobre políticas trabalhistas e extremismos como o anarquismo, o
comunismo e o socialismo evolucionário. Ele simpatizava com as reivindicações trabalhistas e suas atividades
fizeram com que o público o visse como um advogado radical, defendendo opiniões radicais. No fim da
guerra, foi um dos intelectuais que assinou a declaração de princípios para a formação da Liga das Nações e
defendia a participação dos Estados Unidos em assuntos internacionais. Envolvido na questão sionista por
Louis Brandeiss, seu amigo e Juiz do Supremo, ajudou a pressionar o Presidente Wilson a dar suporte à
Declaração Balfour, um documento do governo britânico que apoiava o estabelecimento de um estado judeu
na Palestina. De opiniões radicais, ele foi um dos maiores ativistas pelo reconhecimento da União Soviética
pelos Estados Unidos em 1919, ajudou a fundar o Sindicato Americano das Liberdades Civis e sempre
batalhou na defesa dos direitos civis e humanos das minorias. Professor do curso de Direito de Harvard, ele
86
discordado de Roosevelt quanto à mudança do preço do ouro, ficou pouco tempo no cargo,
mas em seu terceiro mandato, o presidente o chamou de volta ao Tesouro e ele participou
ativamente, tanto da elaboração legal dos embargos de 1940 que levaram à crise com o Japão,
quanto do programa de ajuda econômico-militar aos Aliados (Lend-Lease102), juntamente com
Harriman, Forrestal e Harry Hopkins
Também foi em 1940 que Lovett e McCloy, que haviam trabalhado durante a Primeira Guerra
como oficiais juniores de Henry Stimson,
foram convocados para auxiliá-lo a estruturar as
forças armadas norte-americanas para uma eventual intervenção no conflito recém iniciado na
Europa. Sob Stimson, Bob Lovett tornou-se responsável pela área de Assuntos Aéreos e John
McCloy, pelos Assuntos Gerais.
Ambos trabalharam intensa e eficientemente com o Secretário na logística de produção e
distribuição dos armamentos e das forças terrestres, navais e aéreas na Europa e na Ásia, e foi
durante esse período que tiveram os primeiros contatos profissionais com George Marshall,
então Chefe do Estado Maior e responsável pela reorganização e modernização da estrutura
do Exército e Força Aérea, além da administração de todo o processo de moradia e
suprimento de mais de oito milhões de soldados.
Pelos vínculos pessoais que criara com Winston Churchill na Inglaterra e pelas relações
comerciais que mantivera com a União Soviética durante a década de 1930, William
Harriman foi nomeado enviado especial do Presidente à Europa, entre 1941 e 1943. Nesse
período, trabalhou diretamente com Dean Acheson, sub Secretario de Estado e com James
Forrestal, Sub-Secretário da Marinha
que faziam lobby no Congresso em favor do Lend-
continuou seu trabalho em defesa dos socialistas e das minorias religiosas e oprimidas, tendo se envolvido,
nos últimos anos da década de 1920 com o julgamento de Sacco e Vanzetti, argumentando que ambos eram
vítimas de preconceito contra imigrantes anarquistas. Por suas opiniões radicais, ele angariou muitos inimigos
e não era muito bem vista pela elite de Boston. In Jewish Virtual Library.
Disponível em
http://www.jewishvirtuallibrary.org/jsource/biography/frankfurter.html. Acesso em 03/03/2011.
102
Lend-Lease ou Empréstimo-Arrendamento foi o nome dato ao programa sob o qual os Estados Unidos
supriram a Inglaterra, União Soviética, China, França e outras nações Aliadas com grande quantidade de
material bélico entre 1941 e 1945. O projeto foi transformado em lei em 11/03/1941, antes da entrada dos
Estados Unidos na guerra e deu fim à pretensa neutralidade daquele país. Cerca de US$ 50.1 bi em
suprimentos foram enviados para o teatro da guerra: US$ 31.4 bi para Inglaterra, US$ bi para União Soviética,
US$ 3.2 bi para a França e US$ 1.6 bi para a China. Após a data determinada para a devolução, os
suprimentos foram vendidos à Inglaterra com desconto, por £ 1.1 bi através de empréstimos de longo prazo
oferecidos por bancos norte-americanos. O Canadá operou um programa semelhante, que enviou US$ 4.7 bi
em suprimentos para Inglaterra e União Soviética. Esse programa foi um passo decisivo nas relações entre
Europa e Estados Unidos – que desde o fim da Primeira Guerra haviam mantido uma politica isolacionista
nas relações internacionais. In US History. Disponível em http://www.u-s-history.com/pages/h1600.html .
Acesso em 03/03/2011 e in Navy History. Disponível em http://www.history.navy.mil/faqs/faq59-23.htm.
Acesso em 03/03/2011.
87
Lease e trabalhavam nas pontas jurídicas e militares do acordo. No exterior, juntamente com
Harry Hopkins, ele servia como elemento de ligação entre Roosevelt, Churchill e Stalin.
Chip Bohlen o acompanhava, bem como ao Presidente, a Harry Hopkins e ao Secretário de
Estado Edward Stettinius em todos os encontros com a liderança soviética como intérprete,
enquanto Kennan digeria seu ―
castigo‖ burocrático na Alemanha e em Portugal, por causa do
conflito com Joseph Davies.
Harriman, Hopkins e Acheson foram diretamente responsáveis pelo amarramento diplomático
da Carta do Atlântico em 1943, firmada entre o presidente norte-americano e Winston
Churchill. Após garantir diplomática e legalmente o acordo com a Inglaterra que promoveria
a descolonização da Ásia e da África no pós-guerra, Harriman foi nomeado embaixador em
Moscou, onde representaria os interesses de seu país entre 1943 a 1945. Enquanto embaixador
em Moscou, Harriman teve o primeiro contato com George Kennan, a quem, por indicação de
Chip Bohlen, convocara em Portugal para assumir o cargo de Chargé d´Affairs em sua
embaixada.
Em 1946, Harriman foi apontado como Embaixador em St. James por um curto período, logo
sendo chamado de volta aos Estados Unidos para ocupar o cargo de Secretário do Comércio,
substituindo Henry Wallace. Em 1949, transformou-se novamente em enviado especial de
Truman na Europa, com a finalidade de implantar o Plano Marshall e de acompanhar os
rumos do movimento socialista na Europa Ocidental por meio de contatos com Irving
Wallace, que trabalhava para a CIA.
Após a Guerra e durante todo o mandato de Truman, McCloy recebeu nomeações do
Presidente para a Presidência do Banco Mundial e para o Alto Comissariado dos Estados
Unidos para a reestruturação da Alemanha Ocidental. Pelas duas funções exercidas,
intensificou seus vínculos com Lovett, nomeado Sub-Secretário da Defesa, sob Forrestal; com
Acheson e Marshall, no Departamento de Estado e com Kennan, no PPS.
A atuação de Lovett, na função de Sub Secretário de Forrestal, na Defesa, bem como a de
Kennan, Henderson, Nitze e Acheson, no Departamento de Estado, foram fundamentais para
a criação da CIA, em 1947, como parte da estratégia estabelecida pela Doutrina da Contenção
para controlar e combater a subversão de valores capitalistas por forças soviéticas.
Ao contrário do que Kennan defendia, Lovett demonstrou grande preocupação em rearmar
os Estados Unidos a longo prazo pois, como James Forrestal e Paul Nitze, o rumo dos
88
acontecimentos na Europa e na Ásia o faziam temer um conflito direto com a União
Soviética.
Em 1949, por ocasião da morte de Forrestal, Lovett retornou à vida privada, mas em 1950,
quando Marshall se cansou dos ataques de McCarthy ao Departamento da Defesa e foi para o
Pentágono, ele o substituiu como titular da pasta e durante a guerra da Coréia e foi
responsável pela implantação do programa de rearmamento que havia idealizado em sua
gestão como Sub-Secretário. O novo programa, voltado não só para a guerra, mas também
para atuar como elemento de dissuasão e de mobilização futura, implicava em treinamento
militar universal e tinha a finalidade de constituir força militar de reserva, reduzindo o
contingente militar fixo.
Lovett também foi um ardoroso defensor da OTAN, tornando-se o principal responsável por
armá-la de acordo com interesses do complexo industrial militar norte-americano e dos
aliados. Em relação às forças militares dos Estados Unidos, propôs a redefinição do Supremo
Comando Militar, do Conselho de Munição e do Conselho de Pesquisa e Desenvolvimento
com a finalidade de agilizar o processo burocrático nas altas instâncias.
Quando Truman foi apeado do poder por Eisenhower em 1952, ele retornou para a Brown
Bros Harriman103 e para suas atividades jurídico-financeiras. Em 1960, quando Joe Kennedy
o convidou para voltar ao governo no Gabinete de seu filho, Lovett declinou a honraria,
argumentando questões de saúde - mas seu capital social ainda estava tão elevado, que fez a
indicação de Dean Rusk para o Departamento de Estado (Kennedy queria Fullbright), de
Robert McNamara para a Defesa e de Douglas Dillon (da Dillon, Read & Co. de Forrestal)
para o Tesouro104. E só a título de lembrança: os Kennedy eram democratas e Robert Lovett,
republicano.
103 A Brown Brothers Harriman & Co. (BBH) é o mais antigo e maior banco privado dos Estados Unidos.
Além da prestação de serviços financeiros, a empresa oferece tutela global e troca de moedas estrangeiras; de
serviços de private equity , fusão e aquisição de propriedades em qualquer país do mundo; gestão de
investimento para pessoas físicas e jurídicas; administração de bens; seguros e assistência a clientes no
mercado de ações. É particularmente notável o grande número de políticos norte americanos influentes e de
servidores nomeados pela Presidência que trabalharam para ela desde sua fundação em 1931. Dentre eles,
principalmente, W. Averell Harriman, Prescott S. Bush (avô de George W. Bush e pai de George Bush) e
Robert Lovett (coincidentemente, todos eram membros da Skull & Bones e maçons). Atualmente, a firma tem
40 associados e cerca de 4.000 funcionários distribuídos em suas filiais pelo mundo. In Brown Brothers
Harriman. Disponível em http://www.bbh.com/index.shtml. Acesso em 03/03/2011.
104 Department of Defense. Disponível em http://www.defense.gov/specials/secdef_histories/bios/lovett.htm.
Acesso em 03/03/2011.
89
Dean Acheson - que atuara como Sub-Secretário de Estado de Edward Stettinius, James
Byrnes e George Marshall e que acumulara imenso capital social pelas atividades
desenvolvidas no governo tanto ao longo da Segunda Guerra, quanto após seu termino –
participou em 1944 da Conferencia de Bretton Woods em que foram formuladas as diretrizes
que criaram o FMI, o GATT (que não foi aceito pelo Congresso norte-americano e substituído
mais tarde pela Organização Internacional do Trabalho) e o Banco Mundial – do qual John
MCCloy seria presidente105, definindo legalmente as estruturas da economia mundial do pós
guerra, como chefe da delegação do Departamento de Estado.
Pelas funções que exercia no Departamento de Estado, Acheson aproximou-se muito do
presidente Truman e teve um papel decisivo, ao lado de Forrestal e de Kennan, na elaboração
do Ato de Segurança Nacional de 1947 (Doutrina Truman) e do Programa de Recuperação
Européia (Plano Marshall).
Entre 1949-1953, após a saída de Marshall do Departamento de Estado, Acheson assumiu
como titular, sofrendo forte crítica da imprensa e, principalmente após 1950, do Senador
Joseph McCarthy sobre as medidas adotadas por sua pasta em relação aos avanços do
comunismo. Atuou na formação da OTAN como signatário dos Estados Unidos e tentou
minorar os estragos causados ao capitalismo pela Revolução Chinesa e pela Guerra da Coréia.
Em 1952, quando Truman passou a presidência para Eisenhower, Dean Acheson retornou à a
prática privada da advocacia, mas continuou fazendo aconselhamento político e jurídico para
a Casa Branca durante os governos Kennedy, Johnson e Nixon.
Finalmente, segue abaixo a análise comparativa do Quadro IV, que contempla os servidores
militaristas.
105 John McCloy foi o segundo presidente do Banco Mundial, indicado por Eugene Mayer como seu sucessor.
Durante seu mandato, (1947 a 1949) ele priorizou a obtenção de recursos no mercado, o início das operações
de empréstimo para reconstrução e desenvolvimento dos países afetados pela guerra, o fortalecimento da
equipe administrativa que assumiria as questões técnicas do banco e principalmente, a definição de funções e
de responsabilidades de cada diretor executivo e do presidente, além de definir, igualmente, o relacionamento
que o Banco deveria ter com as Nações Unidas e com o governo dos Estados Unidos. In World Bank
Archives.
Disponível
em
http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/EXTABOUTUS/EXTARCHIVES/0,,contentMDK:2050472
8~pagePK:36726~piPK:437378~theSitePK:29506,00.html. Acesso em 03/03/2011.
90
Quadro IV. Origens, Capitais Sociais e Trajetórias de Servidores Militaristas
George Marshall
James V Forrestal
Data e local
de nascimento
 31/12/1880 a 16/10/1959
Uniontown, Pennsilvanya
 15/02/1892 a 22/05/1949
 Matteawanm Beacon, NY
Gestão do
capital social
 Serviu em vários postos nas Filipinas entre 1901 e 1905.
 Primeira. Guerra: Assistente do Gal. John J. Pershings,
ttreinando soldados e planejando suas ações
 Permaneceu no cargo após armistício e serviu na China
(1924 a 1927)
 Foi instrutor no War College de West Point(1927), na
Infantry School (1927 a 1932) e instrutor senior na
National Guard of Illinois (1933 a 1936)
 Boxeador amador
 Era frio e indiferente com a família. Depois de sair de
casa, raramente falava de seu passado ou visitava os
pais.
 Ambicioso, workaolic compulsivo, introspectivo,
obsessivo, tímido, filosófico, solitário e emocionalmente
inseguro.
 Dizia que ―
obscuridade‖ era seu hobby predileto.
 Família classe média alta, oriunda da Virginia.
 Seu pai tinha próspero negócio com minas de carvão
 Avô John Marshall ficara mais tempo como Juiz da
Suprema Corte daquele estado do que qualquer outro
(cargo eletivo)
 Caçula, não tinha os mesmos pendores acadêmicos que
irmão mais velho.
 Família de imigrante irlandês,
 Pai diletante em política e trabalhador braçal em
construção civil que conseguiu montar sua própria
construtora.
 Mãe o educou como católico devoto, mas ele abandonou
religião Casado com Josephine Ogden, jornalista da
Vogue e ex-dançarina de Ziegfield (depressiva e
alcoolista). Tiveram dois filhos.
 Instituto Militar da Virginia (1901)
 Escola de Cavalaria-Infantaria do Forte Leavenworth
(1907)
 Colégio de Pessoal do Exército.
 Matteawam High School (1908).
 Dartmouth College (1911) transferiu-se para
 Princeton (1912), (editor do The Daily Princetonian),
abandonou o curso no ultimo ano
 Votado pela classe como ―
o mais provável a ser bem
sucedido‖,
Fratrias
familiares e
sociais
Educação
Fraternidades
Acadêmicas
Partido
Cargos e
funções antes
WWII
Cargos e
funções
durante WWII
 Kappa Alpha Order (1901)
 Democrata
 Serviu na França com Alto Comando, sob John Pershings
treinando soldados e planejando operações desenvolvidas
por eles.
 Após guerra e até 1924, manteve-se como auxiliar de
campo de Pershings.
 Entre 1924-1927, assume funções na China
 Voltando aos EUA, assumiu como instrutor em escolas do
exército, como o Colégio de Guerra de West Point,
 Em 1938 foi para o Alto Comando em Washington e no
ano seguinte, assumiu a chefia do Estado Maior.
 Chefe do Estado Maior, reordenou a estrutura do Exército
e Força Aérea em 1941.
 Administrou processo de moradia, suprimento e
distribuição de oito milhões de soldados durante 2ª.
Guerra.
 Compôs comitê que supervisionou estudos atômicos, com
cientistas americanos e britânicos.
 Apontou D. Eisenhower como Comandante Supremo dos
Aliados.
 Idealizou a Operação Overlord, que promoveu a invasão
da Normandia para libertar a França dos alemães.
 Participou das seguintes conferencias:
 Carta do Atlântico (1941-42)
 Casablanca (19430
 Quebec (1943)
 Cairo-Teerã (1943)
 Yalta (1945) e
 Potsdam (1945) .
 Em 1944 foi nomeado General de 5 estrelas.
 Democrata
 Durante I Guerra, alistou-se na Marinha e tornou-se
aviador naval, treinando com o Royal Flying Corps no
Canadá.
 1918: Washington no Escritório de Operações Navais,
para completar treinamento de vôo.
 Após a guerra, trabalhou como publicitário para o
Partido Democrático em Dutchess County, NY. Dentre
eles, Franklin D. Roosevelt.
 Voltou para a Read &Co. como sócio (1923), tornandose seu presidente em 1937.
 1940 – Publicitário da 1ª. campanha de Roosevelt em
Duchess, NY. Em junho, assume cargo de Assistente
Administrativo Especial para fazer ligação do presidente
com Depto Tesouro.
 Em agosto de 1940 - Sub-secretário de Guerra
(agosto/40) para empreitar e conduzir confecção de
materiais bélicos.
 Acompanhou Dean Acheson e Harry Hopkins a Londres
para negociar Lend Lease.
 Mobiliza com eficiência produção industrial para
guerra, quando trabalhou com McCloy, Bundy e Lovett..
 Abril de 1944: nomeado Secretário da Marinha após
morte de Frank Knox, fica responsável pela
desmobilização. .
 Com Henry Stimson, Secretário da Guerra e Joseph
Grew, sub-secretário de State , defendia menos pressão
sobre Japão nos primeiros meses de 1945, para
negociarem uma rendição
 Temia influencia do comunismo sociedades dizimadas
e desestabilizadas da Europa e da Ásia‖ e queria manter
a URSS fora da guerra com o Japão.
 Negociou paz unilateralmente com autoridades
japoneses, mas foi desautorizado por Truman.
91
 Em setembro 1946, como Secretário da Marinha: ajudou
James Byrnes a pressionar Roosevelt para demitir Henry
Wallace (Sec Comercio), quando este pede a pressão da
opinião pública para parar Guerra Fria.
Cargos e
funções
durante
Guerra Fria
 Aposentou-se como militar em 1945. Convidado a
representar Truman na China durante Rev Chinesa. Tentou
criar governo de coalizão entre comunistas e nacionalistas
e fracassou.
 Como Secretário de Estado em 1947, defende plano de
recuperação econômica européia (Plano Marshall) em
Harvard e pede adesão nacional.
 Contra o reconhecimento do estado de Israel, foi
dispensado. do cargo em 1949 e substituído por Dean
Acheson, mas no ano seguinte foi chamado como
Secretário da Defesa de Truman, mas renunciou ao cargo
por causa de disputas desgastantes com Senador Joseph
McCarhy relacionadas á Guerra da Coréia.
 Presidente Cruz Vermelha dos Estados Unidos
 1º. Secretário de Defesa (17/09/1947 a 28/03/1949) dos
EUA.
 Contrário à unificação do Serviço Militar, mas ajudou a
desenvolver o National Security Act de 1947 que criou o
National Military Establishment.
 Secretário do Depto de Defesa (1949) foi contrario ao
reconhecimento de Israel e propunha federalização da
Palestina.
 Gestão na Defesa: crise na Checoslováquia e na China,
Bloqueio de Berlin, invasão de Israel pelos árabes após
declaração de independência e início de negociações
para OTAN.
 Corte de orçamento para Serviços Militares e aumento
de rivalidades entre Marinha e Aeronáutica
 Ocupação comunista da Europa Oriental, ameaça
comunista na Grécia, Itália e França, eminente tomada
de poder na China e invasão da Coréia do Sul.
 Demitiu-se em março/1949 e deu baixa no Hospital
Naval de Bethesda com estafa, exaustão nervosa e
psíquica, além de depressão severa.
 Suicidou-se em maio/1949.
Choques
 Drew Pearson: jornalista liberal do Washington Post
que era contrario a qualquer política externa contra
URSS, acusa Forrestal de ter sonegado impostos na
Dillon, Read & Co.
 Acusado de ter ações de empresas alemãs e de ter
impedido bombardeio sobre várias cidades alemãs com
sua influencia sobre Alto Comando.
Parcerias,
Choques e
Honrarias
Choques

Truman: sobre Israel e substituição por Acheson
(1949).

McCarthy: Guerra da Coréia (1951)
Honrarias

Time Magazine Man of the Year(1944 e 1948).

Premio Nobel da Paz (1953) pelo Plano Marshall
Parcerias
 George Kennan (divulgação) do Longo Telegrama e
incentivo a escrever X
 Trabalhou com Nitze na Dillon, no Departamento da
Defesa e o encaminhou para Estado
 McCloy, Bundy e Lovett, para ampliar produção
industrial de guerra
 Maior divulgador do Longo Telegrama de Kennan e
incentivador de X
Honrarias
 Teve seu nome em um super porta-aviões.
Fontes: FORRESTAL DIARIES, 1951; MANUSCRIPT LIBRARY, PRINCETON UNIVERSITY; US DEFENSE DEPARTMENT; AKASHAH & TENNANT,
1908; ANDREW, 1996; ATKINSON, 1947; THE TIME MAGAZINE, 1949; CRAY, 1990; CURTISS, 1991; DILLON, READ &Co.; DOBSONn, 1986; DOWSON,
1959; GARDNER, 1970; HOOPED& BRINKLEY, 1992; HULEN, 1947; ISAACSON &THOMAS, 1986; BIOGRAPHY RESOURDE CENTER, 2009; KROCK,
1947; LAWRENCE, 1946; NATO; NAVY HISTORY; PATERSON, 1975, 1988; PEARSON, 1949; RESTON, 1947; ROGOW, 1963; SHAH & TENNENT, 1960;
TANNENHAUS; 2003; TASK, 1985; TRUMAN LIBRARY;
A análise do Quadro IV permite observar que George Marshall (1880) e James Forrestal
(1892) também vieram de lares muito diferentes, mas suas trajetórias estavam intimamente
ligadas com as funções que exerceram durante a Primeira e Segunda Guerra Mundial.
Marshall era o segundo filho de uma família tradicional da Virgínia, cuja situação financeira
era estável; Forrestal era filho caçula de imigrante irlandeses, cujo pai havia chegado aos
Estados Unidos em 1857 como trabalhador braçal.
92
Marshall passou a interessar-se pela carreira militar quando cursou o Virginia Military
Institute (VMI) onde, após graduar-se, prestou exames para ser oficial do exército. A carreira
militar de Forrestal só teve início em 1917, quando se alistou na Marinha como aviador e,
apesar de ter passado o último ano da guerra em Washington, fazendo trabalho administrativo
no Escritório de Operações Navais enquanto completava seus treinamentos, atingiu a patente
de sub-tenente. Marshall, por outro lado, atuou durante a Primeira Guerra no Alto Comando
sob ordens o General John Pershings, treinando soldados e ajudando seus oficiais a criar
estratégias de ação.
Durante a década de 1920, Marshall manteve-se em funções militares, primeiro na China e
depois, como instrutor em escolas do Exército, como West Point até 1938, quando foi
chamado de volta ao Alto Comando em Washington, assim que começaram a ser dados os
primeiros sinais de que uma guerra estava sendo preparada na Europa.
No mesmo período, Forrestal deu baixa no exército e retornou à iniciativa privada após um
curto período em que trabalhou para os candidatos democratas durante as eleições de 1920.
Nessa época, um dos senadores que ele ajudou a eleger foi Franklin D. Roosevelt.
Em 1923, associou-se à Dillon, Read Co106, onde iria fazer fortuna e ganhar nome no
mercado, partilhando muitos casos em comum com a Brown Brothers & Harriman de Lovett
e Harriman, com a Cravath de John McCloy e com a Covington & Burlington de Dean
Acheson.
Em 1938, após uma carreira eficiente como operador no mercado, sucedeu
Clarence Dillon como presidente da Dillon Read e chegou ao topo, mas dois anos depois,
abandonou a carreira em Wall Street para assumir o cargo de Sub-Secretário da Marinha na
administração Roosevelt. Juntamente com Frank Knox (Marinha) e Henry Stimson (Guerra)
empenhou-se em conta da tarefa colossal de lidar com as contratações de armamentos e de
homens, com logística e com a expansão do Departamento da Marinha.
A mobilização da produção industrial para a guerra vinculou seu trabalho ao de McCloy e
Lovett, bem como com o de Marshall que, nomeado chefe do Estado Maior na Europa, tinha a
tarefa de reordenar a estrutura do Exército e da Força Aérea em 1941 107.
106
A Dillon, Read & Co foi um Banco de Investimento norte-americano que se manteve proeminente no
mercado desde os anos 1920 até os anos 1960. Lidava principalmente com empresas multinacionais e atuava
em Wall Street. DILLON, READ & CO Disponível em http://www.dillonread.com/ . Acesso em 10/10/2010.
107
Seria interessante lembrar que durante a Primeira Guerra, o Presidente Roosevelt atuara na posição ocupada
por Forrestal e que sempre demonstrara evidente preferencia por essa pasta de seu Gabinete. James Forrestal
93
Durante a Segunda Guerra George Marshall administrou a logística relacionada à moradia,
suprimentos e distribuição de oito milhões de soldados nas frentes européias e asiáticas, além
de compor o comitê que supervisionava os trabalhos do Projeto Manhattan e que idealizara a
Operação Overlord, que promoveria a invasão da Normandia em 1944. Como representante
do Estado Maior do Exército e conselheiro militar da confiança do presidente, juntamente
com Forrestal, Acheson e Bohlen, Marshall participou dos encontros entre Roosevelt e
Churchill ou Stalin na assinatura da Carta do Atlântico (1941-42) e nas Conferências de
Casablanca (1943), Quebec (1943), Cairo-Teerã (1943), Yalta (1945) e Potsdam (1945).
Após a guerra, Marshall deu baixa definitiva no Exército, mas por sua experiência em postos
militares no Oriente, foi convidado por Truman para representá-lo na China durante a
Revolução Popular e tentar formar um governo de coalização ente os comunistas e
nacionalistas. Apesar de ter fracassado nesse intento, o capital simbólico que acumulara
durante a guerra lhe serviu em 1947, quando foi novamente chamado para o governo, para
assumir a pasta de Secretário de Estado, substituindo James Byrnes. Em sua gestão, foram
colocadas em prática grande parte das propostas de Kennan relacionadas à Doutrina da
Contenção; dentre elas, principalmente, o plano de recuperação das economias européias que
ficaria conhecido como o Plano Marshall.
Em 1948, quando juntamente com toda a equipe técnica de seu Departamento, Marshall
identificou o reconhecimento de Israel como um grande problema em longo prazo para os
Estados Unidos e posicionou-se contra a vontade do Presidente, este, pressionado por eleições
e por forte ataque da imprensa contra sua política ―
soft‖ em relação ao comunismo ,
reconheceu a nova nação e dispensou seu Secretário do cargo, substituindo-o por Dean
Acheson.
Nesse ínterim, como primeiro Secretário da Defesa dos Estados Unidos - em consequência da
unificação dos Departamentos da Guerra e da Marinha, Forrestal se empenhava em divulgar o
Longo Telegrama pelos quatro cantos de seu país, em preparar a Doutrina Truman (National
Security Act de 1947) e a criar a CIA , com o apoio do PPS de Kennan e de outros órgãos do
Gabinete Truman, como os coordenados por Lovett, McCloy e Henderson.
atuou com tal eficiência no cargo que, em 1944, por ocasião da morte de James Fox, Secretário da Marinha,
foi promovido a titular.
94
Forrestal, como Marshall, também foi contra o reconhecimento do Estado de Israel e, em sua
gestão na Defesa, teve que enfrentar crises com os russos na Checoslováquia e na China, o
Bloqueio de Berlim, a invasão de Israel pelos árabes após a declaração de independência, a
ameaça comunista na Grécia, Itália e França, a invasão da Coréia do Sul e o início das
negociações para a criação da OTAN. Com a imprensa liberal batendo pesadamente contra
ele, acusando-o, como a Marshall de não estar lidando adequadamente contra os comunistas e
de ter sonegado impostos na Dillon, Read & Co, ele implodiu: em março de 1949, demitiu-se
do cargo e deu baixa no Hospital Naval de Bethseda com estafa, exaustão nervosa e psíquica,
além de severa depressão. Poucos meses depois, suicidou-se.
Em 1950, Marshall foi mais uma vez chamado governo, desta vez a pasta da Defesa, mas seu
mandato teve curta duração: renunciou no ano seguinte desgastado por intensos ataques da
imprensa e por disputas desgastantes que teve q
ue enfrentar, juntamente com o Secretário
de Estado Dean Acheson, contra o Senador Joseph McCarthy e com o próprio Presidente,
relacionadas às suas posições em relação à Guerra da Coréia.
Em suma, as trajetórias tratadas nos quatro Quadros demonstram que o cenário em 1950 era
novamente de transição entre as eminências pardas do poder. Marshall afastado, Forrestal
morto e Kennan, igualmente, afastado. Acheson, McCloy e Lovett – mais flexíveis ou com
maior capital social para enfrentar as críticas do Senado e da imprensa, ainda se sustentaram
em seus cargos por mais dois anos, até o fim do mandato de Truman e só retornaram à vida
privada em 1952.
Um ciclo se fechara. Entre 1947 e 1950, a temperatura no cenário internacional e o choque de
vontades entre União Soviética e Estados Unidos subira a tal ponto que, para não explodir
em uma nova guerra de enormes proporções,
as forças governamentais acionaram as
engrenagens da Guerra Fria. O processo que Kennan delineara em seu Longo Telegrama
deslanchara, mas gradualmente tomara proporções que haviam saído de seu controle.
Com a queda de prestígio do grupo progressista moderado que ascendera ao Departamento de
Estado com Truman em 1945, uma facção mais radical e militarista, liderada por Dean Rusk,
Paul Nitze e Foster Dulles os substituiu.
Harriman, um camaleão político, manteve-se ativo no governo. Em 1951 – em nome do
governo mas também defendendo os interesses da Brown Bros Harriman – foi enviado com
Loy Henderson a Teerã para tentar solucionar com o Irã a nacionalização da Anglo Iranian
Oil Company. Em 1954, dando continuidade à suas estratégia de reconversão, desvinculou-se
95
do grupo de servidores de confiança e passou-se para o lado dos servidores eleitos, assumindo
o cargo de governador de Nova York. Harriman estava de olho na Presidência, mas nas
primárias do Partido Democrata em 1952 e 1956, foi preterido por Adlai Stenvenson por ser
considerado muito à esquerda por seus correligionários.
Em 1961, enquanto servia ao Presidente Kennedy como Embaixador no Laos – em plena
guerra do Vietnam – Harriman foi acusado de ser agente soviético, mas recebeu amplo
respaldo da CIA para contestar seus detratores. Entre 1963-65, atuou como Sub-Secretário de
Estado para Assuntos Políticos até ser novamente enviado para o Laos, em 1965, para
negociar a Paz de Paris.
De maneira geral, no entanto, o que se pode observar, antes, durante e principalmente após a
Segunda Guerra, é que as trajetórias desses servidores nomeados estiveram em constante
cruzamento nas altas esferas do campo político, como se pertencessem à uma mesma ―
panela‖
ou ―
igrejinha‖ e que, durante o período em que mantiveram as rédeas do poder, formaram um
grupo coeso no propósito de reestruturar todas as práticas econômicas, sociais e políticas
relacionadas à política externa de seu país.
A ―
igrejinha‖ tinha origem no fato de terem cursado as mesmas universidades de elite
(Harvard, Yale e Princeton) e de suas trajetórias terem sido definitivamente interligadas
durante a Segunda Guerra: Harriman, com Forrestal, Lovett e McCloy por causa das ações
conjuntas que, como Enviado Especial do Presidente, tinha que realizar com o Departamento
da Guerra e da Marinha; Harriman com Bohlen e Acheson, por causa das medidas adotadas
departamento de Estado em relação a refugiados e às forças da Resistencia e da OSS;
Harriman com Kennan, por ser seu Chargé d`Affairs na Embaixada em Moscou; Harriman
com Marshall, por ter sido o contato de Roosevelt com Churchill e ter intermediado a invasão
da Normandia com os ingleses.
Ou seja, Harriman seria uma espécie de força catalisadora cuja ação diplomática, militar e
econômica, agregava toda a força produtiva dos demais em torno do Presidente. Kennan seria
a força intelectual que teria elaborado o convencimento ideológico de que necessitavam para
colocar em prática um projeto internacionalista focado no papel a ser exercido pelos Estados
Unidos na ordem internacional que se formaria após a Segunda Guerra.
Eventualmente, foi por isso que em sua auto-biografia, sem falsa humildade, Dean Acheson
se declarou, juntamente com os demais membros de sua clique, presente à ―
criação‖ de uma
nova era.
96
3. O mercado de capitais simbólicos no governo Truman
Durante a era Roosevelt e mesmo nos primeiros meses após o fim da Segunda Guerra,
observou-se que grande parte dos americanos - nas ruas ou nos corredores do poder - ainda
sentia uma espécie de fascínio assombrado com a emergência da União Soviética como
potência mundial, acreditando na possibilidade de uma parceria construtiva e pacífica a partir
dos escombros da guerra.
Enquanto a maioria só desejava retornar à normalidade da vida civil, a análise dos Quadros
dispostos no capítulo 3 evidencia que havia uma pequena facção de elite política do país que
não tinha a menor intenção de retornar ao contexto internacional anterior à guerra e que
decidira tomar
para si
o que consideravam uma
―
missão‖ patriótica:
consolidar a
hegemonia dos Estados Unidos e ―
criar‖ um mundo mais livre e democrático, moldado nos
valores e crenças capitalistas. Ao desfraldar a bandeira da liberdade por todo o mundo
civilizado, esses ―
escolhidos‖ do destino pretendiam reafirmar e consolidar o que Henry
Luce108 descrevera em 1941, em editorial da Time Magazine, como o ―
Século Americano‖.
Os ―
escolhidos‖ faziam parte de uma facção importante do Establishment norte-americano do
pós-guerra. Os trunfos que acumularam ao longo quatro décadas, por meio de capitais sociais,
econômicos, políticos e profissionais, lhes condicionou a trajetória e facilitou o acesso à
carreira política e às posições dominantes nas frações dirigentes durante a Guerra Fria.
Valorizavam, pragmática e objetivamente, a visão de mundo internacionalista e o realismo
108
Henry Luce graduou-se em 1920 em Yale, onde tornou-se membro da fraternidade Alpha Delta Phi e em seu
último ano, da sociedade secreta Skull & Bones (Esqueleto e Ossos). Foi editor assistente de Briton Hadden,
editor chefe do Yale Daily News, com quem faria uma parceria frutífera na fundação da Times Magazine em
1922, idealizada por eles quando ainda eram parceiros na Skulls and Bones. Em meados de 1960, a Time Inc.
já era a maior e mais conhecida editora de revistas do mundo, consistindo de vários títulos além da Times
Magazine, como a Fortune e a Life Illustrated (1936) , a House & Home (1952), a Sports Illustrated (1954) e
a The March of Time. Durante sua vida, Luce apoiou financeiramente vários programas como o Save the
Children Federation, o Metropolitan Museum of Art e a United Service to China, Inc. Anti-comunista
convicto, Luce era membro influente do Partido Republicano e teve um papel importante no chamado China
Lobby, quando utilizou sua força editorial para influenciar a política externa norte-americana, insuflando os
sentimentos populares em favor da luta do líder nacionalista Chiang Kai-shek e sua esposa Soong Me-ling,
contra os japoneses. Em 1941, desejoso de tornar-se secretário de Estado em uma administração Republicana,
Luce escreveu um editorial (LUCE, H. R: "The American Century" reimpresso em The Ambiguous Legacy,
M. J. Hogan, ed. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 1999.), no qual definia o papel da política
externa norte-americana para o restante do século XX e eventualmente, para além dele. No artigo, ele exigia
que os Estados Unidos trocassem o isolacionismo praticado até então ―
por um papel missionário, de Bom
Samaritano do mundo, com a finalidade de espalhar a democracia entre todos os povos‖. De acordo com
David Harvey (in The New Imperialism, New York: Oxford University Press, 2003, p.50.) ele acreditava que
o poder de uma grande potencia deveria ser global e universal, muito mais do que especificamente territorial e
portanto, para definir o papel dos Estados Unidos no cenário internacional, preferia usar o termo Século
Americano,
ao invés de Império Americano. In Henry Luce Foundation. Disponível em
http://www.hluce.org/history.aspx. Acesso em 07/03/2011.
97
político. Engajados na luta comum contra o isolacionismo, eles perceberam que a adesão da
opinião pública e de seus próprios pares ao seu projeto de poder seria mais facilmente
conquistada, se o fizessem sob o argumento de coibir a expansão de um adversário externo
que ameaçasse a segurança nacional - no caso, a União Soviética e o comunismo.
As variações de rumo na trajetória desses diplomatas ou militares, por outro lado, foram
consequência das mudanças ocorridas na transição da administração Roosevelt para a
administração Truman, além da emergência da União Soviética como potencia hegemônica na
arena internacional. Ou seja, o acesso a posições políticas dominantes aparece nos Quadros,
de certa forma, como produto de uma estratégia de reconversão que os ―
retirou‖ da vida
privada para atuarem ao lado de Truman e os atraiu para os centros de poder, num
conveniente ―
chamado‖ da nação para defendê-la de ideologias contrárias109.
O êxito e a permanência maior, ou menor, de cada um desses agentes no campo do poder
foram determinados principalmente pelo grau de relações profissionais e pessoais mantidas
entre eles e os dois presidentes em exercício e, em menor escala, com o Congresso, imprensa
e grande massa.
109 Em suas memórias, Dean Acheson narra que em 8/8/45, decidido a retornar à pratica privada da advocacia e
considerando-se liberado de seus deveres patrióticos com o fim da Segunda Guerra, apresentou sua demissão
de Secretário Assistente ao Secretário de Estado James Byrnes, aceita no dia seguinte, conforme documentos
que ele transcreve nas paginas 114 e 115 da obra acima referida. No mês seguinte, no entanto, foi chamado de
volta a Washington para assumir o cargo de Sub-Secretário, que aceita após alguma hesitação, mas fortemente
influenciado pelo mesmo ―
espírito patriótico‖ que já o fizera abandonar a prática privada anteriormente. É ele
também quem narra, (Pgs. 140-148) que o General George Marshall, Comandante em Chefe que havia
solicitado baixa do serviço e aposentadoria após o fim da Segunda Guerra , aceitou por ―
dever patriótico‖ ser
enviado à China em novembro de 1945 como emissário especial de Truman para resolver a questão comunista
e posteriormente, (pg192-193) em setembro de 1946, assumiu o cargo de Secretário de Estado que havia sido
deixado vago por James Byrnes. Esse ―
chamado‖ era mais facilmente identificado entre os servidores de
confiança do Presidente e entre os militaristas, pois todos – sem exceção – tinham uma carreira civil bem
sucedida e poderiam retornar a ela quando bem entendessem, como efetivamente retornaram. De acordo com
Wright Mills, de modo geral, os membros da elite do poder nos Estados Unidos tendiam, convencionalmente,
a negar que fossem poderosos. Segundo ele, nenhum americano se candidatava a cargos públicos para
dominar ou mesmo para governar, mas apenas para ―
servir‖. Não se tornavam simplesmente burocratas ou
funcionários, mas ―
servidores públicos‖, pois na democracia americana, são impotentes enquanto partido ou
círculo: só o povo seria ―
onipotente‖. No entanto, quando falam do poder do partido ou círculo do
adversário, atribuem-lhe onipotência – e o povo é enganado. O argumento de Wright Mills explica,
parcialmente, o desdém de Harriman, Acheson ou mesmo de Kennan, enquanto chefiava o PPS, em relação à
opinião pública. Ocupantes nomeados de seus cargos, não dependiam do voto popular para se manter nele,
mas Roosevelt ou Truman não podiam dar-se a tal luxo se quisessem permanecer no poder. Como os cargos
de Harriman, Acheson, McCloy, Lovett, Marshall e Forrestal eram da confiança do governante e portanto,
―
movíveis‖, todos eles retornaram à vida privada ao final do governo Truman. Após se desligarem da Casa
Branca, Harriman e Lovett, reassumiram seus postos na Brown Brothers; McCloy, na Milbank, Tweed,
Hadley & McCloy. Acheson também retornou à iniciativa privada em 1953. Forrestal, apesar de ser presidente
da Read & Co, suicidou-se em 1949 após deixar o cargo. Marshall assumiu a presidência da Cruz Vermelha.
ACHESON, Op.cit. 1987 ; MILLS, Op. cit. 1962, p. 30.
98
Por defenderem um projeto de relações externas objetivo e direcionado para a contenção da
expansão soviética, suas trajetórias políticas e grau de influência se alteravam na mesma
proporção em que, politicamente, mudassem ou se radicalizassem as relações com a União
Soviética - ou de acordo com sua adequação, ou não, às consequências advindas das novas
diretrizes.
O mecanismo que dava acesso ao campo dependia da capacidade de cada agente utilizar de
forma adequada o capital de prestígio de que dispunha, acionando a seu favor relações sociais
de honorabilidade110 ou de conhecimento. Dentre os pesquisados, o presidente F. D.
Roosevelt, William A. Harriman, Robert Lovett, Dean Acheson, Charles Bohlen e George
Marshall utilizaram seu capital de honorabilidade como estratégia de acesso e manutenção de
poder; George Kennan, John McCloy e James Forrestal o fizeram com seu capital de
conhecimento.
Tomando George Kennan e Charles Bohlen por exemplo, observa-se que experimentaram a
proximidade com o poder soviético durante o período que serviram na embaixada americana
em Moscou, na década de 1930. A partir dessa experiência comum, eles formaram uma
opinião técnica bem definida de como os Estados Unidos deveriam se relacionar com os
russos. Posteriormente, em meados dos anos 1940, uma nova convivência na embaixada de
Moscou entre Kennan e Harriman alteraria a visão do mundo soviético do embaixador, que
por sua vez, no decorrer na 2ª. Guerra, atrairia Lovett,
McCloy, Acheson e outros a
Washington, para formarem a equipe de internacionalistas que atuaria com Truman nos
primeiros momentos do pós guerra.
É difícil discutir a extensão do papel individual de cada um desses agentes no fluxo da
História, mas uma coisa é certa: por intermédio das relações de poder que mantiveram no
campo da política - e enquanto as sustentaram - eles tanto direcionaram as relações
internacionais para o lado que melhor lhes aprouvera, quanto atraíram para sua ideologia
internacionalista ―
universal‖ o maior número possível de adeptos.
Em suas memórias, todos apresentaram ao mundo uma versão própria dos eventos de que
participaram111 e, ao retratarem o período com suas próprias cores, visavam oferecer à
110 As relações de honorabilidade aqui descritas são as referentes ao capital social da família, somado a outros
capitais simbólicos, como a educação, a escolha dos cursos superiores, o casamento, etc. MICELI, Op.cit,
2001.
111Na elaboração de suas memórias, esses internacionalistas se comportaram, aliás, com a discrição
característica de seu grupo de status. Para Bourdieu, comparativamente às classes sociais, os grupos de status
99
sociedade uma melhor dimensão dos papéis que desempenharam individualmente na
configuração de uma nova ordem internacional.
Os eventos desencadeados em consequência de ações individuais dos pesquisados e a análise
das trajetórias de cada um deles permitiu, portanto, constatar como sua intersecção no campo
político, suas atuações e predileções individuais contribuíram para a inspiração de uma nova
política externa para os Estados Unidos 112.
George Kennan era oriundo de uma classe média distinta e razoavelmente letrada, mas
totalmente desprovido de recursos financeiros ou de capitais sociais consistentes. Quando por
concurso público ele assumiu um cargo na burocracia do Estado, sua trajetória de ascensão
hierárquica foi pouco significativa, apesar de sempre ter demonstrado competência
comprovada.
Em 1946, no entanto, ele foi subitamente catapultado para o topo e convocado a Washington
para colocar em prática as propostas que delineara no Longo Telegrama. Sua aguda percepção
analítica em relação aos soviéticos, no entanto, não foi suficiente para que compreendesse os
interesses que moviam seus próprios conterrâneo, nem permitiu que percebesse que sua
posição no Gabinete de Planejamento Político, frágil e dependente de instancias superiores,
sustentava-se na disposição – que ele não tinha - de continuar ofertando ao grupo que o
adotara uma produção simbólica compatível com os interesses dominantes.
Como já se observou em outras passagens, Kennan tinha certa dificuldade em cumprir
fielmente os cânones da burocracia, com tendência a contestá-los. Quando percebeu que a
Doutrina da Contenção estava se desviando dos rumos que idealizara, tornando-se mais
se definem menos por um ter do que por um ser, perseguindo a distinção com uma espécie de arte. Weber, por
sua vez, afirma que os grupos de status cristalizam seus princípios em tipos específicos de estilo de vida. As
diferenças mais significativas entre cada grupo de status, podem ser encontradas em distinções significantes diferenciando simbolicamente a posição de cada agente na estrutura social - como por exemplo, na maneira de
vestir-se, na linguagem, na pronúncia e mesmo, na maneira de comportar-se em sociedade, seja em gestos
pertinentes ao convívio social, seja na própria maneira de atuar ética e moralmente em relação aos demais
grupos. As maneiras, o bom gosto e a cultura dos atores de grupo de status mais elevados têm a finalidade de
distingui-los dos grupos que se posicionam abaixo de si, permitindo-lhes demonstrar uma natureza mais
cultivada. Por esse motivo, aliás, Weber afirma que os grupos de status apresentam convenções próprias,
específicas, que marca a todos como uma regra comum. No caso da elite do poder em questão, eles
procuravam distinguir-se dos demais grupos sociais por meio de um discurso voltado à ―
missão‖ de levar a
democracia, a liberdade, o capitalismo, ou valores quejandos, ao restante do mundo, protegendo os povos
oprimidos e defendendo sua nação contra quem não os adotasse. BOURDIEU, Pierre. Distinção: uma crítica
social do julgamento do gosto. Cambridge: Harvard University Press, 1984 e SILVA, Augusto Santos, Entre
a razão e o sentido, Durkheim, Weber e a Teoria das Ciências Sociais. Porto, Afrontamento, 1988.
112 Que fique bem claro, neste ponto, que o que se discute nos exemplos acima não é o ―
se‖ da História, mas
―
como‖ a ação desses agentes efetivamente deu outra configuração aos fatos.
100
militarista, passou a clamar independência intelectual e manifestar-se contrário a alguns de
seus desdobramentos, insistindo obstinadamente que o Departamento de Estado deveria se
manter na linha moderada e institucional nas relações com os soviéticos. Pregava uma guerra
política e abominava a idéia de um confronto direto113.
Sua insistência em perseguir objetivos mais institucionais e menos militaristas começou a
incomodar um grupo de republicanos adeptos de uma linha mais incisiva e ao próprio
Presidente, pois a opinião pública, devidamente inflamada contra o socialismo soviético, além
de cobrar governantes atitudes mais enérgicas, certamente se horrorizaria com a idéia de criar
estratégias secretas para dissolver grupos comunistas ao redor do mundo.
Percebendo que Kennan e seu grupo estavam perdendo influencia, os militaristas entreviram a
oportunidade de neutralizar os contencionistas moderados do campo e ocupar sua posição.
Detentor de uma visão pessimista e desencantada em relação ao mundo político e aos
mecanismos democráticos que movimentavam Washington, Kennan resistia obstinadamente
em render-se ás características próprias da hierarquia funcional
e insistia em desprezar
convenções burocráticas corriqueiras114.
Essa inabilidade política, além de lhe render conflitos de ordem prática e operacional no
interior do Departamento, também se manifestou em outras áreas115 e seu comportamento
independente e rebelde numa instituição que exigia respeito e obediência hierárquica, só
poderia desestabilizar ainda mais a posição que ocupava no grupo. Em pouco menos de dois
anos, sua trajetória de ascensão no campo se invertera:
de reverenciado e respeitado, ele
113 O Gabinete de Planejamento Político chefiado por George Kennan aprovou um documento intitulado The
inauguration of organizational political warfare, no qual era proposto um programa ―
de apoio a comitês de
liberação‖, ―
atividades underground atrás da Cortina de Ferro‖ e ―
apoio a grupos anti-comunistas em países
ameaçados do mundo livre‖. Nele, Kennan procurou enfatizar o aspecto psicológico e político que estava
sendo dado ao confronto com a União Soviética, justificando sua necessidade a partir das doutrinas de
Clausewitz. As operações de guerra política deveriam ser abertas ou encobertas, variando entre ações abertas,
como alianças políticas e medidas econômicas como o Plano Marshall e operações encobertas, como
propaganda ―
branca‖ de apoio a estrangeiros amigáveis e guerra psicológica ou encorajamento a resistência
underground em países hostis. O projeto foi apresentado por Kennan ao NSC em 05/05/1948. NARA, RG
773 NSC 10/2
114 O desdém intelectual e a intransigência racional que reservava às grandes massas, a outros membros
dirigentes da Administração Truman e à maioria dos representantes no Congresso, chegaram a render-lhe o
epíteto de totalitário e se consagraram em sua absoluta incapacidade de adotar a flexibilidade política da
maioria de seus parceiros no campo. Kennan era um crítico feroz do parlamentarismo e da democracia,
abominando a inclinação dos líderes norte-americanos a ignorar ou se desfazer de fatos ou problemas que
perturbassem a opinião pública ou os sentimentos populares. In LUCAKS, Op.cit, 2007, p.33 e 37-38.
115 Como quando Kennan manifestou sua contrariedade ao Presidente Truman pelo reconhecimento do Estado
de Israel e nos embates que manteve com os Secretários Dean Acheson e Foster Dulles - que resultaram em
seu pedido de demissão do Serviço Externo. LUKACS, Op. cit. 2007, p. 110
101
passou a ser negligenciado e ignorado até que, agastado por não ter mais voz, ele solicitasse o
afastamento oficial de seu cargo.
O contexto conjuntural que favorecera sua ascensão em 1946 e 1947 desaparecera. James
Forrestal, que desde o primeiro momento em que pusera os olhos no Longo Telegrama, lhe
dera o apoio integral do Departamento da Defesa, morrera em maio de 1949. George
Marshall, Secretário de Estado que havia lhe dado carta branca para criar o Gabinete de
Planejamento Político, corroborara todas as suas ações relativas ao plano de Recuperação
Européia (plano Marshall) e à criação da CIA e fora ouvinte atento de seus conselhos, havia
sido substituído por Dean Acheson e posteriormente, por John Foster Dulles, com quem ele
não comungava a mesma visão de mundo. A China havia se tornado comunista, apesar de
todas as ações contencionistas do Departamento de Estado. A dominação soviética se fechara
em torno do Leste Europeu. O Estado de Israel fora reconhecido pelos Estados Unidos, apesar
de todo o aconselhamento contrário dos oficiais do Departamento de Estado ao Presidente. Os
russos também já tinham construído sua bomba atômica. Mais do que nunca, a ―
guerra
política‖ criada, organizada e orquestrada pelo Gabinete de Planejamento Político de Kennan
permitia que a CIA e indiretamente, os Estados Unidos, tivessem acesso direto a todos os
grandes eventos políticos do mundo. Desencadeado o processo e colocado em andamento para
atender às demandas da opinião pública, ele deixara de ser necessário. A Guerra Fria não era
mais uma possibilidade, um projeto disperso e fragmentado nas mãos de um pequeno grupo
que se acercara do poder para fazer prevalecer as suas crenças no cenário externo: tornara-se
um rebento concreto e ameaçador e saíra do controle de seus criadores.
Ou seja, em fins da década de 1940, disputas com outros agentes do departamento de Estado
ou exigências de outras facções contendoras do campo provocaram o declínio da influência
do grupo e os que ocupavam postos no centro do poder se sentiram ameaçados de perder
posição no campo dominante. Muitos mudaram de estratégia e reconverteram o processo,
alinhando-se às novas correntes mais radicais do grupo e cedendo às novas tendências nas
relações entre americanos e soviéticos. Kennan não se deu a esse trabalho.
Quando pressentiu que deixara de ser útil ao grupo que o catapultara ao poder em 1949, se lhe
fosse importante a permanecer no campo, ele poderia ter-se realinhado à proposta de um
militarismo mais agressivo como o proposto por Nitze (NSC-68), quando a opinião pública e
os militares pressionaram o Departamento de Estado e o Gabinete de Planejamento
Estratégico por ações mais radicais contra os soviéticos. No entanto, desgostoso com os
rumos que sua Doutrina de Contenção estava tomando e após receber de Robert Oppenheimer
102
um convite para exercer funções acadêmicas em Princeton - que lhe supririam necessidades
materiais e simbólicas – ele preferiu manter-se firme em seu ponto de vista moderado e não
militarista e abandonou qualquer estratégia de reversão.
Outros agentes, ocupando posições em falso por terem dilapidado parte de seu capital social
em conflitos com outros atores emergentes na arena do campo, como Dean Acheson ou
George Marshall
- nas questões da Revolução Chinesa 116 contra McCarthy e no
reconhecimento de Israel, contra outros agentes próximos ao poder, como Harry Clifford e
Dean Rusk - sabiam que ainda poderiam contar com algum capital social disponível.
Para eles, a única possibilidade de reconversão ao campo, ou de evitar que se sujeitassem a
rebaixamentos ainda maiores, dependia do uso adequado do capital social que haviam
poupado e de outras conjunturas estratégicas pregressas, como a garantia de sobrevivência
material por empreendimentos que já haviam desenvolvido antes de serem convocados ao
governo, além de seus vínculos universitários, de casamento, de alinhamento ao partido
dominante, ou de relações profissionais. Marshall passou a presidir a Cruz Vermelha
Internacional117 por exemplo, e Dean Acheson, apesar de ter retornado à pratica privada,
manteve-se em permanente contato com a Casa Branca, servindo de conselheiro a todos os
presidentes que sucederam Truman, até sua morte.
Os vínculos criados durante a Guerra em atividades militares, de inteligência ou diplomacia –
muitas delas intimamente relacionadas entre si - também tiveram papel dominante na
trajetória de cada um.
Cada vez que um novo governante dos Estados Unidos - Roosevelt (1933-1945), Truman
(1945 – 1952) e posteriormente, Eisenhower (1953 -1961) - descendia ou ascendia ao poder,
116 Durante o verão de 1949 o Departamento de Estado, chefiado por Dean Acheson, produziu um estudo sobre
as relações recentes entre Estados Unidos e China. O documento, chamado de Relatório Branco, tentava
desfazer qualquer interpretação incorreta das relações diplomáticas sino-americanas e, publicado no calor da
ascensão de Mao Zedong ao poder, tentava demonstrar que a intervenção dos Estados Unidos na China estava
destinada ao fracasso. Apesar da expectativa de Acheson e Truman de que o estudo pudesse desfazer rumores
e conjecturas levantados por congressistas e populares que apoiavam o Senador McCarthy, na verdade, seu
papel foi o de ajudar a convencer os críticos de que a administração havia realmente falhado por não terem
diagnosticado com maior antecedência a disseminação do comunismo na China. GARSON, Robert, The
United States and China since 1949. Madison: Fairleight Dickinson University Press, 1994 pp. 27–33.
117A Cruz Vermelha Internacional é uma organização humanitária que foi fundada em 1863 para assistir
militares feridos, Em 1864, após a realização da Convenção e Genebra, para melhorar as condições de amparo
aos feridos e a Convenção de Haia em 1899 disciplinando as ―
normas‖ de guerras terrestre e marítimas, a
assistência aos prisioneiros de guerra teve grande avanço. Atualmente, ela também atende a civis em
situações de guerra e em nações que violam os Estatutos dos Direitos Humanos, bem como a vítimas de
desastres naturais em nações com carência de recursos próprios para assistir às vítimas. In Red Cross
International. Disponível em http://www.icrc.org/eng/who-we-are/history/index.jsp. Acesso em 07/03/2011.
103
observa-se que a fração dominante à sua volta evoluía no mesmo sentido, desaparecendo ou
emergindo na arena política para desocupar ou ocupar as novas posições criadas com a
expansão do mercado de postos administrativos, políticos e culturais vinculados à nova ordem
bipolar delineada no pós-guerra.
Para os agentes deste estudo, a rentabilidade do capital simbólico que haviam acumulado ao
longo de suas trajetórias dependia, no limite, das exigências do trabalho de dominação legal118
e dos fatores externos à lógica do funcionamento desse capital119. Esses fatores foram
determinantes para que, como internacionalistas,
eles se encaixassem nos postos que
estavam sendo abertos e cujo acesso, até então, estivera sob o controle de agentes das linhas
políticas com visão de mundo diferente (idealista e isolacionista) da que começava a
predominar.
O capital das relações entre eles, facilitando o acesso às posições dominantes, se manifestou
de formas diferentes em termos de valor. Em alguns casos, foram consequência de posição na
fratria social (Harriman e Lovett), em outros, de relações com o partido (Roosevelt, Truman,
Forrestal e Acheson), de vínculos com fratrias universitárias (Roosevelt, Harriman, Lovett e
Acheson), de relacionamentos profissionais em Wall Street (Harriman, Lovett, Forrestal e
McCloy), de funções em escritórios de advocacia que atendiam ao governo ou às grandes
empresas (McCloy e Lovett),
de cargos militares, administrativos ou de inteligência
ocupados durante a 2ª. Guerra (Truman, Lovett, McCloy, Marshall e Forrestal),de relações
profissionais na diplomacia (Kennan e Bohlen) e até mesmo do cruzamento de vários desses
capitais .
Quando George Kennan e os demais servidores que comungavam com sua visão sobre a
União Soviética se tornaram desnecessários, foram gradualmente afastados do centro do
poder e viram-se passando o bastão – involuntariamente – para que outros servidores, com
118 De acordo com WEBER, essa dominação se assenta em uma verdadeira constelação de interesses ou de
monopólios econômicos e se estabelece a partir da autoridade legal, qual seja, do poder de dar ordens a
pessoas em virtude de um estatuto sancionado e de uma burocracia fundada em hierarquia funcional, de
profissionalismo, de atribuição de funções. A obediência se presta não à pessoa, em virtude de direito próprio,
mas à regra, que se conhece competente para designar a quem e em que extensão se há de obedecer. Weber
classifica este tipo de dominação como sendo estável, uma vez que é baseada em normas estatutárias,
assegurando legalmente o poder de autoridade. WEBER, Op.cit. 2005.
119 Como por exemplo, situações de política externa em que esses oficiais fossem exigidos, como o confronto
com a União Soviética, as necessidades da descolonização de Ásia e África, as cobranças internacionais por
causa de divisão da Alemanha, a criação de organizações de caráter supra-nacional para exercer domínio
indireto sobre as demais nações e as mudanças na ética de governança com o início das operações ―
políticas‖
desenvolvidas pela CIA no ambiente internacional.
104
posturas bem mais radicais em relação aos soviéticos120, continuassem assessorando os
interesses de um governo que se tornava cada vez mais militarista.
O imenso capital social que Kennan acumulara durante sua estadia no Departamento de
Estado não se esvaíra na mesma proporção que seu poder, mesmo porque seu capital de
conhecimento continuava intacto, ou melhor, estava ainda mais fortalecido pela intima
convivência com o poder e pela oportunidade de ver, aplicadas, várias de suas produções
simbólicas. Portanto, ele ainda tinha recursos importantes para negociar no mercado
simbólico, seja pelos postos prestigiosos e influentes que ocupara na hierarquia burocrática do
governo, seja pelas relações fratriais que construiu nesse processo.
Foi o que ocorreu. Outros parceiros na aplicação da Doutrina de Contenção, detentores de
imenso capital econômico além do capital social acumulado em suas relações com o governo,
retornaram às suas vidas produtivas no campo da economia liberal, mas Kennan migrou
definitivamente para o campo intelectual, levando consigo parte do prestígio outorgado por
seu profundo conhecimento da sociedade soviética.
No novo campo, na Universidade de Princeton e mais especificamente no Institute of
Advance Studies, ele se utilizou largamente desse capital em suas estratégias para ser aceito
no novo grupo e para ocupar uma posição central entre eles121.
Assim, invertendo ou controlando a trajetória descendente que o havia ameaçado no campo
político, ele passou a ocupar uma posição dominante no interior do campo intelectual onde,
das alturas de sua ―
torre de cristal‖, sentiu-se completamente à vontade – já que sua
sobrevivência material não estava mais vinculada a um cargo no Departamento de Estado –
para dardejar uma prolífera produção crítica contra o grupo dominante do campo que o
expulsara.
120 Paul Nitze era um produtor de bens simbólicos no Departamento de Estado subordinado a Kennan, como
antes havia se subordinado a James Forrestal e, como um servidor mais afeito às regras do campo, soube
oferecer à camada dominante uma produção intelectual mais afinada com os interesses militaristas do grupo
que buscava a hegemonia no governo. Além de apresentar uma argumentação intelectual onde a força –
representada pelos militaristas e pelo Departamento da Defesa - teria um papel mais predominante do que a
diplomacia, que caracterizara a ação dos primeiros contencionista e que era representada pelos membros do
Departamento de Estado, Nitze se consagrou ao elaborar o NSC-68 e ao insistir em sua aplicação,
transformando-se na escolha natural do grupo que disputava o poder aos internacionalistas: substituiu seu
mentor e passou a ocupar a chefia do Planejamento Político. THOMPSON, Nicholas. The Hawk and the
Dove: Paul Nitze, George Kennan and the History of the Cold War. New York: Henry Holt and Co., 2009.
121 Em suas Memórias, Kennan enfatiza que não queria ter poder per si ou pelo prestígio que este trazia
consigo, porque sabia que estes eram privilégios efêmeros, mas porque com poder, teria condições de colocar
em prática o que acreditava ser melhor para seu país. KENNAN, Op. cit. 1992.
105
O mesmo processo de movimentação no mercado de capitais simbólicos pode ser observado
em relação aos demais membros do Departamento de Estado e de Defesa: o que se pode
constatar nos Quadros II, III e IV é que cada um dos pesquisados utilizou seus bens
simbólicos de formas diferentes para se manterem no campo ou para preservarem o capital
social acumulado. Todos eles, no entanto, ao serem afastados dos centros de poder, o
utilizaram largamente em seus interesses privados, mantendo-se indiretamente vinculados ao
governo como conselheiros ou como membros de comissões públicas.
106
4. A elite do poder e a doutrina de contenção
Pessoas comuns, sozinhas, não mudam o mundo. No mundo imediatamente pós-guerra,
caracterizado pela emergência de sociedades de massa122, as pessoas comuns faziam parte de
grupos sociais fragmentados, heterogêneos e dispersos. Marcada por forte individualismo e
alienação em relação ao mundo, a maioria não manifestava interesse, poder decisório,
capacidade ou vontade suficiente para promover grandes transformações na sociedade.
Mas nem todas as pessoas eram comuns123. Em qualquer grupo social existem pessoas que se
destacam entre a grande massa disforme e, detentores de capitais sociais, econômicos ou
intelectuais mais elevados, tendem a se aglutinar com os que partilhem uma visão de mundo
comum à sua. No lugar certo, entre pessoas certas, podem se unir para formar uma elite e, em
virtude de capitais simbólicos acumulados ao longo de suas trajetórias, têm acesso a uma
quantidade desproporcional de riqueza e a instrumentos imensuráveis de domínio sobre os
demais.
Suas decisões – muitas delas de ordem corporativa ou institucional – afetam milhares de
pessoas: são detentores de meios de produção, de informação e de prestígio político e acessam
livremente o poder, ocupando posições privilegiadas em seus campos de atuação.
Sua
experiência técnica, política ou social é infinitamente superior à vivenciada pela grande massa
e se constituem na nata da sociedade. Ocupam postos de comando estratégico em
organizações produtivas, no Estado, em instituições de conhecimento, em instituições
religiosas e em organizações militares. Controlam os instrumentos do poder e, ricos ou
122Por grande massa, a autora considera o sentido que lhe dá Emile Durkheim, qual seja, o de uma massa
disforme, atomística, de indivíduos indiferenciados, pulverizados e fragilizados. O conceito também pode ser
entendido como um grupo social que se opõe ideologicamente à elite, ou seja, como uma forma de sociedade
teoricamente identificada como dominada por um pequeno número de elites interconectadas que controlam as
condições de vida da maioria de seus membros, de maneira geral, por meio de persuasão e de manipulação.
POGGI, Gianfranco Durkheim. Oxford: Oxford University Press, 2000 e McQUAIL, D. Mass
Communication Theory Londres: Sage, 2006.
123 Segundo Gaetano Mosca (1858-1941) em Elementi di Scienza Politica (1896) em toda sociedade arcaica,
antiga ou moderna, sempre existe uma minoria que é detentora do poder em detrimento de uma maioria que
dele está privado. Os poderes econômicos, ideológicos ou políticos são igualmente importantes, mas a força
política das elites, como um restrito grupo de pessoas que a detêm – a classe dirigente – foi mais enfatizada
por ele. De acordo com essa teoria, as sociedades estão divididas em dois grupos: o dos governantes e o dos
governados. Os governantes são menos numerosos, monopolizam o poder e impõem sua vontade valendo-se
de métodos legítimos ou arbitrários e violentos ao restante da sociedade. ALBERTONI, Ettore. Mosca and
the Theory of Elitism. Oxford: Basil Blackwell. 1987
107
notórios, posicionam-se de forma dominante nos campos em que atuam, emanando todas as
diretrizes que determinam a estrutura de sua categoria social.
Por isso não surpreende que a maioria dos servidores de confiança ou políticos pertencentes
ao Departamento de Estado ou de Defesa, tivessem feito parte, em um dado momento, do
Establishment124, ou da elite do poder norte-americano.
O termo Establishment, em sentido abstrato, se relaciona com a ordem ideológica, política e
econômica que configura uma sociedade ou um Estado, implicando o controle exercido por
sua elite sobre o conjunto da sociedade e funcionando como base dos poderes estabelecidos.
O termo se estende, igualmente, à nata das instituições que são controladas por essa elite de
acordo com seus interesses e concepções.
Ocupando posição dominante no campo, os membros do Establishment em questão
mantiveram fortes vínculos com as frações dirigentes, estabelecidos por meio de estratégias
sociais, acadêmicas ou profissionais, ou por meio de funções políticas, administrativas,
diplomáticas ou militares exercidas antes e durante a Segunda Guerra Mundial.
O que os aglutinava, criando valores e interesses comuns, era o meio em que transitavam. A
rede de relacionamento que os conectava ao poder abrangia Wall Street, Washington, ricas
fundações e clubes masculinos e eles formavam, segundo Arthur Schlesinger Jr., historiador
e conselheiro da administração Kennedy ―
a comunidade financeira e legal de Nova York, o
coração do Establishment norte-americano. Suas deidades na área diplomática eram Henry
Stimson e Elihu Root125; seus líderes eram Robert Lovett e John McCloy, seus organizadores
principais eram as Fundações Rockfeller, Ford e Carnegie e o Conselho de Relações
Exteriores‖126
O elitismo desses membros do Establishment sofria, na arena política norte-americana, a
oposição de uma tendência populista com raízes no Grande Despertar de Jonathan Edwards
124Originariamente, o termo Establishment se relacionava a uma aliança entre burguesia urbana e grupos da
aristocracia rural britânica que, tradicionalmente, concentravam em suas mãos os meios de ação do país.
Ambos eram pouco abertos a inovações em todos os campos e extremamente hostis no compartilhamento do
poder
com
outros
grupos.
In
Dictionary
Reference.
Disponível
em
http://dictionary.reference.com/browse/establishment. Acesso em 07/03/2011.
125 Elihu Root foi Secretário da Guerra na administração William McKinley e Secretário de Estado de
Theodore Roosevelt. Diplomada da ―
velha escola‖, ajudou a elaborar os ideais wilsonianos. Henry Stimson
foi seu sucessor como Secretário da Guerra e Secretário de Estado, sob Franklin D.Roosevelt. Breves notas
biográficas dos dois diplomatas nas referências no. 125 e 98, respectivamente.
126 HALLBERTAM, David. The Best and the Brightest.New York: Random House, 1972.
108
contra a florescente sofisticação do século dezoito 127 e na revolta popular liderada por Andrew
Jackson contra John Quince Adams 128.
No entanto, apesar de imensamente poderoso per si, esse grupo de elite não consegue
comandar as massas sozinho, principalmente no campo político. Necessitam de acólitos ou
servidores técnicos-funcionais, que os ajudem a exercer o poder.
Roosevelt ou Truman, por exemplo, estavam muito bem posicionados no centro do campo
político e dele, outorgavam poder a seus servidores, mas para chegar ali ou para manterem
essa posição, dependiam das estruturas da máquina partidária e da aprovação popular. Pelo
próprio caráter da política administrativa, tinham que cercar-se de técnicos e burocratas de sua
confiança e além de estarem sujeitos às alianças e a apoios políticos construídos no interior
de seu partido, também sofriam forte pressão de partidos da oposição.
No caso de Roosevelt, observa-se que sua ascensão ao poder se deu no início da década de
1930, em meio a uma crise econômica e social de caráter mundial.
Oportunizando o
momento, o Partido Democrata apeou os Republicanos do poder e, ao longo décadas
seguintes, procurou monopolizar a máquina estatal apoiando-se em políticas sociais voltadas
para a recuperação econômica do país e para melhorias nas condições de vida dos
trabalhadores em geral. Com a crise de 1929, muitas fortunas tradicionais se desfizeram e
127Johnatan Edwards (1703-1758) , foi um ministro e teólogo calvinista de Massachusetts que deu início ao
Grande Despertar, movimento interno norte-americano ocorrido durante as décadas de 1730 e 1740, visando o
retorno às raízes calvinistas dos peregrinos. Esse movimento também pode ser interpretado como a última
grande expressão dos ideais religiosos que motivaram a fundação das colônias da Nova Inglaterra. Disponível
em http://www.jonathan-edwards.org/. Acesso em 07/03/2011.
128Andrew Jackson (1767-1845) foi advogado e presidente dos Estados Unidos de 1829 a 1837. Epônimo da
Democracia Jacksoniana, foi uma figura polarizadora do Partido Democrata, ampliando a participação
popular na política norte americana nas décadas de 1820 e 1830. Mais que qualquer outro de seus
predecessores, Jackson foi eleito pelo voto popular e como presidente, procurou agir como um representante
direto do homem comum e não da elite. Foi o primeiro homem do Tenessee eleito para o Congresso e serviu
brevemente no Senado. Conseguiu consagração popular ao vencer militarmente os ingleses na Guerra de
1812, em New Orleans. Ele tentou democratizar os cargos oficiais federais em Washington desacreditando
funcionários que ocupavam cargos vitalícios e propondo que os deveres de governança fossem claros e
simples o suficiente para haver rotatividade dos cargos entre os que os merecessem. À medida que a política
nacional se polarizava em torno de Jackson e de seus oponentes, o velho Partido Republicano se dividiu em
dois: o Partido Democrata, que aderiu a Jackson e o Partido Nacional Republicano (Whigs), que se opunha a
ele. Henry Clay, Daniel Webster e outros líderes republicanos se auto proclamaram defensores das liberdades
populares, atuando contra o que consideravam uma usurpação por Jackson. Este, ao contrário de seus
antecessores, não se curvava à política feita no Congresso e usava seu poder de veto e a liderança de seu
partido para governar autocraticamente. Sua maneira de agir, no entanto, obteve a aprovação do eleitorado
americano e em 1832, ele conseguiu mais de 56% do voto popular e quase cinco vezes mais votos eleitorais
que Clay. Sua luta contra os bancos e contra os ricos comerciantes em benefício do populacho levou esse
período a ficar conhecido como o da ―
democracia jacksoniana‖. In Miller Center of Public Affair.
Disponível em http://millercenter.org/president/jackson . Acesso em 07/03/2011.
109
novas oportunidades surgiram para jovens de classe média, ambiciosos e com bom acúmulo
de capital intelectual, como Raymond Moley129 ou de capital de prestígio, como Harry
Hopkins.
Quando Roosevelt assumiu o poder em 1933, a burocracia do Estado começou a se ampliar
para atender aos novos projetos sociais do governo e como a economia estava em franca
espiral descendente, o presidente teve grandes dificuldades em preencher seus gabinetes com
conselheiros políticos de sua confiança.
Intelectuais por definição, a função desses servidores públicos seria a de construir um projeto
de governo de acordo com a ideologia que a nova elite que se instalava no poder pretendia
disseminar. Por serem servidores políticos e não concursados ou legalmente eleitos, não
detinham o poder per si, mas circulavam tão perto dele que – enquanto servidores – eram tão
poderosos quanto os que serviam.
O Gabinete Roosevelt - composto por pessoas de sua confiança, ou da confiança do partido contava com conselheiros políticos130 como Harry Hopkins e Clark Clifford; com consultores
acadêmicos como Raymond Moley, Cordell Hull e Henry Morgenthau Jr; com juristas como
Felix Frankfurter e Louis Brandeis e com gestores corporativos como William Harriman,
Robert Lovett e John McCloy, além de editores de mídia e de jornalistas de alto padrão, que
ajudavam o governo a promover a opinião pública. O serviço – e é por isso que eram
chamados servidores públicos - que deveriam executar seria capitanear os pensamentos e
decisões da Presidência, ajudando-a a elaborá-los intelectualmente e a transmiti-los para as
camadas inferiores.
Nos Estados Unidos dos anos 40 e 50, como consequência do processo de transição social que
marcou os anos imediatamente pré e pós-guerra, observa-se que, apesar das relações entre os
129 Raymond C. Moley (1886-1975) foi um intelectual que ajudou a formular o New Deal e que,
posteriormente, tornou-se um de seus mais acirrados oponentes. Doutor em Filosofia pela Columbia
University em 1918, ensinou Política na Western Reserve University e foi diretor da Cleveland Foundation e
do Conselho de Defesa Estadual de Ohio. Em 1928 foi professor de Direito da Harvard University,
especializando-se em justiça criminal. Moley apoiou a candidatura democrata de Roosevelt à Presidência em
1932 e o ajudou a recrutar colegas professores em Columbia para formar Conselho Cerebral (Brain Trust) que
criaria os projetos sociais de desemprego divulgados em sua campanha. Após a vitória, seus membros se
tornaram importantes figuras no governo e a Moley, coube o crédito de inventar o termo New Deal. Em
meados de 1933 ele rompeu com Roosevelt e tornou-se um republicano conservador. Como colunista da
revista Newsweek, de 1937 a 1968, tornou-se um dos mais conhecidos críticos do New Deal e do liberalismo
In
The
New
York
Times.
Disponível
em
em
geral.
http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,788997,00.html. Acesso em 07/03/2011.
130 A classificação da sociedade norte-americana adotada neste trabalho é originária de MILLS, Op. cit., 1956,
pp.15-16.
110
indivíduos que ocupavam cargos políticos se darem em esferas distintas (funcionários de
carreira e funcionários políticos), prevalecia dentre os que cercavam o presidente uma espécie
de consenso e visão de mundo comum – homogeneizando-os sob um poder muito maior do
que o que poderia derivar das sociedades de massa, ainda razoavelmente fragmentadas e
impotentes.
Oportunizando seu capital intelectual e valendo-se da influência derivada de seus cargos, os
servidores políticos dos governantes transitavam livremente entre o campo econômico e o
político, valendo-se de seu acesso simultâneo ao poder do Estado e ao poder corporativo para
configurar a economia e a política conforme os interesses do grupo que os nomeara, enquanto,
concomitantemente, externavam em público discursos de interesses nacionais.
Suas trajetórias no momento histórico que fundamenta este trabalho eram coincidentes ou
colidentes, na medida em que se aliavam ou concorriam entre si para atingirem o centro do
comando, mas suas relações se condicionavam à necessidade de expandir a influência dos
Estados Unidos no mercado internacional e principalmente, a eliminar os entraves que
pudessem surgir nesse processo, no caso, os interesses similares da União Soviética.
Seria importante reforçar aqui que, principalmente no mundo que emergiu no pós-guerra, a
idéia de classe dominante, indicando uma formação social baseada em laços de nascimento,
de riqueza tradicional e de status que monopolizava o poder, estava sendo gradativamente
substituída por elite do poder131, termo que implicava riqueza e poder adquiridos e que
reorganizava as classes proprietárias e as emergentes em um extrato mais ou menos
homogêneo de ricos e poderosos, apesar das diferenças de origem.
Em outras palavras, essa elite do poder132 seria composta por ricos tradicionais, que
formaram a classe dominante no passado mas que haviam perdido a
exclusividade de
domínio no campo social; por ricos emergentes, cujas fortunas derivavam da expansão de
estradas de ferro ou de industrias químicas, automotivas ou de comunicação no país e por
poderosos burocratas, pois o comando, agora, emanava também de instituições econômicas e
131 MILLS, Op. cit., 1956, p. 147.
132 De acordo com Domhoff, os Estados Unidos da década de 1950 eram governado por proprietários e gestores
de propriedades que geravam altas rendas, ou seja, por corporações, bancos e agro-business, com o suporte
intelectual de gestores e especialistas altamente qualificados que empregavam para tanto. Esse domínio era
exercido por meio de envolvimento aberto e direto com a política, seja influenciando os governantes no
planejamento de políticas públicas, seja na participação de campanhas políticas e de eleições, seja por meio de
nomeações de seus acólitos a posições-chave em um governo. DOMHOFF, William G. Who Rules
America Now? Waveland Press. 1997, p. 2.
111
políticas. Nessas instituições, membros da elite do poder se vinculariam a membros
diferenciados das classes inferiores e juntos, criariam as estruturas de um novo grupo
dominante.
Atuando em várias camadas privilegiadas dos campos econômicos, políticos e militares,
partilhavam decisões de caráter nacional e internacional e podiam ser identificados em três
setores: o das lideranças políticas, incluindo o presidente e um grupo seleto de membros de
gabinete e conselheiros que constituem o objeto deste trabalho; o de grandes proprietários e
diretores corporativos, de onde foram convocados muitos dos conselheiros presidenciais, e
finalmente, o dos oficiais de exército de alta patente que, principalmente com a expansão do
complexo industrial-militar durante a Guerra Fria, passaram, igualmente, a ter grande
influência nas decisões governamentais 133.
Por que se pode afirmar que eles compunham uma elite? Por que elite é um grupo de pessoas
que sempre tem o máximo de tudo o que se pode ter: dinheiro, poder e prestígio. Alguns
poucos privilegiados já nascem com tais regalias, mas pessoas comuns só os conquistavam
por meio de estratégias simbólicas: com o acumulo de conhecimento técnico diferenciado, ou
capitais de prestígio, para oferecê-los, posteriormente, no mercado simbólico em troca de
poder. O acúmulo de capitais simbólicos permitiu, portanto, que os menos bem-nascidos
circulasse em torno da elite, ou fossem nela inseridos- sempre cientes de que, quanto maiores
os recursos simbólico acumulados, maiores seriam suas chances de galgar boas posições nas
grandes instituições.
Tais servidores, por receberem poder por outorga dos naturalmente poderosos, só seriam
poderosos enquanto tivessem acesso ao comando de instituições econômicas, políticas,
militares ou jurídicas. Fossem eles políticos de alto escalão, diretores ou acionistas de grandes
empresas, ou oficiais de alta patente, o controle do poder institucional é que os tornava
poderosos, principalmente porque esse controle deixara de ser exclusivamente tradicional ou
hereditário, como no passado. Fundado na meritocracia e no prestígio, os cargos institucionais
deixaram de ser perenes e aqueles que fossem destituídos desses instrumentos do poder ou
afastados das instituições que davam acesso a eles, retornariam às grandes massas e à
insignificância. Ou seja, deixariam de pertencer à elite.
133Classificação adotada de acordo com o verbete "Power elite" conceituado por Jason Powell in The
Blackwell Encyclopedia of Sociology, Blackwell Publishing, 2007, pp. 3602-3603
112
O processo de descenso social era particularmente difícil, especialmente para servidores
políticos com origens nas camadas inferiores da sociedade. Após fazerem parte do
Establishment, ou seja, de se sentirem aceitos no grande circulo dos poderosos, era-lhes
particularmente penosa a idéia de rebaixamento. Desejosos de se manter no poder,
empenhavam-se vigorosamente em atender aos interesses dos que os haviam colocado em
seus postos, esforçando-se para identificar-se com eles e absorver seus valores morais e
psicológicos.
E, inebriados pela proximidade que mantinham com a elite e iludidos pelo poder que emanava
do cargo que ocupavam nas instituições dos poderosos, muitos deles se esqueciam de que seu
papel era de coadjuvante – de servidor – no processo de dominação. George Kennan, por
exemplo, iludido pela repentina projeção de seu Longo Telegrama e pelo poder derivado de
seu cargo de Diretor de Planejamento Político,
não conseguia aceitar que suas
recomendações de contenção – mais diplomacia e menos armamentos na relação com a
União Soviética - voltassem a ser ignoradas.
Sua posição burocrática no campo de poder se tornara tão central, que ele se esqueceu de que
era um servidor dos poderosos, um simples acólito sem luz própria. Enquanto servidores
público, pessoas como Kennan existem – e recebem poderes – para criar uma visão de mundo
que atenda aos interesses da administração que os colocou no cargo que ocupam. Sua
neutralidade deve ser absoluta e eles jamais determinam a política a ser seguida: cabe-lhe
apenas fornecer instrumentos para sua realização e manter-se fiel à orientação que lhe for
traçada.
Como Kennan, Dean Acheson e Marshall tiveram a oportunidade de aprender, quando
servidores deixavam de produzir o que deles se esperava no campo, ou de atender aos
interesses dos naturalmente poderosos, estes lhes retiravam o poder outorgado e os
substituíam por servidores mais coniventes, adequados ou flexíveis.
Que interesses que estavam em jogo? Durante a década de 1940, coexistiam nos Estados
Unidos dois grupos de elite com uma visão oposta de política externa. Um deles pregava a
postura tradicional do isolacionismo e continuava ignorando os problemas internacionais que
não estivessem afetando diretamente os seus territórios ou seus quintais. O outro, mais
progressista, percebia o vácuo de poder criado pelo declínio das potencias européias que,
enfraquecidas com a guerra, não apenas ficaram destituídas de recursos para manter seus
113
impérios coloniais, como haviam se comprometido com a descolonização para receberem o
Lend Lease.
No fim da Segunda Guerra, potencias antigas, como a França e a Itália, já haviam se
eclipsado. A tentativa alemã de dominar a Europa, bem como a do Japão, de controlar o
Extremo Oriente e Pacífico fracassara. A Grã Bretanha, que suportara o maior peso da defesa
contra Hitler, estava totalmente debilitada e dentre os Aliados, apenas os Estados Unidos e a
União Soviética haviam ficado em pé no tabuleiro.
Os Estados Unidos foram os únicos que se tornaram muito mais ricos com a guerra. Sua
marinha mercante concentrava cerca de metade do transporte marítimo mundial. Entre 19401944, a produção industrial norte-americana – civil e militar – crescera em mais de 50%,
num ritmo de mais de 15% ao ano. Embora o crescimento tenha sido causado principalmente
pela produção de guerra - que passou de 2% da produção total de 1939 para 40% em 1943 os produtos não-bélicos também ganharam maior escala. Seu exército tinha 69 divisões na
Europa e 26 na Ásia e Pacífico e apesar de muitos soldados estarem ansiosos para voltar para
casa, a influencia militar informal que os Estados Unidos estavam exercendo em várias partes
do globo
transformava-se
em formal à medida que encontravam ―
novas fronteiras de
insegurança. ]
Na outra ponta, a União Soviética se fortalecera militarmente com a extensa campanha que
manteve na frente ocidental, recolocando-se no nível que ocupara nas primeiras décadas do
século XIX, quando seu exército policiava a Europa Centro-Oriental. Após a Segunda Guerra,
suas fronteiras se ampliaram à custas da Finlândia, Polônia e Romênia e estados bálticos
como Letônia, Estônia e Lituânia foram reincorporados a seu território. Um cordão sanitário
de estados satélites a separava do Ocidente, permitindo que o Partido Comunista e a polícia
secreta impusessem regras sem contestação. Mas sua economia havia sido profundamente
afetada com imensas perdas de população e prejuízos materiais incalculáveis nas áreas
ocupadas pelos alemães. Para poderem vencer militarmente o invasor, os russos concentraram
toda sua produção no setor industrial-militar, reduzindo drasticamente os demais – bens de
consumo, comércio e varejo, abastecimento agrícola. Ou seja, em 1945 a Rússia era um
gigante militar, mas economicamente estava pobre, desgastada e com deficiência de recursos
114
humanos, ansiando por matérias primas estratégicas – como petróleo, borracha e minérios tanto quanto os Estados Unidos134.
Econômica e estrategicamente, os Estados Unidos ocupavam uma posição mais favorável que
a dos russos na nova ordem bipolar, mas temiam a disseminação da ideologia soviética entre
os trabalhadores dos países ocidentais devastados pela guerra.
Ao mesmo tempo, seus
governantes passaram a sofrer intensa pressão das industrias de exportação que receavam que
uma depressão de pós-guerra pudesse seguir-se ao declínio dos gastos governamentais a
menos que novos mercados além mar fossem abertos para absorver seu excesso de produção .
Era o momento adequado para a investida dos internacionalistas e não surpreende que tenham
conseguido a aprovação da opinião pública para seu projeto: além de criarem uma justificativa
moral para ocupar espaços vacantes na economia internacional com a ―
pax americana‖,
também usaram o argumento da ―
segurança nacional‖ para não desativar o complexoindustrial militar que se provara tão eficiente, durante a guerra, para reativar a economia
interna e manter inimigos à distância.
Ora, a empresa moderna pode ser considerada, em nossos tempos, como a principal fonte de
riqueza e poder, mas política e especialmente a praticada na democracia, também abre e fecha
muitas portas para a fortuna. No caso dos Estados Unidos, entre 1940 e 1950, muitas fortunas
foram criadas a partir da política e de decisões tomadas por membros da burocracia do poder,
especialmente as fundadas no complexo industrial militar.
A luta contra o nazi-fascismo, a princípio, e a contenda internacional levantada pela
democracia contra o comunismo, posteriormente, foram muito oportunas para a criação de
uma sociedade militarista-industrial nos Estados Unidos e o posicionamento de alguns
servidores chave nos círculos de dominação foi fundamental para assentar as bases desse
novo tipo de sociedade.
Havia muita coisa em jogo. Ideais cavalheirescos, relações fraternais e ética política se
mesclavam com segurança nacional, realismo político e com a necessidade de expandir o
poder além das fronteirasdos Estados Unidos, justificados pela defesa da democracia. Grandes
ideias surgiram. Novas estruturas burocráticas foram criadas para colocá-las em prática, tanto
na política, quanto na economia.
134 KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1989. Pgs. 343347
115
Vários agentes das camadas subalternas, com competência comprovada nessas estruturas
burocráticas ocuparam os espaços criados com a aplicação da doutrina elaborada por George
F. Kennan por meio de instituições diplomáticas, se possível ou pela força das armas, se
necessário, ao longo de quase meio século.
Ou seja, a Doutrina de Contenção atendeu amplamente aos interesses das elites políticas,
burocráticas e econômicas do pós guerra: criou um sentimento de coesão nacional contra uma
ameaça externa, impôs a necessidade de ampliar o comércio além das fronteiras para
resguardar o sistema capitalista da ofensiva socialista e principalmente, deu continuidade ao
projeto econômico interno mais bem sucedido na criação de emprego e riqueza durante a
décadas de 1940: o do complexo-industrial militar.
116
5.1 Vocação pública e o Establishment
A observação das trajetórias paralelas ou perpendiculares dos membros do Establishment que
constam desta pesquisa auxiliou muito a análise das forças que sustentavam o campo político
do pós-guerra nos Estados Unidos, mas para evitar reducionismos, não seria produtivo tratar
todos como parte de um mesmo processo monolítico. Apesar dos pesquisados circularem em
ambientes sociais, universitários e profissionais comuns, seus Quadros de Origens e
Trajetórias ilustraram bem a diversidade que pode ser encontrada no interior de um campo
que, sem esse enfoque, poderia ser visto como compacto.
O fator de integração e determinante de suas trajetórias - o ingresso à carreira pública - surge
no discurso dos servidores políticos como uma espécie de chamado ou vocação, configurando
o que Weber135 consagrou como o sentimento que levava um agente a viver para a política e
não necessariamente dela, tornando-a o objetivo de sua vida, seja pelo prazer derivado da
simples posse do poder, seja porque a atividade nesse campo a serviço de uma causa daria
algum tipo de significação à sua vida.
William A. Harriman, Dean Acheson, John McCloy ou Robert Lovett atuaram nos moldes
descritos por Weber, encaixando-se no tipo dos que viviam para a política por serem
independentes das vantagens econômicas que essa atividade lhes podia proporcionar.
Possuíam fortuna pessoal ou ganhos suficientes assegurados e estavam economicamente
disponíveis, não tendo necessidade de dedicar todo seu tempo e capacidade de trabalho
perseguindo a própria subsistência.
A disponibilidade de um grupo considerável de altos burocratas públicos atuando na máquina
administrativa do Estado e vivendo para a política e não dela, implicava que - desejosos
apenas dos dividendos simbólicos da máquina estatal - os burocratas em questão viam-se
menos constrangidos pelas regras ou exigências cobradas de funcionários menos autônomos
e eram bem mais independentes no campo.
Dean Acheson, por exemplo, era originário de uma distinta família de classe média de
pastores presbiterianos. Estudara em Groton e ao graduar-se em Direito por Harvard,
acumulou vultoso capital social nas relações com seu professor de Direito Administrativo,
Felix Frankfurter, que seria sob Roosevelt, nomeado para o Supremo Tribunal.
135WEBER, Max. Ciência e Política: Duas Vocações. São Paulo: Ed Martin Claret, 2005, p.68
117
Muito bem sucedido na carreira jurídica e recebendo altos dividendos como associado da
Convington & Burling, Acheson tinha uma posição confortável em termos financeiros e uma
extensa rede de relacionamento entre a elite do poder. Democrata, auxiliou na campanha de
Roosevelt em 1932 e, em reconhecimento por sua participação, foi nomeado Sub Secretário
do Tesouro pelo Presidente.
Durante a década de 1930 os Estados Unidos estavam atravessando uma enorme depressão
econômica causada pela quebra da Bolsa de Nova York e dentre as medidas propostas pelos
assessores de Roosevelt para amenizar as dificuldades do mercado, estava a desvalorização do
dólar em relação ao padrão ouro.
Acheson, atuando como Secretario do Tesouro por motivo de doença do titular, considerou a
proposta ilegal e emitiu sua opinião em documento dirigido ao Presidente. Roosevelt lhe
respondeu que a função de um advogado seria de encontrar meios para contornar as filigranas
da lei e cobrou-lhe uma ação mais efetiva no sentido de agilizar tais procedimentos. Acheson
manteve sua posição, afirmando que estava sendo solicitado a fazer algo com que não
concordava e irritado com a insubordinação de seu servidor, Roosevelt o dispensou do cargo.
Diplomático e tremendamente ético, Acheson escreveu uma renuncia breve e polida,
agradecendo ao presidente por ―
todas as demonstrações de gentileza‖ manifestas á sua pessoa.
Roosevelt nem sequer respondeu e Acheson soube pela imprensa que o presidente havia
escolhido Henry Morgenthau para substituí-lo. Apesar de não ter sido convidado para a
cerimônia de diplomação de Morgenthau no Salão Oval, Acheson compareceu assim mesmo e
foi quase ignorado pelo presidente, que discursou longamente aos poucos presentes sobre as
virtudes da lealdade.
No final da fala, constrangido, Acheson dirigiu-se ao Presidente, estendeu-lhe a mão e
agradeceu pela oportunidade que lhe fora dada de estar a seu serviço. Roosevelt o abraçou.
―
Estou realmente furioso com você‖ disse-lhe ao ouvido ―
mas você é um grande esportista‖.
Alguns anos mais tarde, quando outro oficial lhe enviou um carta grosseira de renuncia,
Roosevelt
a entregou à sua secretária e disse: ―
Devolva isso para ele e diga-lhe para
perguntar a Dean Acheson como é que um cavalheiro deve pedir sua renúncia.‖ 136
136Esses fatos foram narrados a partir de várias referências. Vide ACHESON, Dean em Morning and Noon,
pgs. 161-194;
TULLY, Grace (secretária de Roosevelt) em FDR, My Boss p. 178 e ISAACSON &
THOMAS, Op. cit., 1986, pp.133-135.
118
A narrativa desses eventos demonstra alguns aspectos importantes na trajetória de Acheson
como servidor político. Primeiramente, dentre os fatores que aumentaram seu capital social e
o aproximaram do poder do poder, é possível apontar o início de sua carreira como pupilo do
Juiz Felix Frankfurter, bem como a parceria profissional com o Juiz Brandeiss, ambos
altamente influentes no governo pela amizade pessoal com o Presidente e por seus cargos no
Tribunal Supremo Federal. Outro fator importante de prestígio, foi o fato de Acheson ter sido
grotoniano, maçom e Bonesman, como Harriman e Roosevelt. Como pertencia a vários
clubes sociais137 na cidade e abundava charme pessoal, acumulou capitais sociais que lhe
seriam muito úteis no governo e, ao atuar na campanha de Roosevelt em 1932, adicionou
mais capital político às suas estratégias para aproximar-se dos círculos centrais do poder.
Advogado bem sucedido na firma Convington & Burley, acumulou o confortável capital
financeiro que lhe ensejou participar da política pela política, com relativa independência de
suas recompensas pecuniárias. No caso citado acima, como não dependia dos recursos
financeiros de seu cargo, Acheson não apenas pode dar-se ao luxo de manter sua opinião
perante Roosevelt como, mesmo não pertencendo ao Establishment por origem, sua
convivência com essa elite e a absorção de seu habitus o levou a agir, no caso da demissão,
com a nobreza de atitude que seria esperada de um agente das camadas dominantes.
Outros servidores, se desprovidos de fortuna, não poderiam dar-se ao luxo de manter
convicções pessoais contra interesses das camadas de poder, pois dependiam da remuneração
que o Estado lhes provia para sobreviverem e portanto, eram mais suscetíveis às variações da
opinião publica e de seus representantes, sendo obrigados a levá-los em consideração se
quisessem viver da política
Se o conceito de que o Estado moderno 138 é de um agrupamento de dominação que
monopoliza nos limites de seu território a violência física legítima e garante os meios
materiais de gestão aos dirigentes, aqueles que conseguem manter sua independência desses
recursos atuam de forma mais livre, como demonstrado pelo exemplo acima com Dean
Acheson.
137Acheson pertencia ao Peguim, um grupo de discussão liberal, ao Royal Bengal Bicycle, uma organização
social bem ativa e ao Alphapha, nome dado a uma planta cujas raízes entram fundo na terra em busca de
bebida (era um grande amante Martinis e Scotch), além de recebeer frequentemente em sua casa. ISAACSON
& THOMAS, Op. cit. 1986, p.32
138 WEBER, Op. cit, 2005, pps. 86 a 93.
119
Alguns dos funcionários que cercaram Kennan para colocar em prática sua proposta de
contenção, como Harriman e Acheson, empenharam-se na luta política com um intuito claro:
estarem próximos aos círculos do poder e, ao administrar seus interesses (idealisticamente ou
para atender negócios pessoais) encontravam nessa atividade tanto um ganha-pão, quanto um
conteúdo moral para suas vidas.
Outros, como McCloy e Lovett, praticaram a política como profissão secundária, mesclando
passagens pelo governo com retornos às atividades civis e a seus interesses econômicos
pessoais, conforme as tendências do campo e a importância de suas contribuições pessoais no
confronto com os soviéticos.
Além de benefícios materiais, as posições que Acheson, McCloy ou Harriman ocuparam no
governo, os municiaram com um imenso capital social, com um prestígio que, no retorno à
vida civil e principalmente à prática jurídica ou empresarial, foi adequadamente aplicado para
implementar suas atividades profissionais.
Integraram embaixadas importantes (Harriman), ocuparam cargos de destaque no
Departamento de Estado (Marshall, Forrestal, e Acheson)e participaram da criação de órgãos
de importância vital para a Contenção aos soviéticos, como o Banco Mundial (McCloye
Lovett), bem como de dezenas de Conselhos de Estado e de órgãos consultivos, mesclando
tais atividades com suas atividades civis.
Nos Estados Unidos, a participação das elites na estrutura burocrática do governo vinha de
longa data, apesar de aquele país caracterizar-se por uma cultura política em que as crenças e
valores da classe média sejam predominantes 139. A igualdade de oportunidades é um valor
importante na sociedade americana e, sem dúvida alguma, ajudou a limitar o crescimento de
classes aristocráticas na política, mas críticos radicais dessa perspectiva de cultura política,
como Samuel Huntington140, argumentam que as crenças e valores públicos norte-americanos
são impostos por grupos que ocupam posições centrais nos campos do poder e que as crenças
139 Há muito indicadores que confirmam a predominância da cultura da classe média: em 2002, 45% dos
trabalhadores americanos atuavam em profissões técnicas, gerenciais ou administrativas. Outros 28% atuavam
em atividades burocráticas de alto escalão, 25% em empregos braçais e 2% em atividades rurais. Mais de 80%
dos jovens de 18 anos graduaram-se na High School e destes, 30% seguiram carreira universitária. (Fonte:
US Census Bureau, disponível em <http://www.census.gov>, com acesso em 12/08/2010.) No entanto, alguns
acadêmicos questionam a objetividade desses indicadores, apontando que o relacionamento entre
empregadores e empregados é um pouco diferente para trabalhadores do setor privado e os do setor público e
principalmente.
140 HUNTINGTON, Samuel. American Politics, Boston: Harvard University Press, 1981. p. 14
120
que praticam , na verdade, constituem uma ideologia com a função de legitimar o sistema
vigente de autoridade política e de organização econômica.
A ideologia dominante é muito poderosa nos Estados Unidos e está tão voltada para os
interesses dos grupos dominantes que todo e qualquer arranjo econômico e político é
apresentado às massas, frequentemente, não apenas como os melhores possíveis, mas como
os únicos viáveis, como foi o caso da Guerra Fria.
Uma análise crítica da Constituição dos Estados Unidos141, por exemplo, indica que uma das
diretrizes mais importantes da tradição federalista era que os direitos de propriedade se
colocavam moralmente acima do governo. Ou seja,
independentemente do discurso
democrático emitido, os pais fundadores criaram instituições governamentais para apoiar as
necessidade privadas de seus cidadãos, reconhecendo o vínculo íntimo entre bem estar
público e desejo de poder e propriedade dos indivíduos.
Para Charles Beard, empresários como William Harriman, portanto, envolviam-se em
atividades políticas para atender a interesses pessoais e específicos, ou para atender
necessidades de auto-estima e reconhecimento e não por ―
vocação‖ ou ―
chamado‖, como
afirmado por Weber.
Filhos de boa linhagem – tradicional ou emergente – eram preparados desde a infância para se
integrarem ao projeto de poder familiar e atuar de forma representativa ou executiva no
governo, adequando-o aos seus interesses individuais e de sua classe. Considerando os
Quadros de Origens e Trajetórias, essa perspectiva pode ser observada principalmente entre
os grotonianos e entre membros do Establishment que se inauguravam nas redes de
relacionamento universitárias, na maçonaria e em clubes masculinos, onde cultivavam
vínculos sociais como estratégias políticas e econômicas de ascensão social ou de manutenção
do poder.
Importantes para reforçar a legitimidade do poder outorgado pelo povo aos seus governantes,
os membros da elite econômica e intelectual que circulavam em torno das instituições
democráticas emprestavam-lhe parte do poder simbólico que traziam de seus campos e
cercavam o dirigente com membros de sua própria classe. Durante os primeiros anos do
141Apesar da primeira publicação do trabalho crítico de Charles Beard ser datada de 1913, seu conteúdo ainda é
atual quase um século depois, por tratar-se de um trabalho seminal na criação de uma nova – e polêmica maneira de pensar a democracia norte-americana. BEARD, Charles. An Economic Interpretation of the
Constitution of the United States. New York: The Free Press, 1986.
121
governo Roosevelt observou-se no departamento de Estado uma maior incidência de
servidores de confianças pertencentes ao mesmo círculo social do Presidente142 mas, à medida
que a crise dos anos 1930 se aprofundava e eram criadas instituições públicas para dar suporte
à política de recuperação do New Deal, tornando o Estado mais burocrático e funcional,
membros de outras classes também lograram ascender aos círculos funcionais de poder.
Quando Truman assumiu a presidência em 1945, uma série de transformações sociais já
estavam se consolidado nos Estados Unidos, aceleradas por alguns fatores decorrentes da
guerra na Europa:
a) intensa migração rural, com rapido processo de urbanização;
b) ascensão do trabalho feminino nos centros urbanos, para substituir a mão de obra
masculina que havia perecido durante a guerra;
c) emergência de novas forças econômicas entre imigrantes europeus e latinoamericanos, que haviam feito fortuna durante a guerra;
d) disseminação de centros econômicos importantes para outras regiões além da Costa
Leste, para atender á demanda interna e externa gerada pela guerra e
e) maior inserção dos afro-americanos no mercado produtivo, pela acentuada divulgação
dos direitos humanos e pela necessidade de mão de obra em uma economia em
crescimento.
Sendo o próprio presidente fruto dessas transformações, seria natural que procurasse se cercar
de iguais, principalmente porque os servidores políticos das classes aristocráticas gozavam de
muita independência e consequente,
tinham menor comprometimento com os valores
democráticos que cercavam o cargo da presidência.
Muitos eram advogados e advogados, além de dispor de mais tempo para a política, também
detinham um domínio maior sobre o discurso escrito e falado, pelas próprias exigências da
profissão. O fato desses profissionais terem atuado na configuração da política externa norteamericana como servidores políticos com mais constância e em maior volume do que as
demais categorias de trabalhadores ou proprietários no período estudado, provocou uma série
142 Mantiveram vínculos pessoais com o Presidente Roosevelt, por meio de fraternidades universitárias ou
sociais os seguintes oficiais citados neste trabalho:, Joseph Grew (Boston´s Back Bay, Groton e Harvard),
Henry Stimson (Yale, Harvard, Skull & Bones) , William Bullit (Yale, Harvard, Scroll & Key), William
Harriman (Groton e Skull & Bones) , Dean Acheson (Groton, Harvard e Skull & Bones), e muitos outros que
ocuparam cargos importantes em sua administração.
122
de reações favoráveis ou negativas em algumas pessoas que atuavam com eles naquela
área143.
Grande parte dos servidores políticos era da confiança do Presidente e ocupavam cargos
rotativos, mas como a funcionalidade burocrática das instituições públicas necessitava de
continuidade, havia também especialistas sem vínculos políticos com as classes dirigentes.
Esses agentes sociais se dedicavam integral e exclusivamente à burocracia política, como
Kennan e Bohlen, fazendo dela sua atividade principal e tornando-se responsáveis pela
manutenção da estrutura administrativa governamental.
Por isso, o peso desses dois oficiais, em relação às forças que determinavam as posições de
cada um no campo político era bem menor que o dos servidores nomeados ou de confiança e,
para eles, além da política ser permanente fonte de rendas, viviam dela e para ela,
simultaneamente.
143 Jean Monet, por exemplo, especulava se a aglomeração de tantos advogados no Departamento de Estado se
devia à necessidade da área ter técnicos devidamente treinados para lidar com situações complexas a partir de
precedentes e de formas inovadoras. Acheson e McCloy partilhavam dessa visão e Acheson, inclusive,
acreditava que os melhores estadistas eram aqueles que possuíam os atributos de um grande advogado, qual
seja, manter-se emocionalmente afastado de um caso, apreciando os fatos dos dois lados. Kennan, por outro
lado, abominava os juristas da política externa, argumentando que viviam preparando tratados complexos que
nunca eram utilizados e que tinham pouca relação com as realidades do poder. Lovett, eminentemente prático,
via o Direito como a força coercitiva que, contratual e pacificamente, teria a capacidade de reforçar
comportamentos desejados e atender ao projeto de governança. MONNET, Jean. Memoires. Paris:
Arthème Fayard. 1976, pp. 20–28 e ISAACSON & THOMAS, Op. cit., 1986.
123
5. Conjuntura econômica, política e social da Guerra Fria
Em termos históricos, observou-se que o período em questão foi uma espécie de intermezzo
nas relações internacionais, delineando e consolidando a ruptura de valores e comportamentos
isolacionistas, ratificando o internacionalismo e determinando as regras do realismo político
adotado pela política externa norte-americana pelas cinco décadas seguintes.
Do início da República em 1776 até 1929, independentemente do discurso em vigor e das
tendências democráticas dos governantes que se intercalavam à frente dos Partidos
Republicano ou Democrata, observou-se nos Estados Unidos uma prática altamente
centralizada de poder, fundada nos interesses econômicos de um grupo de elite que controlava
a política nacional e apoiada em um relativo isolacionismo político em relação ao restante do
mundo144.
A partir da crise de 1929 e das transformações sociais, econômicas e políticas que
configurariam um novo cenário internacional, esse isolacionismo começou gradativamente a
perder espaço para uma nova prática nas relações externas até que em 1941, os Estados
Unidos se viram diretamente envolvidos na guerra européia.
Após a Segunda Guerra, o papel dominante exercido pelos Estados Unidos, como se observou
anteriormente, foi objeto de muitas análises acadêmicas conflitantes, seja sob o ponto de vista
histórico, seja econômico, seja de relações internacionais. No centro dessas diferentes visões
em relação à posição central dos Estados Unidos nos eventos internacionais durante o último
século, estava a primazia dos norte-americanos na economia mundial.
Apesar das muitas evidências a esse respeito, autores ortodoxos do período analisavam
política e economia como duas esferas separadas e ignoravam qualquer conexão entre a
posição política dominante dos Estados Unidos e a natureza da economia internacional do
pós guerra145.
144 Essa visão é partilhada pelo economista Robert Gilpin, que descreve as relações internacionais e a
economia política internacional a partir de um ponto de vista realista, na tradição de E. H. Carr e de Hans
Morgenthau, conforme evidencia em Global Political Economy – Understanding the International Economic
Order. Princeton: Princeton University Press. 2001, pp. 15-23. O tema também foi tratado em The Political
Economy of International Relations (1987).
145 De acordo com GILPIN, Robert. The Rise of American Hegemony, in Two Hegemonies: Britain 1846-1914
and the United States 1941-2001 edited by Patrick Karl O'Brien and Armand Clesse .Aldershot: Ashgate
Publishing, Ltd., 2002, pp. 165-182
124
Autores marxistas ou de esquerda, por outro lado, viam essas duas esferas como
profundamente interligadas em função do desejo ―
insaciável‖ dos capitalistas de acumulação
continua e julgavam que as necessidades econômicas teriam sido o mote das políticas
relacionadas à Guerra Fria 146.
Robert Gilpin, por exemplo, apesar de entender as duas esferas como intimamente ligadas,
não as via exatamente sob a perspectiva marxista. Para ele, o sistema político internacional
tinha profunda influência sobre a natureza e sobre o funcionalmente da economia
internacional, mas sua principal expressão dessa perspectiva seria a teoria da estabilidade
econômica.
Ou seja, para ele os Estados Unidos emergiram da Segunda Guerra com uma visão clara da
nova ordem internacional que gostaria de criar, criando para tanto, uma série de instituições
importantes: as Nações Unidas e seu Conselho de Segurança, que tinham a finalidade de
garantir a paz; a Conferência de Breton Woods (1944), que propunha uma nova constelação
de instituições econômicas como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a
Organização Internacional do Trabalho, que tinham a responsabilidade
de promover e
administrar uma economia mundial aberta e multilateral147.
Além disso, toda a ordem internacional do pós-guerra teria sido fundada na Carta do Atlântico
e em suas quatro liberdades (hoje conhecidas como os direitos humanos), em nome das quais
os Estados Unidos e seus aliados haviam lutado no confronto contra o Eixo. Nessa estrutura,
146 Immanuel Wallerstein é um autor muito representativo desse grupo de esquerda. Seu trabalho O Moderno
Sistema Mundo surgiu em três volumes, em 1974, a980 e 1989 e nele, são observadas três influências
importantes. De Karl Marx, ele se apropria da ênfase nos fatores econômicos se sobrepondo aos ideológicos
em política global, das dicotomias existentes entre capital e trabalho, da visão do desenvolvimento econômico
mundial a partir de estágios como o feudalismo e o capitalismo, da crença na acumulação do capital e do
conceito de dialética, entre outros. Como Fernand Braudel, ele admite a descrição do desenvolvimento e a
implicação política de uma rede extensa de trocas econômicas no mundo europeu entre 1400 e 1800.
Finalmente, Wallerstein adota a teoria da Dependência, especialmente em seus conceitos de potencias centrais
e periféricas, presumivelmente, pela experiência prática adquirida na elaboração de sua obra relacionado à
África pós-colonial. Suas teorias provocaram fortes críticas, não apenas entre círculos neoliberais ou
conservadores, mas alguns historiadores chegam a negar a veracidade histórica de parte de suas afirmações.
Alguns críticos sugerem que ele tende a negligenciar a dimensão cultural das potencias em detrimento da
dimensão econômica, reduzindo-a a uma ideologia ―
oficial‖ de países, quando estas poderiam ser facilmente
identificadas como meras agencias de interesse econômico. Seu enfoque analítico, no entanto, juntamente
com o de outros teóricos associados a ele, como AndreGunder-Frank, Samir Amin, Christopher Chase-Dunn e
Giovanni Arrighi tiveram um impacto significativo no pensamento econômico moderno e estabeleceram uma
base institucional mais voltada para uma visão geral da economia. WALLERSTEIN, I. The Politics of the
World-Economy. The States, the Movements and the Civilizations. Cambridge: Cambridge University Press.
1984 e WALLERSTEIN, I, ARRIGHI, G. e HOPKINS, T. Anti-systemic Movements. London: Verso, 1989.
147 Quando a Organização Mundial do Comércio (OMC) não foi aprovada pelo Congresso norte-americano,
os Estados Unidos e seus parceiros comerciais estabeleceram o GATT como fórum de negociações, mesmo
faltando-lhe o status completo de organização internacional.
125
os vitoriosos se propunham construir o mundo pacífico, próspero e humano que havia sido
prometido à espécie humana após a Primeira Guerra.
Esse ideal ―
rooseveltiano‖ de uma economia mundial unificada durou pouco, segundo Gilpin,
desintegrando-se quando o confronto americano-soviético sobre territórios na Europa Central
e Oriental destruiu o espírito de colaboração que animara os Aliados, colidindo com a
realidade da devastação econômica trazida pela Segunda Guerra e pela Guerra Fria que a
seguiu. A economia mundial se dividiu, a partir de então, em dois sistemas antagônicos capitalismo e socialismo - e os Estados Unidos e seus aliados responderam à situação
assumindo a tarefa de criar arranjos econômicos, políticos e de segurança que restaurassem as
economias destruídas do Japão e da Europa Ocidental, além de prover por sua segurança, qual
seja, criando um Sistema Americano que abarcaria todas as potencias capitalistas.
No centro desse Sistema Americano e de suas alianças militares estava a percepção de um
perigo supremo - a ameaça soviética. Com a finalidade de manter unidade política para
enfrentar esse novo problema, os Estados Unidos e seus aliados fizeram um acordo tácito e
subordinaram suas diferenças econômicas de curto prazo e políticas de longo prazo para
priorizar a contenção do poder soviético. Qual seja, o perigo soviético teria sido responsável
pelo ―
grude‖ político que, entre 1946 e 1950148, ajudou a manter a economia internacional do
pós-guerra e facilitou o comprometimento das nações à solução dos sérios problemas
econômicos que as afligiam.
Apesar de concordar com esse contexto econômico e político, é importante que se observe
que algumas realidades sociais internas também se refletiram de forma preponderante na
formação da política externa adotada pelos Estados Unidos do pós-guerra. A partir,
principalmente de 1930, quando se configurou uma forte crise no interior do sistema
capitalista, novas forças internas começaram a emergir na política norte-americana.
Aproveitando-se do colapso econômico instaurado após o crack da Bolsa de Nova York o
partido Democrata149 quebrou a hegemonia política dos Republicanos e elegeu Franklin D.
148GILPIN, Op. cit. 2002.
149 O Partido Democrata e o Partido Republicano são os dois maiores partidos políticos dos Estados Unidos.
Historicamente, a plataforma do Partido Democrata é liberal e ocupa uma posição de centro-esquerda no
espectro político, apoiando trabalho organizado, minorias étnicas e reformas progressivas. Tende a favorecer
maiores intervenções governamentais na economia e a se opor a intervenções públicas em assuntos privados e
não econômicos dos cidadãos. Apesar de ter suas raízes no pensamento de Thomas Jefferson, que advogava
um governo federal menos poderoso e mais descentralizado, o partido Democrata moderno defende um
governo federal forte com poderes para regulamentar os negócios e a indústria em nome do interesse público;
126
Roosevelt em 1932, apoiado em uma grande coligação social que se propunha a reconstruir a
economia nacional com políticas sociais de emprego e com a intervenção do Estado na
economia (New Deal).
Para legitimar a posição de seu mandatário perante as massas, a primeira administração
Roosevelt começou a abriu espaço na máquina administrativa para a participação política de
setores até então deixados á margem do poder150. No final da década, durante o segundo
mandato de Roosevelt, às instituições criadas pelas necessidades de reconstrução nacional,
juntou-se a guerra europeia contra o fascismo e seu desenvolvimento ofereceu a novas
camadas da burguesia emergente, até então limitadas as círculos restritos do poder,
oportunidades político-comerciais até então inimagináveis.
Apesar de isolados da guerra na Europa por determinação do Congresso, a oferta de LendLease feita aos Aliados em 1940, envolveu os Estados Unidos em um enorme processo de
produção, organização e distribuição de bens, armas e homens às potências que lutavam
contra Hitler. A falta de quadros devidamente qualificados na elite tradicional decadente para
supervisionar e acompanhar esse processo, favoreceu a emergência de burocratas oriundos de
camadas menos centrais dos campos econômicos ou políticos e estes, em virtude de
habilidades pessoais, empenho político ou vínculos sociais,
lançaram mão desse capital
simbólico para se aproximarem dos centros de poder.
Tão logo ocupavam os vários cargos burocráticos disponíveis na área de política externa,
esses burocratas se aliavam ou subordinavam a um setor do poder tradicional que almejava
substituir a fração então dominante no centro do campo, integrando-se a eles e sua
intervenção na elaboração de novas estratégias e posturas em relações internacionais foi
fundamental, tanto para configurar a disputa bipolar entre Estados Unidos e União Soviética,
quanto para criar as instituições supra-nacionais que seriam proeminentes na reconfiguração
de relações de coexistência entre capitalismo e socialismo após 1945.
financiamento federal de serviços sociais e de benefícios para os pobres, desempregados, idosos e outros
grupos; e a proteção dos direitos civis. Em relação à política externa, os Democratas tendem a ser mais
internacionalistas e multilateralistas do que isolacionistas e unilateralistas. Desde as eleições gerais de 2006, o
Partido Democrata tem sido o partido majoritário em ambas as Casas do Congresso e no Senado. Também
detêm a maioria no governo dos estados. Barack Obama, o atual presidente dos Estados Unidos, é o 15º.
Democrata a ocupar o posto. Democrat Party. Disponível em http://www.democrats.org/about/our_history.
Acesso em 07/03/201 e The origins of the Republican Party. In US History. Disponível em
http://www.ushistory.org/gop/origins.htm. Acesso em 07/03/2011.
150
Com a convocação, por exemplo, de jovens talentosos das camadas médias e inferiores da sociedade - como
Harry Hopkins, James Forrestal, John McCloy e George Kennan, dentre muitos outros, para participarem das
instituições burocráticas que estavam se formando na nova estrutura de governo.
127
Como e porque essa ―
elite do poder‖, composta por membros tão diversos e de origens tão
distintas conseguiu promover tantas mudanças no cenário internacional? Acompanhando
respeitáveis correntes acadêmicas151 e analisando os Quadros de Origens e Trajetórias, a
autora constatou que grande parte dos acontecimentos que marcaram o cenário internacional
naquela época (1945-1950)152, apesar de intermediados pelo Congresso e eventualmente, de
terem sido limitados por ele, foram consequência direta dos valores e interesses da elite que
dominava - por meio da representação pública ou em imensas corporações econômicas - as
principais esferas do poder político e econômico nacional.
O recrutamento e as trajetórias possíveis no interior dos partidos Democrata e Republicano ou
da máquina administrativa governamental; os mecanismos de consagração, por meio de
nomeações para cargos de confiança, como Secretário de Estado, ou a chefia do Escritório de
Planejamento Político, bem como as demais condições técnicas ou políticas, respectivamente,
necessárias à atuação de servidores de burocráticos, como Kennan e Bohlen, de servidores
políticos como Harriman, Acheson, Lovett e McCloy, ou de servidores militaristas, como
Marshall e Forrestal nas diferentes modalidades da governança,
dependiam quase
completamente de instituições publicas como a Presidência, ou a Secretaria de Estado ou da
Defesa e dos grupos políticos que exerciam o trabalho de dominação, como o Partido
Republicano ou o Partido Democrata.
Por esse motivo, o capital social ou intelectual acumulado pelos aspirantes ao poder foi
negociado no mercado simbólico dessas instituições para conquistarem e manterem posições
dominantes no campo. Em troca, adotaram medidas que atendiam às facções emergentes e
economicamente poderosas que disputavam o poder com a elite tradicional.
151
Nas questões econômicas relacionadas à Guerra Fria, a autora concorda com a maioria dos conceitos
relacionados ao expansionismo norte-americano emitidos por Charles Beard em An Economic Interpretation
of the Constitution of the United States; por William Willians em The tragedy of American Diplomacy e por
Robert Gilpin em A economia política das relações internacionais. Nas questões voltadas à análise
hierárquica da sociedade norte-americana e aqui explicitadas, foram adotados os conceitos levantados por C.
Wright Mills, em The Power Elite. De Max Weber, em Ciência e Política, Duas Vocações, foram
emprestados os conceitos funcionais do poder burocrático e tradicional. Na análise historiográfica relacionada
às origens da Guerra Fria e ao papel de um determinado grupo de elite na formulação da política norteamericana do pós-guerra, apesar de aceitar alguns dos conceitos emitidos por autores revisionistas como
Williams, a autora se posiciona principalmente de acordo com as perspectivas lançadas por John Lewis
Gaddis em The Cold War e em The United States and the Origins of the Cold War (1941-1947).
152
Como a ascensão das grandes redes de comunicação em massa e do poder da mídia, ao lado de outros fatores
de igual importância, como o desenvolvimento da tecnologia industrial, a ampliação dos meios de transporte
de massa, do controle da energia nuclear e o crescimento galopante da urbanização.
128
Todos acreditavam na liberdade e na democracia, em vários graus de intensidade - desde os
mais obsessivos, como Forrestal, até os mais autocráticos, como Kennan e Harriman. Alguns
tinham bens materiais de monta e negócios, inclusive, situados na União Soviética, como
Harriman e mesmo assim, usaram e abusaram de políticas econômicas para equilibrar o poder
diplomático. Conflito de interesses? Eles não viam as coisas sob esse prisma.
O que os motivava, aparentemente, não eram somente os impulsos imperialistas ou o medo de
uma crise eminente no sistema capitalista. Apesar de nem todos terem as mesmas origens e
de tecerem considerações bem distintas sobre ideais democráticos puros, eles eram unânimes
em abominar as táticas políticas utilizadas pelo Kremlin e, de forma compreensível, estavam
ansiosos em evitar que se disseminassem.
Em suas mentes, livre comércio, livre mercado e homens livres eram termos intimamente
interligados e indissolúveis. O fato dos Estados Unidos serem os principais beneficiários de
um sistema de mercados livres mundiais era algo bem claro para eles, mas a imbricação dos
interesses pessoais de alguns dos que transitavam entre o governo e a iniciativa privada com
imensa liberdade e naturalidade, não se lhes configurava como um elemento conflitante com a
ética profissional, ou os tornava menos sinceros na busca de um melhor posicionamento de
seu país no cenário internacional.
Ao desenvolverem mecanismos econômicos para reconstruir e militares para proteger a
Europa contra a União Soviética, por exemplo, a afinidade com as tradições e aspirações
europeias, observadas em Kennan e McCloy (germanófilos), Harriman e Acheson, (anglófilo)
ou Bohlen, (francófilo), pode ter pesado em suas decisões relacionadas à abertura de novos
mercados para as indústrias norte-americanas naquele continente.
A doutrina de contenção soviética adotada por eles refletia uma centralização pragmática de
objetivos: Harriman, Kennan e Bohlen, tendo vivenciado em Moscou a realidade do sistema
soviético, sabiam que era perigoso confiar em excesso em uma cooperação pós-guerra com a
Rússia e gradualmente, ajudados, inclusive, pelas ações beligerantes de Stalin no leste
europeu, persuadiram Acheson, Lovett, McCloy - e Truman, a adotar o mesmo ponto de
vista.
Diretos e objetivos, não se concentraram na discussão da questão ideológica entre capitalismo
e comunismo, mas em conter, com medidas efetivas, a disseminação de um poder contrário
que poderia estreitar a esfera de influencia dos Estados Unidos no restante do mundo. Para
tanto, ampliaram os riscos da ameaça externa para manipular a aprovação da opinião pública
129
e atraíram os representantes no Congresso para essa cruzada. Por algum tempo, foram bem
sucedidos, mas o remédio acabou se tornando mais forte que a doença: lutas internas no
centro do campo do poder levaram ao enfraquecimento dos que ocupavam as posições
centrais e forças opostas se apropriaram das configurações do comunismo como um inimigo
externo, exacerbando-as e utilizando-as contra eles para destituí-los de seus cargos.
Aliás, é interessante observar que a divisão entre populistas e membros do Establishment se
manifesta com mais constância na política dos Estados Unidos do que as manifestas entre
esquerda e direita, ou entre liberais e conservadores. Democratas como Jimmy Carter, Ronald
Reagan, Bill Clinton e Barack Obama – bem como seus predecessores, Franklin D. Roosevelt
e Harry Truman – conseguiram, invariavelmente, chegar á Casa Branca com um discurso
que explorava a seu favor as veias anti-Establishment existentes no seio das grandes massas.
E essa espécie de ressentimento contra o Establishment, aliás, partilhada tanto pela velha,
quanto pela nova esquerda ou direita, pode ser apontada como a causa de muitas das
dificuldades encontradas pelos governos Roosevelt e Truman em lidar com o Congresso.
Num sistema democrático como o norte-americano, a oposição ao governo podia, fatalmente,
afetar muitas das decisões da elite dirigente e nos Estados Unidos, como a ―
voz do povo‖
sempre retumbou com muita força nos salões da Casa Branca e na imprensa nacional, seus
anseios ou receios sempre tiveram razoável influencia sobre o comportamento dos dirigentes
nacionais.
A maioria dos membros do Congresso, como representantes distritais, dedicavam-se quase
exclusivamente a temas locais e provinciais de seus constituintes e por isso,
eram
desprovidos da visão macro que caracterizava a presidência. Política externa - ou o mundo
além das fronteiras do país - para a maioria deles, significava apenas uma intrusão aborrecida
em seus interesses principais, qual seja, nos assuntos internos do país e especialmente, nos
relacionados às regiões que representavam153.
Como consequência da forte influência que a opinião pública exercia sobre seus
representantes, governantes democratas como Roosevelt e Truman ou os republicanos, em
geral, tiveram sérias dificuldades para equacionar questões internas com as externas durante
153 Comentário de Dean Acheson em Present at Criation. New York: W W Norton & Company, 1987, p. 99,
citando suas próprias relações com o órgão representativo do povo norte-americano.
130
seus governos154. Em anos eleitorais, em especial, era mais difícil ajustar decisões políticas
com a vontade popular e muitas das decisões presidenciais - nem sempre adequadas para
estadistas, mas necessárias para políticos – tiveram um impacto decisivo na história das
décadas seguintes155.
Além de apontar para todos os problemas que Roosevelt e Truman tiveram que contornar para
manter uma prática de governança adequada às novas configurações internacionais sem
melindrar a opinião publica que mantinha seu Partido no poder, a análise dos Quadros de
Origens e Trajetórias permitiu identificar que boa parte das hostilidades enfrentadas por
Acheson, McCloy e por seus companheiros na consecução dos projetos de contenção no
governo, origina-se em outra característica que definia esse grupo.
Como não dependiam pessoalmente do voto popular ou distrital, nem dos proventos do cargo
que ocupavam, os servidores políticos que atuavam nos altos círculos do Departamento de
Estado eram decididamente não-populistas e, enquanto elaboravam executavam as políticas
relacionadas ao leste Europeu e ao sudeste asiático, ou criavam organismos como o Plano
Marshall ou a OTAN para lidar com os soviéticos, mantiveram-se desdenhosamente alheios
às pressões da opinião pública e à sua expressão no Congresso.
Observe-se, no entanto, que o uso do termo não-populista não implica, necessariamente, que
fossem autocráticos no sctrictu sensu da palavra, mas que lidavam com as massas a partir de
um ponto de vista elitista. Apesar das muitas diferenças de opinião que havia entre o grupo de
elite que ocupava o poder, todas as decisões e medidas adotadas em relação à política externa
sempre foram exaustivamente discutidas pelos membros do Departamento de Estado, tanto
154 Como John Lewis Gaddis afirma no prefácio de The United States and the Origins of the Cold War.
New York: Columbia University Press, 2000, implicando que muitas das decisões da presidência relacionadas
à Guerra Fria foram muito mais influenciadas por cobranças internas dos eleitores, do que por
aconselhamento de sua acessória técnica.
155 A decisão da criação do Estado de Israel, por exemplo, foi tomada em 1948 num momento delicado da
campanha de Truman para se reeleger. Os ingleses haviam encaminhado a questão palestina para a ONU e
haviam planejado deixar o território em 15 de maio. A luta entre palestinos e judeus estava se acirrando dia a
dia. Apesar do aconselhamento contrário de todos os oficiais do Departamento de Estado consultados sobre a
questão (Marshall, Lovett, Forrestal, Kennan), que mais pragmáticos que anti-semitas, consideravam a criação
de um estado judeu no Oriente Médio um tremendo risco para a segurança nacional dos Estados Unidos, o
presidente Truman queria ajudar a criar o novo país por motivos humanitários. Além de considerar justo que
após tantas perseguições o povo judeu merecesse um território próprio, ele também e sofria enorme pressão
dos grupos judaicos norte-americanos que ameaçavam retirar seu apoio financeiro e político à campanha de
reeleição e ele precisava deles desesperadamente para vencer nas urnas Thomas Dewer, o popular governador
de Nova York. De maneira geral, Truman sempre concordava com a opinião de seus conselheiros sobre
política externa, mas o caso de Israel foi uma exceção e em 15 de maio de 1948, os Estados Unidos tornaram
público o reconhecimento. ISAACSON & THOMAS, Op. cit., 1986.
131
em encontros informais, quanto documentalmente, como foi possível constatar com a leitura
de centenas de memorandos e relatórios que discutiam propostas como a criação do Banco
Mundial, do Plano Marshall ou da CIA156.
Nem sempre havia consenso entre eles, obviamente e, apesar de no dissenso prevalecer a
opinião da fração dominante nos Departamentos de Estado ou da Defesa, haviam questões
que eram postergadas indefinidamente até que se chegasse a um denominador comum 157. No
entanto, como a maior parte deles comportava-se de forma elitista em relação às massas e a
seus representantes, foi justamente necessidade intelectual de justificar as ações do governo
na área externa de forma racional e lógica com um discurso convincente para as grandes
massas, que vinculou George Kennan - um agente de claramente destoante desse grupo de
elite – a seus interesses políticos.
Os membros do Establishment ou dessa elite não eram adeptos a uma única ideologia
partidária, nem ideologia partidária era uma força motriz que impulsionasse suas vidas 158.
Preocupados com a visão macro do cargo, abominavam os exageros da esquerda e da direita,
desprezavam os fervores ideológicos e suas ações valorizavam, acima de tudo, o
pragmatismo, o realismo, a moderação e o consenso.
Apesar das diferenças significativas que os caracterizava e os distribuía em frações distintas
no interior do campo político, havia algumas premissas básicas que eram partilhadas por
todos os pesquisados. A mais importante dentre elas era a oposição absoluta ao isolacionismo
que marcara a política externa das administrações anteriores.
156 Fato que pode ser constatado pelas estratégias criadas por Acheson e Marshall para promover a aprovação
do Plano Marshall no Senado e nos vários memorandos elaborados pela burocracia do Departamento de
Estado e disponíveis nos arquivos do NARA. Disponível em http://www.archives.gov/research/arc/. Acesso
em 07/03/2011.
157 A criação da CIA a partir de algumas unidades que foram preservadas da OSS e toda a discussão em torno
de ―
guerra política‖ estimulada pelos Departamentos de Estado, Defesa, FBI e militares em geral e
formalizada por um memorando de Kennan em 1947, exemplifica claramente esse processo, que pode ser
observado em memorandos trocados entre departamentos, secretarias e conselhos, referentes à criação da
CIA, e que estão disponíveis em http://www.state.gov/www/about.state/history/Intel/intro6.html, com acesso
em 02/02/2010.
158 Mais do que um princípio, o apartidarismo praticado pelos democratas Roosevelt e Truman foi uma tentativa
pragmática de obter aprovação para seus projetos em Congresso hostil, com oposição majoritária. Os dois
únicos cargos públicos ocupados por John McCloy ou por Robert Lovett, ambos republicanos, foram em
governos democráticos. Henry Stimson, Secretário da Guerra e Frank Knox, Secretário da Marinha durante a
administração Roosevelt, eram, igualmente, membros influentes do Partido Republicano e foram escolhidos
para esses cargos para diminuir as críticas republicanas contra os esforços que o Presidente fazia para ajudar
os ingleses durante os primeiros anos da 2ª. Guerra. ISAACSON & THOMAS. Op. Cit., 1986.
132
Os servidores burocráticos e políticos que cercavam Roosevelt e Truman eram diplomatas
primordialmente internacionalistas e todos se sentiam diretamente comprometidos com as
mazelas mundiais. Acreditavam que o papel de liderança a ser exercido pelos Estados Unidos
- e por eles próprios – na constituição de um mundo melhor fazia parte de um destino moral
inevitável159. Atiravam-se afoitos aos problemas do mundo, acreditando-se depositários da
honra nacional e comprometendo-se pessoalmente com a liberdade do todos os povos. Esse
era o primeiro fator.
Em seguida, vinha o comprometimento com os interesses que os levaram a perseguir ou a
aceitar os cargos que ocupavam. Exceto Bohlen e Kennan, que eram servidores burocráticos
de carreira, todos os demais eram egressos de grandes escritórios jurídicos ou de investimento
que atuavam em Wall Street -
ou membro das Forças Armadas, como Marshall. Aos
primeiros, como já se observou em capítulos anteriores, não cabia determinar as políticas a
serem seguidas, mas fornecer recursos para que pudessem ser executadas.
Já aos demais, estava reservada a missão de – ―
além de serem depositários da honra nacional
e comprometer-se pessoalmente com a liberdade de todos os povos‖ - utilizar a máquina do
Estado para determinar práticas políticas que atendessem aos seus interesses privados ou aos
interesses de suas empresas. Ou seja, para abrir os mercados externos para a produção
americana, instalar bases militares em postos estratégicos para defesa e controle de matérias
primas necessárias para a manutenção de seu crescimento industrial e dispor de poder de
decisão em órgãos supra-nacionais que controlassem a economia e a segurança de todos os
países ocidentais – interesses claramente internacionalistas e muito distintos do regionalismo
isolacionista de seus antecessores.
Como também já se observou anteriormente, a constituição norte-americana foi elaborada por
uma elite burguesa que se esforçou por fazer prevalecer entre os norte-americanos a ideia de
que propriedade privada e defesa dos direitos do indivíduo estava acima dos interesses
nacionais. Portanto, era-lhes natural que os preceitos elaborados no Longo Telegrama,
perfeitamente adequados para preservar os interesses e a segurança nacional dos Estados
159
Em sua biografia, Dean Acheson deixa bem claro esse conceito de ―
dever‖ para com o próximo e
principalmente, para com a coisa pública. Ele considerava a ―
criação‖ de uma nova forma de política externa
uma missão de enorme responsabilidade moral para todos os envolvidos e quando solicitado, abandonou sem
titubear uma lucrativa prática jurídica privada e dedicou-se ao cargo público com o maior empenho possível.
Vide em ACHESON, Op. cit. 1987, p. 162 e 163.
133
Unidos contra a indesejada expansão de um inimigo poderoso e ideologicamente contrário,
também beneficiasse os seus próprios interesses.
A Doutrina da Contenção, diferentemente da prática que até então havia sido adotada pela
diplomacia norte-americana, dava-lhe um objetivo mundial: limitar a todo custo e em todo o
globo, a expansão do comunismo soviético, fosse por meio de força, fosse por meio de
diplomacia, fosse por outros meios, não confessáveis ou publicáveis. Era justamente essa
premissa internacionalista que direcionaria todas as ações políticas dos pesquisados, formando
um credo consensual de política externa que prevaleceria por quase uma geração e que, apesar
de legar algumas heranças indesejadas à posteridade - a saber, o envolvimento destrutivo com
o Vietnam, as dificuldades com a China ou os desencontros com Cuba - continuaria a ser
aplicada, até muito recentemente, com diretrizes muito similares às concebida por eles.
134
Conclusão
A proposta desta pesquisa não foi descobrir responsabilidades sobre a Guerra Fria, nem
estabelecer suas origens, já suficientemente discutidas por boa parte dos autores relacionados
à historiografia do período. O que se pretendeu foi analisar as trajetórias de uma elite de
servidores públicos do governo Truman que influenciaram diretamente na elaboração da
política externa dos Estados Unidos pós-guerra e por meio delas, procurar identificar as
estratégias que utilizaram para atingir seus objetivos de ascensão política e de legitimar a
hegemonia dos Estados Unidos no cenário internacional.
O que se constatou, a partir dos dados levantados, foi que parte da elite que tomava as mais
importantes decisões nos Departamentos de Estado e Defesa dos Estados Unidos nos
primórdios da Guerra Fria logrou, efetivamente, atingir posições centrais no campo político
em consequência de uma série de transformações estruturais sofridas pelo Estado durante as
décadas de 1930 e 1940, mas não exatamente na proporção que a autora esperava encontrar.
O cruzamento das trajetórias dos pesquisados permitiu concluir que o poder de tomar decisões
de caráter nacional e internacional estivera, até o inicio do século XX, efetivamente centrado
exclusivamente nas mãos de uma elite tradicional, poderosa econômica e socialmente, mas
que, após os anos 1930, a sociedade norte-americana assistiu à emergência de uma nova elite
de administradores, muito bem posicionados em instituições políticas, econômicas e militares
e com livre trânsito entre suas instâncias e as do Estado.
Em termos políticos, com algumas exceções dentre o grupo de pesquisados - como McCloy e
Lovett - a maioria dos membros da elite que cercou Truman nos anos 1940 eram democratas.
Seu partido havia afastado os republicanos do poder na década de 1930 com um discurso de
reconstrução nacional e assumido o controle do Estado e de suas estruturas visando
modernizá-lo de acordo com sua visão de mundo.
Durante a Grande Depressão, confirmou-se que a criação de várias instituições de assistência
ao emprego, de alívio aos mais pobres e de incentivos à produção favoreceu à criação de uma
nova estrutura burocrática e que, em seus cargos principais, foram assentados os aliados que
apoiaram o Partido em seu projeto de dominação. Como a convocação de quadros
administrativos representando todas as classes poderia reforçar a legitimidade do projeto de
poder partidário, levantou-se a hipótese de que esse foi um dos fatores que levou os altos
ocupantes de cargos eleitos a selecionarem acólitos para os cargos de sua confiança não
135
apenas
em critérios fundados na hereditariedade ou em privilégios, mas também na
meritocracia de membros brilhantes de outras classes.
Supunha-se que a emergência de novas elites poderia ser mais facilmente identificada se a
trajetória de seus membros fosse comparada quando estruturas sociais ou políticas sofressem
transições históricas importantes, como as que se observou ocorrer entre 1945-50 já que,
nesse período, uma série de eventos internos e externos desencadeados por decisões e
interpretações conflitantes de ambos os lados, levou Estados Unidos e a União Soviética
criarem uma bipolarização que desembocou na Guerra Fria.
Esperava-se igualmente, confirmar o fato de que, nos Estados Unidos, a crise institucional
provocada pela quebra da Bolsa de Nova York havia quebrado a espinha dorsal das grandes
lideranças econômicas e políticas tradicionais e ensejado a emergência de uma nova camada
de elite oriunda da recente elite industrial, ou dos impérios de transportes, ou principalmente,
das instituições burocráticas políticas que davam suporte aos programas de auxilio social e de
segurança nacional, criados pelo New Deal. Supunha-se que um número significativo de
indivíduos sem grande tradição social ou econômica foram catapultados aos altos círculos
financeiros ou burocráticos da nova política nacional, disputando em condições de igualdade
o mercado dos altos cargos públicos com os bem-nascidos por terem acumulado um volume
considerável de capitais simbólicos.
Os capitais simbólicos acumulados por esses indivíduos foram representados nesta pesquisa
pelas relações sociais que travaram em ambientes universitários de elite, em fraternidades
sociais - como os clubes masculinos, de filantropia ou de classe da Costa Leste - e em
escritórios de advocacia ou financeiros influentes de Wall Street. Por terem acesso a esses
ambientes através de uma série de estratégias pessoais, acreditava-se que os capitais
simbólicos acumulados foram aplicados na negociação dos postos gerados pela burocracia do
New Deal e esperava-se que, dessa forma, uma camada significativa dessas classes tivesse
ascendido ao poder.
Supunha-se igualmente, que a ascensão de membros das classes menos privilegiadas em uma
escala maior do que a tradicionalmente presente no governo, teria sido responsável pelas
transformações estruturais ocorridas na política externa de Roosevelt e Truman, pois sua visão
de mundo era menos conservadora e portanto, mais adequada às novas circunstancias
históricas criadas pela crise do capitalismo, pela emergência de estados totalitários de direita e
de esquerda na Europa e na União Soviética, pela aceleração da produção industrial nas
136
potencias centrais e pelo consequente aumento, tanto das forças operárias em todo o mundo,
quanto da demanda por commodities e recursos energéticos.
Nem todas essas hipóteses, no entanto, se confirmaram tal como esperado.
Em termos do aumento percentual esperado de membros de camadas inferiores no governo e
comparando os dados estatísticos de uma pesquisa 160 feita no principio dos anos 1950 com as
trajetórias dos sujeitos deste trabalho, observou-se que as transformações ocorridas na
hierarquia das elites do poder ensejadas pela crise dos anos 1930 tiveram um caráter muito
mais institucional do que social. Apesar de a crise ter afetado de forma significativa as
estruturas da riqueza tradicional norte-americana verificou-se, no grupo pesquisado, não ter
havido uma alteração muito sensível no volume da elite política em si, mas que a nova
burocracia estatal e suas exigências técnicas favoreceram o surgimento de mais um canal de
acesso a elas, além da riqueza ou da notoriedade: o conhecimento.
Qual seja, se para superar a crise econômica que se abateu sobre o país, o Estado criou
milhares de cargos burocráticos nas instituições públicas - voltados para a reconstrução
nacional, para a criação de empregos e para a assistência aos mais necessitados - seus
membros mais elevados, diretamente vinculados aos altos círculos do governo e
independentemente de origens sociais lograram acumularam tanto poder que, ao invés de
nivelarem as relações de domínio político em patamares mais democráticos, simplesmente
passaram a ocupar o espaço que havia sido deixado vago pelos membros da hierarquia
proprietária tradicional falida com o colapso econômico.
Deve-se ressalvar, no entanto, algumas diferenças entre dois grupos de elite que partilhariam
o poder na administraçãoTruman: enquanto algumas parcelas das elites de poder tradicional
ainda mantinham seus cargos de confiança na estrutura pública de forma quase hereditária, os
membros emergentes que ascenderam à nova elite do poder apresentavam um caráter
meritocrata e, para se manterem no poder, dependiam de suas qualificação e de capitais
160 A pesquisa em referencia foi feita por Wright Mills para determinar quem compunha a elite do poder dos
Estados Unidos na década de 1950. Seu critério para a composição da cúpula política foi o levantar as origens
de 513 membros da elite política norte-americana, eleitos direta ou indiretamente pela sociedade, tais como
Presidentes e Vice-presidentes da República, presidentes do Congresso e do Senado, membros do Alto
Gabinete presidencial e juízes da Suprema Corte que ocuparam seus cargos entre 1789 e 1953, não estando aí
incluídos os representantes do legislativo, com exceção de seu presidente. A idéia era de, efetivamente,
elencar apenas a elite, ou seja, aqueles que efetivamente chefiavam politicamente o poder formal. MILLS,
Op. cit, 1956, p. 277 - 280.
137
simbólicos tanto quanto dos interesses tradicionais colocados em jogo nas estruturas
partidárias ou econômicas nacionais.
A pesquisa de Wright Mills citada no início deste capítulo constatou que em 1953 seis em
cada dez membros da cúpula política nacional haviam usufruído de uma juventude
confortável e que seus pais eram prósperos, ricos ou influentes em suas comunidades locais.
O fato de pertencerem a famílias mais tradicionais ou distintas161 os havia direcionado para
escolas exclusivas e diferenciadas e, mesmo não sendo primogênitos, para carreiras
específicas em grandes firmas jurídicas ou financeiras, quando não em grandes
conglomerados emergentes – químicos, de transportes, de comunicação e até mesmo, de
armas162.
Desses seis políticos pertencentes às camadas mais elevadas da sociedade, aproximadamente
três (28%) eram oriundos de classes superiores como os latifundiários, os grandes
comerciantes, os industriais e financistas de destaque, ou os membros de família profissional
de grande fortuna. Os outros três (30%), pertenciam à classe média próspera, formada por
homens de negócios, agricultores e profissionais liberais muito bem sucedidos que, embora
não gozassem de notoriedade nacional, tinham grande prestígio regional.
Os quatro (42%) restantes não pertenciam à nata da sociedade: dois (24%) eram originários da
classe média remediada e seus pais ou eram pequenos homens de negócios, pequenos
agricultores e advogados ou médicos de pouca projeção, ou estavam mortos quando o
estadista concluiu seus estudos, deixando a família – anteriormente mais próspera – em
situação menos confortável, apesar de razoável.
Os dois últimos membros do grupo pesquisado por Wright Mills (18%) teriam origens em
classes definitivamente inferiores: ou eram filhos de pequenos comerciantes ou lavradores que
viviam com dificuldade, mas que conseguiam manter-se acima da linha da pobreza por
intermédio de trabalho braçal (13%)
ou eram filhos de trabalhadores assalariados ou
agricultores realmente muito pobres (5%).
161 O grupo de famílias mais ricas e poderosas dos Estados Unidos no período pesquisado por Wright Mills
compunha de 5 a 6% da classe superior norte-americana. Op. cit. Idem.
162 Seria interessante observar que não há, dentre as grandes famílias proprietárias dos impérios formados com
o complexo-industrial militar, um número significativo de membros que tenham se dedicado à politica, sendo
uma prática bem mais comum no setor apoiar a campanha de representantes públicos que ocupassem postos
chaves em comitês relacionados às contratações de seus produtos.
138
Se compararmos os dados acima com a configuração social dos dez políticos das altas
instancias públicas pesquisados neste estudo poderemos confirmar os resultados encontrados
por Wright Mills e identificar seis dos pesquisados que pertenciam ao grupo que tivera
―
juventude despreocupada e pais prósperos e influentes‖. Roosevelt pertencia ao grupo dos
muito ricos da elite burguesa tradicional e Harriman aos bilionários emergentes da indústria
de transportes; Marshall, Lovett e Acheson à classe próspera de famílias bem sucedidas e
conceituadas e Bohlen, às famílias distintas socialmente, mas decadentes economicamente.
Os outros quatro membros das camadas interiores seriam representados por Kennan, que
pertencia à classe remediada, pois seu pai fora apenas um advogado de pequena projeção em
Milwakee; por Truman, cuja família era composta de pequenos lavradores do Kansas que,
apesar de pobres, viviam com alguma dignidade acima da linha da pobreza e por Forrestal e
McCloy, que mesmo filhos de pais assalariados e irremediavelmente pobres, conquistaram
espaço entre a elite por mérito exclusivo de seu profícuo trabalho intelectual.
Considerando os argumentos acima, conclui-se que a segunda hipótese levantada no início
desta pesquisa, qual seja, a de que as camadas médias oportunizaram as rupturas causadas
pela crise de 1929 para chegar ao poder em grande escala, não se confirmou plenamente. O
percentual de membros da elite tradicional no poder se manteve razoavelmente semelhante
aos níveis observados em décadas anteriores a 1930 e os casos de ascensão política de
membros das camadas inferiores, como a de Kennan Truman, Forrestal ou McCloy –
extraordinárias em si, coadunavam no entanto, com o caráter da política americana e com os
percentuais estatísticos esperados em um país com raízes democráticas tão fortes.
Por outro lado, considerando a hipótese seguinte de que o período de Kennan constitui-se em
uma transição entre duas elites distintas de poder, não há como negar que a ameaça
representada pela expansão da ideologia soviética foi um importante fator de propulsão na
formação de elites com imenso poder burocrático, político e, após Kennan, militar. Não
apenas nos setores militaristas, representados por Forrestal e Marshall neste trabalho,
diretamente interessados em não permitir o desmonte das estruturas das forças armadas
nacionais após a Segunda Guerra, mas também no impulso que foi dado às carreiras públicas
de Lovett,
McCloy, Acheson, Bohlen e especialmente, de Kennan, com a criação de
organismos institucionais contencionistas como o Banco Mundial, o Plano Marshall e a CIA e
de cargos como o de Secretario de Assuntos Soviéticos ou o de Chefe do Planejamento
Político no Departamento de Estado.
139
O discurso muito bem articulado de Kennan, de que os soviéticos representavam uma séria
ameaça à segurança nacional e que precisavam se contidos pontualmente onde quer que se
manifestassem foi fundamental para que os internacionalistas sacudissem a letargia
isolacionista que prevalecera por décadas no país e obtivessem a adesão da opinião pública
para seus projetos. É importante recordar aqui o caráter democrático do país e portanto, a
dependência que os dirigentes eleitos tinham da aprovação pública para lograrem não apenas
colocar em prática suas propostas de governo, mas principalmente, para manterem a
hegemonia de seu partido no poder.
A reação política do governo Truman à ameaça soviética teria sido, como se constatou na
evolução das trajetórias dos pesquisados, o elemento catalisador que forneceu ao governo a
aprovação do Senado aos orçamentos necessários à criação das instituições contencionistas e
a adesão popular àquela linha de política externa, mesmo que gerada pelo medo.
Independentemente das questões econômicas que alavancaram inicialmente as propostas
internacionalistas – mercados de consumo europeus e asiáticos e garantia de continuidade do
fluxo de recursos energéticos e de matérias primas externos – observou-se igualmente que a
necessidade do governo em obter o apoio popular por meio da argumentação teórica eficiente
de Kennan apresentou efeitos colaterais inesperados. Geralmente, como se pode observar em
outros exemplos históricos recentes163, não é difícil persuadir as massas a confiar maiores
poderes e recursos institucionais a seus governantes para que estes defendam suas famílias de
ameaças externas.
Mas não em países democráticos, principalmente, que têm que lidar com essa situação de uma
forma muito mais convincente do que os de caráter autoritário e que são obrigados a
equacionar adequadamente o grau de medo a ser gerado em seus discursos alarmistas. Se a
ameaça externa não for suficientemente forte para motivar as massas a lhes dar suporte, os
governantes democráticos ficarão impedidos adotar as medidas planejadas. Se anunciada com
cores exageradas, a eventual ameaça pode provocar pânico coletivo, tendendo a rumos e
proporções inesperados e podendo levar a radicalizações sobre as quais os governantes podem
perder o controle.
163 Em termos contemporâneos, é possível citar a atitude adotada nesse sentido pelos governos fascistas e
comunistas estabelecidos na Itália, Alemanha e União Soviética. Mussolini e Hitler usaram a crise do
capitalismo da década de 1930 e a ameaça representada pelo fortalecimento dos movimentos operários para
obter a adesão da burguesia a seu projeto totalitário de governo. Stalin, por sua vez, apoiou-se na ameaça
representada pelos países capitalistas à ditadura do proletariado para centralizar poderes ilimitados em suas
mãos.
140
De uma forma muito peculiar, foi a segunda hipótese que se manifestou nas relações entre o
governo e a sociedade norte-americana nos primeiros anos da Guerra Fria. A princípio, as
propostas envolvidas na política contencionista de Kennan pareceram a Truman, ao partido
Democrata, ao Departamento de Estado e ao Departamento da Defesa e mesmo à opinião
pública em geral, uma solução extremamente oportuna para reagir às atitudes de Stalin no
Leste Europeu e para favorecer o projeto internacionalista. No entanto, em pouco menos de
um lustro, começaram a surgir divergências não apenas no interior do Departamento de
Estado sobre o grau efetivo de coerção que o contencionismo deveria exercer nas relações
com a União Soviética, mas também no seio da sociedade norte-americana.
Alguns pretendiam que a coerção tivesse um caráter mais incisivo do que o previamente
estabelecido por Kennan. Em virtude da crescente inversão da disposição amigável que a
sociedade norte-americana apresentara em relação aos soviéticos durante e imediatamente
após o fim da Segunda Guerra, temia-se nos últimos anos da década de 1940 que a aplicação
exclusiva de medidas diplomáticas ou políticas contra os russos, sem uma retaguarda militar
adequada para intimidá-los, pudessem gerar insegurança entre os formadores de opinião e ao
público em geral - genuinamente aterrorizados com a possibilidade de um ataque soviético –
além de tornar o Kremlin ainda mais audacioso em suas investidas contra o Ocidente.
Por outro lado, também havia fortes vozes dissidentes contra uma escalada armamentista,
principalmente em virtude das enormes perdas humanas e materiais sofridas durante a
Segunda Guerra. O fato dos isolacionistas ainda contarem com muitos adeptos, com um
grande volume de votos e com numero significativo de representantes no Congresso Nacional
dificultava a ação governamental, forçando o Presidente a dispender esforços políticos
dobrados para atender aos interesses de ambos os lados.
Para gáudio dos internacionalistas, uma série de atitudes de Stalin após a Segunda Guerra –
ocupação autoritária do Leste Europeu, incentivo encoberto aos movimentos operários em
países europeus devastados pela guerra (como Itália, Turquia e Grécia), apoio à Revolução
Chinesa, dentre outras - contribuiu oportunamente para que o Departamento de Estado
colocasse em prática as medidas contencionistas planejadas sem ferir os melindres pacifistas
da opinião pública e atendendo de forma satisfatória àqueles que demandavam mais atitudes
mais veementes nas questões de segurança nacional.
Após 1950, no entanto, a bipolaridade se acirrou e algumas tendências mais radicais
começaram a delinear-se na no cenário interno e externo, desgastando politicamente
141
contencionistas mais moderados como Kennan e Marshall e definindo a transição do poder
para um novo grupo de aspirantes da elite.
Como se observou na periodização das trajetórias, os desentendimentos de George Kennan
com Dean Acheson o levaram a pedir demissão de seu cargo no início de 1950 e tão logo foi
apeado do PPS, Paul Nitze, um antigo financista de Wall Street que havia sido seu assessor,
recebeu do Secretário de Estado a missão de criar um documento que acentuasse de forma
ainda mais veemente que o artigo ―
X‖ o risco militar representado pelos soviéticos. O que se
pretendia, conforme assumido por Acheson muitos anos mais tarde, era dar elementos à
Presidência para que esta pressionasse o Congresso a aumentar o orçamento militar
severamente limitado após a guerra164 sem provocar a ira da opinião pública contra tais
medidas.
Obedientemente, Nitze produziu o NSC-68165, no qual reforçava a iminência de uma invasão
soviética e recomendava que, para contê-la, medidas econômicas e políticas, como as até
então sugeridas e aplicadas por Kennan, só seriam eficientes se tivessem o apoio de uma
considerável força militar. Para ele, a melhor forma de se evitar uma guerra nuclear era
preparar-se para ganha-la, mantendo-se militarmente à frente dos adversários166.
Pressionado pela opinião pública - que o acusava de leniência em relação ao agravamento dos
problemas no Oriente com a China e com a Coréia - o Secretário de Estado Dean Acheson
tinha consciência de que havia um certo exagero na peroração do novo Chefe do
Planejamento Político, mas viu-se forçado a adotar as cores fortes de seu discurso, pois o
acreditava eficiente na dissuasão das massas.
Para o diplomata, o Kremlin tinha por objetivo intrínseco a dominação mundial e como
adotava medidas de força para eliminar qualquer oposição efetiva a seus interesses – interna
ou externamente –procuraria, inexoravelmente, destruir seu principal oponente, os Estados
164 Em suas memórias Acheson admitiu que a linguagem utilizada no NSC-68 era um tanto hiperbólica, mas
considerava-a necessária para assustar os altos círculos do governo. Assim, não apenas o presidente seria
levado a agir de forma peremptória contra os russos, como as ações contencionistas aprovadas pelo Congresso
também teriam o apoio de todas as camadas da sociedade. Acheson acreditava, no entanto, que os termos
explícitos no documento e as propostas agressivas que fazia jamais teriam sido levados efetivamente a sério
pela sociedade americana ―
se os russos não tivessem sido estúpidos o suficiente para instigar o ataque contra a
Coréia do Sul, abrindo a campanha do ódio americano‖. ACHESON, Op. cit., 1969, p.374
165 O documento, intitulado Objetivos e Programas para a Segurança Nacional, foi produzido por Paul Nitze
para o National Security Counsel (NSC) em abril de 1950 e ficou popularmente conhecido como NSC-68.
166 THOMPSON, Nicholas. The Dove and the Hawk: Paul Nitze, George Kennan and the history of the
Cold War. New York: Henry Holt and Co., 2009.
142
Unidos. Segundo os cálculos de Paulo Nitze, os russos acumulariam capacidade atômica
superior à dos americanos por volta de 1954 e só poderiam ser contidos se os Estados Unidos
ampliassem substancialmente suas defesas terrestres, aéreas e navais, seu arsenal nuclear e a
defesa civil imediatamente.
O documento foi entregue a Truman em abril de 1950, fechando o ciclo de descenso que os
contencionistas moderados sofreram a partir da morte de Forrestal em maio do ano anterior e
encerrando o período de transição em que a Guerra Fria havia sido definida. Em junho, a
Coréia do Norte atacou a Coréia do Sul.
Talvez o NSC-68 não tivesse sido a melhor solução para o problema que os norte-americanos
tinham em mãos, mas era um roteiro de ação que já havia estava escrito e que de certa forma,
alertara para acontecimentos como aquele conflito. Também pressionado, o National Security
Counsel (NSC) aprovou o projeto em setembro e imediatamente - para prover recursos não
apenas para combater a Coréia do Norte, mas também para contrapor-se ao comunismo em
qualquer lugar em que essa ideologia se manifestasse – o orçamento de Defesa alcançou as
alturas e não baixou mais por muitas décadas.
O ciclo de Kennan terminara e a política externa norte-americana passou a ser aplicada a
partir da visão maniqueísta de Nitze: toda e qualquer luta em países que fizessem parte das
áreas de influência norte-americanas ou soviéticas, seriam reflexo do ―
conflito implícito‖
entre o ―
mundo livre‖ do Ocidente e a ―
sociedade escravizada‖ que se estendia atrás da
Cortina de Ferro. À nova elite que passaria a controlar a política externa dos Estados Unidos,
caberia o papel de não permitir que essa ―
escravização‖ prevalecesse ou se ampliasse 167.
Os eventos históricos e a trajetória comparada dos pesquisados mais uma vez confirmaram,
portanto, a terceira hipótese deste trabalho. A política de contenção foi colocada em
andamento em função das transformações ocorridas no Departamento de Estado após a morte
de Roosevelt e de Harry Hopkins e foi prestigiada até 1950, quando a escalda da campanha do
ódio e as ações soviéticas no Leste Europeu e no Oriente forçaram a radicalização da opinião
pública contra os russos.
A demissão e morte de Forrestal indicaram a primeira ruptura grave na evolução do projeto de
poder do grupo que apoiava o contencionismo e a expulsão de Marshall e de Kennan do
centro do campo político consolidou sua falência e permitiu a ascensão de uma nova elite do
167 NSC-68. In Naval War College Review. Vol. XXVII (mai-jun/75) pgs. 51-108
143
poder. A era Kennan no Gabinete de Planejamento Estratégico foi, definitivamente, um
período de transição entre duas forças políticas opostas.
Os internacionalistas conseguiram atingir os seus objetivos principais com Kennan,
sobrepondo-se aos isolacionistas e consolidando-se no poder. As perspectivas levantadas pelo
Longo Telegrama, radicalizadas no artigo ―
Origens da Conduta Soviética‖ publicado pela
Foreign Affairs e colocadas em prática por meio das ações diplomáticas do PPS garantiram a
hegemonia norte-americana em todos os mercados ocidentais, bem como asseguraram o fluxo
de matérias primas e de recursos energéticos necessários para alimentar o desenvolvimento
econômico do país, efetivamente contendo o avanço da expansão soviética.
Os acordos firmados com os fragilizados governos europeus permitiram a instalação de bases
militares em dezenas de pontos estratégicos por todo o mundo e o mercado financeiro norteamericano fervilhou com os empréstimos realizados a governos e a particulares que tentavam
revigorar suas economias destroçadas pela guerra. A criação de instituições supragovernamentais chefiadas por representantes dos Estados Unidos garantiu a legitimidade da
dominação de uma elite do poder sobre os assuntos de política externa e permitiu a
consolidação de posições importantes no Departamento de Estado e da Defesa, confirmando a
hipótese inicial de que a Guerra Fria não foi consequência apenas de uma disputa por esferas
de influencia política e econômica, ou um conflito de caráter ideológico, mas também da
necessidade de legitimar no poder uma elite burocrática emergente.
Assim, observa-se que apesar da História sempre fluir como consequência de fenômenos
sociais e políticos muito mais distintos do que os que podem ser controlados por um ou mais
indivíduos, ela também pode ser construída pela ação de pessoas que tomam decisões e que
podem formar e transformar a estrutura econômica.
Qual seja, por mais distintas que tenham sido suas origens, trajetórias, interesses, estratégias
ou motivações, entre os anos 1945- 1950, o pequeno grupo que partilhou do poder no
Departamento de Estado e da Defesa, constituiu-se uma elite diferenciada e, no conjunto, a
soma de sua influencia como meros indivíduos permitiu que criassem e consolidassem muitas
das instituições que atualmente fazem parte da vida contemporâneo, dando-lhe novas formas e
perspectivas.
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