do IST diz que as universidades têm interesse em que
fique excluído de uma formação por motivos económicos
O professor
ninguém
Como a universidade
discrimina os pobres
José
Maria CS. André
aurent Lafforgue é um matemático célebre e relativamente jovem. Começou a receber prémios mundiais de matemática
nos últimos anos do liceu e depois continuou a somar: a Clay Research Award e,
mais recentemente, a medalha Fields, o
máximo galardão das matemáticas. Fora
do âmbito científico, Lafforgue ficou conhecido pela defesa da qualidade do ensino. Só essa qualidade permite que as crianças pobres
cheguem ao topo da cultura, só ela integra os filhos dos
imigrantes, só ela democratiza a sociedade. Quando o
ensino se degrada, como aconteceu em França a partir
dos anos 30, alguns dos mais ricos conseguem escapar,
mas a sociedade, no seu conjunto, é enganada: sem se
perceber porquê, no topo da universidade
aparecem
quase só os ricos. Esta exclusão não acontecia quando o
ensino tinha qualidade, mas passou a verificar-se quando se degradou. O problema que Laurent Lafforgue reconheceu em França, está a verificar-se em Portugal e
posso testemunhar esta experiência com muitas histórias.
Desde há muitos anos, o Técnico elabora relatórios
acerca do sucesso dos alunos. Uma vez, a responsável
desse gabinete tentava identificar as circunstâncias
que
favorecem o êxito escolar e eu disse, ingenuamente, o
que vem nos manuais: a variável que melhor correlaciona é o nível de escolaridade da mãe. Por exemplo, se a
mãe tem um curso superior os filhos têm, estatisticamente, melhor aproveitamento. Ainda hoje me lembro
da resposta: normalmente é assim, mas no Técnico
esse critério dificilmente
se aplica, pois mais de
metade das mães dos alunos têm um curso superior.
Quem trabalha no Técnico sabe perfeitamente que são raros
os alunos oriundos
de famílias com um
nível cultural pouco
elevado, ou com dificuldades
económicas. É uma boa notícia, o problema é que a sociedade tem sobretudo famílias de poucos recursos e
o facto de não estarem re-
presentadas
significa
que há uma discriminação efetiva e não estamos a promover a ascensão
social
dessas
pessoas. Como é sabido, o Técnico procura
apoiar os alunos com dificuldades económicas, psicológicas, ou outras. Mas a verdade é que a percentagem de
alunos realmente pobres é ínfima. Basta percorrer os
olhos pela turma e contabilizar quem anda de automóvel ou passa férias no estrangeiro. Na altura em que se
permitiu às faculdades cobrar uma propina um pouco
maior, o Técnico optou, sem hesitar, pelo escalão superior. A Associação de Estudantes protestou energicamuito participado pelos
e lançou um inquérito,
alunos, a perguntar: tiveste dificuldade em pagar? A propina limitou-te? A resposta esmagadora foi: não tive dificuldade, nem me privei de nada. A Associação afixou os
resultados nos placarás e nunca mais houve protestos
mente
por causa das propinas.
As universidades
têm todo o interesse em que ninguém fique excluído de uma formação mais completa
por motivos económicos. O problema é que os alunos
cujas famílias têm menos posses não estão a ser excluídos por falta de bolsas, mas por não terem notas
suficientes. Quer dizer, de um modo geral, o péssimo
funcionamento do ensino primário e secundário é disfarçado graças à inflação das notas e à passagem dos
alunos mal preparados...
até chegarem aos exames
nacionais e não conseguirem
entrar nas faculdades
exigentes.
As famílias desafogadas têm meios para escapar a esta
ratoeira. Podem aproveitar umas turmas escolhidas de
certas escolas estatais e, inclusivamente,
podem colocar
os filhos em escolas não estatais. O resultado é que uns
ficam em condições de aceder às melhores universidades e os outros ficam sistematicamente
de fora.
Uma exclusão por motivos económicos choca sempre
a sensibilidade democrática, mas a atual é particularmente dolorosa porque, em certo sentido, as coisas pioraram nos últimos 50
anos. Antes, o acesso ao ensino era
mais restrito, mas havia mais mobilidade social e uma criança pobre podia
chegar ao topo de uma carreira universitária.
Não podemos fechar os olhos à injustias famílias mais pobres a
filhos
os
nas escolas estatais. É
porem
dever do Estado pagar substancialmente o custo da educação, mas cativar essa verba contra a vontade das famílias é um abuso que penaliza (um
pouco) os ricos e expulsa os
mais pobres da universidade e de tudo o que isso significa, perpetuando as deça de obrigar
sigualdades sociais.
É da maior relevância
social apoiar as famílias,
sem as obrigar a escolher
uma escola estatal.
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