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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
FACULDADE DE MEDICINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM SAÚDE PÚBLICA
MUITO MAIS DO QUE PE(N)SAM:
PERCEPÇÕES E EXPERIÊNCIAS ACERCA DA OBESIDADE
ENTRE USUÁRIAS DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE
FORTALEZA - CEARÁ
Orientanda
Maria Soraia Pinto
Orientadora
Profa. Dra. Maria Lúcia Magalhães Bosi
FORTALEZA – CEARÁ
2009
1
MARIA SORAIA PINTO
MUITO MAIS DO QUE PE(N)SAM:
PERCEPÇÕES E EXPERIÊNCIAS ACERCA DA OBESIDADE
ENTRE USUÁRIAS DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE
FORTALEZA - CEARÁ
Dissertação Apresentada por Maria Soraia
Pinto
à Coordenação do Curso de
Mestrado
de
Saúde
Pública
do
Departamento de Saúde ComunitáriaFaculdade de Medicina da Universidade
Federal do Ceará, como requisito para a
obtenção de Título de Mestre em Saúde
Pública sob a orientação da Profª. Drª.
Maria Lúcia Magalhães Bosi.
FORTALEZA – CEARÁ
2009
2
MUITO MAIS DO QUE PE(N)SAM:
PERCEPÇÕES E EXPERIÊNCIAS ACERCA DA OBESIDADE ENTRE USUÁRIAS
DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE FORTALEZA - CEARÁ
Projeto de Dissertação apresentado por Maria Soraia Pinto à Coordenação do Curso de
Mestrado de Saúde Pública do Departamento de Saúde Comunitária - Faculdade de Medicina
da Universidade Federal do Ceará, como requisito para a obtenção de Título de Mestre em
Saúde Pública sob a orientação da Profª. Drª. Maria Lúcia Magalhães Bosi.
BANCA EXAMINADORA
Prof ª Dra. Maria Lúcia Magalhães Bosi
Universidade Federal do Ceará
Orientadora
Examinador 1: Prof ª Dra. Márcia Maria Tavares Machado
Universidade Federal do Ceará
Examinadora 2: Prof ª Dra. Ana Maria Fontenelle Catrib
Universidade de Fortaleza
3
Dedico esta dissertação a minha mãe Laura que
durante o trajeto final deste trabalho enfrentou
momentos angustiantes em sua vida, e ainda assim
encontrou forças para me incentivar na conclusão de
mais este sonho. Obrigada pelo amor incondicional.
“como é grande o meu amor por você”!
4
AGRADECIMENTOS
O processo dissertativo repercutiu em vários aspectos de minha vida. Ele foi permeado por
uma variedade de emoções que transitaram entre dores e delícias. Representou principalmente
o reconhecimento de minhas potencialidades, limitações, incongruências e incompletude.
A dissertação, atrevo-me dizer, é paradoxalmente um processo coletivo e solitário. Coletivo,
porque demanda a participação direta ou indireta de vários atores, no entanto, a redação do
trabalho na maioria das vezes é um processo solitário. Assim se faz necessário a participação
de várias pessoas para a construção solitária do texto.
Essa construção só foi possível devido a uma série de felizes encontros, que agora desejo
agradecer.
Agradeço a Deus pelo Dom da vida e ancoradouro seguro nos momentos mais difíceis.
Agradeço aos meus pais, irmãos e toda a família pelo incentivo, apoio, compreensão, presença
e por fazerem parte de tudo que sou, a todos vocês muito obrigada!
Agradeço ao meu sobrinho Mário Filho pelo design dos slides da apresentação!
Agradeço ao encontro com minha orientadora professora Maria Lúcia Magalhães Bosi, pelo
acolhimento do meu tema e a possibilidade de mergulhar de forma mais profunda no campo
epistemológico da pesquisa qualitativa, por direcionar o estudo, por compartilhar teorias,
práticas e devaneios tão enriquecedores para meu crescimento acadêmico, além de
compreender minhas limitações e incentivar a reflexão sobre as mesmas. Finalmente agradeço
pela solidariedade e compreensão do momento angustiante que vivenciava. Espero que
possamos desenvolver outros projetos no futuro. A você Malu meu muito obrigada!
Agradeço a professora Ana Maria Fontenelle Catrib por aceitar o convite em participar de
minhas bancas de qualificação e defesa e pelas valorosas contribuições ao texto.
Agradecimento especial a professora Márcia Maria Tavares Machado que esteve presente
desde a entrevista do processo seletivo do mestrado, acompanhou o trabalho, esteve em todas
as defesas, incentivou, contribuiu com sugestões valiosas. Obrigada Márcia pelo carinho
dispensado e pela confiança, e que venham novos trabalhos.
Agradeço ao encontro com a turma do mestrado. Pessoas incríveis, sujeitos que
individualmente e coletivamente me enriqueceram muito.
Agradeço ao amigo André, fiel companheiro de orientação, parceiro e ouvinte das
dificuldades enfrentadas e das alegrias conquistadas.
5
Agradeço aos professores que partilharam seus conhecimentos e buscaram despertar em nosso
grupo o interesse pelos mais variados temas da saúde coletiva.
Agradecimento especial ao professor, pensador, filósofo, encorajador e “em síntese” o mestre
Ricardo Pontes. Obrigada pelo incentivo, conselhos e pelas sugestões valiosíssimas ao
enriquecimento do trabalho.
Agradeço a Ana Mary, por partilhar os mais diferentes momentos vivenciados durante esse
processo, amiga de todas as horas, incentivadora , ouvinte paciente, ombro para o riso e o
choro, colaboradora da dissertação, fonte bibliotecária, e neófita forçosa da abordagem
qualitativa. Sua presença foi fundamental, muito obrigada!
Agradeço a amiga Karine, co-responsável pelo título da dissertação, meu obrigada pelo apoio,
paciência, incentivo, pela escuta nos momentos angustiantes e felizes, por tentar me
tranqüilizar ao seu modo, pelas vivências e pelo carinho.
Agradeço às professoras nutricionistas do Curso de Ciências da Nutrição da Universidade de
Fortaleza pelo apoio e compreensão, em especial às professoras Vírginia, Armênia, Laydiane,
Ana Vaneska, Fátima, Daniele.
Agradeço à amiga Mazé incentivadora e propulsora de meu crescimento profissional e
acadêmico.
Agradeço à amiga Suziane que me deu inspiração e apoio para realização do mestrado.
Agradeço às amigas nutricionistas residentes Kelly, Camila e Bianca pelo apoio mesmo que
fisicamente distante.
Agradeço a amiga Diana Cris pelo carinho, apoio e por confiar sempre no meu trabalho. Sua
presença me alegrou muito! Obrigada.
Ao grupo de funcionários do mestrado, as eficientíssimas Zenaide e Dominik, obrigada pelo
acolhimento e pelos serviços oferecidos a nossa turma.
E finalmente um agradecimento mais que especial as mulheres que de forma tão carinhosa me
acolheram em seus lares, confiaram suas histórias e permitiram a realização desta
investigação. A vocês meu eterno obrigada!
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Daquilo que eu sei
Nem tudo me deu clareza
Nem tudo foi permitido
Nem tudo me deu certeza...
Daquilo que eu sei
Nem tudo foi proibido
Nem tudo me foi possível
Nem tudo foi concebido...
Não fechei os olhos
Não tapei os ouvidos
Cheirei, toquei, provei
Ah Eu!
Usei todos os sentidos
Só não lavei as mãos
E é por isso que eu me sinto
Cada vez mais limpo!
Ivan Lins
7
O corpo que vi
Corpo que come
Corpo que engorda
Corpo que emagrece
Corpo que tem história
Corpo que está no mundo
Corpo que tem sintomas
Corpo que chora
Corpo que se mostra
Corpo que se envergonha
Corpo que trabalha
Corpo que gera
Corpo que é máquina
Corpo que é razão
Corpo que é idolatrado
Corpo que é rechaçado
Corpo que (res)sente
Corpo que é símbolo
Corpo que é tudo
Corpo que quer ser respeitado!
Soraia Pinto
8
RESUMO
A obesidade é um fenômeno complexo que acomete uma parcela importante da
população mundial, em especial as mulheres adultas de menor estrato de renda. A obesidade
também pode ser vista como um atributo físico, percebido, interpretado e influenciado pelo
sistema social. O objetivo deste estudo foi compreender as percepções e experiências de
mulheres usuárias de um centro de saúde da família do município de Fortaleza com
diagnóstico de obesidade. Trata-se de uma investigação qualitativa com
enfoque
fenomenológico-hermenêutico, cuja estratégia metodológica adotada foi a articulação entre as
entrevistas em profundidade e a observação livre. Foram realizadas 8 entrevistas com
mulheres entre 28 e 56 anos, com média de idade de 44 anos. Todas apresentavam obesidade
grau II (IMC= 35,0-39,9kg/m2), e referiram a experiência com o excesso de peso há mais de 5
anos, além disso apresentavam hipertensão, diabetes, dislipidemias e problemas
osteomusculares, A maioria era casada, dona de casa e tinham filhos. A média de
remuneração familiar observada foi de um a dois salários mínimos. O nível de escolaridade
ficou entre o ensino médio e o fundamental incompleto. A categorização do material empírico
indicou quatro eixos temáticos, e a partir dos quais foram traçados os eixos centrais de
análise. 1) Auto-percepção do corpo; 2) Etnoetiologia da obesidade; 3) Estigma e as
Repercussões nas distintas esferas da vida; 4) Trilhando os Caminhos da Cura. Cada eixo
temático foi desdobrado em diferentes dimensões. Os resultados revelaram que as mulheres se
percebem com excesso de peso, porém não se classificam como obesas. O uso de medicamentos,
a alimentação e passagens importantes da vida foram consideradas fundamentais para a
explicação do perfil de obesidade no grupo. Sobre as mulheres “pesam” estigmas e discriminações
atribuídos a sua aparência. Finalmente para as depoentes a obesidade é uma doença que tem cura.
Nesse sentido, o estudo chama atenção para importância da multidimensionalidade da obesidade.
Tal compreensão é fundamental para a proposição de planos e estratégias de atendimento no
campo das políticas de saúde.
Descritores: pesquisa qualitativa; mulheres; obesidade; preconceito.
.
9
ABSTRACT
The obesity is a complex phenomenon that occurs in an important parcel of the
world-wide population, in special in the adult women of lower incomes. The obesity also can
be seen as a physical attribute, perceived, interpreted and influenced for the social system.
The aim of this study was to understand the perceptions and experiences of women attended
in a health family center of the city of Fortaleza with obesity diagnosis. This is study is about
a qualitative inquiry with phenomenologic-hermeneutic approach, whose adopted
methodology strategy was the joint enters the interviews in depth and the free comment. 8
interviews with women between 28 and 56 years had been carried through, with average of
age of 44 years. All presented obesity degree II (BMI= 35,0-39,9kg/m2), and had related the
experience with the excess of weight at least for 5 years, moreover they presented
hypertension, diabetes, dyslipidemia and osteomuscular problems, the majority was married,
house owner and had children. The average of family remuneration was 1-2 minimum wages.
The education level was between secondary education and the incomplete fundamental
education. The categorization of the empirical material indicated four thematic axles, and
from which the axles had been tracings analysis central offices. 1) Body Self-perception ; 2)
Etnoethyology of the obesity; 3) Stigma and the Repercussions in the distinct spheres of the
life; 4) Treading the Ways of the Cure. Each thematic axle was unfolded in different
dimensions. The results had disclosed that the women perceive her excess weight, however
they are not classified as obese. The medicine use, the feeding and important moments of life
had been considered basic for the explanation of the profile of obesity in the group. Under the
women “weigh” stigma and discriminations attributed by their appearance. Finally for the
deponents the obesity is an illness that has cure. In this direction, the study it calls attention
for importance the multidimensionality of the obesity. Such understanding is basic for the
proposal of plans and strategies of attendance in the field of the health politics.
Descriptors: qualitative inquiry; women; obesity, prejudice
10
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
1.
INTRODUÇÃO
14
2.
ESTADO DA ARTE
18
2.1 Um Breve Olhar biomédico e Epidemiológico da Obesidade
18
2.1.1 Obesidade: Classificação e fatores de risco
18
2.1.2 Obesidade: Expressão da Transição ou Heterogeneidade Nutricional?
21
2.1.3 Obesidade: Epidemia Global
22
2.2 Um breve olhar das Políticas Públicas de Alimentação e Nutrição no Brasil e a 27
interface com a obesidade
2.3 O olhar das Ciências Sociais
30
2.3.1 Abordagem Histórico Cultural da Obesidade: Interfaces com a 30
Subjetividade.
2.3.1.1 Corpo: um objeto polissêmico
31
2.3.1.2 O reflexo da obesidade na História
33
2.3.1.3 Obesidade, Sociedade de Consumo e Mídia
35
2.4 Estigma e Obesidade
40
2.5 Estudos Qualitativos sobre Obesidade
43
OBJETIVOS
47
3.1 GERAL
47
3.2 ESPECÍFICOS
47
4.
ASPECTOS ÉTICOS
48
5.
METODOLOGIA
49
5.1 Cenário do Estudo
51
5.2 Informantes do Estudo
51
5.3 Técnicas Empregadas
54
5.4 Análise das Informações
55
RESULTADOS E DISCUSSÕES
58
6.1 PERCEPÇÕES E EXPERIÊNCIAS DE MULHERES COM OBESIDADE
58
6.1.1 Auto-percepção do corpo
58
6.1.2 Etnoetiologia da obesidade
68
3.
6.
11
7.
6.1.3 Estigma e Repercussões nas distintas Esferas da Vida
76
6.1.4 Trilhando os Caminhos da Cura
89
CONCLUSÕES
95
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
98
APÊNDICES
108
ANEXOS
111
12
LISTA DE ABREVIATURAS
DCNT
DOENÇAS CRÔNICAS NÃO-TRANSMISSÍVEIS
ENDEF
ESTUDO NACIONAL DA DESPESA FAMILIAR
ESF
ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA
IBGE
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
IMC
ÍNDICE DE MASSA CORPORAL
INAN
INSTITUTO NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO
OMS
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE
OPAS
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE
PNAE
PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
PNAN
POLÍTICA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO
PNIAM
PROGRAMA
NACIONAL
DE
INCENTIVO
AO
ALEITAMENTO
MATERNO
PNSN
PESQUISA NACIONAL DE SAÚDE E NUTRIÇÃO
POF
PESQUISAS DE ORÇAMENTOS FAMILIARES
PRONAN
PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO
WHO
WORLD HEALTH ORGANIZATION
PSF
PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA
VCT
VALOR CALÓRICO TOTAL
SUS
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
STAN
SERVIÇO TÉCNICO DE ALIMENTAÇÃO NACIONAL
13
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
Quadro I
Número de estudos publicados sobre obesidade em diferentes
bases de pesquisa .......................................................................
15
Quadro II
Categorias de índice de massa corpórea (IMC), segundo OMS
1995 ...........................................................................................
18
Quadro III
Caracterização sociodemográfica e clínica das mulheres do
estudo...................................................................................
53
Quadro IV
Rede Interpretativa proveniente da análise das falas das mulheres
do estudo ........................................................
57
Figura 1
Distribuição da Pandemia da Obesidade no Mundo..................
Figura 2
Tendência secular da obesidade no Brasil, segundo sexo. Brasil,
1975-2003.......................................................................
24
Figura 3
Tendência secular da obesidade feminina segundo região
brasileira......................................................................................
25
23
14
1. INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem como objetivo compreender as percepções e experiências de
mulheres usuárias da rede pública de saúde com diagnóstico de obesidade. Ao iniciarmos esta
pós-graduação, nosso objetivo de estudo se nos parecia bem delineado e definido: tratava-se
de um estudo qualitativo sobre obesidade. No entanto, durante os encontros tutoriais e no
percurso das disciplinas pudemos perceber o quanto seria necessário paradoxalmente nos
afastar do tema, estranhar o familiar, procurar novos olhares problematizar, para, então
retomá-lo e resignificá-lo (BOSI, 1996).
Neste percurso procuramos delimitar o tema, bem como o grupo e o local em que se
realizaria a pesquisa. A fase de revisão bibliográfica acerca do objeto de estudo nos levou
inicialmente a observar a literatura sobre o aspecto biológico do fenômeno obesidade. Nesta
incursão foi possível visualizar que este é um tema que vem sendo alvo de um expressivo
número de trabalhos científicos.
Pra alguns autores a obesidade pode ser definida como o excesso de tecido adiposo no
corpo, bem como doença crônica resultante de um balanço positivo de energia por tempo
prolongado, produzindo excesso de gordura corporal (SAMPAIO, 2007). Este excesso pode
advir de uma ingestão energética alimentar além da necessidade individual, da inatividade
física, de uma predisposição genética para armazenar estoques de gordura (SAWAYA et al.,
2003; BATISTA FILHO & RISSIN, 2003).
No entanto, tais definições não explicam totalmente a complexidade do processo
obesogênico,
uma vez que entre outros fatores as situações de desigualdade social e
diversidade cultural também podem potencializar o problema (BERMUDEZ & TUCKER,
2003). A obesidade também pode ser vista como um atributo físico, percebido, interpretado e
influenciado pelo sistema social. Dessa forma os valores sócio-culturais relacionados à
obesidade podem ter uma grande variabilidade dentro da sociedade, nos diferentes momentos
históricos (FERREIRA & MAGALHÃES, 2005).
Vale enfatizar a opinião de Sobal (1991), quando destaca a importância no estudo de
agravos nutricionais, em especial a obesidade, a utilização de múltiplas perspectivas de
15
análise, levando em consideração o contexto socioeconômico e cultural do grupo estudado. A
alimentação caracteriza-se assim, com um ato complexo, mediado por diversos fatores que
ultrapassam a questão nutricional e alcança o plano simbólico referente ao fenômeno.
Não é possível ocultar que a obesidade é um grave problema sócio-sanitário em países
desenvolvidos e em desenvolvimento. No Brasil, estudos demonstram que a população adulta
vem apresentando um importante aumento na prevalência de excesso de peso. De acordo com
os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2003 a obesidade afeta 8,9% dos
homens adultos e 13,1% das mulheres adultas do País, ratificando dados de uma pesquisa
anterior – PNSN - Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (1989) que já determinava que
cerca de 30% dos adultos brasileiros apresentavam algum grau de excesso de peso, destes 6,8
milhões de indivíduos (8%) possuía obesidade, com predomínio entre as mulheres
(MONTEIRO, MONDINI & POPKIN, 1995; BRASIL 2006a).
Não pretendemos negar a importância das investigações que abordam os aspectos
biomédicos e epidemiológicos deste processo já aludidos anteriormente; os mesmos
necessitam ser abordados e pesquisados constantemente. No entanto, concentrar as discussões
apenas nos aspectos supracitados, limita o alcance da pesquisa na medida em que revela os
sintomas e a manifestação física da obesidade, privilegiando, dessa forma, as dimensões mais
imediatas. O estudo da obesidade implica análise de aspectos que vão além da dimensão
biológica, compreendendo elementos históricos, sociais, ecológicos, econômicos, culturais e
políticos.
Ter vivenciado o acompanhamento de usuários com sobrepeso e obesidade na
Residência Multiprofissional em Saúde da Família 1, despertou o interesse pelo estudo da
relação entre os diversos fatores causais desta morbidade, sendo tema de meu trabalho
monográfico. Contudo, durante o atendimento ambulatorial considerava paradoxal o
considerável número de mulheres com sobrepeso e obesidade em uma comunidade de baixa
renda. Durante os atendimentos ambulatoriais e domiciliares pude perceber que meus
conhecimentos “tecnicistas” não eram suficientes para vislumbrar as diversas dimensões deste
processo. A graduação em Nutrição me forneceu subsídios técnicos para avaliar, classificar e
1
Programa de pós-graduação com caráter de residência (pautado na formação em serviço para o Sistema Único
de Saúde) coordenado pela Escola de Formação em Saúde da Família Visconde de Sabóia em parceria com a
Universidade Estadual Vale do Acaraú em Sobral – CE.
16
tratar a obesidade e suas co-morbidades, no entanto, era e ainda se faz necessário deslocar-me
deste patamar técnico e realizar imersão no universo subjetivo das pessoas que convivem com
essa enfermidade e assim transitar em aspectos mais simbólicos.
É importante assinalar que o levantamento bibliográfico que realizamos nas fontes
MEDLINE (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online), LILACS (Literatura
Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde) e SCIELO (The Scientific Electronic
Library Online), sobre “obesidade em mulheres” nos últimos 5 anos detectamos um grande
número de trabalhos que enfatizam os aspectos mais imediatos da doença, dentro de uma
abordagem quantitativa. No entanto, quando refizemos o levantamento nas mesmas bases
bibliográficas, desta vez cruzando os termos “obesidade em mulheres” com o descritor
“pesquisa qualitativa” este número foi drasticamente reduzido (Quadro 1).
É válido ainda acrescentarmos que durante observação dos trabalhos classificados com
abordagem qualitativa, alguns trabalhos apresentavam apenas técnicas comuns a esses
estudos como uso de grupos focais e entrevistas, sem contudo agregar a metodologia da
pesquisa social. Este fato é relevante e digno de nota, uma vez que os artigos científicos
possuem função primordial de embasar as atividades da pesquisa, portanto devem oferecer
uma classificação adequada no que concerne sua abordagem epistemológica.
Quadro I. Número de estudos publicados sobre obesidade em diferentes bases de pesquisa
Obesidade mulheres
MEDLINE
SCIELO
LILACS
28.121
631
15.196
172
5
50
Obesidade mulheres
Estudo qualitativo
O levantamento bibliográfico destaca uma
caracterização epidemiológica da
obesidade com maior prevalência desta condição nas populações mais pobres e em mulheres
com menor escolaridade, em especial no nordeste brasileiro, dado que fundamenta a
focalização no segmento feminino. A obesidade ganha um significado diferencial entre
17
mulheres, pois envolve diversos aspectos, sócio-culturais esclarecendo
que este recorte
direciona o estudo para o enfoque da percepção feminina acerca do fenômeno.
Além de nosso interesse em investigar o tema obesidade, acreditamos que a escassez
de estudos qualitativos acerca deste objeto, como pode ser comprovada na revisão da
literatura, associada à inequívoca importância do tema como problema sócio-sanitário
justifica o desenvolvimento deste projeto que visa explorar as percepções e experiências de
usuárias da rede pública de saúde buscando a compreensão do fenômeno obesidade para além
de seus determinantes biológicos, percebendo-o em sua complexidade, incorporando
a
perspectiva e a experiência das mulheres que convivem com o fenômeno da obesidade,
apresentando assim a voz de quem vivencia o processo. Dessa forma esperamos ampliar o
conhecimento e assim oferecer subsídios ao aprofundamento da compreensão do fenômeno na
literatura especializada.
A compreensão do fenômeno obesidade, na perspectiva das mulheres que vivenciam a
experiência do corpo obeso, nos permite vislumbrar que as considerações deste estudo
poderiam, ainda que de forma incipiente, despertar nos profissionais de saúde as diversas
dimensões envolvidas no processo da obesidade. Um convite para que esses profissionais
ampliem o olhar em relação ao tema e dessa forma contribuam com um melhor atendimento
a esse grupo específico de usuários da atenção básica.
18
2. ESTADO DA ARTE
A revisão bibliográfica deste estudo buscou ancorar-se no campo das ciências
biológicas e das Ciências Humanas, uma vez que conforme já assinalado anteriormente, o
fenômeno da obesidade é complexo e transita em vários campos do conhecimento.
Como estratégia de exposição e visando a facilitar a leitura deste trabalho, optamos
por dividi-lo em tópicos apresentando os diferentes aspectos do objeto de estudo. Para tanto,
buscaremos apresentar dentro dos aspectos biomédicos a definição, classificação e os aspectos
etiológicos da obesidade, além de seu panorama epidemiológico no Brasil e no mundo. Em
outro capítulo, resgataremos a inserção da obesidade nas políticas sociais de alimentação e
nutrição no país e como esta sendo abordada junto às equipes do Programa de Saúde da
Família (PSF), estratégia orientadora da Atenção Básica à Saúde no Brasil. Finalmente
apresentamos um capítulo acerca das interfaces da obesidade, visando apresentar aspectos
subjetivos, simbólicos, históricos, significativos sobre este fenômeno.
2.1. Um Breve Olhar Biomédico e Epidemiológico da Obesidade
2.1.1 Obesidade: Classificação e Fatores de Risco
Do ponto de vista da biomedicina a obesidade é a doença na qual o excesso de
gordura acumulada nos tecidos adiposos chegou a um nível que pode ser prejudicial à saúde.
Vários autores concordam que dentre os fatores que contribuem para a obesidade incluem-se
os genéticos, hábitos alimentares aprendidos no início da infância, alimentação excessiva,
estilo de vida sedentário, dieta muito rica em gordura e de alto teor calórico (SWINBURN et
al.;2004; ST-ONGE et al., 2004).
O aspecto mais imediato da obesidade pode ser avaliado de várias maneiras, no
entanto o Índice de Massa Corporal (IMC) ou Índice de Quetelet que se refere à massa
corporal em (kg) dividida pelo quadrado da altura (em metros), tem sido o principal parâmetro
utilizado para a avaliação da obesidade, tanto do ponto de vista clínico quanto da investigação
19
científica e está estreitamente correlacionado com a gordura corporal (RANG, 2004;
LOTTENBERG, 2001).
Assim esses indivíduos são classificados de acordo com IMC
proposto pela
Organização Mundial de Saúde – OMS (1995), categorizando os indivíduos em sete estratos,
segundo risco de co-morbidades (Quadro 2). Esses pontos de corte são classicamente
conhecidos como de risco para várias co-morbidades, especialmente as cardiovasculares, o
diabetes mellitus e as dislipidemias (WHO, 2003).
Quadro II. Categorias de índice de massa corpórea (IMC), segundo OMS - 1995.
Categorias IMC (Kg/m²)
Risco de comorbidades*
Classificação
< 18,5
Baixo †
Abaixo do peso
18,5-24,9
Médio
Normal
25-29,9
Aumentado
Sobrepeso
30,0 - 34,9
Aumentado
Obesidade grau I
Moderadamente
35,0 - 39,9
Aumentado
Obesidade grau II
Gravemente
≥ 40,0
Aumentado
Obesidade grau III
Muito gravemente
Fonte: Organização Mundial de Saúde - OMS (1995) * diabetes melito tipo 2 e doença cardiovascular ; † risco
aumentado de outras co-morbidades (desnutrição)
No discurso da medicina oficial a obesidade é concebida como uma doença crônica
que não tem cura, mas tem tratamento. As pessoas com sobrepeso e obesidade são
consideradas de risco para o
desencadeamento de outras doenças(co-morbidades),
comprometendo a qualidade de vida da pessoa a ponto de poder levá-la à morte
(LAQUATRA, 2005; GONÇALVES, 2004).
A obesidade ganha maior importância por estar relacionada com doenças e
mortalidade. A obesidade aumenta o risco de hipertensão, hipertrigliceridemia, cálculos
biliares e cardiopatia isquêmica. Além disso, os indivíduos obesos correm risco aumentado de
20
câncer de cólon, mama, próstata, vesícula biliar, ovário e útero (RANG et al. 2004;
WANNMACHER, 2004 ; LAQUATRA,2005).
Em relação à hipertensão arterial vale destacar que a mesma prevalece seis vezes mais
em obesos do que em não obesos, e o aumento de 10% na gordura corporal reflete aumento
significativo da pressão arterial (MARIATH et al., 2007). Além disso, de acordo com Cohen
(2004), o risco de desenvolver diabetes aumenta proporcionalmente conforme o grau e a
duração da obesidade (obesos com IMC > 40 têm 10 vezes mais probabilidade de desenvolver
diabetes do que indivíduos com IMC < 25).
Os problemas de saúde não fatais, mas debilitantes associados à obesidade incluem
problemas respiratórios, musculares, esqueléticos crônicos, doenças na pele e infertilidade.
Embora a obesidade seja considerada uma enfermidade em si, ela também representa um dos
maiores fatores de risco de outras doenças crônicas, paralelamente ao fumo, a hipertensão e
altos níveis de colesterol sanguíneo (OPAS, 2003).
Embora a etiologia da obesidade não esteja totalmente esclarecida, existe um certo
consenso na literatura de que ela é causada pela interação de fatores genéticos, metabólicos,
endócrinos, nutricionais, psicossociais e culturais que conferem a essa enfermidade uma
natureza multifatorial (FERREIRA & MAGALHÃES, 2005; CAMPOS, LEITE &
ALMEIDA, 2006).
Para autores como Monteiro & Conde (1999), Popkin (2001) e Vasconcelos & Silva
(2003), várias explicações têm sido dadas para o aumento da prevalência da obesidade, sendo
classificadas em três categorias: as que o atribuem às mudanças das características genéticas,
as que o atribuem às condições ambientais e, finalmente, aquelas para as quais as mudanças se
devem à interação de fatores genéticos e ambientais. Do ponto de vista epidemiológico, tudo
conduz às explicações ambientalistas, uma vez que, nas últimas décadas, não ocorreram
alterações substanciais nas características genéticas das populações, entretanto as
modificações dos hábitos foram expressivas.
21
2.1.2 Obesidade: Expressão da Transição ou Heterogeneidade Nutricional?
A obesidade integra o grupo das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) que
vem aumentando no país, configurando uma tendência de mudança no padrão da
morbimortalidade da população brasileira (BRASIL, 2003).
A compreensão da dinâmica social, geográfica e temporal da situação nutricional do
país e suas mudanças envolvem um resgate de alguns dados importantes para a determinação
do perfil alimentar/nutricional da população brasileira. Podemos destacar as mudanças
ocorridas na estrutura das ocupações de trabalho do país, passando de um mercado
eminentemente primário (agropecuária e extrativismo) para um mercado centrado no setor
secundário e, sobretudo, no setor terciário da economia, resultando em transformações
cruciais, no que se refere à geração de renda, estilos de vida e, especificamente, das demandas
nutricionais. Outro aspecto relevante diz respeito à participação da mulher no mercado de
trabalho, e à diminuição em quase 50% do tamanho da família economicamente dependente,
em especial a partir da década de 1970, movimentos que indiretamente influenciaram no
aumento do ingresso per capta de melhoria da renda. No entanto, a distribuição social da
renda
não melhorou e a diferença entre ricos e pobres manteve-se ou até aumentou
(BATISTA FILHO & RISSIN, 2003).
Para os mesmos autores a melhora significativa, em especial nos últimos vinte e cinco
anos, ao acesso, cobertura e resolutividade das ações de saúde, de forma que hoje a maioria
das mães são atendidas no período pré-natal e durante o parto, enquanto a proteção vacinal
praticamente universalizou-se e o tratamento das doenças de elevada prevalência foi ofertado
à grande maioria da população. Melhoraram ainda as condições de saneamento (água potável
e esgotos sanitários) bem como ao acesso aos meios de comunicação massiva, destacando
principalmente a televisão.
A Transição Nutricional implica mudança no padrão alimentar tradicional, com base
no consumo de grãos e cereais, que aos poucos está sendo substituído por um padrão
alimentar com grandes quantidades de alimentos industrializados e relativamente pouca
quantidade de carboidratos complexos e fibras (BRASIL, 2006a). Assim como Popkin e
colaboradores (1998), concordamos que a Transição Nutricional “é um processo de
22
modificações seqüenciais no padrão de nutrição e consumo, que acompanham mudanças
econômicas, sociais e demográficas, e do perfil de saúde das populações”.
Dessa forma o processo de transição pressupõe a mudança de um padrão
epidemiológico para outro. Assim podemos concluir que o processo de Transição Nutricional
do Brasil não esta concluído, bem como este não se apresenta como na maioria dos países
industrializados e mesmo em alguns países como Chile, Cuba e Costa Rica, assim o fenômeno
assume característica multifacetada e complexa (BRASIL,2006 a).
Dessa forma convêm analisarmos o processo da transição nutricional para além da
mudança na dimensão e no risco de agravos nutricionais, ou seja, na transição da desnutrição
para a obesidade. É importante percebermos que presenciamos uma superposição de etapas,
ou uma heteregoneidade, onde presenciamos concomitantemente altas prevalências de anemia
e hipovitaminose subclínica e desnutrição com alta prevalência de obesidade no país.
2.1.3 Obesidade: Epidemia Global
A obesidade representa o problema nutricional de maior ascensão entre a população
observada nos últimos anos, sendo considerada uma epidemia mundial, presente tanto em
países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento (POPKIN & DOAK, 1998;
MARIATH, 2007).
De acordo com as mais recentes estimativas globais da OMS, mais de dois bilhões de
pessoas acima de 15 anos de idade apresentam excesso de peso, sendo que 400 milhões são
obesos. Além disso, as projeções futuras indicam um aumento mundial do número de pessoas
adultas com excesso de peso e obesidade, chegando em 2025 a três bilhões e 700 milhões,
respectivamente (VIGITEL, 2007).
A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2003) também relata que, em todo o mundo,
há cerca de 18 milhões de crianças menores de cinco anos com sobrepeso e que nos países em
desenvolvimento estima-se que mais de 115 milhões de pessoas estejam sofrendo de doenças
relacionadas à obesidade.
23
Nos Estados Unidos a obesidade é um grave problema de saúde pública, naquele país
aproximadamente 30,4% dos adultos (>20 anos) são obesos e 16% das crianças (6 a 19 anos)
estão com sobrepeso (BASKIN, FRANKLIN, ALLISON, 2005). Entre os anos de 1980 e
2002, a prevalência de obesidade duplicou em adultos com 20 anos ou mais e a prevalência de
sobrepeso triplicou em crianças e adolescentes entre 6 e 19 anos (OGDEN et al., 2006).
Na Europa, a obesidade afeta 15-20% da população de meia-idade (RANG, DALE &
CORSO, 2004) destacando-se a Inglaterra, com um aumento superior ao dobro, entre os anos
de 1980 e 1990. A Região Oeste do Pacífico, compreendendo a Austrália, o Japão, Samoa e
China, também apresentou aumento da prevalência de obesidade; porém, importa destacar que
China e Japão, apesar do aumento da obesidade em comparação com outros países
desenvolvidos, apresentam as mais baixas prevalências: na China, 0,36% para mulheres e
0,86% para homens de 20–45 anos em 1991; no Japão, 1,8% para homens e 2,6% para
mulheres maiores de 20 anos, em 1993 (PINHEIRO, FREITAS & CORSO, 2004). Na
Austrália os números chegam a 19% em homens e 22% em mulheres ( THORBURN,
2005).
Em estudo de Abubakari e colaboradores (2008), realizado na África Oriental
apresentou uma prevalência estimada em 10% da obesidade. As mulheres apresentavam
maior probabilidade de apresentarem obesidade do que os homens. Análise temporal indicou
que a prevalência de obesidade duplicou nos últimos 15 anos, incrementada especialmente
pelas mulheres. A figura 1 ilustra a distribuição espacial das prevalências de obesidade nos
diferentes continentes, demonstrando o caráter pandêmico que esta enfermidade alcançou.
24
15-20 %
30,4%
0,36 %
10 %
13,1%
22 %
Figura 1. Distribuição da Pandemia da Obesidade no Mundo.
No que concerne ao Brasil inquéritos importantes realizados no Brasil foram o
Estudo Nacional da Despesa Familiar (ENDEF) em 1975, a Pesquisa Nacional sobre Saúde e
Nutrição (PNSN) em 1989, e a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) em 2002-2003.
Este último inquérito revelou que a obesidade afeta 8,9% dos homens adultos e 13,1% das
mulheres adultas do País. O aumento do excesso de peso no Brasil é notoriamente percebido
a partir da década de 1970. A maioria dos estudos epidemiológicos acerca do tema cita esses
três inquéritos nacionais sobre a tendência do aumento da prevalência de obesidade na
população brasileira, enfatizando o processo de transição nutricional que o País tem sofrido.
Estas informações são imprescindíveis para a compreensão da evolução do estado nutricional
da população durante este período. Os dados destes vinte e oito anos apontam de modo geral
para uma tendência secular positiva da prevalência da obesidade.
As mulheres apresentam prevalências de obesidade superiores a dos homens, como
pode ser visto na figura 2. Além disso, houve um crescimento desta prevalência, entre as
mulheres na classe de menor rendimento (BRASIL, 2006a). Alguns estudos no Brasil têm
revelado que a proporção de obesidade também aumenta com a idade, demonstrando haver
uma prevalência maior em especial entre mulheres após os 40 anos (GIGANTE et al., 1997;
KAC,VELÁSQUEZ-MELÉNDEZ & VALENTE, 2003; PINTO, 2007). Tais resultados
25
vieram confirmar que a obesidade entre a população pobre feminina tornou-se hoje um dos
maiores problemas nutricionais e de Saúde Pública no Brasil.
Fontes: ENDEF(1977); PNSN (1989); POF (2004)
Figura 2. Tendência secular da obesidade no Brasil, segundo sexo. Brasil, 1975-2003
Como demonstrado na figura 2, os dados da POF /2003 revela uma prevalência de
8,8 e 12,7% de homens e mulheres adultos, respectivamente, com obesidade através da
classificação do Índice de Massa Corporal (IMC > 30,0 kg/m2). A gravidade do problema fica
evidente quando visualizamos a tendência secular de crescimento da obesidade no País, bem
como o crescimento da obesidade feminina, com especial destaque para o aumento da
obesidade em mulheres da região nordeste, enquanto as demais regiões apresentam uma
menor tendência no numero de casos como pode ser visualizado na figura 3 (JORDÃO &
KAC, 2005). Esses dados apóiam a focalização realizada no sexo feminino em nossa
investigação.
26
Figura 3. Tendência secular da obesidade feminina segundo região brasileira.
Os dados brasileiros mais recentes são os provenientes do Sistema de Vigilância de
Fatores de Risco para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) realizado em
todas as capitais do país em 2007, essas informações revelaram que o percentual de adultos
(>18 anos) com obesidade em Fortaleza era 14,7%. É importante observarmos esses dados
com cautela, uma vez que a pesquisa é realizada por meio de entrevistas telefônicas, com
amostras probabilísticas da população adulta residente em domicílios servidos por linhas fixas
de telefone em cada cidade. Este fato limita os resultados da pesquisa uma vez que exclui os
indivíduos que residem em domicílios sem telefone. A cobertura da rede de telefonia fixa no
Brasil, embora tenha crescido nos últimos anos, não é evidentemente universal, podendo ser
particularmente baixa em cidades economicamente menos desenvolvidas e nos estratos de
menor nível socioeconômico (MOURA et al, 2008). Dessa forma não retrata fielmente a
situação de sobrepeso e obesidade da população de Fortaleza. No entanto, é um dado
aproximado e que serve de parâmetro para classificação do estado nutricional da população.
27
2.2 Um breve olhar das Políticas Públicas de Alimentação e Nutrição no Brasil e a
interface com a obesidade
Diante do quadro de obesidade apresentado epidemiologicamente e percebendo-o
enquanto um agravo nutricional já consolidado, não sendo mais considerado um problema
emergente de saúde pública, vale indagarmos como este fenômeno vem sendo discutido no
âmbito das políticas públicas no Brasil.
Burlandy (2007), apresenta uma concepção enriquecedora sobre política ou
programa social.
o formato de uma dada política ou programa social é resultante de
um complexo processo de intermediação de interesses, representados
sob as mais variadas formas organizacionais e com diferentes graus
de poder de influência na agenda governamental. Expressa, desse
modo, uma opção política, construída sob certas condições materiais,
a partir dos embates e alianças forjados por atores sociais diversos
com capacidades também distintas de interferência no processo
decisório de formulação de políticas públicas. (BURLANDI 2007,
p.2)
Para Escoda (1989), a questão nutricional está compreendida no contexto da
questão sanitária da população como um todo. Assim a autora concorda com Luz (1989), em
seu conceito de política de saúde, admitindo que política de alimentação e nutrição, são todas
as formas que o Estado utiliza para contornar a questão alimentar e nutricional da população.
Para tanto pode utilizar-se de planos de nutrição explícitos ou não, para a autora a política
está além do projeto escrito, esta presente na prática para adotar medidas que conduzam a
questão.
Já em Faleiros (1995), nos deparamos com uma definição mais detalhada de política
social de alimentação e nutrição como sendo as ações estatais voltadas para a produção,
comercialização e consumo de alimentos para determinados segmentos sociais, sendo
produtos da correlação de movimentos simultâneos de acumulação de capital, de forças
sociais e da forma que o Estado assume em determinadas conjunturas.
28
Em estudo realizado por Uchimura & Bosi (2003), as autoras relatam que remonta de
1918 a intervenção do poder público no setor de alimentação no país, com a criação do
Comissariado de Alimentação Pública, órgão com a finalidade de controlar os estoques e
tabelar os preços dos gêneros alimentícios. No entanto, Vasconcelos (2005) argumenta que os
primeiros instrumentos específicos de política social de alimentação e nutrição foram
instituídos apenas ao longo da Ditadura Vargas (1937-1945).
Dentro da política trabalhista, o governo Vargas tomou duas medidas que deveriam ter
influência na alimentação da classe trabalhadora: 1) o salário mínimo, que deveria "satisfazer
às necessidades normais do trabalhador e sua família"; 2) o Serviço de Alimentação da
Previdência Social (SAPS), criado em 1940 e considerado como primeiro órgão de política de
alimentação no Brasil, surge para promover a instalação de refeitórios em empresas maiores,
fornecer refeições nas menores, vender alimentos a preço de custo a trabalhadores com
família numerosa, proporcionar educação alimentar, formar pessoal técnico especializado e
apoiar pesquisas sobre alimentos e situação alimentar da população (SILVA, 1995).
Ainda na década de 40, foram criadas outras três agências da política nacional de
alimentação: o Serviço Técnico de Alimentação Nacional (STAN) em 1942, o Instituto de
Tecnologia Alimentar (ITA) em 1944 e a Comissão Nacional de Alimentação (CNA) em
1945 (UCHIMURA e BOSI, 2003).
Em 1972, durante o governo do presidente Médici, é criado o Instituto Nacional de
Alimentação e Nutrição (INAN), este órgão passa a ser o centralizador da política alimentar
por meio dos vários programas nacionais de nutrição I Programa Nacional de Alimentação e
Nutrição (I PRONAN), era composto de vários subprogramas, tendo como objetivos
prioritários a assistência alimentar aos grupos vulneráveis e a promoção de programas de
educação nutricional. Em 1976 entra em execução o II PRONAN, caracterizado por uma
estrutura dirigida aos grupos mais carentes, urbanos e rurais (LIMA, OLIVEIRA & GOMES,
2003).
Na década de 1980 para o governo federal os principais problemas de nutrição e
saúde pública referiam-se a falta de alimento que conseqüentemente levava à desnutrição.
Assim a maior exigência das intervenções governamentais dizia respeito a creditar a solução
dos problemas na conta do crescimento econômico. Este resolveria os principais problemas
29
alimentares e nutricionais da população, com o aumento do emprego e da renda, uma vez que
haveria acesso satisfatório aos alimentos básicos pela parcela da população em situação de
pobreza (LEÃO & CASTRO, 2007).
Nesse período são criados alguns institutos e implantados programas pautados na
suplementação alimentar a grupos da população, racionalização do sistema de produção e
comercialização de alimentos e atividades de complementação e apoio (VASCONCELOS,
2005).
No decorrer dos anos seguintes as políticas e programas passam a enfatizar a
assistência alimentar e nutricional ao grupo materno infantil e aos escolares, destacando
Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno – PNIAM; Programa Nacional de
Alimentação
Escolar
–
PNAE,
Programa
de
Combate
às Carências Nutricionais Específicas – PCCNE. ( SILVA, 1995; LEÃO & CASTRO, 2007)
A
partir dos resultados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN),
realizada em 1989, e de outros estudos realizados no país, cientistas brasileiros começavam a
alertar para a sensível redução da prevalência das doenças nutricionais relacionadas à fome e
à miséria (desnutrição energético-protéica, hipovitaminose A, anemia ferropriva e bócio
endêmico) e, simultaneamente, para a sensível elevação da prevalência da obesidade e outras
doenças crônicas não transmissíveis (MONTEIRO, MONDINI & POPKIN, 1995).
Finalmente em 1999 é aprovada a Política Nacional de Alimentação e Nutrição
(PNAN), atestando
o interesse do poder público em relação aos males relacionados à
escassez alimentar e à pobreza, sobretudo a desnutrição infantil e materna. Esta política passa
a preocupar-se com o já complexo e configurado quadro dos excessos das taxas de
prevalência de sobrepeso e obesidade na população brasileira adulta ( BRASIL, 2003)
Para Leão e Castro (2007) as diretrizes da PNAN deixam claro que o entendimento do
governo federal sobre o problema alimentar e nutricional do país passou a transcender a visão
segundo a qual a questão da privação alimentar tem como causa básica a pobreza e ampliou
sua abordagem para os problemas relacionados ao aumento de peso da população propondo
como estratégia fundamental a promoção da alimentação saudável.
30
Este ponto passa a ser relevante uma vez que a partir da PNAN há uma maior
abrangência no enfoque dos problemas nutricionais, passando a considerar a obesidade como
alvo das políticas, ao lado do combate à fome e à desnutrição. Isso corresponde ao quadro
alimentar-nutricional vigente, já discutido anteriormente, caracterizado por uma expressiva
redução da desnutrição energético-protéica, concomitante a um aumento do sobrepeso e
obesidade em todas as classes sociais ( SANTOS, 2005).
O Ministério da Saúde (2006) defende que o contexto da Estratégia Saúde da Família
se apresenta como palco apropriado para o desenvolvimento das diretrizes propostas pela
política nutricional, uma vez que se caracteriza como uma estratégia para reorientação do
modelo assistencial, ancorando-se nos pressupostos da prevenção e não do processo curativo
em si. Dessa forma, este espaço torna-se um local privilegiado para o enfrentamento do
excesso de peso que acomete o indivíduo, as famílias e a população brasileira.
2.3 O Olhar das Ciências Sociais
2.3.1
Abordagem Histórico Cultural da Obesidade: Interfaces com a Subjetividade
A Questão deste Corpo
A questão deste corpo está hoje no esquecimento
dogma sobre ele erguido há muito tempo:
é um corpo flutuante
confuso próximo de
um conhecimento verbal
questão em si mesmo questionando teoria
opinião tradicional.
Contamos histórias
renunciamos a determinar-lhe origem
recurso a outro corpo perguntando reclamando
a perder de vista.
Se interrogo retenho a questão quotidiana
o defeito do corpo disponível
ante toda a constatação todo o exame.
João Miguel Fernandes Jorge, in "Vinte e Nove Poemas"
31
Nos capítulos anteriores buscamos resgatar brevemente os aspectos clínicos e
epidemiológicos da obesidade, bem como inserção do tema na agenda das políticas públicas
do setor. A discussão se deslocará agora para uma recuperação do plano subjetivo e
simbólico, fundamental em um estudo voltado às experiências, percepções e vivências de
pessoas com obesidade.
2.3.1.1 Corpo: um objeto polissêmico
O corpo adquiriu conotações, significados, importância e tratamentos diferentes
através dos séculos, nas diversas culturas e sociedades. Dessa forma o corpo é pensado,
representado e passível de diferentes leituras de acordo com o contexto social e os diferentes
campos do saber. (BRASIL, 2006 b).
Os especialistas da área da saúde vêem o corpo como depositário de processos
biológicos indicadores de saúde ou doença para o indivíduo. Enquanto que para as ciências
sociais o corpo é um reflexo da sociedade, ao corpo se aplicam sentimentos discursos e
práticas que estão na base de nossa vida social (FERREIRA, 1994).
O discurso do corpo fala das relações internas à sociedade – é também nele que
veremos expressar-se a busca da felicidade plena. Palco privilegiado dos paradoxos e dos
conflitos, o corpo que almeja sua singularidade é o mesmo que tenta negar a diferença e a
alteridade. A eterna busca da imortalidade transforma-o em um corpo de encenação da obra
de arte (NOVAES & VILHENA, 2003).
É valido destacar a contraposição de dois pensadores do século XVII quando
destacamos algumas concepções de corpo, são eles, Descartes e Espinosa. Na concepção
espinosiana, a essência das coisas está na existência delas. Não há como separar corpo e alma
ou corpo e ambiente, por exemplo. Diferente da concepção cartesiana que acreditava em duas
substâncias diferentes, a do corpo e a da mente (DESCARTES, 1991), segundo Espinosa
todas as coisas são constituídas por uma só substância e tomam formas diferentes em seus
modos de existência.
Outra vertente para análise do corpo, diz respeito à visão mais utilitária, fruto da
importância da força física nas ocupações desempenhadas. Dentro dessa perspectiva, para
32
muitas mulheres das classes populares o corpo pode se apresentar como condição para a
produção do trabalho. No cotidiano de luta pela sobrevivência diária – duras e longas
jornadas de trabalho, incluindo os afazeres domésticos e os cuidados com os filhos –, o corpo
tende a não ser percebido em toda sua plenitude (BOLTANSKI, 1979).
Este fato é corroborado por outros autores brasileiros (SILVA, 1995; LUZ, 1998;
FERREIRA, 2003; PINTO, 2007) e as informações de seus estudos convergem para um ponto
em comum: o excesso de peso em mulheres de baixa renda ganha uma visão de capacitação/
incapacitação para o trabalho, relação com um corpo utilitário, recebendo dessa forma um
valor diferente da questão estética do corpo.
Neste diálogo sobre o corpo vale destacar a enorme contribuição do filosofo francês
Michel Foucault, para quem o corpo é um lugar prático direto de controle social. Através de
seus últimos trabalhos Vigiar e Punir e História da Sexualidade, Foucault salienta
constantemente a primazia da prática sobre a crença. Dessa forma nossos corpos são
treinados, moldados e marcados pelo cunho das formas históricas predominantes de individualidade, desejo, masculinidade e feminidade. Foucault refere-se ao corpo feminino
como "corpos dóceis": aqueles cujas forças e energias estão habituadas ao controle externo, à
sujeição, à transformação e ao "aperfeiçoamento".' Por meio de disciplinas rigorosas e
reguladoras sobre a dieta, a maquiagem, e o vestuário— princípios organizadores centrais do
tempo e do espaço nos dias de muitas mulheres — acabam sendo convertidas em pessoas
menos orientadas para o social e mais centradas na automodificação. Induzidas por essas
disciplinas, as mulheres são levadas a memorizar nos corpos o sentimento e a convicção de
carência e insuficiência, a achar que nunca são suficientemente boas (BORDO, 1997).
Outra concepção importante sobre o tema corpo é do filósofo Maurice Merleau-Ponty
(1994), para este autor o corpo é produtor e portador de significado, é fonte natural de sentido;
apresenta-se como um espaço expressivo, é o nosso meio geral de ter o mundo, porquanto ele
me abre ao mundo e nele me coloca em situação e em comunicação com a
espaciotemporalidade2, com o mundo visto não mais como a soma de objetos determinados,
mas como horizonte de possibilidades infinitas, motivo pelo qual não posso possuí-lo, e como
horizonte dissimulado de nossa experiência sem cessar, como meio e campo de todos os meus
2
Espaciotemporalidade: vem de espaciotemporal – visa concentrar a idéia de “na circunstância de tempo e
espaço, o lugar”.
33
pensamentos e de todas as minhas percepções explícitas. Ele é tempo e espaço, é
sensibilidade, é expressão, fala, linguagem, isto é, espaço expressivo, conjunto de
significações que, ao serem vividas durante nossa deambulação existencial, passam a fazer
parte do nosso ser, da nossa bagagem cultural e histórica e que, fazem do corpo “memória”,
memória que guarda, retrata, conta e faz histórias, porque vivencia e experiencia o ser e o
estar no mundo, o ser-ao-mundo em um processo de coexistência” (LABRONICI, 2002,
p.34). O corpo é o espelho do nosso ser, é o nosso ancoradouro, é o veículo do ser no mundo,
porquanto permite nossa deambulação existencial, nos entrelaça com o mundo e com outras
corporeidades por meio da relação intencional e dialética que se dá no espaço topológico3 (
ZOTTIS & LABRONICI, 2003).
Inúmeras são as possibilidades para definição de corpo. No entanto, para sociedade
atual só parece possível a existência de um tipo de corpo - o corpo magro. Vivemos em uma
época de “lipofobia” como denominou Fischler (1995) e que está diretamente associada a uma
“obsessão pela magreza, sua rejeição quase maníaca à obesidade” (Fischler, 1995, p.15). A
sociedade contemporânea, ao valorizar a magreza, transforma a gordura em um símbolo de
falência moral, e o obeso, mais do que apresentar um peso socialmente inadequado, passa a
carregar um caráter pejorativo. Além disso, passa a ser o que Sant’Anna (1995) denominou de
um “corpo desumanizado”.
2.3.1.2 O reflexo da obesidade na História
Durante muito tempo na história da humanidade, o ganho de peso, bem como o
acúmulo de gordura, eram vistos como sinais de saúde e prosperidade. Contudo na atualidade,
a obesidade é considerada pela literatura científica como uma doença crônica, que afeta
crianças, adolescentes e adultos, presente tanto em países desenvolvidos quanto em
desenvolvimento (WHO, 1998).
De acordo com Fischler (1990), um pouco de adiposidade era sinal de status e riqueza
no século XIX. Entretanto, isto não quer dizer que a obesidade fosse desejada por todos, ou
seja, apenas indica que ela era mais tolerada, pois estava associada a certo prestígio social. O
3
Espaço topológico é o meio onde se circunscrevem relações de vizinhança, de envolvimento (Merleau-Ponty,
1992, p.196).
34
autor mostra em seu estudo que a diferença fundamental dos dias de hoje em relação ao
século XIX, é que, atualmente, o mínimo sinal de gordura é rechaçado. Hoje, se deseja um
corpo absolutamente magro, sem adiposidade alguma. Além disso, os referenciais de
obesidade e magreza mudaram com o tempo. No passado, era preciso ser bem mais gordo
para ser julgado obeso e bem menos magro para ser considerado magro.
No período do renascimento as mulheres deviam exibir medidas maiores, faces
redondas e coradas para serem consideradas saudáveis belas e férteis, pois a magreza sempre
esteve associada com a pobreza, baixo nível e infertilidade no decorrer da história da
humanidade. No entanto, a mulher das últimas décadas do século XX e a deste século não
deseja alcançar o ideal de corpo da renascença, posto que seria considerada gorda e a
sociedade atual não parece ser simpática aos gordos (CAMPOS, 2005).
Nesse contexto, Vasconcelos, Sudo & Sudo (2004), nos apresentam a magreza como
o ideal feminino moderno. A mesma passa a ser representada e glorificada como um sinal
externo de sucesso. As mulheres em todo o mundo ocidental passam a ter uma obsessão por
uma imagem corporal esbelta. Assim, o corpo, é agora estereotipado e estampado diariamente
nas revistas e a beleza é um valor inerente ao feminino.
Um dos sinais da obesidade é dado pelo tamanho do corpo, pela abundância de
gordura corporal, a qual se presume, deve ser facilmente percebida pela observação clínica do
médico. Entretanto, a pessoa que apresenta uma determinada aparência corporal, a qual pode
indicar doença pela medicina oficial, não necessariamente percebe que este dado pode
implicar um problema de saúde. É possível que o indivíduo possa pensar que não precisa
perder o que é considerado excesso de peso para viver bem, podendo ser considerado
“normal”. Assim se o indivíduo não perceber este excesso de peso comprometendo suas
atividades cotidianas, pode não considerá-lo como um fator de risco (ARNAIZ, 2004).
A percepção de doença e sua visibilidade são importantes para auxiliar na
determinação da busca pela atenção a saúde. A obesidade, por se tratar de uma doença de
grande período de latência, algumas vezes assintomática e com ausência da dor física, pode
retardar a busca destes indivíduos por atenção à Saúde (BRASIL, 2006 b).
35
Além disso, alguns profissionais de saúde de orientados por uma visão tradicional da
medicina acreditam que doença é uma entidade identificável e erradicável com uso de
medicamento ou cirurgia. Assim o diagnóstico da obesidade pode ser negligenciado ou não
ser oferecida a referida importância devido ao grau de complexidade desta enfermidade (LUZ,
1997).
O discurso biomédico, que acolhe o sofrimento corporal e, como discurso da ciência
que pretende objetividade e universalidade, acaba por excluir a singularidade, o particular, a
diferença, única forma pela qual a subjetividade poderia aparecer. Perdendo seus referenciais
próprios, resta ao individuo identificar-se com sua própria condição (CLAVREUL, 1983).
Dessa forma é possível perceber a variedade de concepções que o corpo recebe, de
acordo com o referencial estudado ou campo do conhecimento. O corpo se traduz nesta
junção da natureza, cultura, sociedade, trabalho, consumo, estética e poder.
2.3.1.3 Obesidade, Sociedade de Consumo e Mídia
Como mencionamos em tópicos anteriores, o Brasil encontra-se em um processo de
transição alimentar que incorre naturalmente em transformações impressas pela urbanização e
pela globalização. Essa transição promove mudanças que afetam a qualidade dos alimentos
produzidos e industrializados. Diante disso, um novo estilo de vida impõe novas expectativas
de consumo, que acabam orientando as escolhas de alimentos (SANTOS, 2005a).
Nessa perspectiva de mudança de consumo, George Ritzer (1993), sociólogo
americano nos apresenta um processo que tem contribuído para a modificação do
comportamento alimentar, entre outros aspectos, trata-se da “McDonaldização”. Para o autor
este pode ser definido como um processo pelo qual os princípios do restaurante fast food vem
dominando cada vez mais setores da sociedade americana, bem como as sociedades do resto
do mundo. Este fenômeno atinge sobremaneira a indústria alimentícia, bem como, a mídia
falada e escrita, as lojas de brinquedos, a educação, entre outros vários setores da sociedade.
Esse processo repercute no estilo de vida das pessoas a partir do momento em que as mesmas
36
transferem para o seu dia-a-dia elementos desta MacDonaldização, centrados na eficiência,
calculabilidade/quantificação, previsibilidade e controle.
O autor afirma que os elementos supracitados concorrem para uma “racionalização
irracional” levando a desumanização associada ao progresso, através dos quatro elementos
supracitados. A eficiência, diz respeito ao fato de que é possível, sem grandes esforços, obter
tudo rápido e fácil e dessa forma satisfazer as necessidades; a calculabilidade relaciona-se a
questão de custo-porção , enfatizando-se portanto a quantidade em detrimento da qualidade; a
previsibilidade refere-se a tentativa de estruturar um ambiente evitando surpresas, logo não é
preciso pensar, os produtos são sempre os mesmos, cria-se uma rotina, uma sistematização; e
finalmente o controle com substituição do homem pela tecnologia, seguindo um mesmo
padrão de produção e
atendimento, reduzindo-se cada vez mais as competências e
capacidades humanas.
Santos (2005a), retoma o tema assumindo que vivemos a MacDonaldização do
mundo, prevalecendo um gosto pasteurizado e homogêneo. Dessa forma o fast-food tornouse o principal fenômeno de consumo do mundo globalizado, podendo ser considerado um
ícone da globalização, expressos no sanduíche de hambúrguer, na pizza, na batata frita e nos
refrigerantes e que ganham a preferência, principalmente entre os jovens, valorizando a
praticidade e a rapidez.
O hábito de consumir produtos cada vez mais industrializados parece ser uma marca
da modernidade, além de uma tendência mundial e parte integrante do fenômeno da
globalização. Porém, percebe-se que os produtos industrializados têm no Brasil uma
facilidade maior para conquistarem espaço. Destaca-se a valorização da cultura da quantidade
e não do sabor e a ausência de uma tradição ligada à gastronomia, vista como um luxo, e não
uma arte, como a música ou a pintura, favorecem a introdução de novos produtos.
Para o sociólogo polonês Bauman (2008) a “sociedade de consumidores” representa
um conjunto de condições existenciais em que há grande probabilidade de que a maioria dos
indivíduos venha a seguir a cultura consumista em detrimento de qualquer outra, e de que na
maior parte do tempo obedeçam aos seus preceitos com grande dedicação. Dessa forma essa
sociedade encoraja ou reforça a escolha de um estilo de vida consumista rejeitando as opções
culturais alternativas e exigindo de seus membros a condição de afiliação.
37
Compreendendo que hábitos e práticas alimentares são construídos com base em
determinações socioculturais, as repercussões dessa afiliação também podem recair sobre a
alimentação. Monteiro et al. (2000), analisaram a composição alimentar e adequação
nutricional da dieta familiar brasileira (1988-1996) e destacaram o aumento na importância
relativa das carnes e a expansão do grupo de cereais e derivados em detrimento do grupo de
raízes e tubérculos. Além disso, relataram o declínio no consumo relativo de frutas e de sucos
naturais
e o aumento na contribuição calórica proveniente do açúcar refinado e dos
refrigerantes. Entendemos dessa forma que o arroz, o feijão, a farinha de mandioca, que
foram, desde o século XVIII, a base do cardápio da maioria da população, perdem cada vez
mais espaço para os produtos industrializados, mais consumidos em nossa sociedade.
Outro aspecto a ser apresentado neste tópico diz respeito ao papel estruturador na
construção e desconstrução de procedimentos alimentares no mundo contemporâneo. As
práticas alimentares de emagrecimento inserem-se numa lógica de mercado impregnada por
um padrão estético de corpo ideal. A indústria cultural move-se articulando diferentes
campos, como empresas produtoras de mercadorias, indústrias de aparelhos e equipamentos e
setores financeiros. É nessa lógica que se produzem os paradigmas estéticos e, por
conseqüência, discursos sobre práticas alimentares para emagrecimento. (SERRA &
SANTOS,2003).
Dessa forma a mídia representa uma influência importante neste universo complexo
que envolve a obesidade. Para Andrade e Bosi (2003), experienciamos uma era de mudanças
tecnológicas através da computação e da mídia nunca antes vivenciada. A velocidade que as
informações chegam até nossos lares faz com que o ser humano tenha a possibilidade de viver num
mundo instantâneo. Na lógica dessa nova era as pessoas criam uma ilusão de que tudo pode ser
conseguido de forma rápida , fácil e que as necessidades podem e devem ser atendidas prontamente.
De certa forma esse fenômeno gera na população uma voracidade cada vez maior por consumir
novidades (sejam objetos, comida, informação, psicoestimulantes, sexo casual).
A influência da indústria midiática na produção do ideal da beleza feminina dissemina
duas crenças falsas acompanhando a busca do corpo ideal, como destacado pelas autoras:
... a primeira de que o corpo é infinitamente maleável, podendo alcançar o
ideal estético com dietas e exercícios, negligenciando-se as determinações
biológicas e genéticas. Dessa forma se faz necessário uma grande dose de
38
esforço pessoal, acompanhado de conotações simbólicas de sucesso,
liberdade, felicidade, longevidade, liberação sexual, mobilidade social, e
outras, reforçando a outra crença de que, ao conseguir este ideal, a pessoa
terá alcançado o sucesso não só na profissão como também nos
relacionamentos sociais e amorosos. (ANDRADE & BOSI, p. 119)
Dessa forma é vendida à população em geral, a pseudocrença de que quase tudo pode
ser programado, comprado sendo possível inclusive “criar” o corpo perfeito através de dietas,
cirurgias e exercícios físicos. Consequentemente as pessoas com excesso de peso, são vistas
como acomodadas que não se transformam porque lhes falta força de vontade suficiente,
portanto são pessoas que estão escolhendo ficar a margem da sociedade.
Nessa construção do corpo feminino ideal, Natansohn (2005), concorda que os
imperativos estéticos, e as aparelhagens multidisciplinares (dietas, cirurgias, ginástica) são
justificados para moldar o corpo feminino. A autora ainda destaca que quando se fala das
mulheres e para as mulheres o discurso sobre a corporalidade parece tomar rumos precisos: o
corpo parece a âncora da mulher no mundo, sua razão de ser, para si mesma e para o outro,
para o desejo do outro. Essa é a lógica que orienta o discurso da mídia e se torna visível tanto
no discurso da publicidade quanto nos diversos programas de TV. Essa equação mulher =
corpo se reafirma nos programas femininos, onde é grande número de médicos de
especialidades diversas para falar de tudo aquilo que falta ou sobra na insubordinada
fisiologia feminina.
Desse modo, os meios de comunicação veiculam ou produzem
notícias,
representações e expectativas nos indivíduos com propagandas, informações e noticiário em
que de um lado estimulam o uso de produtos dietéticos e práticas alimentares para
emagrecimento e, de outro, instigam ao consumo de lanches tipo fast food. Não se trata de
uma decisão ou ação das empresas midiáticas, elas integram um contexto empresarial e um
sistema de crenças em que há uma estreita relação entre uma suposta verdade biomédica e um
desejo social e individual. O corpo é um campo de luta que envolve diferentes saberes,
práticas e imaginário social (SERRA & SANTOS, 2003).
A mídia tem sido uma fonte importante de normas sociais da magreza, em especial
junto às mulheres, uma vez que a mesma enfatiza os aspectos positivos associados à magreza,
39
como atratividade e sucesso. Em contrapartida evidencia a associação entre gordura e
aspectos negativos, destacando lentidão, insatisfação corporal e depreciação.
Para Gonçalves (2004) tais estereótipos podem ser verificado nas bancas de revista,
nas propagandas de televisão, nas novelas e filmes onde a magreza é extremamente
valorizada. Imagens de mulheres magras, artistas, modelos e manequins consideradas ícones
de beleza internacionais, figuras legítimas de imitação e de identificação, estão estampadas
nas mais diversas capas de revistas e jornais. De forma contrastiva, não é comum
enxergarmos mulheres e homens gordos como protagonistas de filmes e novelas, em papéis
de “mocinhos” e heróis, ao passo que é comum enxergarmos corpos magros e,
principalmente, “sarados” ilustrados nas capas das revistas que consistem num padrão estético
muito valorizado atualmente.
Indivíduos com obesidade passam a ser protagonistas de programas televisivos quando
o foco é a mudança dos hábitos alimentares e de atividade física. O exemplo mais recente é o
reality show internacional apresentado pelo canal de televisão GNT, intitulado “Magros X
obesos”, a cada programa, um trio de especialistas médicos acompanha duas pessoas que
estão em lados opostos da balança: enquanto uma está no auge da magreza, a outra está
atingindo a obesidade mórbida. Ainda em se tratando de canais por assinatura, o outro
exemplo é o “Perder para ganhar” apresentado pelo canal People and Arts, este programa
apresenta um grupo de pessoas obesas que se dispõem a perder peso em troca de uma alta
quantia de dinheiro. Há alguns anos atrás o canal brasileiro SBT apresentou o programa “O
grande perdedor” que também seguia a mesma linha do programa anterior. Os programas
abordam a questão da obesidade em seu aspecto biomédico, os obesos são submetidos a
cargas intensas de exercícios físicos bem como dietas hipocalóricas, são submetidos a provas
físicas e “tentações” alimentares.
A obesidade agrega, portanto, aspectos culturais, políticos, sociais e midiáticos que
interagem com os fatores alimentares, genéticos e de atividade física, resultando em um
processo multifatorial que exige um olhar ampliado para sua compreensão.
40
2.4 Estigma e obesidade
Um aspecto reincidente na literatura acerca do fenômeno obesidade e no senso
comum, diz respeito às pré-concepções estabelecidas de que os indivíduos obesos são,
habitualmente, considerados como preguiçosos que comem demais e que não têm força de
vontade para realizar um plano alimentar e praticar exercícios. Esta compreensão errônea das
causas da obesidade se traduz na estigmatização em relação aos obesos, levando a
discriminação no trabalho, na família e na comunidade (BANDINI & FLYNN, 2006).
Pelo ponto de vista sociológico, o estigma que sofre o obeso pode ser tão ou mais
prejudicial do que os problemas de saúde decorrentes da “enfermidade”. Vários estudos
comprovam que as pessoas gordas são vistas como relaxadas, feias, sujas e culpadas de sua
condição, causando-lhes muito sofrimento (GONÇALVES, 2004).
Goffman (1988), sociólogo americano nos apresenta um tema muito recorrente quando
tratamos do fenômeno obesidade, Estigma. Este termo é de origem grega, referia-se a sinais
corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre
o status moral de quem os apresentava. Neste sentido, a pessoa que tem obesidade é alvo de
preconceito devido a um atributo relacionado ao seu corpo - a gordura - como se a sua
identidade estivesse reduzida àquilo, os outros atributos constituintes da sua identidade são
marginalizados. Logo, a pessoa corpulenta é portadora de um estigma que a coloca na
situação de indivíduo que está inabilitado para a aceitação social plena.
Mattos (2008) realizou estudo de caso – de natureza sócio-antropológica com o
objetivo de apreender e interpretar sentidos e significados que os indivíduos com sobrepeso
ou obesidade atribuem às práticas corporais de saúde realizadas no Projeto de Exercício Físico
Adaptado para Obesos (PEFAO) do Instituto de Educação Física e Desportos (IEFD) da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O estigma da gordura vai sendo
resignificado e novos sentidos sobre a vida são produzidos coletivamente e partilhados pelo
grupo social. O autor concluiu que atividades coletivas com indivíduos partilhando um
mesmo estigma podem resultar em efeitos significativos, na medida em que o encontro com
seus pares permite que vivenciem experiências construtoras de valores e produtoras de
sentidos para além do desejo de emagrecimento.
41
As pessoas com excesso de peso significante freqüentemente sofrem discriminação na
família, em ambientes sociais e de trabalho, assim como experiências negativas dos
provedores de serviços, além de sentimento geral de desaprovação (LEWIS &
PUYMHROECK,2008).
Sobre este aspecto Rogge (2004), em um estudo de abordagem fenomenológica
explorou as percepções de indivíduos e familiares de pacientes com obesidade, e demonstrou
que os obesos são lembrados em seus encontros diários com familiares, colegas, cuidadores, e
estranhos, de que eles desviam das normas sociais, e que são inferiores aos não obesos. Nesse
sentido o estudo valida o impacto negativo do estigma da obesidade sobre as interações
sociais desses indivíduos.
Antes mesmo que a obesidade fosse considerada uma crise internacional, cientistas
sociais começaram a identificar propriedades estigmatizantes deste fenômeno como uma
forma de desvio moral e social. Cahnman (1968), já definia esta estigmatização como o " …
rejeição e desonra que estão conectadas com o que é visto como deformidade física e
aberração comportamental" (pg 293); para este autor indivíduos obesos são mais vulneráveis a
discriminação do que outros grupos marginalizados. Complementando esta idéia Lewis e
Puymhroeck, (2008) propõem que esses indivíduos apresentam dificuldades em desenvolver
estratégias para se protegerem do estigma, diferentemente de outros grupos marginalizados,
para esses autores os obesos enfrentam algumas barreiras quais sejam: falta de uma identidade
coletiva; a heterogeneidade das pessoas com obesidade e a crença disseminada de que a
obesidade é controlável e merecedora de vergonha.
Dessa forma, essas características
poderiam impedir o uso de estratégias de auto-proteção contra o estigma imposto pela
sociedade.
Este fato é corroborado pelo estudo qualitativo realizado por Komesaroff, (2008),
com 76 indivíduos obesos. O estudo demonstrou que essas pessoas são extremamente
afetadas por uma falta da piedade pública ou respeito em relação a sua enfermidade. O autor
ressalta que a maioria dos entrevistados havia vivenciado episódios de humilhação ou
discriminação relacionada ao seu peso. O estudo também destaca que embora a maioria
receba as orientações de saúde, os mesmos encontram dificuldades em segui-las, destacando
que as intervenções em relação à obesidade devem ser realizadas com intuito de direcioná-las
as necessidades sociais, pessoais e emocionais dos próprios indivíduos com excesso de peso.
42
Lewis e Puymhroeck (2008), destacam um outro aspecto bastante relevante que diz
respeito ao fato de que as pessoas com sobrepeso importante não apenas enfrentam o
julgamento e discriminação da sociedade em vários aspectos de suas vidas, como também
impõe uma discriminação às outras pessoas com sobrepeso.
Além do estigma se manifestar na vida diária desses indivíduos, ele também parece
causar impacto no tratamento daqueles que procuram perder peso. Estudos sugerem que os
efeitos psicossociais referentes ao estigma da obesidade parecem reduzir a resposta ao
tratamento. Em geral tal tratamento inclui realização de atividade física que os indivíduos
preferem não realizar por se sentirem discriminados, bem como pelo uso de um vestuário que
enfatiza ainda mais sua corpulência (LEWIS & PUYMHROECK, 2008).
Assim como afirma Gonçalves (2004), em uma investigação de caráter antropológico
sobre obesidade refere que alguns indivíduos obesos buscam parecer “invisíveis” para não
serem notados e tratados de forma diferente dos demais. A visibilidade do estigma, da gordura
em excesso, gera muitas discriminações, o que resulta em revolta e raiva por parte dos
estigmatizados.
Uma investigação conduzida por Molinari e Riva (1995) mostrou que mulheres obesas
sentem-se indesejadas socialmente. O estudo de Correia et al (2004) também mostram que as
pessoas obesas são vistas de forma mais negativa do que pessoas não obesas nos aspectos de
inteligência e sucesso e, portanto, socialmente evitadas ou até mesmo rejeitadas para certas
funções de trabalho. Esses estereótipos preconceituosos e a discriminação contra pessoas com
excesso de peso podem gerar problemas psicológicos e dificuldades variadas nas relações
sociais que, por sua vez, podem complicar ainda mais o funcionamento adaptativo desse
segmento da população.
Por outro lado o obeso pode carregar o conceito que Goffmann (1988), denomina de
desviante integrado, termo que o autor utiliza para analisar o lugar que o individuo gordo
ocupa nas comunidades e grupos sociais. Dessa forma, ainda que integrado, o gordo deve
desempenhar papéis muito específicos, cujo comportamento, invariavelmente engraçado ou
patético, provoca uma reação de deboche por parte dos outros integrantes do grupo. Assim,
embora centralize as atenções sobre si, não partilha do mesmo estatuto que os demais
membros. Cabe ao gordo resignar-se a desempenhar o papel de bufão, figura desleixada mas
43
bonachona, caso queira integrar-se é nesse acordo implícito no qual o gordo, como ator social,
está sempre restrito ao mesmo papel, ao contrário dos outros atores, que deslizam livremente.
2.5 Estudos Qualitativos sobre Obesidade
As pesquisas acerca do fenômeno obesidade sob o enfoque da investigação qualitativa,
como mencionamos anteriormente, ainda é escasso, se comparado ao grande número de
estudos com abordagem quantitativa. Além disso, os trabalhos publicados neste campo se
vêem afetados por certa confusão em relação ao que se compreende ou se define como
pesquisa qualitativa. Encontramos trabalhos que empregaram técnicas de estudos qualitativos,
porém sem um fundamento epistemológico de “postura qualitativa”, os quais foram excluídos
desta revisão.
O tema obesidade no campo da pesquisa social abrange um número variado de
objetos de estudo. Foi possível vislumbrarmos que as inquietações destes pesquisadores
permeiam vários aspectos deste complexo fenômeno, quais sejam: as percepções do corpo
obeso, auto-imagem, experiências de indivíduos submetidos à cirurgia bariátrica4, percepções
dos profissionais de saúde, associação aos transtornos alimentares, representações sociais,
pobreza e estigma.
Zotti & Labronici (2003), em uma pesquisa de iluminação fenomenológica
fundamentada no pensamento de Maurice Merleau-Ponty realizaram um estudo com o
objetivo de compreender a percepção do corpo obeso sobre si. Essa investigação foi realizada
com clientes obesos em acompanhamento no ambulatório de nutrição de um hospital escola
de grande porte da cidade de Curitiba. A análise das informações revelaram que os
mecanismos de defesa do ego, negação do corpo e o isolamento são comportamentos
freqüentes e associados à baixa auto estima nos corpos obesos. Estes mecanismos,
relativamente inconscientes, envolvem um grau de auto-decepção e distorção da realidade
podendo constituir em respostas mal adaptadas ao estresse. Outro ponto destacado diz respeito
à alteração da imagem corporal associada à baixa auto-estima nos corpos obesos associado a
4
Cirurgia bariátrica – cirurgia para redução de estômago
44
comportamentos que têm como significado a insatisfação consigo mesmo, levando a
sentimentos de desprezo e menos valia em relação a eles próprios.
O trabalho de Grejanin e colaboradores (2007), teve como objetivo analisar a
percepção que profissionais da saúde têm em relação ao paciente obeso e a percepção do
paciente obeso sobre si mesmo em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do município de São
Paulo. O estudo foi realizado com 19 sujeitos, sendo 10 usuários obesos e 9 profissionais da
UBS. O estudo revelou que para esses profissionais de saúde o obeso é visto como uma
pessoa doente, com uma baixa auto-estima, e que sua realidade sócio-econômica e cultural
favorece o desenvolvimento da obesidade. Os profissionais também destacaram que o
tratamento é simples, podendo ser realizado na UBS, dependendo principalmente da força de
vontade do usuário. Na percepção dos indivíduos com obesidade do estudo, o ato de comer é
simbolizado como um alívio para as tensões por eles vividas, e que se percebem como
diferentes, inconformados com sua aparência física e excluídos socialmente. Além disso, em
ambos os grupos emergiram percepções de que o obeso é infeliz, sofre preconceitos sociais e
que o apoio familiar é fundamental para o sucesso do tratamento.
Felippe (2003) realizou estudo com 50 participantes que já haviam submetido a
tratamento para obesidade em uma clinica particular da cidade de Porto Alegre. O objetivo do
estudo era conhecer as representações sociais de indivíduos obesos sobre o significado
atribuído à relação com o comer e com a manutenção de um peso saudável. Para tanto
elegeram um estudo qualitativo e o referencial empregado para análise das informações foi
baseado no método de análise das representações sociais, que se insere na tradição
hermenêutica de pesquisa . Os resultados do estudo mostraram aspectos contraditórios no
significado do comer para os obesos, como prazer e sofrimento relacionado ao comer
caracterizado pela compulsão e descontrole. Para a autor como aspectos que permeiam essa
relação, surgiram os fatores sociais como discriminação, pressão, preconceito e culto ao
corpo.
Também sobre as representações sociais e a obesidade, as autoras Sudo e Luz (2007)
apresentam um estudo com objetivo de analisar as representações sociais acerca do ser gordo,
através de uma análise qualitativa e interpretativa de catorze matérias que foram capas de
duas revistas semanais brasileiras: Veja e IstoÉ, entre os anos de 1997 e 2002. As autoras
observaram que as revistas destacaram depoimentos baseados no saber científico e biomédico
45
que legitimavam a escolha de um tipo de corpo caracterizado como supostamente “ideal”, por
ser considerado sinônimo de saúde, felicidade e alegria: o corpo magro. Dessa forma, as
autoras concluem que um cerco à gordura é declarado e estratégias de “luta” são formuladas,
recaindo, em última análise, sobre o ser gordo.
No que diz respeito a estudos qualitativos acerca da obesidade e cirurgia bariátrica
destacamos o estudo de Gonçalves (2004). A autora realizou um trabalho de caráter
qualitativo de orientação etnográfica com indivíduos submetidos à cirurgia bariátrica em um
centro de obesidade mórbida de Porto Alegre. O estudo tinha como objetivo investigar a
forma como algumas pessoas que se submeteram à cirurgia bariátrica representavam a
gordura corporal. Os resultados deste trabalho mostraram que a difícil mobilidade corporal
apresentou implicações importantes na vida social dos informantes. A autora também defende
que a gordura corporal “pesa” mais para as mulheres em diversos aspectos, quais sejam os
estéticos, desempenho das atividades
domésticas, econômicas e pessoais além de gerar
dependência dos outros. Dessa forma ocorre uma inversão de papéis e a mulher passa de
cuidadora do lar, dos filhos e do marido a dependente deles. À medida que vai se tornando
mais dependente sente-se mais doente.
Em outra investigação Souza e colaboradores (2005) analisaram o significado de ser
obeso e da cirurgia bariátrica na perspectiva dos ex-obesos mórbidos. O estudo foi
desenvolvido a partir do Serviço de Cirurgia Bariátrica de um hospital público de São Luís,
onde funciona o Programa de Cirurgia da Obesidade, Centro de Referência do Estado do
Maranhão. Assim como o estudo de Gonçalves (2004), os resultados desta investigação
também apontam que ser obeso significa ter grande dificuldade de locomoção o que leva a
um esforço sub-humano nas atividades diárias, diminuindo a auto-estima e aumentando as
insatisfações.
O trabalho de Junqueira (2003), intitulado “Fome de vida” buscou compreender
percepções e vivências de mulheres obesas portadoras de Transtorno da Compulsão Alimentar
Periódica - TCAP. A investigação utilizou pressupostos da fenomenologia-hermenêutica e
entrevistou mulheres participantes de um programa de assistência especializado, disponível
em um hospital público do município do Rio de Janeiro. Os resultados do estudo levaram a
considerar que a obesidade e seus comprometimentos clínicos são preocupantes,
principalmente quando associados ao TCAP. Além disso, a multidimensionalidade desse
46
agravo indicou que componentes psicoafetivos e sociais fizeram parte da gênese do problema
, nos quais se retratam através do sofrimento psíquico e das limitações com prejuízos sociais
extremamente significativos para as mulheres do estudo.
Outro aspecto acerca da obesidade e discutido no âmbito dos estudos qualitativos, diz
respeito à percepção do fenômeno combinado à pobreza. Nesse ponto destacamos o estudo de
Silva (1995), nesta investigação a autora descreve a percepção de mulheres obesas de baixa
renda usuárias de um Centro de Saúde de Atençäo Primária, situado em Manguinhos, uma
área urbana de periferia da cidade do Rio de Janeiro, sobre os principais aspectos de
determinação causal da sua obesidade. A autora destaca que as condições de vida atual e na
infância, sua história reprodutiva, o estresse causado pela violência urbana, o tipo de consumo
alimentar e a imagem ideal do corpo se revelaram questões importantes na problemática da
obesidade para as mulheres.
Sobre este aspecto destacamos ainda o trabalho de Ferreira e Magalhães (2006). Tratase de uma investigação sobre o corpo e obesidade, também realizada em uma comunidade da
periferia do Rio de Janeiro. O estudo buscou aproximação com o vocabulário sobre o corpo, a
vida, o trabalho e a obesidade em um grupo de mulheres moradoras da favela da rocinha
usuárias de uma unidade básica de saúde do município. O estudo revelou que o corpo obeso é
o elemento de conforto que ameniza as adversidades vividas no cotidiano em meio à pobreza.
Assim, angústias e tensões são aplacadas e delimitam um perfil de excesso de peso.
O resgate da literatura acerca da obesidade, delineado neste trabalho, confirma a
multidimensionalidade deste fenômeno. Os diversos estudos permearam aspectos biomédicos,
epidemiológicos, políticos, culturais, sociais e simbólicos compondo um cenário complexo
entremeado por diversas abordagens. O referencial teórico aqui apresentado busca nortear o
trabalho empírico, trata-se de uma exploração inicial do objeto de estudo, um diálogo entre a
teoria e o tema abordado.
47
3. OBJETIVOS
3.1 GERAL
Compreender percepções e experiências acerca da obesidade de usuárias de um
Centro de Saúde da Família de Fortaleza - Ceará.
3.2 ESPECÍFICOS
•
Explorar a auto-percepção do grupo em relação ao corpo e à obesidade.
•
Conhecer a etiologia da obesidade tal como é percebida pelas usuárias;
•
Compreender as dimensões mais relevantes desse processo na perspectiva das
mulheres entrevistada;
•
Identificar com base nas experiências relatadas, a influência da obesidade em distintas
esferas de vida das informantes do estudo;
•
Analisar
aspectos
relacionados
à
diversidade
percepções/experiências do grupo investigado.
porventura
presente
nas
48
4 . ASPECTOS ÉTICOS
A realização da pesquisa obedeceu aos preceitos éticos de privacidade e
individualidade dos participantes que compõem o estudo, sendo pautadas na Resolução 196
de 10 de outubro de 1996 (Diretrizes e Normas Reguladoras de Pesquisa envolvendo Seres
Humanos), do Conselho Nacional de Saúde, que tem o mérito de dar ênfase aos
compromissos éticos com os sujeitos da pesquisa, seja como indivíduo, seja como
coletividade (BRASIL, 1996).
Essa pesquisa incorporou em seu contexto os quatro referenciais da bioética:
autonomia, onde se manteve o anonimato das informações obtidas sobre as pessoas
envolvidas na pesquisa; a não maleficência, garantindo que os danos previsíveis serão
evitados; a beneficência, que envolve o comprometimento com o máximo de benefício e o
mínimo de danos e riscos; e a justiça, considerando as vantagens significativas para os
sujeitos da pesquisa e minimização do ônus para as pessoas vulneráveis, o que garante a igual
consideração dos interesses envolvidos.
O projeto foi cadastrado no Sistema Nacional de Informação sobre Ética em Pesquisa
- SISNEP e submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará
obtendo parecer favorável na reunião do dia 07 de novembro de 2008 através do protocolo n°
217/08 (Anexo I).
49
5. METODOLOGIA
Dada a natureza e a complexidade do objeto de estudo, optamos por realizar uma
investigação fundamentada na tradição qualitativa com
enfoque fenomenológico-
hermenêutico de tendência crítica (GODOY & BOSI, 2004). Tendo em vista a ausência de
literatura acerca do referido objeto na perspectiva aqui adotada, este estudo se caracteriza
como pesquisa exploratória, por meio do qual pretendemos compreender distintas dimensões
do fenômeno obesidade, em diálogo com diferentes campos disciplinares consoante a
complexidade do objeto.
A abordagem qualitativa caracteriza-se pelo reconhecimento da existência de uma
relação dinâmica entre a materialidade e a produção subjetiva, uma interdependência viva
entre sujeito e o objeto e uma postura interpretativa, portanto não neutra, do sujeitoobservador que atribui significados aos fenômenos que interpreta (DESLANDES & GOMES,
2004).
Dessa forma a relação entre sujeito investigador e sujeito investigado é decisiva em
um estudo qualitativo. A visão de mundo de ambos incide sobre o processo de conhecimento,
influenciando desde a concepção do objeto de estudo até a sua conclusão (DEMO, 1981).
Neste ponto recai uma importante tarefa do pesquisador qualitativo, qual seja; enfrentar o
desafio de manejar teorias e instrumentos capazes de promover a aproximação da diversidade
simbólica inerente a existência humana em sociedade ( MINAYO, 2006).
Diante de tal desafio buscaremos utilizar a fundamentação epistemológica da
fenomenologia hermenêutica neste estudo como caminho de possibilidade de nossa
construção teórico-metodológica.
A fenomenologia tem como característica a investigação direta e a descrição de
fenômenos que são experienciados conscientemente. Ela possibilita uma compreensão livre de
preconceitos. É um pensar a realidade (o fenômeno, aquilo que se manifesta para uma
consciência) de forma rigorosa. A essência do fenômeno é mostrada na busca rigorosa do
fundamento primeiro do que é compreendido e no cuidado de cada passo na busca da
50
essência. Apresenta dois momentos: a epoché: pôr o fenômeno em suspenso, se afastar; e a
redução: descrever o visto, selecionar as partes essências. (BICUDO, 1997).
Ao descrever a hermenêutica, Gadamer (1999) a entende como a busca de
compreensão de sentido presente na comunicação entre seres humanos, tendo na linguagem
seu núcleo central. Assim a hermenêutica trabalha com comunicação da vida cotidiana e do
senso comum, seguindo alguns pressupostos: o ser humano é um ser histórico e finito e
complementa-se por meio da comunicação; sua linguagem também é limitada, assim é preciso
compreender também seu contexto e cultura.
Metodologicamente a abordagem hermenêutica se ampara em alguns parâmetros: ela
busca esclarecer o contexto dos diferentes atores; acredita que existe uma racionalidade e
responsabilidade nos veículos de comunicação das diferentes linguagens; além disso, os
fatos, as falas são postas no contexto dos sujeitos; também julga e toma posição sobre o que
ouve, compartilha e observa e finalmente produz um relato dos fatos em que os diferentes
atores se sintam contemplados.
Em resumo podemos dizer que a hermenêutica procura o significado da obra enquanto
produção humana capaz de expressar seu contexto. Pressupõe que a linguagem, ao expressar
diferentes contextos, se torna polissêmica e ambígua, e que ao se apropriar de um discurso, o
sujeito se apropria de uma visão de mundo. É um processo de interpretação dialético. Dessa
forma envolve um processo com enfoque fenomenológico-hermenêutico (ESPÓSITO,1997).
Nessa construção, para a hermenêutica, a compreensão só é possível pelo
estranhamento, pois a necessidade do entendimento surge do fracasso da transparência da
linguagem assim como da própria incompletude e finitude humana. Assim, a atividade
hermenêutica se move entre o familiar e o estranho, entre a intersubjetividade do acordo
ilimitado e a quebra da possibilidade desse acordo (MINAYO, 2006).
51
5.1 Cenário do Estudo
A investigação teve como cenário o Centro de Saúde da Família Francisco Melo
Jaborandi, do bairro São Cristóvão da Secretaria Executiva Regional VI (SER VI) de Saúde
do município de Fortaleza, Ceará. Esta unidade recebe alunos do curso de Ciências da
Nutrição para estágio curricular em saúde coletiva da Universidade de Fortaleza, instituição
na qual desempenho atividades de docência.
O CSF localiza-se no bairro São Cristóvão , periferia do município de Fortaleza, esse
bairro pertence a Secretaria Executiva Regional VI do município. Esta área foi construída no
início da década de 90. Os primeiros moradores receberam as chaves em julho de 1992. O
bairro começou com estrutura de três escolas de ensino fundamental, uma unidade de saúde,
um posto policial e a sede da associação. O CSF foi construído há doze anos e funciona com
quatro equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF). Atualmente a unidade pertence à
Prefeitura de Fortaleza e desenvolve atividades previstas pela ESF, como os programas de
assistência integral a saúde da criança, do adolescente, da mulher, do adulto e do idoso. As
atividades do CSF abrangem oito especialidades – pediatria, clínica medica, gineco-obstetrícia,
odontologia, serviço social, enfermagem, nutrição e
fonoaudiologia, essas duas últimas
especialidades só funcionam através da parceria com a Universidade de Fortaleza, e a participação
de acadêmicas dos referidos cursos.
O CSF possui uma população adstrita de cerca de 58 mil habitantes (SIGAB/DATASUS,
2008) que abrange os bairros de São Cristóvão, Jangurussu, João Paulo II, e ainda a comunidade
Unidos Pela Paz. Caracteriza-se por uma região onde residem grupos populacionais de baixo e
médio poder socioeconômico e outros submetidos a situações de vulnerabilidade social, como a
comunidades carente. Algumas áreas possuem alto nível de violência
5.2 Informantes do Estudo
Com relação à amostra, por se tratar de um estudo eminentemente qualitativo não
nos fixamos em questões como "representatividade" ou "generalização" assim como se faz
comum em estudos de abordagem quantitativa. Adotamos como critério de suficiência a
52
recorrência das categorias empíricas no material discursivo, sinalizando-nos a recuperação do
modelo focalizado nesta investigação (BOSI, 2000).
Na seleção das informantes que fizeram parte da amostra teórica desta investigação,
enfatizamos sujeitos sociais detentores de atributos que possibilitassem a compreensão
profunda e abrangente do objeto sob investigação. Assim as 08 mulheres colaboradoras deste
estudo eram adultas entre 20 e 59 anos, assistidas pelo Centro de Saúde da Família Francisco
Melo Jaborandi, que vivenciavam o fenômeno recortado – o corpo obeso - clinicamente
caracterizada por um índice de massa corporal maior que 30 kg/m2, moradoras de um bairro
da periferia da cidade de Fortaleza e que aceitaram participar da pesquisa.
Com a intenção de apresentar a caracterização das mulheres do estudo, apresentamos
adiantadamente, mas compreendendo como espaço adequado, o perfil da população
investigada. As participantes da pesquisa assinaram um termo de consentimento no qual era
garantido o sigilo (APÊNDICE I) e utilizamos os termos “Entrevistadas” seguidas de uma
numeração para substituir os reais nomes das mulheres.
Antecipando informações dos resultados do estudo, todas as mulheres do trabalho
eram moradoras do Bairro São Cristóvão. Entre as oito mulheres entrevistadas, todas
apresentavam obesidade grau II (IMC= 35,0-39,9kg/m2), e referiram a experiência com o
excesso de peso há mais de 5 anos, além disso apresentavam hipertensão, diabetes,
dislipidemias e problemas osteomusculares, esta caracterização clínica do grupo de
informantes reforça dados da literatura visitada na presente investigação, no que diz respeito
ao risco aumentado que as usuárias com obesidade possuem para o desenvolvimento dessas
co-morbidades (WHO, 2003).
As informantes tinham entre 28 e 56 anos, com média de idade de 44 anos.
Algumas referiram que realizavam atividades informais para complementar a renda da
família. Os arranjos familiares eram núcleos do tipo mulher e cônjuge com filhos. Todas eram
casadas ou mantinham união consensual. Apenas três mulheres relataram está inseridas em
postos de trabalho, costureira, técnica em enfermagem e comerciante, as demais eram donas de
casa. Além disso, nenhuma delas assumia posto de chefes de família. Com relação aos valores de
renda mensal, a média de remuneração familiar observada foi de um a dois salários mínimos.
53
Quanto à escolaridade, metade das mulheres possuíam o ensino médio e a outra metade o
ensino fundamental incompleto.
A maioria das mulheres era proveniente do interior do Estado do Ceará, das oito
informantes apenas duas eram naturais do município de Fortaleza. O perfil das entrevistadas
reflete em parte o contingente da população cearense marcada pela migração. O quadro II
sintetiza os aspectos sociodemográficos e clínicos das informantes do estudo.
Quadro III . Caracterização sociodemográfica e clínica das mulheres do estudo.
Entrevistadas
Idade
ProfissãoEscol
escolaridade
IMC
Doença
associada
Entrevistada 1
41
Dona de casa
Ensino médio
39,91
Hipertensão,
Dislipidemia
Entrevistada 2
47
Dona de casa
4ª Série
36
Doença
Osteomuscular
Entrevistada 3
56
Dona de casa
Ensino médio
39,6
Hipertensão,
Artrite
Entrevistada 4
45
Comerciante
Ensino médio
38,55
Hipertensão
Entrevistada 5
28
Costureira
Supletivo
38
Doença
fundamental
Entrevistada 6
51
Técnica em
osteomuscular
Ensino médio
35
Diabetes
5ª série
35
Doença
Enfermagem
Entrevistada 7
49
Dona de casa
Osteomuscular
Entrevistada 8
35
Dona de casa
5ª Série
35
Doença
Osteomuscular
54
5.3 Técnicas Empregadas
No período de novembro de 2008 a janeiro de 2009 realizamos as entrevistas semiestruturadas com duração média de uma hora. As entrevistas realizadas na residência das
informantes, em função da unidade de saúde não contar com espaço adequado para a
realização das mesmas, foram gravadas e transcritas pela pesquisadora. Elaboramos um
roteiro (APENDICE II) utilizado durante as entrevistas, porém com liberdade para
elaboração de perguntas adicionais para melhor apreensão do tema. As entrevistadas tiveram
total liberdade para se expressarem, sofrendo o mínimo possível de intervenções ao longo da
entrevista. Elaboramos um roteiro para nortear a conversa. As seguintes temáticas foram
abordadas durante a entrevista 1) Percepção do corpo e da obesidade; 2) Etiologia da
obesidade na perspectiva das mulheres; 3) Conseqüências para a vida.
Com o intuito de compreender as experiências vividas por essas mulheres esta
investigação utilizou procedimentos não diretivos, elegendo como técnicas as entrevistas
individuais em profundidade. Desta forma buscamos evitar as distorções introduzidas pelo
pesquisador / entrevistador, nos métodos de questionários mais padronizados, além de
ultrapassarmos o limiar de superficialidade nas respostas e possibilitar um aprofundamento
pelos sujeitos interrogados (KANDEL,1981 ). Além destas informações também utilizamos
anotações do diário de campo e da observação livre durante a entrevista, buscando detectar a
linguagem não verbal, como o silêncio, a pausa, tom de voz, o sorriso.
Concordamos com Minayo, (2006) quando descreve a entrevista como “uma
conversa com finalidade”. De fato a entrevista é uma conversa a dois, ou entre vários
interlocutores, iniciada pelo entrevistador e que tem como objetivo construir informações
relacionadas ao objeto de estudo. Elas visam à compreensão de como os sujeitos percebem e
vivenciam determinada situação ou evento que está sendo focalizado. Somente se o
entrevistador mantiver uma relação de maior proximidade com o entrevistado é que a
compreensão do mundo pela sua perspectiva se tornará acessível (FRASER &
GONDIM,2004; GASKELL, 2003).
As entrevistas buscaram apreender experiências e percepções das mulheres com
obesidade, bem como de que forma esse fenômeno influenciava as diferentes esferas de vida
dessas colaboradoras. Foram realizados os seguintes procedimentos antes da realização das
55
mesmas: apresentação da pesquisadora/mestranda, menção do interesse da pesquisa,
explicação do motivo da pesquisa, solicitação para realizar a gravação de áudio da conversa,
garantia de anonimato e sigilo das informações prestadas pela entrevistada, utilizou-se
também como uma conversa inicial de “aquecimento”, e ao final assinatura do termo de
consentimento livre e esclarecido As entrevistas sempre iniciavam com uma conversa sobre
qual a última vez que a usuária havia comparecido a Unidade de Saúde, bem como havia sido
atendida e finalmente que procedimentos tinham sido empregados pelos profissionais de
saúde, verificando se ocorreu a pesagem e aferição da altura. A abordagem inicial tinha por
objetivo deixar as mulheres menos constrangidas e mais a vontade para o diálogo. Todas se
mostraram receptivas e falaram sobre o excesso de peso sem ser necessário que
perguntássemos diretamente a respeito. Ao final da entrevista as mulheres forma convidadas a
receber acompanhamento nutricional no CSF Melo Jaborandi.
5.4 Análise das Informações
A organização e análise das informações deu-se a partir das leituras sucessivas e da
classificação das mesmas em temas, dimensões e categorias empíricas a partir dos quais
procedemos à interpretação das informações e à construção da rede interpretativa. Esse ponto
nos parece crucial para que possamos compreender o significado que ultrapassa o nível
espontâneo das mensagens transcritas.
Minayo destaca que as análises das informações podem apresentar alguns obstáculos.
1º) ilusão da transparência, como se o real se mostrasse nitidamente ao pesquisador e o
aumento do grau de familiaridade com o objeto ampliaria essa ilusão; 2º) dar importância
maior às técnicas que as significações presentes nos dados; 3º) dificuldade de juntar teorias e
conceitos muito abstratos com as informações recolhidas Procuramos atentar a essas
“armadilhas metodológicas” a fim de apresentarmos uma aproximação adequada ao fenômeno
estudado. (MINAYO, 2000: p.197-198).
Procuramos seguir os seguintes passos no processo de análise:
•
Ordenação das informações: transcrição das fitas, releitura do material, organização
dos relatos, organização dos dados de observação. Essa técnica nos ajudou a
56
estabelecer categorias empíricas, confrontando-as com as categorias analíticas
teoricamente estabelecidas como bases da investigação (Estado da Arte), buscando as
relações dialéticas entre ambas;
•
Classificação das informações: leitura exaustiva e repetida dos textos, recortamos em
cada texto as unidades de registro a serem referenciadas por tópicos de informação ou
por temas. Foram criados comentários classificatórios nos textos, inicialmente de
forma mais ampla e em seguida a revisão para a classificação por temas mais
relevantes;
•
Análise final: a partir das informações recolhidas, procuramos uma revelação da sua
especificidade de concepção sobre o fenômeno obesidade.
A organização e análise das informações deste estudo foram realizadas a partir de
leituras sucessivas e classificação do material em temas, dimensões e categorias empíricas, a
partir dos quais procedemos a análise e a interpretação das informações, bem como a
construção da rede interpretativa. Analisamos os depoimentos convergentes e divergentes,
enfatizando os significados no contexto pessoal, social e cultural das mulheres.
A categorização do material empírico indicou quatro eixos temáticos, e a partir dos
quais foram traçados os eixos centrais de análise. 1) Auto-percepção do corpo; 2)
Etnoetiologia da obesidade; 3) Estigma e as Repercussões nas distintas esferas da vida; 4)
Trilhando os Caminhos da Cura. Cada eixo temático foi desdobrado em diferentes dimensões.
Como recurso de exposição apresentamos no quadro III a seguir uma esquematização da rede
interpretativa.
57
Quadro IV. Rede Interpretativa proveniente da análise das falas das mulheres do estudo
REDE INTERPRETATIVA
Temas
1. Auto-percepção 2.
Centrais
do corpo
Etnoetiologia 3. Estigma
da obesidade
e 4. Trilhando os
repercussões nas caminhos
distintas esferas cura
da vida
Dimensões
Obesa x gorda
Uso
de Sociais
medicamentos
Corpo que dói
Alimentação
excessiva
Insatisfação
corporal
Discurso médico
Passagens da vida
Percurso
terapêutico
Trabalho
Cura
da
58
6. RESULTADOS E DISCUSSÕES
6.1 PERCEPÇÕES E EXPERIÊNCIAS DE MULHERES COM OBESIDADE
Nesse capítulo adentraremos o universo das mulheres do estudo. A rede
interpretativa, apresentada previamente, sumariza a análise das informações obtidas no
trabalho de campo. Os resultados desta análise serão apresentadas na forma de temas e
dimensões. O primeiro tema diz respeito à auto-percepção das mulheres acerca de seus
corpos, a partir dessa temática emergiram as dimensões que orientam os significados que o
corpo representa para essas mulheres. Em seguida buscaremos destacar, na perspectiva das
mulheres, a etnoetiologia da obesidade que vivenciam, nas dimensões deste tema
destacaremos as causas aludidas pelas mulheres para justificar o excesso de peso. A terceira
temática do estudo diz respeito ao estigma e suas repercussões nas relações sociais e de
trabalho das entrevistadas do estudo, as dimensões deste tema emergiram nas diferentes
esferas da vida do grupo estudado. Finalmente apresentaremos a temática referente aos
caminhos da cura, representado por dimensões sobre o itinerário percorrido e a perspectiva de
cura para as mulheres.
“Diga, quem você é?
me diga
me fale sobre a sua estrada
me conte sobre a sua vida...”
(Pitty – Máscara)
6.1.1 Auto-percepção do corpo
Neste primeiro tema buscamos compreender qual a percepção das mulheres
entrevistadas a respeito de seus corpos. Entendemos que a classificação antropométrica,
através do IMC per si, não traduz o real conceito que as mulheres possuem de si mesmas.
59
No exercício da busca da não direcionalidade, procuramos apreender essa informação de
forma indireta.
Ancoramos-nos no conceito de percepção trazido por Marilena Chauí (2005), que o
define da seguinte forma: a percepção é uma maneira fundamental de os seres estarem no
mundo, ela portanto envolve nossa personalidade, nossa história pessoal, nossa afetividade,
nossos desejos e paixões. Assim percebemos positiva ou negativamente as coisas ou pessoas.
Para a autora o mundo é percebido qualitativamente, afetivamente e valorativamente. Dessa
forma o mundo percebido possui sabores, cores, sons, tamanhos, proximidades e distâncias,
além de ser desejado ou indesejado, amado ou odiado, prazeroso ou doloroso e finalmente
pode ser bom ou mal, belo ou feio, maravilhoso ou terrível.
Através dos relatos das mulheres foi possível aglutinar as informações em algumas
dimensões dentro deste primeiro tema: Obesa x gorda, Corpo que dói, Insatisfação
Corporal e Discurso médico.
- Obesa versus gorda “se eu disparar na comida eu vou ser uma obesa”
Notadamente algumas mulheres não se percebem obesas, reconhecem que
apresentam um peso maior, porém não se classificam dessa forma. Nesse contexto emerge a
dimensão em nosso estudo denominada obesa versus gorda. Uma das mulheres quando
indagada sobre o seu peso atual refere que o mesmo está aumentado, porém no decorrer da
entrevista deixa transparecer que não se considera obesa:
“ah o peso tá muito alto...”
(Entrevistada 3)
“...por exemplo eu se eu disparar na comida eu vou ser uma obesa, é
vou disparar sendo uma obesa...”
(Entrevistada 3)
A obesidade apresenta-se como uma categoria comumente utilizada no meio
acadêmico, mas que parece não expressar os diferentes contornos do problema para essas
60
mulheres. O termo obesa tão comum no linguajar biomédico não parece ser aceito pelas
mulheres do estudo. Trata-se de um termo não internalizado pelas informantes. Os termos
“gordas”, “gordinhas”, “bem forte” são os mais citados e apresentam melhor aceitação por
parte das mesmas.
Rito (2004), apresenta outro estudo com informações semelhantes. A investigação
foi realizada com gestantes obesas e identificou que a percepção corporal da obesidade foi
expressa por vários adjetivos, tais como "cheinha", "gordinha", "pouco mais de peso" e
"forte", sendo o termo obeso (a) restrito a situações consideradas por elas como limite,
caracterizando uma conotação negativa atribuída ao excesso de peso.
Associada a essa dicotomia entre a concepção de ser obesa ou gorda, as entrevistadas
expressam uma negação do peso que possuem. Destacamos alguns trechos para ilustrar essa
afirmativa:
Eu me olhava no espelho, eu sabia sim como estava, mas sabe as
vezes eu procurava nem olhar que era para não assumir o peso que
tinha, eu evitava olhar...
(Entrevistada 5)
Pra mim eu sinto que não tá bem...quando a gente ta com peso alto a
gente sente que não tá bem...então a gente quer baixar um pouco.
Uma das mulheres retoma esse aspecto na seguinte fala:
(Entrevistada 2)
“eu vi uma reportagem que tavam fazendo uma gordinha de manequim
e ficou tão bonito, ...bem vestidinha, a gente acha bonita, agora obeesa
obesa demais com a barrigona empendurada ali não tem como ficar
bonita [risos]”
(Entrevistada 2)
61
- Corpo que dói
“não trouxe nada positivo[peso]... só trouxe isso doença”.
Em geral as mulheres argumentam que o deflagrador da percepção do aumento do
peso foi o surgimento de alguma complicação clínica, como a hipertensão, dislipidemia ou
problema osteomuscular:
“Eu me sinto bem em relação ao meu peso, tirando essa dor no joelho
tá tudo bem.”
(Entrevistada 6)
“Antes eu não pensava nisso [peso], eu nem me olhava no espelho
não, mas a ficha caiu quando tive esse problema da dor nos pés.”
(Entrevistada 3).
“Foi aí ... foi aí onde surgiu o problema da pressão alta né?”
(Entrevistada 2)
“...talvez a dor que eu sentia do joelho, a das pernas, o mal estar,
porque eu sinto muito cansaço pode ser por causa do peso”
(Entrevistada 5)
“Quando eu passei dos 70 kg aí veio a pressão alta, veio o colesterol
alto, veio o tal do triglicereo [triglicerídeos] alto.”
(Entrevistada 1)
O peso trouxe problema no coração...eu bati um raio x do coração ,
ele tava coberto de gordura
(Entrevistada 3)
Essa dimensão representa a consequência mais imediata do ganho de peso para as
nossas informantes. Os relatos confirmam que a percepção da obesidade está ligada a algum
prejuízo na realização das atividades normais e às sensações desagradáveis como cansaço,
dor, mal estar:
62
“Atrapalha tudo [o peso], o cansaço, qualquer coisa que eu faço eu
fico cansada, se eu não me sentar me dá aquela moleza, aquele
suor...a pressão que baixa.”
(Entrevistada 2)
“O peso atrapalha para fazer as coisas do dia a dia fica tonta, cansa
tinha medo de andar só.”
(Entrevistada 4)
“De negativo tem um monte, mas positivo não vejo nenhum. Trouxe
dor nos pés, tenho dormido pouco...”
(Entrevistada 7)
As informações do presente estudo se assemelham aquelas encontradas em outros
trabalhos (GONÇALVES, 2004; SOUZA, 2005) que sugerem que a qualidade de vida é
freqüentemente comprometida em mulheres com excesso de peso, devido a prejuízos no
funcionamento físico e psicossocial. A partir dos discursos, evidenciamos algumas queixas,
em especial, as físicas referentes ao sistema músculo-esquelético, através da expressão de dor
e sentimentos de incapacidade devido à obesidade. A obesidade afeta o corpo em sua
totalidade, sendo difícil encontrar uma alteração física do organismo que não esteja atrelada
ao excesso de peso. Em nosso trabalho os problemas osteomusculares são recorrentes e
destacados pelas entrevistadas.
Esse aspecto também foi encontrado por Ferreira (2006) no estudo intitulado
Obesidade & Pobreza: o aparente paradoxo realizado com mulheres da favela da Rocinha no
Rio de Janeiro, as percepções acerca do corpo revelaram que o excesso de peso no grupo se
relacionava essencialmente ao aparecimento de sintomas clínicos diversos, à menor agilidade
e à menor disposição para o trabalho.
Para Boltanski (1979), a atenção prestada ao corpo pelas classes sociais populares
pode ser menos freqüente. Particularmente neste grupo, o uso do corpo pode compreender uma
visão mais utilitária, fruto da importância da força física nas ocupações desempenhadas. Dentro
63
desta perspectiva, para muitas mulheres das classes populares o corpo pode se apresentar como
condição para a produção do trabalho. No cotidiano de luta pela sobrevivência diária, incluindo os
afazeres domésticos e os cuidados com os filhos, dessa forma o corpo tende a não ser percebido
em toda sua plenitude. Finalmente o corpo obeso parece ser julgado como “pesado” e, portanto,
menos ágil. Nesse aspecto, o corpo magro passa então a ser valorizado.
- Insatisfação corporal
“... vai se vestir se olha no espelho..se sente mais fracassada ali”
A partir da valorização do corpo magro, surge nas falas das mulheres a insatisfação
corporal das mesmas, essa terceira dimensão da auto-percepção do corpo para algumas das
entrevistadas é relatada de forma enfática. Os trechos abaixo ilustram bem essa constatação:
“a gente vai se vestir se olha no espelho, se sente..., aquele momento é
o momento que você se sente mais fracassada ali, momento mesmo em
que você se olha na hora de você se trocar , você chega até a sentir
vergonha de si própria, nem querer se olhar, aí deixa a gente muito
triste”
(Entrevistada 3)
“Eu não gosto né desse peso, não me sinto bem, e esse peso assim que
eu adquiri foi questão de anos, foi aumentando e aos poucos aí eu
olhava na balança tava 70 , 82, 90 Kg...”
(Entrevistada 8)
“Eu não me olho no espelho, eu me arrumo , me visto, olho só para o
rosto, e saio.”
(Entrevistada 4)
“quando eu ia com outra pessoa eu nem subia na balança, para a
outra pessoa não ver o peso”.
(Entrevistada 2)
Como um mecanismo de defesa, percebemos que o corpo avantajado passa então a
não ser olhado no espelho, não é mais pesado. Essa negação da própria imagem corporal
parece uma fuga das realidades que não são agradáveis, dessa forma as mulheres buscam
ignorá-las ou não reconhecê-las.
64
Esses relatos são concordantes com as afirmativas de Bosi e colaboradores (2006),
que afirmam que vem ocorrendo uma crescente insatisfação das pessoas com a própria
aparência. Para as autoras isso reflete o fato de que o culto ao corpo está diretamente
associado, entre outros aspectos, à imagem de beleza, poder e mobilidade social.
Paradoxalmente, apesar de algumas mulheres do estudo não se identificarem com o termo
obesa, as mesmas também não se sentem satisfeitas com a imagem refletida no espelho.
Slades (1988) define o termo imagem corporal, referindo-se a uma ilustração que se
tem na mente acerca do tamanho, imagem e forma do corpo, como também aos sentimentos
relacionados a essas características, bem como às partes que o constituem. Dessa forma, se
pode dizer que a imagem corporal envolve diversos fatores que se inter-relacionam, como os
emocionais, de atitude e também de percepção. Para Smeets (1999), a imagem corporal é um
processo que envolve não apenas as representações visuais, mas para a autora trata-se de um
processo no qual pensamentos, sentimentos e emoções podem afetar a imagem resultante,
sendo um complexo mecanismo da identidade pessoal. Assim, a insatisfação com o corpo,
como mencionado no relatado das mulheres do estudo tem sido freqüentemente associada à
discrepância entre a percepção e o desejo relativo a um tamanho e a uma forma corporal
(ALMEIDA et al., 2005).
Assim colocado, o corpo gordo é definido como algo anormal em uma cultura
contemporânea que institui um modelo de corpo magro como uma imagem ideal de corpo. A
idéia de indivíduo normal está construída a partir de médias da espécie humana e do
imaginário social, determinada em um contexto social em que nossa cultura atribui
normalidade a um modelo idealizado social e culturalmente, com medidas antropométricas
predeterminadas. Em relação ao modelo de corpo intitulado de normal, o corpo gordo se torna
na verdade desviante.
Esse culto ao corpo em nossa sociedade tem se traduzido na
normatização de um corpo perfeito, entenda-se um corpo magro, em padrões algumas vezes
inalcançáveis (CARVALHO & MARTINS, 2004).
A insatisfação corporal parece sofrer uma grande influência da indústria midiática.
Como enfatiza Bosi et al (2006, p. 109)
A mídia tem influência sobre a imagem corporal, pois ao mesmo
tempo em que exige corpos perfeitos, estimula práticas alimentares
não-saudáveis. O desfile de figuras jovens, com corpos esqueléticos
65
ou musculosos apresentados em revistas, cinema e comerciais torna
muito difícil,...considerar a beleza em sua diversidade e singularidade,
ou seja, como componente individual, sem se prender a padrões
estéticos cada vez mais inatingíveis.
As mulheres do estudo quando indagadas sobre a presença das pessoas com excesso
de peso na mídia televisiva destacaram:
“Eu acho que pros olhos deles [mídia], sei lá não cai bem, assim as
roupas, porque eles querem assim manequim pra ficar bonito se
apresentar bonito.”
(Entrevistada 2)
“Eu acho que porque , pelo fato das pessoas da televisão terem
preconceito com os gordos...as pessoas infelizmente, elas ainda
acham que gordo não é uma pessoa ideal para ser ator principal, não
é o mais bonito, mais legal.”
(Entrevistada 5)
Esses depoimentos enfatizam o sentimento de inadequação que essas mulheres
vivenciam diariamente, pois não se sentem representadas nos veículos de comunicação,
levando assim a busca por corpos magros como condição de normalidade.
- Discurso médico
“se a senhora quiser viver mais , ...não coma muito.”
Na terceira dimensão, discurso médico, percebemos que a percepção de corpo
também perpassa a relação médico-paciente. Nas conversas com as mulheres ficou evidente o
papel do profissional de saúde na regulamentação do corpo. As entrevistadas relataram que
durante as consultas eram alertadas acerca do excesso de peso.
“quando a gente vai pro médico, a primeira coisa que ele fala é perca
peso, perca peso”
(Entrevistada 2)
66
“ o médico disse que eu tava obesa, ...gorda demais”
(Entrevistada 5)
“Aí o médico disse: se a senhora quiser viver mais , não fume e não
coma muito.”
(Entrevistada 3)
“Ele disse que meu peso tava muito acima e eu procurasse fazer uma
dieta, baixar mais, que talvez a dor que eu sentia do joelho, a das
pernas, o mal estar, porque eu sinto muito cansaço ele disse que pode
ser por causa do peso.”
(Entrevistada 8)
Pereira (2006) retrata essa relação de forma interessante. Para o autor a relação
existente no imaginário das pessoas, inclusive dos profissionais de saúde, está baseada no
contexto entre saúde e salvação: o médico, como sacerdote, define as regras, prescreve os
comportamentos e “ameaça” o cliente/paciente, que como fiel precisa obedecer às orientações
e sentir-se culpado quando não seguir as regras. Esquece-se, portanto, que o ser humano
continua sua vida após a doença crônica. Assim as pessoas nãos se vêem como enfermas ou
moribundas. A consciência nunca pode objetivar-se em consciência-de-doente ou consciência
de enfermo.
Outra constatação percebida nos discursos das mulheres diz respeito a “apropriação”
ou “apropriação ilusória” de termos médicos para descrever sua situação:
“Chegou certo momento que eu to me sentindo, que eu tenho que
diminuir peso para ser uma pessoa saudável. Não to me sentindo bem
com esse tanto de peso porque complica muito a saúde da gente.”
(Entrevistada 4)
“Ele [médico] já disse até que desde a proporção que eu for
perdendo, até me disse nessa ultima consulta, que se eu continuar
perdendo, controlando a pressão vamos testando tirar os
medicamentos, até tirar todos.”
(Entrevistada 4)
67
“Assim...eu me vejo gorda, mas se o médico não tivesse falado não
teria caído a ficha, de que eu tava passando do peso, não ia saber que
tava nessa obesidade grau 3.”
(Entrevistada 5)
“foi alto né [peso], o médico disse que eu tava obesa
Ele [médico] falou que eu estava com obesidade”
(Entrevistada 2)
Dessa forma o saber dessas mulheres, pelo menos em parte, parece ser dependente do
saber médico. No domínio da doença e da relação com o corpo, podemos retomar o trabalho de
Boltanski (1968), o autor defende que o princípio explicativo do pensamento de senso comum sobre a
doença reside, em particular, nas “classes baixas”, no efeito de legitimidade produzido pelo discurso
médico e na distância social que separa o médico e o doente. O discurso de senso comum parece,
portanto desprovido de autonomia, constituído, nas palavras do autor “de materiais fragmentários e
heteróclitos, palavras mal-entendidas e frases em pedaços, arrancadas do discurso do médico”
(BOLTANSKI, 1968,p. 81).
Godoy e Bosi (2004), também apresentam a relação médico-paciente, resgatando a
influência do modelo biomédico nesta relação de poder implícita entre esse binômio, que
segundo as autoras se expressa pela intervenção sobre o corpo físico do outro,
desconsiderando seus desejos e emoções, privilegiando aspectos orgânicos sobre os
emocionais. A desqualificação do cuidado do profissional de saúde (médico) durante o
diagnóstico de obesidade de uma usuária transparece na seguinte situação:
“Foi eu nunca me esqueci, naquela hora eu dei aquele baque assim
parece que a mulher [médica] me deu foi uma facada, eu voltei pra
casa triste com aquilo... Ela tinha me falado que tava bichado devido
que tava com pressão alta, colesterol alto, triglicerídeo alto, aí ela
usou essa expressão você ta “bichada”. Pra mim aquela palavra “
bichada” pesou muito eu sai pra casa assim triste , mas aí foi ela já
me encaminhou para endocrinologia
já rapidinho eu fiquei
impressionada já logo fui correndo...”
(Entrevistada 1)
68
A negligência como foi tratada a usuária nos faz repensar a importância da formação
dos profissionais de saúde, dentro de um contexto mais humanizado, resgatando a ética do
cuidado e dos aspectos relacionais e emocionais, tão importantes quanto os valorizados
aspectos técnico no desenvolvimento das ações de saúde.
6.1.2 Etnoetiologia da obesidade
Todas as mulheres do estudo declararam que apresentavam, quando mais jovens, um
peso bem inferior e considerado adequado pela classificação da OMS (1995). Dessa forma,
durante as entrevistas procuramos compreender de que forma esse excesso de peso foi se
contornando na vida dessas mulheres. Percebendo a obesidade como um fenômeno que
envolve um grupo heterogêneo de condições, procuramos averiguar na perspectiva das
mulheres do estudo, quais teriam sido as dimensões deflagradoras da obesidade. O material
empírico nos leva a considerar três dimensões, quais sejam: Uso de medicamentos, a
alimentação excessiva e a “impressão” direta de acontecimentos da vida e sofrimentos
experienciados pelas mesmas, reunidos na dimensão passagens da vida.
- Uso de medicamentos
“eu querendo adquirir um peso maior né eu danei tomando
vitamina”
Na busca de uma explicação para o aumento de peso as mulheres identificam a
dimensão uso de medicamentos. Esta categoria está relacionada ao uso de medicamentos
por parte das mulheres do estudo. O aumento do peso estava vinculado ao uso de certos
fármacos por parte das depoentes, como demonstrado nas afirmações abaixo:
“Foi aí naquele momento eu querendo adquirir um peso maior né eu
danei tomando vitamina [polivitamínico]...um ano 3 vezes ao dia...
Não sei se foi a partir daí, porque logo em seguida eu passei a
engordar. Aí nunca mais eu parei.”
(Entrevistada 1)
69
“...isso aqui são os comprimidos que eu to tomando, tem gente que
quando tomam comprimidos [anticoncepcional] faz é engordar né.”
(Entrevistada 3)
“Não esqueço tomei aquele Normamor [anticoncepcional] ganhei
muito peso.”
(Entrevistada 6)
“Eu acho que ajudou a ganhar peso, porque eu tomei comprimido e
injeção [contraceptivos hormonais].”
(Entrevistada 4)
“Pra mim acho que aumentei tomando o anticoncepcional.”
(Entrevistada 5)
Para Cohen e Cunha (2004) a ingestão de certos
medicamentos podem estar
envolvidos na gênese da obesidade. Para os autores os principais remédios envolvidos são os
corticóides, os contraceptivos orais, antidepressivos e orexígenos (medicamentos que
estimulam o apetite).
Existe um senso comum de que o uso de contraceptivos orais (CO) gera um ganho de
peso em mulheres. O tema é controverso e a literatura apresenta estudos que afirmam essa
associação e outros que consideram pouco consistente.
Rosenberg (1998), defende que apesar do ganho de peso estar presente como uma
das principais reclamações de mulheres que utilizam o contraceptivo oral, sendo inclusive
uma razão freqüente para descontinuidade do uso dos mesmos, os estudos não fornecem
embasamento suficiente para apoiar essa percepção. Nesse estudo foram analisados os pesos
diários de 128 mulheres durante quatro ciclos menstruais utilizando CO. A média de peso no
final do estudo não sofreu alterações significativas, ocorreram flutuações de peso esperadas
do próprio ciclo menstrual. Estudos como esse enfatizam a falta de associação entre o uso de
CO e o ganho de peso.
Em um estudo de revisão utilizando as bases bibliográficas CENTRAL, MEDLINE,
EMBASE, Popline, and LILACS realizado por Gallo et al. (2004), avaliou a associação entre
70
o uso de CO e mudança de peso corporal. Os autores concluíram que as evidências
disponíveis são insuficientes para determinar o efeito dos contraceptivos sobre o peso.
Mito ou verdade o fato é que na perspectiva de todas as oito mulheres entrevistadas
no estudo, o uso prolongado dos contraceptivos representou uma forte influência no aumento
do peso corporal.
Alimentação excessiva
“comia era dentro de uma bacia”
A segunda dimensão do tema etnoetiologia da obesidade diz respeito a alimentação
excessiva utilizada para agregar as informações que surgiram nos depoimentos das mulheres
acerca da quantidade de alimentos ingerida, bem como sua inadequação. Apenas duas das
mulheres declararam abertamente que consideravam o ganho de peso decorrente da maior
ingestão alimentar. No entanto, todas as entrevistadas relatam o consumo exagerado de
alimentos.
“eu coloco culpa mesmo na má alimentação, a comida é que foi
mesmo a vilã.”
(Entrevistada 4)
“Ah eu comia bem também, ...comia era dentro de uma bacia
[risos].”
(Entrevistada 3)
“Era o prato cheio mesmo, completo de tudo, eu gosto de farinha,
gostava muito de macarrão, feijão, tudo completo , eu gostava de
comer bem pra ficar bem satisfeita”
(Entrevistada 2)
“Comia demais, arroz com feijão, macarrão, tudo muito”.
(Entrevistada 5)
“Eu acho que foi devido a má alimentação , porque quem se cuida não
fica gorda não.”
71
(Entrevistada 7)
“eu comia muito também, eu pedia uma menina que trabalhava lá na
casa que eu morava vá comprar pão com manteiga, pão com queijo,
com cremucho, coca cola em lata aí era assim eu comia muito.
Comida de panela eu não gostava muito , mas as “goloseimas”
mesmo eu adorava... “
(Entrevistada 4)
A partir da reflexão e análise aprofundada foi possível identificar um dos aspectos
mais imediatista da obesidade, qual seja o aumento da ingestão alimentar. Obviamente, o
desequilíbrio entre o que se ingere e o que se gasta é relevante na etiologia e manutenção da
obesidade, mas não encerra toda a problemática da mesma.
A obesidade é determinada por uma série de fatores que combinados concorrem para
o aumento de peso. Nessa dimensão enfocaremos o fator alimentação excessiva como um
dos aspectos que concorrem para o surgimento da obesidade. Como visto anteriormente o
Brasil atravessa um processo ainda não consolidado denominado transição nutricional que
didaticamente poderia ser caracterizado pela passagem de um estágio bem primitivo, onde
destacaríamos as formas graves de carências nutricionais para outro estágio marcado pelas
Doenças Crônicas Não Transmissíveis – DCNT, incluindo a obesidade. (BATISTA FILHO,
ASSIS & KAC, 2007).
Há evidências de que o perfil alimentar da população brasileira apresentou
excessivas mudanças nos últimos trinta anos. Inquéritos nacionais realizados pelo IBGE entre
os anos de 1974 e 2003, ainda que limitados nos apresenta ilustrativamente a tendência do
padrão de consumo alimentar e valor nutricional da dieta utilizada pela população brasileira.
Em se tratando da distribuição de macronutrientes, houve uma diminuição na participação
relativa de carboidratos totais e complexos (61,66% para 55,9%) próximo ao limite inferior
recomendado, ao passo que a participação dos lipídios aumentou de 25,7 para 30,5.
5
Dessa
forma percebemos que a dieta do brasileiro vem paulatinamente substituindo carboidratos por
gorduras, concorrendo para uma dieta mais calórica (BRASIL,2006).
5
As recomendações de macronutrientes definidos pela OMS (2003) estabelecem os seguintes parâmetros:
Carboidratos: 55 a 75% ; proteína: 10 a 15% e lipídios : 15 a 30% (gorduras saturadas < 10%) do valor calórico
total da dieta.
72
No que se refere à contribuição dos alimentos na dieta brasileira, os inquéritos
apontam para aumento no consumo de biscoitos, açúcar e refrigerantes (400%). Em
contrapartida percebe-se que houve uma queda de 30% a demanda por feijões, raízes e
tubérculos. A tendência na direção de produtos industrializados é nítida
e forte,
caracterizando o que já fora discutido anteriormente sobre o fenômeno de consumo do
mundo globalizado.
Analisando o regime alimentar das mulheres do estudo percebemos que a aquisição,
seleção e o preparo dos alimentos são atividades realizadas pelas próprias mulheres, com exceção
de uma depoente, a mais jovem, que relatou ter a compra dos alimentos realizado por seu
companheiro.
A refeição principal é representada pelo almoço e compreende principalmente arroz,
feijão, macarrão e farinha, sendo a mistura
6
impreterivelmente o frango ou lingüiça. A
análise do recordatório alimentar de duas depoentes desta investigação nos permitiu observar
o padrão do consumo alimentar das mesmas. O regime alimentar dessas mulheres é monótono,
com poucas variações do cardápio e composto basicamente por quatro refeições diárias: café da
manhã, almoço, lanche e jantar.
As práticas alimentares das mulheres do estudo revelam um consumo de alimentos
ricos em açucares, gorduras e cereais, as preparações mais comuns são ricas em gorduras
(frituras), e menor contribuição de legumes e hortaliças nas dietas analisadas, associado a esse
quadro ainda nos deparamos com o aumento do consumo de refrigerantes.
Oliveira & Théband-Mony (1998), analisando as práticas alimentares de mulheres de
diferentes estratos sociais da cidade de São Paulo verificaram o maior consumo de produtos
industrializados entre as classes populares. As mulheres moradoras da Favela de São Remo
investigadas pela pesquisa revelaram utilizar em seu cotidiano alimentos processados dentre
eles os enlatados, vários derivados do leite e produtos de salsicharia.
Colaborando com esses dados, a investigação de Tonial (2001a), sobre as práticas
alimentares de mulheres de diferentes segmentos sociais no Maranhão no período entre os
6
Mistura – termo utilizado pelas mulheres para referir ao prato protéico (carne, frango, peixe)
73
anos de 1998-1999 constatou a valorização de alimentos do tipo industrializado entre o grupo
de mais baixa renda.
No estudo de Ferreira (2003), a prática alimentar das mulheres retrata a sua
identidade cultural, pois através dela preservam aspectos da tradição nordestina. Neste
sentido, os gêneros calóricos valorizados pelo grupo fogem do modelo de dieta “ocidental”,
“fast-food” e convergem para alimentos tradicionais do roçado de subsistência.
- Passagens da vida
“Depois da gravidez é diferença grande...nunca que a gente fica com
mesmo corpo”
Algumas situações, aglutinadas em nosso estudo na dimensão passagens da vida das
depoentes, foram consideradas por elas como deflagradoras do aumento corporal, dentre elas
destacamos: o casamento, a gravidez, sofrimentos, em especial devido a doenças na família e
perdas de entes queridos. As mulheres associaram o ganho de peso com duas passagens
importantes de suas vidas, o casamento e o nascimento de seus filhos.
“aí nessa última gravidez da minha menina que hoje esta com 13
anos, foi onde eu ganhei mais mesmo, meu médico falava , ele
brigava muito porque eu aumentava muito eu ia lá num mês com um
peso e quando eu ia lá de novo.”
(Entrevistada 4)
“Durante a gravidez sempre cada gravidez aumenta mais, sei não ,
porque meu caçula tá com 20 anos e eu não lembro, a gente aumenta
muito, aumenta. Depois da gravidez é diferença grande, tem muita
diferença, nunca que a gente fica com mesmo corpo”
(Entrevistada 2)
“eu fiquei grávida com 15 anos...ganhei muito peso.”
(Entrevistada 5)
74
“Eu casei com ele no ano de 82 e ele era o mesmo peso e eu também
eu tinha 49 kg.”
(Entrevistada 3)
“Antes de casar meu peso era normal, 53 kg, e eu fazia esporte na
escola, futebol de salão, aí quando casei tinha 17 para 18 anos , aí
passei a ficar mais em casa, aí comecei a ganhar peso.”
(Entrevistada 8)
Depois da gravidez é diferença grande, tem muita diferença, nunca
que a gente fica com mesmo corpo
(Entrevista 1)
As informações fornecidas pelas mulheres na presente investigação são consonantes
a alguns estudos qualitativos encontrados na literatura (TEIXEIRA, 2003; FERREIRA, 2005,
PINTO, 2007). Esses estudos destacam que o casamento, a gravidez e o nascimento dos filhos
foram eventos importantes na gênese da obesidade, sendo repetidamente abordados pelas
colaboradoras dos estudos.
Os trabalhos quantitativos que associam o aumento de peso e a história reprodutiva
das mulheres têm associação ainda não muito clara. Em um estudo realizado por Fernandes et
al (2005), em Campinas, São Paulo, verificou a freqüência de sobrepeso, obesidade e fatores
associados entre mulheres de um ambulatório de ginecologia geral. A investigação realizada
com 676 mulheres avaliou entre ou outros dados, o número de gestações e de filhos vivos e
sua relação com o aumento de peso. A comparação realizada entre os grupos de maior ou
menor paridade/filhos vivos e a obesidade não detectou qualquer diferença.
No entanto, outro estudo revela uma associação entre ganho de peso e história
reprodutiva. Trata-se da investigação realizada por Kac e colaboradores (2003), com 486
mulheres brasileiras entre 15-59 anos, residentes na Região Metropolitana de Belo Horizonte,
Minas Gerais, a pesquisa tinha o objetivo de identificar fatores obstétricos potencialmente
associados à obesidade. Os autores buscaram avaliar o grau de associação entre diversas
variáveis obstétricas como idade ao nascimento do primeiro filho, idade de menarca,
nascimento de filho morto, número de filhos e ocorrência de aborto, com a obesidade. Os
resultados da análise revelaram associação importante entre obesidade e as variáveis idade do
75
primeiro parto (<18 anos), menarca (<12 anos) e paridade. É provável que o início antecipado
do ciclo reprodutivo, caracterizado inicialmente pela idade de menarca < 12 anos, e
posteriormente por uma idade prematura ao primeiro parto, ocorreria uma ativação precoce
dos hormônios relacionados ao ciclo reprodutivo. Contudo autores enfatizam que além das
alterações hormonais provenientes da gravidez, fatores psicológicos, culturais e comportamentais
também podem estar envolvidos na dinâmica da obesidade.
A pesquisa de Canteiro (2003) aborda a temática das crenças, mitos e tradições
durante a gravidez. Em sua pesquisa a autora entrevistou mulheres grávidas com objetivo
principal de avaliar se as mesmas são, ou não, influenciadas por mitos e crenças. O estudo
relata que uma crença ainda bastante citada pelas entrevistadas diz respeito à quantidade
alimentar. Algumas mulheres declararam que uma grávida deve comer por dois. Este aspecto
também esta presente em nosso estudo como ilustra a fala de uma das informantes:
“ Na gravidez eu comia muito , sabe aquela coisa de comer por dois
era o que eu fazia”
(Entrevistada 8)
Baião e Deslandes (2008) em uma investigação de abordagem qualitativa discute a
mudança do comportamento alimentar em gestantes que freqüentavam uma unidade de saúde,
localizada em uma comunidade urbana de baixa renda, no Município do Rio de Janeiro, Brasil. Os
resultados demonstram que para uma grávida a dificuldade de controlar o peso e realizar dieta se
tornava pior do que para qualquer outra pessoa. A dificuldade para aderir à dieta era justificada
pela insipidez das preparações e pela “fome” exagerada que sentiam.
Na perspectiva de nossas depoentes o sofrimento também foi importante desencadeador
do aumento de peso. Duas colaboradora relembram passagens importantes em suas vidas:
“Eu perdi um filho problema do coração, me lembro ele morreu nos
meus braços, todo formado, Se ele fosse vivo ia ter 25 anos...lembro
ganhei muito peso nessa época.”
(Entrevistada 5)
“ Tive uma filha com síndrome de Down que morreu com 6 meses, eu
sofri muito, e ganhei muito peso nessa época, sabe era uma forma de
76
esquecer os problemas, porque ela tinha problema do coração e o
médico dizia que ela não ia sobreviver e isso me fazia muito mal.”
(Entrevistada 4)
Conrad (1954) afirma que a comida é como um narcótico para a pessoa obesa e que
esta procura no alimento um escape das situações estressantes da vida. Rotman e Becker
(1970), numa revisão de casos clínicos de 33 homens e mulheres extremamente obesos, que
tinham sido entrevistados por psicanalistas, encontraram o comer em excesso como um
mecanismo de defesa utilizado contra sentimentos inconscientes de abandono e desesperança,
originado por situações de perda.
Para Loli (2000), o individuo se reconduz pelo alimento aos estágios mais primitivos
da relação humana. E parece ser justamente por meio da comida que o obeso procura, em um
infrutífero esforço, saciar sua fome de proteção. Assim diante da dificuldade em lidar com
sentimentos cotidianos de frustração, esses se utilizam da comida como recurso da busca de
potência.
Em nosso estudo a perda dos filhos representou um momento marcante na história de
vida de duas depoentes, e trouxe repercussões traduzidas no aumento do consumo de
alimentos, contribuindo na perspectiva dessas mulheres para a etnoetiologia do ganho
excessivo de peso.
6.1.3 Estigma e as repercussões nas distintas esferas da vida
O terceiro tema que emergiu das entrevistas, sugere uma trama complexa relacionada
à vivência com o excesso de peso associada ao estigma atribuído as mulheres do estudo
permeando vários aspectos da vida dessas informantes. A realização das entrevistas na
residência das mulheres, sem interferência de outros profissionais ou familiares possibilitou o
diálogo acerca de temas mais delicados, como preconceito e estigma. Durante a análise desta
temática percebemos que as mulheres entrevistadas apresentavam situações nas quais o
77
estigma da obesidade se fazia presente trazendo repercussões no seu dia a dia, influenciando
as relações sociais, familiares e de trabalho.
- Sociais
“gorda não tem nome ... é gorda”
O estigma sofrido pelas mulheres do estudo cria rótulos e reforça o sofrimento
psicológico causado por essa situação, essa dimensão referente às relações sociais é destacado
no texto de Goffman:
A sociedade estabelece os meios de categorizar as pessoas e o total de
atributos considerados como comuns e naturais para os membros de
cada uma dessas categorias. Os ambientes sociais estabelecem as
categorias de pessoas que têm probabilidade de serem neles
encontrados. (1988, p.11 – 12) :
A sociedade cria meios para categorizar as pessoas e, da mesma forma, estabelece
certos atributos considerados como comuns e naturais para os membros sociais. Dessa forma,
um indivíduo que possui um traço que chama à atenção e afasta os demais, em vez de ser
inserido normalmente nas relações sociais, é um indivíduo estigmatizado. A característica
apresentada, física ou não, é diferente daquilo que os outros consideram “normal”.
Essa estigmatização da obesidade causa prejuízos ao bem estar social e psicológico
dessas mulheres. As relações sociais são fortemente influenciadas por esse fenômeno. As
informantes referiram que o excesso de peso contribuiu com a restrição de algumas atividades
sociais, como sair com a família, ir à praia ou visitar amigos e parentes.
“Fico mais dentro de casa, eu sinto vontade de sair ir uma praia,
passear com ele [marido], uma pizzaria, sorvete. Bem que eu
gostaria, sair toda mulher gosta, mas não saio.”
(Entrevistada 3)
“mas sincero mesmo eu não faço nada pra sair, na verdade é muito
difícil sair de casa”
(Entrevistada 5)
78
“quando eu vou pra praia, eu não tomo banho não, a não ser que
fosse uma praia deserta.”
(Entrevistada 5)
Esse retraimento social parece estar ligado a percepção negativa que as mulheres
têm de seus corpos o que pode conseqüentemente levar ao isolamento dificultando a interação
social deste grupo. Parecer não haver refúgio para fugir do estigma, exceto a vida privada no
próprio lar. Assim, o
estigma da gordura influencia a evasão da vida pública e o
confinamento privado como relatado pelas mulheres do nosso estudo.
Para Stenzel (2002) os indivíduos sentem-se cada vez mais isolados do mundo dos
“magros” , como se estivessem convivendo em um mundo não apropriado para eles. Como o
autor sugere as conseqüências para esse grupo são a depressão, o isolamento e problemas
relacionados a comida e ao peso.
As informantes deixam de freqüentar determinados locais, vestir certas roupas e até
evitar o contato afetivo em virtude do medo da rejeição do outro face a grande quantidade de
gordura no corpo. Esse aspecto foi abordado pela Marisa:
“É difícil , porque as lojas tem mais número pequeno. Às vezes
acontece de ir pra loja não ter e voltar pra casa. Esses dias mesmo eu
fui numa loja e eu comprei uma roupa lá, experimentei na hora
apressada e trouxe né. Chegando em casa eu vesti, era para eu ir
para um casamento , vesti não gostei guardei e mandei devolver,
troquei por roupa para os meninos [filhos] e peguei uma roupinha
que eu já tinha mesmo e fui, mas não usei a que eu comprei, achei que
não deu legal. Na hora tava muito cheio a loja, eu vesti apressada e
na pressa peguei. Mas já cheguei em casa e não gostei.”
(Entrevistada 1)
No que concerne ao vestuário, vários outros depoimentos agregaram-se ao anterior,
demonstrando a dificuldade das mulheres em encontrarem roupas adequadas ao seu tamanho
corporal.
79
Ave Maria minhas roupas estão todas perdidas, as roupas ficam
todas encostada
(Entrevistada 3)
eu queria ir pro casamento e não tenho roupa, porque minhas roupas
não cabem em mim, nem as calças...
(Entrevistada 8)
Quando a gente vai comprar é difícil de experimentar a roupa, da
vontade de chorar dá vontade de desistir.
(Entrevistada 4)
aí pedia uma roupa e diziam : tem não , tem numero grande não, ou
as vezes você chegava na loja aí você achava aquela roupa linda
maravilhosa, aí vem a vendedora com a roupa desse tamanho ,
horrível sabe
(Entrevistada 4)
As mulheres mais gordas encontram maior dificuldade em encontrar vestuário
adequado às suas medidas, em especial os modelos utilizados por mulheres magras. O mundo
da moda não tem respondido adequadamente as consumidoras com excesso de peso. O estudo
de Cardoso e Costa (2007) procurou analisar a relação e o envolvimento das mulheres obesas
com o vestuário e com a moda. Os resultados mostraram que as mulheres obesas agregam um
valor de proteção e conforto às roupas. Muitas se mostraram insatisfeitas com as lojas de
roupas femininas, alegando que as mesmas utilizam roupas com manequim maior voltadas ao
público mais velho. As autoras relatam que as depoentes do estudo também citaram a
dificuldade em seguir as tendências da moda devido à escassez da oferta.
Para Mattos (2008), a aparência física estar relacionada às representações que as
pessoas possuem sobre o caráter de alguém. O estigma da gordura é, assim, uma construção
social que os desqualifica cada vez mais, na medida em que as pessoas atribuem juízos de
valores pejorativos ao excesso de peso, identificando o gordo como um indivíduo preguiçoso
e descontrolado. Em nosso estudo encontramos em uma das falas a mesma afirmativa:
80
“ah eles dizem mesmo, que [as pessoas gordas] não fazem nada e que
são gulosos mesmo”
(Entrevistada 2)
“a senhora tem que fazer uma ginástica, pra senhora ficar mais
magra, a senhora é bonita , mas você se descuida.”
(Entrevistada 5)
Percebemos que o obeso passa a ser estigmatizado na sociedade contemporânea, em
vários aspectos da vida, e na medida em que há uma expectativa crescente de que o ser
humano magro (“sarado”) é saudável, belo e importante. É nessa perspectiva que Goffman
(1988) afirma que só há estigma quando há expectativa social de pelo menos um dos atores
envolvidos numa relação. Dessa forma, é possível compreender que um atributo que
estigmatiza alguém não é em si mesmo nem honroso nem desonroso, mas é a atitude e a
relação que as pessoas tomam em relação à marca corporal que atribui um valor. O estigma,
nessa perspectiva, é uma relação entre atributo e estereótipo (o que sou/o que tenho – o que
esperam de mim).
“O pessoal quando vê uma gorda de longe, como eu te digo por
exemplo : Lá vem a Maria e a mãe dela , não o pessoal não diz assim,
diz: lá vem a Maria e a gorda, aquela mulher gorda. Pessoal até diz
que gorda não tem nome, perde até o nome é gorda, é gorda.”
(Entrevistada 4)
“ficar julgando você pelo seu peso, muda até o endereço, quando
dizem assim: ei tu vai lá na casa da fulana quem é a fulana? Aquela
gordinha lá da rua tal. Você fica de referência.”
(Entrevistada 5)
A discriminação foi relatada algumas vezes pelas depoentes, no entanto é válido
destacar que durante as entrevistas nos deparamos com depoimentos que oscilavam entre o
riso e o choro, no que concerne a questão do estigma da obesidade. As colaboradoras falavam
de suas dores algumas vezes de forma espirituosa:
81
Uma amiga minha quando liga aqui fala: diz “beleia”[risos] que
é baleia né. Aí eu respondo diz seca veia”
(Entrevistada 4)
Os meninos [filhos dela] ficam falando e tudo, comentando, fica
comentando [risos] ê gorduchinha tá cheia de gordura, vai comer
fica colocando o prato desse tamanho.
(Entrevistada 3)
“me chamam de gordinha aí eu respondo eu sou gorda porque eu
como bem graças a Deus [risos]”.
(Entrevistada 6)
Os risos nestas falas podem representar um mecanismo de proteção, encobrindo um
sofrimento emocional, camuflando sofrimentos e frustrações. No entanto, no decorrer da
conversa as mesmas mulheres modificam o tom de suas falas e relatam suas vivências em
outra perspectiva:
Eu acho que porque , pelo fato das pessoas terem preconceito com os
gordos, porque o gordinho é uma pessoa normal para sociedade,em
relação a saúde não, mas pra sociedade não é nenhum marginal nem
nada, é gordo.
(Entrevistada 4)
Ela [vendedora] me via com um olhar e eu me via com outro, eu tava
olhando a visão interior os meus pensamentos e ela via meu corpo o
externo, às vezes ali me deixava muito magoada, chateada.
(Entrevistada 3)
Já briguei muito com trocador e motorista de ônibus, que ficavam
dizendo não vai passar , não vai passar [na catraca]...isso me dava
um ódio.
(Entrevistada 7)
As mulheres passam a ter vergonha do seu próprio corpo diante do que os outros
pensam e falam do seu corpo. Goffman (1988, p. 17) afirma que “A vergonha se torna uma
possibilidade central, que surge quando o indivíduo percebe que um de seus atributos é
impuro ”.
82
“você chega até a sentir vergonha de si própria, não querer se olhar,
aí deixa a gente muito triste...”
(Entrevistada 2)
As pessoas obesas parecem ser mais vulneráveis a discriminação do que outros
grupos. Para Wang e colaboradores (2004), ao contrário do ocorre com outros grupos
minoritários, as atitudes negativas para indivíduos com excesso de peso são aceitas e até
mesmo incentivadas. As pessoas obesas freqüentemente relatam que são ridicularizadas em
público, por exemplo, são abordados por desconhecidos em mercearias que tecem
comentários sobre suas escolhas alimentares ou que as repreendem em restaurantes por
comerem a sobremesa.
Para esses autores a disseminação deste estigma pode afetar a opinião de indivíduos
com excesso de peso acerca deles próprios. A teoria da Identidade Social postula que quando
os indivíduos se percebem como membros de um grupo, são levados a favorecer os membros
do seu grupo, a fim de manter e reforçar a sua identidade social positiva. No entanto, o grupo
de obesos parece ver seu próprio grupo de forma negativa.
A vergonha do corpo expressa por algumas mulheres do estudo refletem também em
alguns discursos de menor valia acerca delas próprias. Percebemos em algumas falas que as
mulheres carregam concepções do obeso com desvalia, seja na aparência ou na falta de força
de vontade para mudar. Assim como ressaltam os autores Lewis e Puymhroeck (2008), o
grupo com obesidade possui preconceito em relação a si mesmo e com um outro “igual” e em
suas relações interpessoais.
A experiência do preconceito vivida pelo obeso para consigo espelha uma tentativa
de, por um lado, excluir de si mesmo sentimentos indesejados e, por outro, estampar a
máscara social, que busca esconder e invalidar os potenciais das pessoas que discrimina.
Dessa forma, o “outro- gordo” representa frequentemente o papel de espelho, tornando-se
alvo dos sentimentos de baixa estima, de desvalia e de discriminação. Esse é um mecanismo
de introjeção-projeção, concernente aos estudos da Psicologia, ou seja, um reflexo de autoimagem projetada no outro (GASPAR, 2003).
83
“Se eu emagrecesse mais ficava até mais bonita, bem né.”
(Entrevistada 5)
“uma camiseta que cubra assim nessa altura aqui (na coxa) passando
aqui na minha perna pra não ficar assim bem visto assim né o
bumbum da gente , a frente,a barriga, porque fica tão feio, eu acho
feio eu não gosto não , eu ia vestir uma camiseta assim que me
deixasse eu bem, que aí não ia da pra eu ter vergonha.”
(Entrevistada 2)
“eu fico impressionada que tem gente na praia mais gorda que eu e
fica de fio dental, [risos] misericórdia, vestem, eu que fico com
vergonha, eu não uso. Eu não tomo banho não.”
(Entrevistada 8)
“por exemplo na sua casa quando você vai arrumar a sua casa, você
vai querer as coisas mais bonitas que chamem atenção pela beleza e
não pela feiúra.”
(Entrevistada 4, 45 anos, respondendo sobre a preferência que as
pessoas têm pelo magro em detrimento do gordo).
Essa internalização do estigma da obesidade parece apresentar-se completamente
diferente do comportamento de outros grupos marginalizados e portanto merece ser tema de
novas investigações.
Wang e colaboradores (2004) em um estudo com 116 pessoas com objetivo de
investigar a influência do estigma da obesidade em indivíduos com excesso de peso, sugerem
que há várias teorias para explicar porque este estigma aos indivíduos com excesso de peso
seja tão disseminado e recorrente. Um ponto importante diz respeito ao fato do peso ser
encarado como algo controlável, diferentemente de outros traços estigmatizados tais como a
raça e o gênero. A crença de que as pessoas com obesidade são preguiçosas é relatado na
literatura e percebido pelo grupo do estudo. Essa crença supõe que os indivíduos com
excesso de peso encontram-se nessa situação simplesmente devido à falta de motivação ou a
responsabilidade para uma circunstância que esteja sob seu controle.
84
A Entrevistada 4 nos apresenta uma passagem muito interessante ilustrando a
dimensão do preconceito:
“eu gostava de ficar do lado de uma pessoa mais gorda, para me
sentir mais magra. Risos. Uma menina que trabalhava aqui era bem
gordinha, aí a minha filha dizia: ei vamos levar ela pra praia vamos
botar biquíni nela [risos], você vê aquilo no outro sente prazer
porque diz não sou só eu que sou gorda tá vendo ela
é gorda
também”
(Entrevistada 4)
“Eu olho para aquelas pessoas assim bem mais gorda, aí fico meu
Deus, ai meu Deus do Céu como é que pode a pessoa chegar o ponto
desse jeito, aí eu olho assim pra mim e digo assim até que eu me
conformo mais um pouco, porque eu não to desse jeito e tem muita
gente que ta assim. Aí eu já me sinto um pouco conformada”
(Entrevistada 2).
Para Maffesoli (1988), o corpo individual necessita do corpo coletivo para ser
curado. O autor busca demonstrar que a pessoa só existe devido a sua relação com o outro,
social e culturalmente, aprende-se a “dar o troco”, como no velho ditado “ olho por olho,
dente por dente”. A pessoa com obesidade passa a ser uma das principais estigmatizadoras de
uma outra pessoa obesa. Essa concepção irá culminar com preconceito e desgosto individual e
coletivo, seja através da palavra ou da expressão corporal.
Em relação ao estigma sofrido pelo grupo de pessoas com obesidade, vale
pontuarmos a mídia com uma parcela de responsabilidade na estigmatização da população
obesa, uma vez que promove em alguns casos a ridicularização e perpetua uma
permissividade humorística em relação a esse grupo. Essa imagem não passou despercebida
pelas mulheres do estudo. As mesmas relataram a ausência de pessoas obesas na mídia, bem
como a forma caricata como a obesidade é representada na televisão.
85
“Não tem gordinha [na mídia], sempre é mais os mais lights,
escolhem mais as mais magrinhas.”
(Entrevistada 5)
“Com certeza aparece mais na televisão o mais magro.”
(Entrevistada 1)
“ah aparece mais [na televisão] como motivo de piada né... O pessoal
faz até comédia com a Dona Lorca daquele do poooode...”
(Entrevistada 4)
No programa televisivo de grande audiência da Rede Globo - “Zorra Total”,
encontramos um quadro onde a profissional de saúde com o nome convidativo de Dra. Lorca,
personagem vivida por Fabiana Karla recomenda o oposto do que é preconizado para uma
alimentação adequada.
O quadro gerou polêmica inclusive no Conselho Federal de Nutricionistas – CFN.
Para a então presidente do Conselho, Nelcy Ferreira Silva, a personagem criada pela atriz
transmite uma mensagem errônea ao telespectador sobre a educação alimentar, eixo das ações
em programas públicos e privados para combater doenças que afetam a população brasileira
como a obesidade, a hipertensão, o diabetes e as doenças cardiovasculares. Para a
nutricionista a linha do quadro humorístico em questão desvirtua este preceito e pode
confundir o telespectador sem contribuir para o seu aprendizado sobre a importância da
educação alimentar. 7
A mídia impõe um modelo estético a ser seguido, a valorização do corpo, de acordo
com esse padrão
estabelecido e disseminado pelos meios de comunicação, gera uma
percepção negativa acerca do grupo de pessoas obesas.
Além disso, esse reflexo vem
potencialmente prejudicando a inserção dos obesos na disputa ou concorrência no mercado de
trabalho, caracterizando uma desigualdade social (FELIPPE & SANTOS, 2004).
7
Mensagem do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) assinada pela presidente da entidade, Nelcy
Ferreira da Silva, dirigida ao diretor-geral do programa Zorra Total, Maurício Sherman.
86
- Familiares
“Ele [marido] sempre me ajudou... sempre ele esteve presente ali do meu
lado”
Outro aspecto importante a ser analisado nessas falas é a questão das repercussões na
esfera da vida familiar. Sobre esse aspecto os relatos das mulheres se manifestaram de forma
dicotômica. As depoentes retratam a presença do apoio familiar, no entanto os relatos também
indicam que os familiares contribuem para a
disseminação do estigma. Algumas falas
ilustram essas afirmativas:
“Ele [marido] sempre me ajudou sempre me levava no médico, me
acompanhava sempre ele esteve presente ali do meu lado, mas nunca
fez nenhum comentário que era gorda ou não era, isso nunca
atrapalhou nossa vida.”
(Entrevistada 1)
“dentro de casa mesmo, às vezes eu sinto assim que meu filho tem
muita vontade que eu seja mais magra para me arrumar para sair do
lado dele mais light, em casa eu já senti isso.”
(Entrevistada 2)
“Os meninos [filhos dela] ficam falando e tudo, comentando, fica
comentando [risos] ê gorduchinha tá cheia de gordura, vai comer fica
colocando o prato desse tamanho.”
(Entrevistada 3)
“Fala, minha filha sempre diz, a senhora tem que fazer uma ginástica,
pra senhora ficar mais magra, a senhora é bonita , mas você se
descuida...”
(Entrevistada 5)
“Ele [marido] diz assim: agora não posso mais abarcar como
abarcava quando namorava ela (risos).
(Entrevistada 3)
As relações familiares são fundamentais para a organização e suporte para o
enfrentamento das dificuldades da vida. Dessa forma, a família tem uma função importante na
promoção de suporte físico, emocional, afetivo, econômico para seus membros. As pessoas se
organizam em sua estrutura, a fim de formar uma rede de apoio familiar para “cuidar” e “ser
87
cuidado” Esse suporte recebido e percebido pelos indivíduos contribui para o enfrentamento
de situações estressantes, para o alívio físico e mental. (STUART, 1991). Constatamos que
para algumas mulheres esse suporte contribuiu com modos de sobrevivência diante do
fenômeno da obesidade:
“A minha família nunca tirou brincadeira comigo não... Nem dos
meus filhos não, nem meu esposo nunca comentou nada assim”
(Entrevistada 1)
“Mas assim ele[esposo] me apóia me ajuda muito, ele compra as
coisas...ele não se opõe para comprar as coisas, até porque ele sabe o
que nós sofremos”
(Entrevistada 4)
No entanto, alguns discursos de nossas depoentes também ressaltam que as mesmas
são discriminadas dentro do próprio grupo familiar. Ao invés do apoio, encorajamento e
suporte esperado pelas mulheres, algumas falas ainda que mascaradas por piadas e
brincadeiras reforçam atitudes preconceituosas.
O posicionamento de alguns familiares,
utilizando-se de apelidos maldosos, comentários jocosos e a cobrança para mudança de
atitudes e comportamentos pode contribuir para o aumento do sofrimento enfrentado pelo
individuo obeso. Nos relatos percebemos que as mulheres passam a sentir vergonha de si
mesmas, procurando isolamento do convívio social e consideram-se como um “peso” para a
família.
O estigma enfrentado por essas mulheres também parece ser disseminado no próprio
entorno familiar, ainda que aparentemente as falas não demonstrem qualquer sentimento
negativo em relação aos familiares. As repercussões na esfera familiar das colaboradoras do
estudo destacam a importância da inclusão da família nos programas de assistência e
acompanhamento de pessoas obesas.
88
- Trabalho
“Eu acho que o patrão não quer gente gorda”
Finalmente, como última dimensão presente nesta temática do estigma e suas
repercussões nas distintas esferas da vida, a vivência com as relações de trabalho foi relatada
por três mulheres do estudo, nas falas percebemos a recorrência do preconceito enfrentado por
nossas depoentes:
“Ah o pessoal tem preconceito com gordo, eu acho, eu tenho pra mim
que tem, porque eles não falam na sua cara, porque assim, não por eu
ser feia, eu não sou feia, mas se eu fosse magra eles queriam. Eu acho
que o patrão não quer gente gorda, porque para trabalhar no balcão
, ser balconista.”
(Entrevistada 5)
“Eu deixei de trabalhar porque eu passava mal aí a empresa se
responsabilizava me mandava para casa, aí eu deixava de produzir.
Até porque no meu trabalho, eu trabalha com público, com comércio,
trabalhava com os clientes diretamente, e ficava pensando o que eles
falavam de mim ...não sei o que eles deviam falar.”
(Entrevistada 4)
“As meninas que trabalhavam comigo diziam, ih agora que a
entrevistada 6 chegou, não cabe mais ninguém na sala...”
(Entrevistada 6)
Os discursos retratam o efeito causado pelo estigma da obesidade no ambiente de
trabalho dessas mulheres, a postura preconceituosa do empregador ou colega de trabalho,
ainda que disfarçada em um tom brincalhão, repercute e influencia negativamente na vida das
mesmas.
Segundo Gaspar (2003) em sua obra intitulada: Obesidade e trabalho,
atitudes
preconceituosas contra trabalhadores obesos são comuns e afetam sua saúde e sua qualidade
de vida, sendo esta lesada pelas limitações no atendimento das necessidades físicas,
emocionais e sociais deste trabalhador e pela dificuldade do ser humano em lidar com as
diferenças. A autora também defende que em meio à discriminação, o trabalhador obeso
busca reconhecimento no próprio ambiente de trabalho, visando a construção de um vínculo
mais prazeroso entre o que é e o que realiza.
89
Para Luz (2001) nenhum outro grupo parece sofrer maior rejeição profissional do
que o grupo de obesos. Segundo o autor, em um estudo da consultoria Catho realizado com
1.400 executivos, 73% dos presidentes e diretores e 68% dos gerentes de empresas enfatizam
que ser gordo é considerado uma razão suficiente para barrar um pretendente a funcionário.
O autor ainda afirma que obesos têm menor chance no mercado de trabalho que outras
minorias discriminadas, como negros e ex-presidiários.
Stenzel (2002), também contribui com os demais autores relatando que no Brasil, os
empregadores consideram os obesos menos desejáveis para a contratação que trabalhadores
com peso considerado normal, ainda que ambos possuam as mesmas habilidades necessárias
para o cargo. É importante avaliarmos as conseqüências dessas atitudes discriminatórias
contra o indivíduo com excesso de peso, uma vez que essas ações também acarretam para
essas mulheres a perda de uma possível autonomia financeira e do engajamento no mercado
de trabalho.
6.1.4 Trilhando os Caminhos da Cura
A literatura médica é extensa quanto aos diferentes tratamentos para a obesidade,
existem várias alternativas terapêuticas que, combinadas, conseguem significativas perdas de
peso. Entre as estratégias utilizadas os estudos destacam: as dietas de baixas e muito baixas
calorias, a psicoterapia, a terapia comportamental, o exercício físico, e o uso de medicamentos
que atuam no controle e regulação da adiposidade corporal (MANCINI & HALPERN, 2000).
No escopo desta última temática, as dimensões do percurso terapêutico seguido
pelas mulheres do estudo e a perspectiva de cura emergiram e permearam as falas.
- Percurso terapêutico
“tudo que era coisa que o pessoal me ensinava eu tomava”
Durante as entrevistas as mulheres do estudo invariavelmente destacavam o percurso
terapêutico trilhado. Impulsionadas por familiares, amigas ou profissionais de saúde as
90
mulheres submetiam-se as mais diferentes modalidades de tratamento do excesso de peso.
Essa busca pela perda de peso transitava entre as dietas da moda, acompanhamento médico e
o uso de medicamentos.
“Eu já fiz dieta, já emagreci , já engordei, cheguei aos 74 kg, já
tomei chá verde, uma menina daqui do bairro tava me dizendo para
eu tomar vinagre.”
(Entrevistada 3)
“antes tudo que era coisa que o pessoal me ensinava eu tomava, se a
pessoa falasse eu já tava fazendo cheguei a fazer a dieta da sopa,
inclusive (risos) tô até com ela ali, que foi adquirida lá do hospital do
coração, dizem que foi adquirida lá né, porque dizem que foi feita
pra perder peso, pra perder gordura eu tomei ela também. “
(Entrevistada 1)
“Eu já tomei medicamento que vende em revista, eu já tomei plan 30
(chá elaborado a base de ervas de ação laxante e diurética)”
(Entrevistada 6)
“eu tomava fórmula [medicamento - fluoxetina e sibrutamina
anorexígenos] eu tomava uma fórmula, duas fórmulas aliás que eu
tomava lá, que me ajudou muito.”
(Entrevistada 1)
A característica central da situação cotidiana da vida do indivíduo estigmatizado está
na possibilidade de sentir-se aceito. Diante da angústia provocada pelas situações nas quais o
estigmatizado é exposto, principalmente diante da falta de aceitação social, ele procura
continuamente corrigir o seu problema. É comum, portanto, os gordos se lançarem em busca
de cirurgias plásticas e bariátricas, exercícios físicos extenuantes e excessivos, dietas
rigorosas e utilização de medicamentos para emagrecimento, sem prescrição médica. Em
geral, esses recursos não provocam modificações significativas na vida dessas pessoas
(MATTOS, 2008).
Lottenberg (2006) nos apresenta essa relação entre o surgimento de novas dietas e a
aderência por parte dos indivíduos com obesidade.
91
No histórico do tratamento da obesidade, periodicamente, novas
propostas são lançadas e, na maioria das vezes, com grande
aceitabilidade pelo público. O impacto é sempre muito grande quando
novas dietas são lançadas no mercado, principalmente, porque
representa para o obeso uma nova tentativa ou chance para emagrecer.
O marketing utilizado na divulgação, tanto na imprensa escrita quanto
falada, é muito grande, envolvendo os indivíduos em uma série de
ilusões, sendo a principal, a promessa de perda rápida de peso. Sem
dúvida, este é o maior desejo do obeso, razão pela qual, adere com
facilidade a novas propostas de tratamento. A disponibilidade de
dietas radicais é cada vez maior e, embora variem na forma, mantém
sempre o mesmo tema, ou seja, emagrecer sem sacrifício e eleger
alguns alimentos como vilões. Normalmente, penalizam o indivíduo
obeso e, em longo prazo, diminuem as suas chances de
emagrecimento.( LOTTENBERG,p.24)
A autora defende que as dietas alternativas estão associadas ao conceito de ausência
de sacrifícios e solução imediata do problema, contribuindo para sua maior visibilidade e
aceitação.
Nesse contexto o mercado das dietas, dos produtos e serviços indicados para a perda
de peso, como medicamentos e produtos alimentícios da linha diet, light, vem crescendo
rapidamente em vários países. Este mercado é bastante lucrativo e desenvolve-se em virtude
da existência da magreza como padrão estético, o qual também é beneficiado pela divulgação
de um “peso ideal”, muitas vezes difícil de alcançar (GONÇALVES, 2004).
As experiências de nossas depoentes em relação à perda de peso foram as mais
variadas e demonstraram pouca efetividade. Estimuladas pela mídia, familiares e amigos,
algumas das entrevistadas referiram que por um período curto, chegaram a utilizar parte da
renda familiar para a compra de produtos para o emagrecimento, destacando os “shakes” e
fitoterápicos. No entanto, de uma maneira geral as mulheres relataram que costumavam
realizar modificações na alimentação, passando a consumir determinados alimentos ou
preparações consideradas apropriadas para a perda de peso.
“Já me ensinaram aquele sopão de verduras que bota só legumes, me
ensinaram, passar o dia inteiro só comendo verdura”
(Entrevistada 2)
92
“eu já fiz também a do limão[dieta] uma vez , só que no meio da dieta
eu quebrei a do limão porque eu não aguentava comer tanto limão”
(Entrevistada 1)
O percurso terapêutico trilhado fez com que essas mulheres se submetessem aos
diferentes tratamentos. Abordaremos a seguir a concepção de cura desejada pelas mulheres do
estudo.
- Cura
“mas é como eu to dizendo, que tem cura, mas se você mesmo quiser.”
Nesta última dimensão destacamos que para nossas depoentes a obesidade é uma
doença que tem cura. Essa percepção de que a obesidade é uma enfermidade surge nos relatos
a seguir:
“Eu acho que é doença sim, é porque não é uma coisa normal não, e
eu acho que tem cura pelo fato de você voltar ao normal perder
aquele peso e manter sempre ali haja cura , mas se você se desleixar
logicamente que vai voltar tudo de novo, aí... não vai valer de nada,
mas é como eu to dizendo, que tem cura, mas se você mesmo quiser.”
(Entrevistada 2)
“Eu acho, eu acho que é doença, mas que tem cura.”
(Entrevistada 4)
“Eu acho, mas tem cura. Para isso precisa de alimentação
balanceada e já ouvi o povo dizer que fazer essa alimentação é
mentira, é não , porque eu fiz numa gravidez e fiquei magra e porque
não pode agora, e eu não caminhava era só alimentação. O peso vai
diminuir com a alimentação e a caminhada.”
(Entrevistada 5)
A expressão de cura entre as mulheres entrevistadas está ligada aos conceitos de
auto-controle, força de vontade e perseverança. Para as entrevistadas a cura é fortemente
influenciada por suas próprias ações:
93
“Eu acho assim, cabe assim aquela pessoa querer, porque se você
tiver o domínio próprio do seu corpo, da sua mente de tudo, eu acho
que pode ficar naquele regime do que você conseguiu, eu acho que
pode . Tem aqueles que fazem aquela redução do estomago não é,
daquela grossura não fica normal, ali se ela disparar foi porque ela
não teve domínio próprio sobre ela, então se ela quiser se manter
daquele jeito ali pode haver a cura, de ela se manter sempre,né
agora se ela relaxar,ela vai voltar ao normal, ao que era ... que era
antigamente se ela não se dominar, não tiver domínio sobre o corpo
dela, a mente dela, ela volta aí a cura não existe” .
(Entrevistada 3)
“Quando a gente começa a tirar as coisas que a gente gosta logo
assim de uma vez é um choque, pra você ali dá aquele choque, mas
quando você começa a querer fazer, você vê que não é muito difícil, é
quando você começa a ver os efeitos”.
(Entrevistada 4)
“A partir do momento que você tem consciência e você começa a
entrar num processo de tratamento eu vou me cuidar, eu já tenho
muita consciência que eu preciso mudar, eu ainda preciso mudar
muito.”
(Entrevistada 4)
A doença deve ser encarada como um momento de crise defende Canguilhem (2000),
sendo muito mais complexa que um simples fenômeno científico, uma vez que está ligada a
história de vida das pessoas. A cura significa construir uma nova ordem interna que sugere a
transformação em uma forma de funcionar com menor limitação. É importante perceber nas
falas que as mulheres que as mesmas se declaram agentes do seu processo de auto
transformação e cura.
Na perspectiva das mulheres a cura parece está veiculada aos benefícios à saúde:
“Ah vai me trazer o bem... Ele [médico] já disse até que desde a
proporção que eu for perdendo, até me disse nessa ultima consulta
que se eu continuar perdendo controlando a pressão vamos testando
tirar os medicamentos, até tirar todos.”
(Entrevistada 4)
94
O depoimento anterior vai ao encontro do discurso biomédico em relação ao
tratamento da obesidade. Para Zanella (2005) alguns estudos aleatórios e prospectivos
afirmam veementemente que a perda de peso intencional minimiza o efeito de várias
complicações clínicas associadas à obesidade, bem como pode prevenir ou retardar o início
das mesmas.
No entanto é válido destacarmos que o conceito de cura para essas mulheres não está
ligado à obtenção de um “corpo sarado”, o modelo midiático não parece ser o almejado pelas
mulheres do estudo. Algumas das entrevistadas citaram suas metas em relação ao peso
desejável:
“Ah pelo menos uns 70Kg... é menos né o certo? Mas Uns 80kg eu
acho que já ficaria bem ...pra mim.”
Entrevistada 1
“Ah eu queria ficar com 60kg, estava bom!”
Entrevistada 2
O peso considerado aceitável para o grupo de mulheres do estudo, esta relacionado
ao peso que as torne aptas a realizar suas atividades diárias, que proporcione a redução no uso
de medicamentos. Os discursos não parecem implicar necessariamente na busca do modelo
hegemônico de corpo magro, como ideal de beleza. As mulheres do estudo buscam certo
“padrão de normalidade” e dessa forma sentirem-se mais aceitas pela sociedade.
Ao concluirmos a última dimensão cura nos parece legítimo refletirmos sobre o
atendimento dispensado a essa mulheres. A obesidade tratando-se de um fenômeno
multifatorial requer acompanhamento que compreenda o indivíduo em sua singularidade.
Concordamos com Teixeira (2003) quando enfatiza que se faz necessário ser oferecida uma
assistência especializada, onde esse grupo de usuárias seja considerado como seres humanos
integrais, contando com escuta qualificada e atuação diferenciada para melhor atender ao
grupo.
95
7. CONCLUSÕES
A obesidade é um fenômeno complexo que tem acometido na contemporaneidade
parcela importante da população mundial. Os dados apresentados na revisão bibliográfica deste
estudo destacam o crescimento histórico na prevalência desta enfermidade no Brasil. Nesse
contexto epidemiológico vale destacar que a prevalência do excesso de peso no país tem sido mais
significativa entre a população feminina, adulta e nos estratos de menor renda.
A complexidade desse fenômeno no universo feminino se revela para além dos dados
epidemiológicos. As histórias de vida dessas pessoas ultrapassam a amplitude de seus corpos
e nos revela que as mesmas são muito mais do que pesam. São mulheres que vivenciam um
fenômeno e toda sua multidimensionalidade. A realização desse trabalho propiciou captar a
riqueza interativa entre sujeito e objeto, fato somente possível devido à natureza qualitativa do
estudo.
Diante do material empírico desta pesquisa percebemos a árdua tarefa que se nos
apresentava, a de transcrever para um plano linear (escrita) a riqueza tridimensional das
percepções e vivências das mulheres. Neste exercício buscamos apresentar a auto-percepção
do grupo em relação ao corpo e à obesidade; reconhecer a etiologia da obesidade tal como
percebida pelas mulheres; compreender as dimensões mais relevantes do processo que
vivenciam e identificar a influência da obesidade em distintas esferas da vida.
Os resultados demonstram que a obesidade encontrada nas mulheres do estudo
através da classificação biomédica do índice de massa corpórea superior a 30 kg/m2, não
reflete a percepção que as mesmas
possuem sobre seus corpos. As mulheres não se
classificam como obesas e parecem mais inclinadas a adotarem palavras como gordas ou
gordinhas. O termo obesa recebe uma conotação negativa e
representa um estágio de
agravamento no qual as mulheres ainda não se reconhecem. A insatisfação corporal também
foi percebida nos relatos das mulheres do estudo, associada à negação do corpo avantajado. A
insatisfação corporal parece estar veiculada a forma como a mídia valoriza o corpo magro e o
elege como padrão a ser seguido por todos os indivíduos. Outro ponto relevante diz respeito à
influência do discurso médico na percepção de corpo das depoentes. Percebemos a
dependência do saber médico na determinação do ganho de peso das mulheres entrevistadas.
96
A pesquisa mostrou que a gênese da obesidade decorre de múltiplos determinantes.
Na perspectiva das mulheres a etiologia do ganho de peso ocorreu durante a vida adulta e
possui sendo destacado pelas depoentes: o uso de medicamentos, o excesso alimentar,
acontecimentos da vida e sofrimentos vivenciados pelas mesmas.
Sobre as mulheres de nosso estudo “pesam” não apenas a gramatura de seus corpos,
mas também os estigmas e discriminações atribuídos a sua aparência. O estigma se traduz em
olhares recriminadores, insultos, comentários jocosos e significa a impossibilidade de
inserção no mercado de trabalho formal. O estigma da obesidade permeia as distintas esferas
da vida das informantes do estudo, principalmente em suas relações interpessoais, sociais,
familiares e de trabalho. Além disso, ele atinge a dimensão do próprio grupo das informantes,
em relação a si mesmo e ao outro igualmente obeso. Percebemos que as informantes do
estudo transitam entre vítimas e algozes do estigma da obesidade, seja como um mecanismo
de projeção ou de proteção.
Finalmente emergiu das falas de todas as depoentes o percurso trilhado na busca do
emagrecimento, motivadas pelos sintomas imediatos do excesso de peso ou por profissionais
de saúde e apoiadas por amigos e familiares, as mulheres se submeteram as mais diferentes
modalidades para redução de peso. Com exceção da cirurgia bariátrica, as informantes
citaram as mais variadas formas de emagrecimento, transitando entre tratamentos com
profissionais de saúde e uso de medicamentos; tratamento sem auxílio desses profissionais e
com utilização de dietas indicadas por amigas ou veiculadas na mídia.
A compreensão da obesidade a partir da perspectiva de um grupo de mulheres
obesas, usuárias de um Centro de Saúde da Família, proporcionou o reconhecimento do
caráter multidimensional deste fenômeno, entendendo que esse processo ultrapassa o aspecto
biológico e imediato e relaciona-se com as dimensões sociais, históricas, culturais e políticas.
Entendemos que a tradição qualitativa não autoriza extrapolar os resultados deste
estudo para outros grupos e contextos. Contudo, diante da riqueza da vivência das mulheres
acerca do objeto de investigação, acreditamos que esta investigação possa contribuir para uma
ampliação da consciência do fenômeno da obesidade por parte das pessoas que vivenciam o
processo, bem como para os profissionais de saúde que acompanham esse grupo.
97
É necessário que haja maior valorização dos diversos fatores envolvidos nos quadros
de obesidade, em especial os que dizem respeito aos significados, percepções e opiniões que
configuram a constituição da subjetividade e singularidade deste grupo de pessoas que
vivenciam o excesso de peso e buscam atendimento no serviço público de saúde. Tal
compreensão é fundamental para a proposição de planos e estratégias de atendimento no
campo das políticas de saúde.
É fundamental a continuidade de estudos que busquem apreender aspectos
simbólicos e subjetivos, acerca da obesidade, com intuito de ampliar seu campo de
investigação acompanhando
a característica dinâmica desse fenômeno. Entendemos que
alguns pontos desta investigação necessitam ser aprofundados, dentre eles destacamos a
importância do papel da família nesse processo, compreendendo-a como suporte social para
quem vivencia a obesidade.
Na conclusão desta dissertação pude perceber o quanto o pesquisador qualitativo
precisa entregar-se ao projeto e junto com ele desconstruir e construir novamente seus
pressupostos e conhecimentos. Durante toda minha vida acadêmica, anterior a Residência em
Saúde da Família e ao Mestrado em Saúde Pública, estava mais voltada a desenvolver estudos
centrados nos aspectos objetivos dos fenômenos, baseado em números, quantidades e
ancorados na teoria das ciências naturais. A finalização desta investigação significou uma
construção pessoal de iniciação na formação em pesquisa qualitativa como área acadêmica,
permitindo agregar ao meu passado educacional e científico, constituintes de minha
subjetividade, a riqueza do olhar das ciências sociais e humanas, valorizando o espaço das
emoções, vivências, percepções e dessa forma vislumbrando novas possibilidades de
desenvolver o conhecimento.
98
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108
APÊNDICES
109
APÊNDICE I : Roteiro da Entrevista
Dados Gerais:
Nome:
Naturalidade:
Estado Civil:
Peso:
IMC:
Cor:
Ocupação:
Numero de filhos
Altura:
Idade:
Escolaridade:
Renda familiar
Perguntas Norteadoras da Investigação:
1) Percepção do corpo ;
2) Etiologia da obesidade na perspectiva das mulheres;
3) Conseqüências para a vida;
110
APÊNDICE II - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, Maria Soraia Pinto aluna do Mestrado em Saúde Pública da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Ceará estou desenvolvendo a pesquisa intitulada “Muito mais do
que Pe(n)sam : percepções de usuárias com obesidade de um Centro de Saúde da
Família do município de Fortaleza – Ceará.” sob a orientação da profa. Dra. Maria Lúcia
Magalhães Bosi.
Com este trabalho pretendemos observar o que as mulheres pensam sobre obesidade bem
como suas possíveis interferências na vida das pessoas afetadas por este tipo de agravo na
população estudada. Para tanto, realizaremos a verificação de seu estado nutricional com
utilização do peso e altura em dados colhidos nos prontuários, bem como estaremos
realizando uma entrevista individual. Gostaria de acrescentar que não será necessário nos
encontrarmos em outro ambiente que não sua casa ou o centro de saúde da família e não
haverá nenhum gasto extra. Também não serão tiradas fotos, nem realizadas filmagens,
apenas a gravação de aúdio da entrevista que será feita através de um aparelho eletrônico de
propriedade da pesquisadora, respeitando todos os preceitos éticos, garantindo sigilo absoluto
e anonimato quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa. Informo também que a
Sra. tem o direito de se retirar da pesquisa a qualquer momento, bastando apenas informar a
pesquisadora sua desistência. O participante poderá entrar em contato com a pesquisadora,
Maria Soraia Pinto, pelo telefone: (85) 3463-9607, caso necessário.
ATENÇÃO: Para informar ocorrências irregulares ou danosas durante a sua
participação no estudo, dirija-se ao:
Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará
Rua Coronel Nunes de Melo, 1127 Rodolfo Teófilo
Telefone: 3366.8338
CONSENTIMENTO PÓS – INFORMADO
Tendo compreendido perfeitamente tudo o que me foi informado sobre a minha participação no
mencionado estudo e estando consciente dos meus direitos, das minhas responsabilidades, dos
riscos e dos benefícios que a minha participação implicam, concordo em dele participar e para
isso eu DOU O MEU CONSENTIMENTO SEM QUE PARA ISSO EU TENHA SIDO
FORÇADO OU OBRIGADO.
Fortaleza-Ce, ______/______/______.
(Assinatura ou digital)
Maria Soraia Pinto
da voluntária do estudo
(Responsável pelo estudo)
111
ANEXOS
112
ANEXO I - PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO CEARÁ
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MUITO MAIS DO QUE PE(N)SAM: - Pós Graduação em Saúde