OLHAR
AS RAZÕES DE
ACREDITAR
«Só se vê bem com o coração, o essencial
é invisível aos olhos»
Saint-Exupéry in Principezinho
Em hebraico , a mesma palavra que diz
olho (‘ajin) significa também nascente,
poço.
Para o judeu o órgão que preside à visão,
faz entrar na própria profundidade do
ser.
O olho é por isso a lâmpada do corpo e,
ao mesmo tempo, uma epifania, da luz e
do amor, que S. João apresenta como as
definições de Deus.
Por isso é tão importante o olhar como
forma de comunicação e de perceção.
Então vamos olhar, com os olhos e com o
coração, com a razão e o afeto…
Olhar o legado de fé que recebemos,
revisitando alguns dos grandes
pensadores que influenciaram, a
reflexão, a vida, a forma de pensar e agir,
da nossa sociedade, sobretudo de finais
do século XIX e durante o século XX.
Para tentarmos ver se este legado de fé recebido é na
nossa vida, ou pode ser, um sol nascente de
esperança, de sentido existencial, de energia para
encarar a realidade da vida, também de sentido para
perdoar, para recomeçar, para lutar pela justiça…etc…
Ou se é apenas um
ocaso, que pode ser
muito bonito,
contudo, não passa
disso, um ocaso…
Kierkegaard (dinamarquês) é um
filósofo que atravessa a 1ª metade
do século XIX, 1813-1855. dizia
ele que:
«A função da oração não é
influenciar Deus, mas
especialmente mudar a
natureza daquele que ora.”
“A fé é a mais elevada
paixão de todos os
homens.”
“A angústia é a possibilidade da
liberdade. É o medo dessa
possibilidade. A angústia é o puro
sentimento do possível.”
“Se houver coragem de ir mais além, se
constatará que a então realidade será
muito mais leve do que era a
possibilidade. E o grande salto será o
mais difícil, será cair nas mãos de Deus,
será a coragem.”
O que é que o leva a pensar
assim?
Será que ainda faz sentido, hoje,
estudar o seu pensamento e aquilo
que o influenciou?
Todo o pensamento de Kierkegaard está voltado
para a questão da
subjetividade, da existência e da singularidade.
Considerou a sua época como a época da
impessoalidade. A partir desta reflexão todo o seu
pensamento se centra na tentativa de compreender, a
relação do indivíduo com a sua existência…
Jean-Paul Sartre
Francês – existencialista,
1905-1980, um pensador que
atravessou o século XX
"O importante não é aquilo que fazem de
nós, mas o que nós mesmos fazemos do
que os outros fizeram de nós."
"Não há necessidade de
grelhas, o inferno são os
outros."
Acreditava que os
intelectuais têm de
desempenhar um papel
ativo na sociedade.
"Quando, alguma vez, a liberdade
irrompe numa alma humana , os
deuses deixam de poder seja o que
for contra esse homem."
"Cada homem deve
inventar o seu caminho
"Ser homem é tender a ser Deus; ou, se
preferirmos, o homem é fundamentalmente o
desejo de ser Deus."
"Quando muitos homens estão juntos, é
preciso separá-los pelos ritos, senão matamse uns aos outros."
Friedrich Nietzsche
1844 - 1900
A morte de Deus e a elevação do
Super-Homem
“Já ouviram falar daquele
louco que acendeu uma
lanterna numa manhã clara,
correu para a praça do
mercado gritando
incessantemente:
“Procuro a Deus! Procuro a Deus!".
Como muitos dos que estavam na
praça não acreditam em Deus aquele
gesto provocou muito riso...
“Onde está Deus?”,
gritava ele. “Eu devo
dizer-vos: nós o
matamos – vocês e eu.
Todos somos
assassinos... Deus está
morto. Deus continua
morto. E fomos nós que
o matamos...”
- (Friedrich Nietzsche, Gaia Ciência (1882), parte
125.)
Em Assim falou
Zaratustra, Nietzsche
destaca a
necessidade do
anúncio do superhomem.
Nele, Zaratustra, seu personagem principal,
proclama a falência da civilização e a aurora
de uma nova era.
É o anúncio de que o
homem deve superar
a si mesmo, à sua
potencialidade
negada.
Procurando sacudir o velho homem, que vivia
enclausurado no seu pessimismo e ilusão, o
novo pretende ser substituto daquele. O superar
típico do super-homem, entendido como ato de
abertura para o nada ou para o sagrado, nada
mais é do que a própria vontade de poder.
Albert Camus 1913-1960
foi romancista, ensaísta e
jornalista. Disse sempre que
não era filósofo e sobretudo
que não era existencialista
Sem a cultura, e a liberdade relativa que ela
pressupõe, a sociedade, por mais perfeita
que seja, não passa de uma selva. É por isso
que toda a criação autêntica é um dom para
o futuro.
O seu pensamento foi influenciado
por Søren Kirkegaard e Friedrich
Nietzsche
A imaginação oferece às pessoas
consolação por aquilo que não podem
ser e humor por aquilo que
efectivamente são.
"É-nos impossível saber
com segurança se Deus
existe ou não existe.
Por isso, só nos resta apostar. Se
apostarmos que Deus não existe e ele
existir, adeus vida eterna, olá Inferno! Se
apostarmos que Deus existe e ele não
existir, não faz a menor diferença,
ficamos num zero o zero metafísico"
"Amo ou venero poucas
pessoas. Por todo o resto,
tenho vergonha de minha
indiferença.
Mas aqueles que amo, nada jamais
conseguirá fazer com que eu deixe de
amá-los, nem eu próprio e
principalmente nem eles mesmos."
Karl Marx 1818-1883
Alemão - família de
origem judaica
Não é a consciência do homem que
lhe determina o ser, mas, ao contrário,
o seu ser social que lhe determina a
consciência
A religião é o suspiro da criança
acabrunhada, o coração de um
mundo sem coração, assim
como também o espírito de
uma época sem espírito. Ela é
o ópio do povo.
A história da sociedade até aos
nossos dias é a história da luta de
classes.
Até agora os filósofos se
preocuparam em interpretar o
mundo de várias formas. O
que importa é transformá-lo.
Tudo o que era sólido se desmancha no
ar, tudo o que era sagrado é profanado,
e as pessoas são finalmente forçadas a
encarar com serenidade sua posição
social e suas relações recíprocas.
(Manifesto Comunista)
A filosofia de Feuerbach foi,
certamente, a grande inspiração
de Marx para a sua forma de
encarar a religião
Temos de colocar no lugar do amor de Deus, o
amor dos homens, como uma única, verdadeira
religião, no lugar da fé em um qualquer Deus, a fé
no homem em si, em sua força, a fé em que o
destino da humanidade não depende de um ser
fora ou acima dela, mas dela própria, que o único
diabo do homem é o próprio homem (Feuerbach)
http://www.youtube.com/watch?v=xNB_JtK
U_hY
Todo homem nasce
como muitos homens e
morre de forma única.
O que vale não é o quanto se
vive...mas como se vive.
O que me preocupa não
é o grito dos maus. É o
silêncio dos bons.
Somente um Deus nos
poderá salvar!
O homem age como se fosse o senhor e
mestre da linguagem, enquanto que na
verdade a linguagem permanece mestra do
homem.
A verdadeira medida de um
homem não se vê na forma como
se comporta em momentos de
conforto e conveniência, mas em
como se mantém em tempos de
controvérsia e desafio
Nenhuma época soube tantas e tão
diversas coisas do homem como a
nossa. Mas em verdade, nunca se
soube menos o que é o homem.
Emanuel Lévinas
1906-1995
Podemos chamar-lhe o
filósofo da alteridade
Na sua obra transporta a memória e a inquietação
de um século marcado pela dominação do homem
sobre o outro homem. Sofrimento e mal são
impostos de maneira deliberada, que nenhuma
razão limitava na exasperação da razão tornada
política e desligada de toda a ética”.
A obra de Lévinas transmite o alerta
de uma emergência ética de se
repensar os caminhos da filosofia a
partir de um novo prisma, de se
partir do eu já em direção ao Outro.
Uma tal inspiração Lévinas buscará
na sabedoria bíblico-judaica.
O rosto do Outro recorda as
obrigações do ‘eu’”
“
Pode dizer-se que há uma epifania do
rosto. Epifania esta que vem destacar
eminentemente que o rosto, na sua
expressão, se revela como alteridade
absoluta.
Na sua epifania o rosto é capaz de
se expressar e é capaz de falar por si
e o seu dizer revela a sua própria
significação ética.
O rosto do outro é, antes de mais, uma
ordem, um mandamento: não matarás!
O que quer dizer que neste processo
de construção da ética no rosto, além
do “eis me aqui” e do “não matarás”,
encontra-se uma imposição.
De facto, no rosto do outro, mesmo nu, há uma
ordem e um pedido de clemência. O “não
matarás” está inscrito no rosto do outro, sendolhe expressão original. Brilhando em seus olhos,
em sua abertura transcendental.
Paul Ricœur 19132005
Soi-même comme un autre
O pensamento de Ricoeur desenvolve-se no
horizonte de uma teoria do sujeito, de uma
reflexão sobre a pessoa como “sujeito capaz”,
dotado de capacidades, potencialidades e
disposições cuja realização só pode ser
alcançada no nível intersubjetivo e institucional.
.
Seu ponto de partida não é o
Eu da 1ª pessoa (eu penso,
eu sou), mas o Si, reflexivo
de todas as pessoas.
.
Para Ricoeur o si é distinto
do eu. O eu se põe ou é
deposto, é exaltado ou humilhado, enquanto “o si está
implicado reflexivamente nas operações cuja análise
precede. O eu, formulado na primeira pessoa do
singular (“eu penso”, “eu sou”, “eu existo”) exprime a
posição imediata, absoluta do sujeito, sem
confrontação com o outro. O si, pronome reflexivo de
todas as pessoas gramaticais, exprime o primado da
mediação reflexiva, da posição indireta do sujeito
Paul Ricœur 19132005
A questão do sujeito, distinto do eu (Ego) e da
consciência, é decisiva para o campo tanto da
política como da ética. Se não temos a ideia
que um sujeito de direito é, ao mesmo tempo,
“um sujeito por si mesmo”, um sujeito capaz, “e
um sujeito político, como podemos sustentar e
defender uma política dos direitos do homem?”
.
No ano da Fé faz sentido olhar para o
pensamento destes homens?
Será que eles têm ainda alguma coisa para nos
dizer? Ou então, depois de os ouvirmos faz
sentido celebrar um ano da Fé?
Quando temos um papa que parece empenhado
em mostrar um rosto de Igreja mais próximo das
pessoas, mais liberto do poder, revisitar estes
pensadores pode ajudar-nos a clarificar a nossa
missão enquanto educadores de uma escola
católica?
Kant dizia que a razão não era um pressuposto
da fé, mas era o seu escudo terá a reflexão
destes homens algo a ensinar-nos sobre a
vivência da fé enquanto compromisso de vida?
O legado de fé que recebemos é uma mais valia
na nossa vida, pode ajudar-nos a recuperar e, ou,
a manter o sentido da esperança na vida e no
futuro?
Tem, este legado recebido, influência na forma
como nos posicionamos diante dos problemas da
exclusão que cada vez são maiores?
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