Segunda-feira
10 de Agosto de 2015
Jornal do Comércio - Porto Alegre
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Economia
CONSUMO
Alta do dólar deixa brasileiros mais pobres
PIB per capita do País deve passar de US$ 11,6 mil para US$ 8 mil em 2015, aponta pesquisador do Ibre/FGV
Com a recessão se aprofundando, o desemprego em alta e a renda
em baixa, não havia dúvida de que
o brasileiro perderia poder aquisitivo neste ano. Na semana que passou, porém, ficou claro que outro
componente pode comprometer
ainda mais o fôlego financeiro no
Brasil: a insistente alta do dólar.
A moeda americana fechou a
sexta-feira cotada a R$ 3,51, uma
elevação de 2,72% na semana e
de quase 32% no ano. Haverá um
baque inevitável sobre a economia. Na média, a estimativa é que
a capacidade de cada brasileiro de
criar e de usufruir da riqueza do
País vai cair de US$ 11,6 mil, no ano
passado, para a casa de US$ 8 mil.
O efeito do câmbio já vinha
corroendo o poder de compra dos
brasileiros, dentro e fora das fronteiras. Em janeiro, quem foi a Nova
Iorque e comprou o modelo top de
linha do iPhone 6 Plus, desbloqueado, pagou pouco menos de R$ 2,3
mil. Para adquirir o mesmo celular
na última sexta-feira, um brasileiro em visita aos EUA pagou R$ 3
mil, apenas por causa da variação
do câmbio neste ano.
Aqui no Brasil, no mercado
interno, o dólar se entranha sutilmente nos serviços e nos produtos.
Nada menos do que 23 de cada 100
produtos vendidos no País são importados (inteiramente ou parte
deles). Até 77% do insumo de eletrônicos, como computadores e
televisores de LCD, e mais da metade dos insumos de produtos farmacêuticos, como remédios, são
importados, e vêm tendo reajustes.
Uma maneira de medir ganhos e perdas da população com o
câmbio é converter, para dólares,
o Produto Interno Bruto per capita
(PIB per capita). A conta é simples.
O PIB, que indica a geração de riqueza de um País (criada por pessoas, empresas, governo, pela exportação), é dividido pelo número
total de habitantes.
Neste ano, é consenso que o
PIB do Brasil vai encolher. A população, porém, continua aumentando. Numa analogia, o bolo vai ser
menor, mas há mais gente à espera
de um pedaço. A única forma de
dividir é dando pedaços menores
para cada um. Assim, quando o
PIB sofre uma queda, o PIB per ca-
pita cai mais ainda.
A estimativa do PIB per capita de 2015 foi feita pelo economista Claudio Considera, professor de
Economia da Universidade Federal
Fluminense (UFF) e pesquisador
associado do Núcleo de Economia
Aplicada do Instituto Brasileiro de
Economia da Fundação Getulio
Vargas (Ibre/FGV).
Segundo os cálculos de Considera, em valores de 2014, o PIB per
capita nacional tende a passar de
R$ 27,2 mil, no final do ano passado, para R$ 26,4 mil neste ano. Na
média, é como se cada brasileiro
deixasse de gerar e de usufruir de
R$ 830,00 de um ano para outro.
“É claro que, dependendo do emprego e da renda, alguns brasileiros vão ficar bem mais pobres do
que outros, mas, na média, todos
nós ficaremos mais pobres”, diz
Considera.
O PIB per capita é calculado
em reais. No entanto, costuma ser
convertido para dólar para permitir uma comparação com o desempenho entre países. O efeito do
câmbio neste ano será desalentador. A perda vai ser ainda maior
MARCELLO CASAL JR/ABR/JC
Cotação da moeda norte-americana atingiu R$ 3,51 na última semana
do que a vista em reais. O PIB per
capita tende a passar de US$ 11,6
mil, segundo dado divulgado pelo
Banco Mundial em relação a 2014,
para cerca de US$ 8 mil, considerando que, após os solavancos vistos, o dólar termine o ano cotado a
R$ 3,22, média projetada por analistas de mercado no último Boletim Focus, do Banco Central. Visto
assim, é como se quase US$ 4 mil
da riqueza de cada brasileiro fosse
pulverizada.
“O PIB per capita dá uma ideia
da geração de riqueza por habitante”, diz Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados. “Quando ocorre uma queda
na geração dessa riqueza, como a
gente está vendo neste ano e poderá ver no próximo, a perda por
habitante é ainda maior – a percepção de deterioração da economia
se acentua”, diz Vale. A MB projeta
uma queda de 2,1% para o PIB neste ano. Vale estimou que, por esse
parâmetro, a queda do PIB per capita em 2015 tende a ficar em 2,9%.
EMPREGO
Deterioração do mercado de trabalho pode se estender até 2017, estima Ibre/FGV
A deterioração do mercado de trabalho
pode se estender até 2017, afirmou o pesquisador Rodrigo Leandro de Moura, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
Getulio Vargas (Ibre/FGV). Ainda que não
tenha uma previsão fechada de quanto deve
ser a taxa de desemprego daqui dois anos, a
continuidade do aumento é dada como certa. “Com a economia ainda fraca, o desemprego deve continuar subindo”, disse.
Neste ano, a taxa de desemprego deve
atingir 8,3% em todo o País, tendo como
parâmetro a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Será um
recorde na pesquisa, que apontou taxa de
6,8% em 2014. Em 2016, a alta deve continuar, ainda que menos intensa, para chegar a
9,1%. “Nossa previsão até está um pouco otimista para os dois anos. Em 2017, deve continuar o aumento do desemprego. No fim de
2017, pode ser que os empresários voltem a
contratar, mas talvez não haja a pujança de
anos passados, porque o custo de mão de
obra é maior e o mercado está mais formalizado. Será o suficiente para manter a taxa
de desemprego constante”, afirmou Moura.
Um fator negativo, mas que pode provocar a queda da taxa de desemprego a partir
de 2017, é o desalento, apontou o pesquisador. “Isso ocorre quando a pessoa procura
emprego por muito tempo e, sem encontrar,
desiste”, explicou. Caso isso ocorra, será
uma razão não virtuosa para o alívio da
pressão sobre o mercado de trabalho.
No dia 5, a FGV anunciou que o Indicador Coincidente de Desemprego (ICD) avançou 1,2% em julho ante junho, para 90,8
pontos, o maior resultado desde novembro
de 2007, indicando que os consumidores
veem uma piora no mercado de trabalho.
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