AcórdãoAcórdão do processo 0285800-78.2007.5.04.0018 (RO)0285800-78.2007.5.04.0018 (RO)
Redator: MARIA INÊS CUNHA DORNELLESMARIA INÊS CUNHA DORNELLES
Participam: BEATRIZ RENCK, MARIA CRISTINA SCHAAN FERREIRABEATRIZ
RENCK, MARIA CRISTINA SCHAAN FERREIRA
Data: 14/12/201114/12/2011 Origem: 18ª Vara do Trabalho de Porto Alegre18ª Vara do Trabalho de
Porto Alegre
Teor integral do documento (RTF) |
Andamentos do processo
EMENTA: RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE
PÚBLICO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM
ATIVIDADE-MEIO. A conjugação dos artigos 29 e 55, da Lei de
Licitações, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração
Pública, autoriza concluir que, na condição de tomador dos serviços, o
ente público está obrigado a, periodicamente, tomar as contas do
prestador contratado e, diante de qualquer irregularidade, dar por
findo o contrato, nos exatos termos dos artigos 78, I e 80, da mesma
Lei, inclusive sob pena de responsabilidade civil e penal do
administrador (art. 83, Lei n. 8.666/93). Além disso, ao prever que os
princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito
privado são aplicáveis aos contratos regidos pela mencionada Lei, o
artigo 54 autoriza adoção da teoria da responsabilização subjetiva.
Caso em que não há qualquer elemento nos autos, que autorize
concluir que a autarquia acompanhou o desenvolvimento do contrato
de prestação de serviços, exigindo a prestação de contas, no que
respeita às obrigações sociais. Assim, a decisão que reconhece a
responsabilidade subsidiária do ente público pelas obrigações do
prestador, contratado mediante licitação, não desrespeita o artigo 71
da Lei n. 8.666/93. Adoção da Súmula n. 331, V, do TST.
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença
proferida pelo MM. Juiz Paulo Ernesto Dorn, da 18ª Vara do Trabalho de Porto Alegre,
sendo
recorrentes
GRABRIEL
FERNANDO
FERREIRA
DA
SILVA,
SUPERINTENDÊNCIA DE PORTOS E HIDROVIAS - SPH E MUNICÍPIO DE PORTO
ALEGRE e recorridos OS MESMOS, SEGURANÇA E TRANSPORTE DE VALORES
PANAMBI LTDA E BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S.A..
Inconformadas com a sentença das fls. 388-95, apresentam recurso ordinário o
demandante, a segunda e o terceiro demandados.
O autor objetiva ampliar a condenação em horas extras bem como o deferimento do
pedido de pagamento de multa moratória, conforme expressa na peça processual das fls.
407-12
A Superintendência de Portos e Hidrovias - SPH, inicialmente, objetiva o reexame
necessário da decisão de Primeiro Grau, em observância ao Decreto-lei 779/69. No
mérito, insurge-se contra a responsabilidade subsidiária ao argumento de que a
empregadora do recorrido sempre foi a primeira reclamada, com personalidade jurídica,
patrimônio e gestões próprias. Invoca em seu favor o entendimento expresso na Súmula
Vinculante nº 10 do STF. O apelo tem por objeto, ainda, insurgência contra a condenação
ao pagamento de horas extras, intervalos não-concedidos, FGTS, juros e correção
monetária (fls. 413-18).
O Município de Porto Alegre (Hospital Materno Infantil Presidente Vargas) não se
conforma com a responsabilidade subsidiária que lhe foi imposta argumentando com a
regular contratação da empresa prestadora, com prévio processo de licitação nos moldes
da Lei 8.666/93. Suscita violação aos artigos 2º, 5º, II, 22, XXVII e 37, XXI, da
Constituição Federal, 265 do Código Civil, 71, parágrafo primeiro, da lei 8.666/93 (fls.
419-25).
Foram opostas contrarrazões (fls.443-45, 446-49, 450-53).
O Ministério Público do Trabalho, no parecer das fls. 465-69, sugere o nãoprovimento dos apelos.
Os autos vem conclusos para julgamento.
É o relatório.
ISTO POSTO:
I- PRELIMINARMENTE
1. REMESSA DE OFÍCIO. SÚMULA Nº 303 DO TST.
A Superintendência de Portos e Hidrovias - SPH reivindica o reexame necessário da
sentença, prerrogativa do Decreto-lei nº 779/69 (fl. 414 do apelo).
Sem razão.
Segundo o entendimento sumulado pelo Colendo TST, provocado pela alteração do art.
475 do CPC, decisões judiciais contrárias à Fazenda Pública não estão sujeitas ao duplo
grau de jurisdição quando a condenação for de valor equivalente a até 60 salários
mínimos. Nesses termos a Súmula nº 303: FAZENDA PÚBLICA. DUPLO GRAU DE
JURISDIÇÃO. I - Em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo
na vigência da CF/1988, decisão contrária à Fazenda Pública, salvo: a) quando a
condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários mínimos.
Essa a situação dos autos. Conforme se constata na sentença (decisum à fl. 395), a
condenação totaliza R$ 4.000,00 (quatro mil reais). Esse valor é inferior ao limite cogitado
no verbete supracitado.
Por conseguinte, a sentença não é passível de reexame ex officio por este Regional.
Cabe destacar que as prerrogativas inerentes à Fazenda Pública aplicam-se ao ente
público devedor e serão observadas em caso de inadimplemento, pela primeira
reclamada, das parcelas objeto da condenação.
II - NO MÉRITO
RECURSO ORDINÁRIO DA SUPERINTENDÊNCIA DE PORTOS E HIDROVIAS - SPH E
RECURSO ORDINÁRIO DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE. Matéria comum.
1. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.
A autarquia ré (SPH) e o terceiro reclamado (Hospital Materno Infantil Presidente
Vargas/Município de Porto Alegre) foram reputados subsidiariamente responsáveis pelos
créditos devidos ao reclamante, ancorando-se a sentença nas Súmulas 331, IV, do TST e
11 deste Tribunal (fls. 392-93).
Os entes públicos divergem da posição firmada na Origem.
Sem razão, contudo.
Já se tornou remansosa na jurisprudência a tese de que, mesmo admitida a
intermediação de mão-de-obra em atividade alheia ao objeto social, o tomador de
serviços deve responder por eventuais créditos trabalhistas não satisfeitos. Pelas
características singulares, no caso de ente público tomador, esta responsabilidade
merece tratamento especial, nos termos do item V, da Súmula n. 331 do TST: Os entes
integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas
mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento
das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A
aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. Ao se adotar a orientação
jurisprudencial sumulada, não se nega vigência ao art. 71 da Lei n. 8.666/93 ou à Súmula
Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal.
No caso, verifica-se que as partes firmaram contrato de prestação de serviços de
vigilância, relativamente à prestação de serviços de vigilância armada para as instalações
do porto organizado de Porto Alegre e Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (fls.
184-205 e 243-78). Não há notícia nos autos de que tenha havido regular procedimento
licitatório e, ainda que houvesse, se entende que a sua mera observância (ou sua
dispensa para os casos autorizados em lei) não desobriga o ente público, na condição de
tomador, de acompanhar o regular desenvolvimento do contrato de prestação de serviços.
De fato, o próprio artigo 29, da Lei n. 8.666/93, ao estabelecer os requisitos para a
habilitação em processo licitatório, exige, no inciso IV, a prova de regularidade relativa à
Seguridade Social e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), demonstrando
situação regular no cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei. Ora, se a lei
exige, para a habilitação à licitação, que a empresa se encontre em dia com as
obrigações decorrentes dos vínculos de emprego que mantém com seus funcionários,
este raciocínio, com maior razão, deve ser adotado para o desenrolar do contrato
respectivo. Esta conclusão, aliás, é decorrência natural dos princípios que orientam a
Administração Pública e também da expressa previsão do artigo 55 da Lei n. 8.666/93. Tal
dispositivo, ao tratar das cláusulas necessárias em todo contrato firmado com a
Administração Pública, prevê a obrigação do contratado de manter, durante toda a
execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas
as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação” (inciso XIII). Esta regra,
por certo, alcança aquela do artigo 29, transcrita acima.
Portanto, da conjugação dos artigos 29 e 55, da própria Lei n. 8.666/93, que as
reclamadas pretendem ver aplicada ao caso, pode-se inferir que, na condição de
tomadora dos serviços, elas estavam obrigadas a tomar as contas da prestadora (pelo
menos no que respeita às obrigações documentadas), e diante de qualquer
irregularidade, dar por findo o contrato, nos exatos termos dos artigos 78, I e 80, da
mesma Lei, inclusive sob pena de responsabilidade civil e penal do administrador (artigo
83, Lei n. 8.666/93).
Neste mesmo sentido extrai-se entendimento do TST, em julgado do processo n. AIRR51.2001.5.041.0043, da lavra do Exmo. Juiz Convocado Flavio Portinho Sirangelo, de
16.02.2011, em que o Município do Rio de Janeiro vinha questionando a
responsabilização subsidiária que foi reconhecida em razão de prestação de serviços ao
ente público após realização regular de processo licitatório, nos termos da Lei n. 8.666/93.
Há expressa referência a que o TST, ao editar súmula da sua jurisprudência, considerou o
alcance da responsabilização das pessoas jurídicas de direito público em razão das
obrigações trabalhistas das prestadoras de serviços, no que respeita à negligência no
controle da idoneidade destas ao cumprir os contratos assumidos, à luz dos preceitos
constitucionais e infraconstitucionais cuja violação estaria sendo alegada em recurso.
Conforme os fundamentos do acórdão, ainda que se possa reconhecer que não se
poderia imputar ao ente público tal responsabilização em razão de culpa in eligendo,
quando cumpridas todas as exigências do processo licitatório - inexistente, na espécie,
como antes salientado - , o mesmo raciocínio não prevalece frente ao exame da culpa in
vigilando, que não pode ser arredada, porque “decorrente da omissão em verificar o
devido cumprimento das obrigações contratuais da empresa prestadora contratada, o que
permitiria considerar inexistente violação a qualquer dispositivo legal.
A tese da referida decisão do TST tem lastro, por igual, no julgamento do ADC n. 16/DF,
em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o ente público não é refratário ao
alcance de responsabilidade por condenação judicial que se funda em eventual omissão
na fiscalização do cumprimento do contrato ajustado, via licitação, valendo a reprodução
do excerto:
“Note-se que é razoável exigir-se do administrador público, quando contrata
empresa para prestação de serviços, a tarefa de exercer a fiscalização do objeto
pactuado, inclusive a regularidade do cumprimento das obrigações trabalhistas.
Como se tem ponderado na discussão desse tema, a liberação do pagamento ao
prestador deve ser precedida por prévia comprovação de quitação destas
obrigações. Ora, se é verdade que incumbe ao contratado responder pelos
encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução
do contrato (art. 71, caput, Lei 8.666/93) não menos verdade é que esta mesma
execução 'deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da
Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para
assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição', como prevê o
art. 67, caput, da Lei das Licitações ...”.
E é neste contexto que o acórdão do TST conclui o seguinte:
“Reitere-se, portanto, que mesmo afastada a possibilidade de
responsabilização objetiva do Estado em hipóteses como a debatida
nos autos, uma vez considerado constitucional o art. 71, § 1º da Lei n.
8.666/93 no julgamento do DC 16/DF, pelo Supremo Tribunal Federal,
o certo é que aquela Corte relegou ao Tribunal Superior do Trabalho
reconhecer a responsabilidade com base nos fatos de cada causa.
Segundo o Ministro Cezar Peluso, o STF não pode impedir o TST de,
à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a
responsabilidade do poder público. Exatamente neste sentido é que
se entende subsistir o dever do estado em responder
subsidiariamente pelos débitos trabalhistas diante do elemento
subjetivo, representado na culpa do agente”.
Diante desses fundamentos, resulta evidente que a imposição da responsabilidade
subsidiária dos entes públicos, tomadores dos serviços, atenta para o artigo 71 da Lei n.
8.666/93, interpretado de modo sistemático com os demais dispositivos daquela mesma
lei. Por demasia, a responsabilidade própria do direito privado é plenamente invocável na
espécie, por força do artigo 54 da Lei n. 8.666/93, segundo o qual “os contratos
administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos
de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos
contratos e as disposições de direito privado”.
Pelo exposto, não demonstrada nos autos a periódica verificação, pelos recorrentes, das
contas da empresa prestadora relativamente aos contratos de trabalho de seus
empregados, afigura-se correta a sentença, que concluiu pela responsabilidade
subsidiária, na linha da Súmula nº 331, item V, do TST.
Cabe destacar que a prestação de trabalho do reclamante em benefício dos tomadores de
serviços é presumida no período que coincide com a vigência do contrato firmado entre as
empresas integrantes do polo passivo. Logo, sua responsabilidade subsidiária em relação
às parcelas deferidas em sentença decorre da condição dos entes públicos de tomadores
dos serviços prestados pelo autor, em sintonia com o multicitado entendimento da Súmula
nº 331, item IV, do TST, tratando-se de terceirização de atividade-meio.
Por todo o exposto, inexiste qualquer violação aos dispositivos constitucionais e legais
invocados, tendo-se por prequestionados, para todos os efeitos, os artigos 2º, 5º, II, 22,
XXVII, 37, XXI e 97, da Constituição Federal, 265 do Código Civil, 71, parágrafo primeiro,
da Lei 8.666/93.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA SUPERINTENDÊNCIA DE PORTOS E
HIDROVIAS - SPH.
1. EFEITOS DA REVELIA. APLICABILIDADE AO ENTE PÚBLICO. RESPONSÁVEL
SUBSIDIÁRIO.
O Juízo a quo decretou a revelia da primeira reclamada, Segurança e Transporte de
Valores Panambi Ltda, em face de sua ausência injustificada à audiência, aplicando-lhe a
penalidade de confissão ficta quanto à matéria de fato (ata da fl. 158).
Defende a autarquia-recorrente a impossibilidade de extensão automática destes efeitos,
em razão da inexistência de qualquer responsabilidade de sua parte no feito e,
principalmente, porque contestou a ação. Afirma violados os artigos 48, 302, I, 320, II,
350 e 351, da legislação processual civil assim como o princípio do devido processo legal
- artigo 5º, LIV da Constituição Federal (fl. 413, das razões recursais).
Com efeito, a revelia e a confissão ficta aplicadas à primeira ré, ex-empregadora, não
prejudica os litisconsortes, conforme dispõe o art. 350 do CPC. Os efeitos da revelia, em
verdade, ficaram adstritos aos fatos pertinentes ao contrato de trabalho mantido entre o
autor e a primeira ré.
De qualquer sorte, a prova produzida pela recorrente será devidamente valorada nos
autos, nos tópicos pertinentes.
Nada a prover, por ora.
2. DIFERENÇAS DE FGTS.
Insiste a recorrente na ausência de responsabilidade subsidiária e reitera que nunca foi
responsável pelos depósitos do FGTS do contrato de trabalho, tratando-se de “obrigação
personalíssima da primeira reclamada, real empregadora”.
A responsabilidade subsidiária abarca todas as verbas devidas em decorrência da relação
de trabalho mantida entre o reclamante e a primeira reclamada, nos termos da Súmula nº
331, IV, do TST.
Nega-se provimento.
3. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
Condenação acessória, que segue a sorte do principal.
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE E RECURSO DA RECLAMADA
SUPERINTENDÊNCIA DE PORTOS E HIDROVIAS - SPH. Análise conjunta, em face
da identidade de matéria.
1. JORNADA DE TRABALHO. HORAS EXTRAS. REGIME COMPENSATÓRIO.
INTERVALOS.
O reclamante teve deferido o pagamento de a) horas extras, assim admitidas todas as
laboradas além da décima hora em cada jornada e observado o limite mensal estipulado
nas normas coletivas (190h40min), porquanto mais benéfico, com limitação dos efeitos
financeiros ao adicional em relação as indevidamente compensadas até o limite mensal
(Súmula 85 do C. TST) , com reflexos, do valor hora e mais o adicional, inicialmente em
repousos semanais remunerados e feriados e, posteriormente, já considerado o aumento
da média remuneratória, em gratificações natalinas, férias acrescidas de 1/3, abatidos os
valores alcançados aos mesmos títulos; b) remuneração dos intervalos não-concedidos,
com acréscimo do adicional de 50% e reflexos em repousos semanais remunerados,
férias acrescidas de 1/3 e gratificações natalinas.
A reclamada Superintendência de Portos e Hidrovias - SPH se opõe à condenação,
alegando, em suma, que não é responsável pelo débito em questão; o recorrido, se
laborou em tais condições, foi devidamente remunerado por sua empregadora; os efeitos
da confissão ficta não podem ser-lhe estendidos; competia ao reclamante provar suas
alegações (fls. 416-17, do recurso).
O reclamante, por sua vez, requer o pagamento de diferenças de horas extras, assim
consideradas as excedentes da oitava hora diária e quadragésima quarta semanal, uma
vez que não vieram aos autos os controles de horário, a cargo da ex-empregadora,
Segurança e Transporte de Valores Panambi Ltda, revel e confessa nos autos. Salienta
que “o simples fato da existência da norma coletiva não permite que se observe o regime
de compensação horária, inválido no caso em exame, em vista da jornada praticada”
(fls.408-11 das razões recursais).
Examina-se.
A discussão pertinente à responsabilidade do ente público restou dirimida em tópico
anterior. A concessão das parcelas em comento decorrem dos efeitos da revelia e
consequente pena de confissão aplicadas à primeira demandada, empregadora do
demandante, cujos efeitos não foram repassados à ora recorrente, que arcará com o
pagamento dos haveres trabalhistas unicamente na hipótese de descumprimento da
obrigação pela devedora principal.
Explicitado isso, a teor do § 2º do artigo 74 da Consolidação das Leis do Trabalho,
constitui obrigação do empregador efetuar o registro da jornada sempre que seu
estabelecimento contar com mais de dez empregados. Não comparecendo ao chamado
judicial e omitindo-se em trazer aos autos a documentação em questão, impende
presumir verdadeira a jornada de trabalho apontada na petição inicial, como delimitado na
Origem, sopesada a prova testemunhal do feito (fls. 375-77). Na trilha da sentença,
admite-se que o autor laborava em seis dias da semana, das 19h às 07h do dia seguinte,
bem como não desfrutava intervalos para refeição e prorrogava a jornada por mais 15
(quinze) minutos, em média, duas vezes a cada semana.
A jornada praticada (o empregado laborava em seis dias da semana em jornadas de doze
horas) invalida a prática do regime compensatório previsto nos instrumentos coletivos
(cláusula 18ª, fl. 18, por exemplo), motivo porquê vinga a reivindicação do autor de
perceber, como extras, as horas de labor excedentes da oitava diária e quadragésima
quarta semanal. Incide à espécie o item IV da Súmula 85 do Tribunal Superior do
Trabalho.
Pelos mesmos fundamentos, não se cogita de compensação pelo banco de horas, já que
ultrapassado o limite a que se refere o §2º do artigo 59, da CLT, base legal adotada pelo
Julgador da Origem ao considerar como horas extras aquelas além da décima hora diária
de trabalho (fl. 389v,da sentença).
Desta forma, nega-se provimento ao recurso ordinário da reclamada e acolhe-se o
recurso ordinário do demandante para conceder-lhe horas extras, assim admitidas todas
as laboradas além da oitava hora diária e quadragésima quarta semanal, observado o
limite mensal estipulado nas normas coletivas (190h40min), com reflexos do valor hora e
mais o adicional, inicialmente em repousos semanais remunerados e feriados e,
posteriormente, já considerado o aumento da média remuneratória, em gratificações
natalinas, férias acrescidas de 1/3, abatidos os valores alcançados aos mesmos títulos.
Diante do reconhecimento do trabalho em período considerado noturno, das 22h às 5h,
dever ser computada a hora reduzida noturna (artigo 73 e parágrafos 1º e 2º, da CLT).
Quanto aos intervalos, é de ser mantida a sentença. Em decorrência da confissão ficta
que emerge da revelia decretada e da omissão da primeira reclamada quanto aos
registros de horário pertinentes ao contrato de trabalho, tem-se que o reclamante não
usufruia do intervalo destinado ao descanso/alimentação, fazendo jus ao pagamento do
lapso integral desses intervalos, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 307 da SDI-I
do TST:
Intervalo intrajornada (para repouso e alimentação). Não
concessão ou concessão parcial. Lei nº 8923/1994. Após a edição
da Lei nº 8923/1994, a não-concessão total ou parcial do intervalo
intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o
pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no
mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de
trabalho (art. 71 da CLT).
Determina-se, unicamente, a dedução dos valores pagos sob a rubrica 330 hora interv,
como pleiteado pela segunda ré, com fulcro no documento da fl. 209.
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. Item remanescente.
1. MULTA NORMATIVA.
Quanto ao pleito alicerçado na cláusula 58ª das convenções coletivas de trabalho (item
12, fl. 05; letra “j”, fl.09, da exordial) é de ser provido o apelo.
O estatuto coletivo aplicável à categoria profissional do reclamante estabelece o
pagamento de multa por mora salarial, fl. 26, por exemplo, in verbis:
(...)
58 - MULTA - MORA SALARIAL:
Ressalvando questões de diferença de salário, fica estabelecida uma
multa equivalente a 1 (um) dia de salário por dia de atraso em seu
pagamento, além das demais cominações legais, sendo que os
pagamentos normais dos salários mensais deverão ocorrer em uma
única oportunidade, salvo o não comparecimento do empregado ao
serviço no dia do pagamento e desde que a empresa notifique o
Sindicato ou Federação Profissional, no prazo máximo de 48 horas.
PARÁGRAFO PRIMEIRO: A multa deverá ser incluída no pagamento
do salário do mês seguinte, sob pena de incidência de multa de 10%
(dez por cento) sobre o valor devido.
No caso, não vieram aos autos recibos de pagamentos, ficando impossibilitada a
verificação do correto adimplemento dos salários do autor, tanto no que respeita a valores
quanto à data de recebimento. Por tal motivo, impõe-se a aplicação da multa por mora no
pagamento do salário prevista na cláusula citada. Além disso, por conta das penas de
revelia e confissão aplicadas, faz jus o autor, também, à multa de 10% do parágrafo
primeiro da mesma cláusula, limitada pelo valor do principal, em observância ao disposto
no artigo 920 do atual Código Civil, subsidiariamente aplicável ao Direito do Trabalho, nos
termos do artigo 8.º da CLT.
Recurso provido.
Ante o exposto,
ACORDAM os Magistrados integrantes da 6ª Turma do Tribunal
Regional do Trabalho da 4ª Região, preliminarmente, por unanimidade
de votos, rejeitar o requerimento da segunda reclamada para que seja
procedido o reexame necessário da sentença. No mérito, por
unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário do
Município de Porto Alegre. Por unanimidade de votos, dar parcial
provimento parcial ao recurso ordinário da demandada
Superintendência de Portos e Hidrovias do Rio Grande do Sul para
autorizar a dedução dos valores pagos sob a rubrica 330 hora interv,
nos termos da fundamentação. Por unanimidade de votos, dar
provimento parcial ao recurso ordinário do reclamante para deferir-lhe
o pagamento da multa prevista na cláusula 58ª e parágrafo primeiro,
da Convenção Coletiva de Trabalho, limitada pelo valor do principal,
em valores a serem apurados em liquidação de sentença.
Intimem-se.
Porto
Alegre,
14
de
dezembro
de
MARIA INÊS CUNHA DORNELLES
DESEMBARGADORA-RELATORA
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
2011
(quarta-feira).
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Participam: BEATRIZ RENCK, MARIA CRISTINA - DPM-RS