Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas Departamento de Sociologia RODRIGUES, M.L. (1997) – Sociologia das Profissões, Oeiras, Celta Editora Cadeira: Sociologia das Profissões Docente: José Resende Discentes: Catarina Carreira, nº11532 Cátia Pereira, nº11529 Irina Fernandes, nº11427 Isabel Ferrão, nº9069 Sociologia das Profissões A Sociologia das Profissões em Portugal 1 O contexto social em Portugal ocupa um lugar específico, sendo que ainda em meados do século XX este se apresenta como um país essencialmente rural em que na lógica social e económica associada ao pequeno campesinato se utilizava a expressão “ficar livre da escola”. Portugal começa a desenvolver-se muito lentamente, sendo que a progressão cientifica e tecnológica se desencadeia em anos recentes, o que vai influenciar directamente a configuração da nossa sociedade bem como a preocupação com o “social”. Neste sentido, a sociologia é algo recente, tal como os seus estudos, não sendo por isso diferente no caso da sociologia das profissões. Segundo Maria de Lurdes Rodrigues “a sociologia das profissões não tem qualquer tradição em Portugal” (RODRIGUES, 1997:129), não só pela insuficiência de estudos relativamente á institucionalização de muitas profissões em Portugal, como também pela falta de preocupação ao nível dos estudos socio- históricos sobre as instituições de ensino e de formação, bem como ao nível do estudo das organizações profissionais e do seu contributo em relação ao Estado. Devido á história política do nosso país, Portugal vive hoje um paradoxo. Durante o Estado Novo, o poder político exerceu um forte controle sobre os grupos profissionais através de organizações corporativistas o que limitava a sua autonomia, a par de um sistema de ensino elitista e de reduzida dimensão, utilizado pelo Estado como instrumento de controle das tensões sociais e económicas. Após o 25 de Abril de 1974, a democracia traz consigo princípios de pluralidade, liberdade sindical e associativa; o carácter elitista do ensino superior começa a esvanecer-se (mantendo-se no entanto alguns mecanismos de controle como é exemplo o caso dos números clausus). Mais tarde com a entrada para a União Europeia dá-se uma abertura de mercado e reforça-se o princípio da livre concorrência. Assim, é relativamente recente a utilização de instrumentos de conhecimento por parte da sociologia, que vão sendo apropriados e utilizados de forma a contribuir para uma preocupação e interesse cada vez mais premente para com as profissões. Consideramos o desenvolvimento da escolarização e da escola, sendo a instituição que 1 Sociologia das Profissões: A sociologia das Profissões em Portugal, cap. 5, pag. 129 - 137 fornece as bases do conhecimento, cada vez mais indispensável para formar cidadãos. Simultaneamente aptos para o trabalho e para a vida, essa formação, ao longo da vida, passa a ser considerada uma necessidade, quer do ponto de vista das profissões, dos profissionais, ou da sociedade. Por outro lado, o ritmo de transformação na sociedade e, consequentemente, nas profissões não permite considerar suficiente a qualificação obtida através dos diplomas de formação académica inicial, nem mesmo a mera alimentação de competências a partir dessa formação. O crescente reconhecimento da certificação, suas qualificações e competências, tende a tornar-se um processo recorrente da avaliação que acompanha os trajectos profissionais, sendo que a hierarquia dos lugares profissionais vai resultando também de avaliações socialmente produzidas, para além do resultado de ajustamentos negociados pelos parceiros sociais. Essas parcerias ganham em ser amplas, envolvendo organizações patronais e sindicais, com capacidade para ir definido conteúdos e para garantir a valorização, consolidação e continuidade das profissões. As associações profissionais têm também o objectivo de manter o nível de competência, assim como as questões remunerativas; elas estabelecem uma relação de competência dentro das próprias profissões - regulamentação da competição. A intervenção do Estado, segundo o estudo de Helena Araújo, acompanha “a construção de discursos e de uma ideologia de referência” (RODRIGUES, 1997:129) que contribuiu para a entrada de mulheres para a profissão docente. O Estado pode contribuir na consolidação das atitudes de cada profissão ao mesmo tempo que regula, através do aparelho jurídico, as normas segundo as quais as pessoas sujeitam a sua actividade. O Estado confere a cada profissão, um sistema de referências necessário para a organização sistemática da economia. No entanto a união, a consolidação, os interesses económicos e culturais dos profissionais passam também por uma base social, moral e ética, tão importante como a emergência da racionalidade moderna, de base económica e instrumental. Assim, o poder profissional, quanto a nós, está muito para além das relações burocráticas e do universo burocrático, residindo em muito nas relações entre papel social e função social, para além da mobilidade constante nas sociedades modernas, resultante da constante interacção de representações comuns inscritas nos profissionais, assim como nos clientes, isto é, nos actores sociais. Segundo a autora, Carlos Gonçalves mobiliza directamente as teorias relacionadas com a sociologia das profissões na sua “análise socio- histórica do processo de institucionalização dos economistas” (RODRIGUES, 1997:130), o que nos leva a reflectir sobre as trajectórias socio - históricas da noção de profissão. As profissões surgem na Idade Média amparadas pelas instituições religiosas; à chegada do Renascimento as profissões mais importantes eram a teologia, o direito e a medicina sendo que foram secularizas as duas últimas. Com a Revolução Industrial e o progresso da ciência, aumentam o número e tipos de profissões resultantes da necessidade de especialistas; era uma época em que a ordem política e social exigia técnicas capacitadas. O aparecimento e desenvolvimento das profissões, nas sociedades modernas, vem contribuir para organizar a sociedade. Elas vão desempenhar um forte papel de regulação e equilíbrio social, na medida em que vão ser os profissionais os equilibradores entre o patronato e os trabalhadores. A partir do século XIX foi possível construir um modelo a priori de profissão, na medida em que a realidade das profissões não está dissociada das transformações económicas e políticas associadas à crescente e continuada massificação do ensino e ao alargamento dos mercados que lhe conferem uma nova realidade social e profissional. É nesta ética que achamos importante reflectir na teoria clássica que iniciou a discussão sobre a distinção entre profissão e ocupação. Esta distinção tem como base princípios economicistas sendo que, segundo esta teoria os indivíduos detentores de uma ocupação estão ao serviço de um empresário e recebem um salário, enquanto que um indivíduo com uma profissão recebe um honorário cobrado directamente à clientela (este indivíduo está associado às profissões liberais). Assim, as profissões distinguem-se das ocupações pela posição de força sobre o mercado económico e é deste modo que as primeiras são detentoras de monopólio e exclusividade, elas são sustentadas pelas instituições e suas credenciais, bem como pelas associações de pares de modo a constituírem comunidades unidas por valores morais, éticos com o objectivo de servir a comunidade. Mas será que o estatuto de ocupação é estanque? Pensamos que não, na medida em que a ordem social está em constante processo de construção e reconstrução. É neste contexto que o desenvolvimento da escolarização, as transformações dos interesses de cariz e de afirmação social, está associado à construção social do fenómeno das profissões e da estabilização das interacções que possibilitam e ajudam uma ocupação a conquistar e perenizar o estatuto de profissão. Neste campo cabe à sociologia das profissões centrar a sua análise nas situações, nos acontecimentos vividos, experimentados pelos autores sociais, sendo que estes são produtores activos das relações e das configurações profissionais, isto é, estudar as interacções enquanto resultado de coreografias concebidas, interiorizadas, produzidas e reproduzidas pelos actores. As interacções desenham formas de comportar, mas também formas de representação objectivadas em transacções comunicacionais onde o discurso e a linguagem adquirem um papel central. As profissões não podem ser definidas somente como profissões ligadas ao mundo liberal, assim sendo, não faz sentido pensar na dicotomia entre profissões e ocupações. Esta linha de pensamento vai de encontro ao estudo de Graça Carapinheiro e na sua abordagem interaccionista das profissões, em que estas são abordadas como folk categorias, nas quais os atributos, os elementos de estrutura, os discursos e as práticas são instrumentos que contribuem para o processo de profissionalização onde a descrição das situações profissionais, na primeira pessoa dos actores sociais, são a principal matéria prima para o estudo sociológico. Qualquer estudo não poderá nunca esquecer a dimensão temporal, de modo a combinar de forma criativa, mas sustentada, o presente com as antecipações relativamente ao futuro e de modo a considerar a importância dos ciclos de vida dos profissionais, bem como as suas trajectórias. O facto do mundo profissional ser um jogo que se desenvolve em múltiplos tabuleiros e que envolve múltiplos actores, é um elemento essencial a ter em conta em qualquer estudo, ele jamais poderá ser esquecido. Bibliografia: GIDDENS, A. (1992, 1ª edição 1990) – As Consequências da Modernidade, Oeiras, Celta Editora. RODRIGUES, M. L. (1997) – Sociologia das Profissões, Oeiras, Celta Editora WEBER, M.(1983) – A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Lisboa, Edições Presença.