Intervalos de Confiança, Intervalos de Predição e Campo
de Arbítrio nas Avaliações de Imóveis Urbanos.
Autor: Antonio Pelli Neto
Resumo:
A norma brasileira de avaliação de bens – NBR 14.653, parte 2: Imóveis Urbanos – foi
publicada inicialmente em 01 de julho de 2004, revogando a NBR 5676. Em 16 de
agosto de 2007 teve inicio o projeto de revisão pela Comissão de Estudo de Avaliação
na construção civil (ABNT/CB-02) da parte 2 aqui citada, e a última reunião desta
comissão ocorreu no dia 06 de maio de 2010. Durante as reuniões da comissão de
revisão o assunto sobre a conceituação e aplicação do Campo de Arbítrio e do
Intervalo de Confiança gerou constantes discussões tendo culminado no texto que
está em consulta pública nesta data1. Novos conceitos foram introduzidos e conceitos
antigos revisados.
A proposta deste trabalho é entender os conceitos existentes na NBR 14653 sobre os
Intervalos de Confiança, Intervalos de Predição e Campo de Arbítrio e a partir deste
entendimento propor novos conceitos, demonstrando o uso destes intervalos nas
avaliações de imóveis urbanos. Como estes conceitos estão estritamente relacionados
com as estimativas pontuais, estimativas intervalares e testes de hipóteses, estes
assuntos também serão abordados. Para cálculos estatísticos e demonstração dos
resultados será utilizado o software SisDEA©2 Windows.
Referências: Intervalos de confiança, intervalos de predição, campo de arbítrio,
avaliação de imóveis urbanos, SisDEA.
Julho / 2010
1
O texto proposto durante a revisão da NBR 14653-2 para substituir o texto atual pode ser visualizado e impresso em
www.abnt.org.br, acessando a área do site referente à Consulta Nacional.
2
O software e a marca SisDEA são propriedades da Pelli Sistemas Engenharia.
CURRICULO RESUMIDO
Nome: Antônio Pelli Neto
Empresa: Cargo: Endereço Comercial: Pelli Sistemas Engenharia Ltda
Diretor Técnico
Rua Eurita, 464 ‐ Bairro Santa Tereza, CEP 31010‐210 – Belo Horizonte/MG. +55 (31) 3466‐1557 – 2552‐0357
+55 (31) 3467‐1502
 Engenharia Mecânica, UFMG ‐ Univ. Federal de Minas Gerais, ano de conclusão: 1982.  Engenharia Civil, KENNEDY ‐ Fundação Educacional de Minas Gerais, ano de conclusão: 2000 6021/D
Linha de pesquisa: Inteligência Computacional ‐ Universidade Federal de
Minas Gerais – UFMG / 2006. [email protected]
www.pellisistemas.com.br
Telefones: Fax: Curso de Graduação: CREA / DF: Mestre em Engenharia Elétrica e‐mail: Endereço na internet: Eng. Civil e Mecânico Antônio Pelli Neto, Mestre em Inteligência Computacional pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) – 2006 e instrutor de diversos cursos especializados na área da Engenharia de Avaliações para empresas públicas e privadas em todo o País. É autor dos softwares SISDEA Windows – Envelopamento de Dados, SISREN Windows – Redes Neurais e Regressão Linear Aplicada à Avaliações Comparativas , SISPLANV Windows – Sistema de Apoio ao Desenvolvimento de Planta de Valores, SISRENDA Windows – Avaliações pelo enfoque da Renda, SISREG Windows – Regressão Linear, SISDAT Windows – Banco de Dados Imobiliários e co‐autor do aplicativo SISVALUE Windows. Atualmente é Instrutor de Avaliação de Bens – atuando no processo de Avaliar Bens da Caixa Econômica Federal. É diretor da Pelli Sistemas Engenharia. 2
1. Introdução
O objetivo principal deste trabalho é apresentar os conceitos existentes na NBR 14.653
sobre os Intervalos de Confiança, de Predição e do Campo de Arbítrio, propor nova
conceituação e fazer a conexão da teoria estatística com a prática nas avaliações de
imóveis urbanos.
Os estudos nas áreas de avaliação de imóveis no Brasil estão em um estágio bem
avançado quando comparados com outros países, tais como os EUA, Inglaterra e
França, consideradas grandes potências mundiais. O principal diferencial está na
norma brasileira de avaliação de bens – a NBR 14.653, que é uma ferramenta de
extrema importância para os serviços de avaliação de bens no Brasil, pois além de
padronizar os procedimentos, introduz conceitos e exigências técnicas para que o
trabalho seja executado com uma fundamentação e precisão mínima desejáveis.
Embora os tratamentos de dados de mercado, definidos na parte 2 – Avaliação de
Imóveis Urbanos – da referida norma utilizem ferramentas da matemática e da
estatística e os cálculos oriundos destes tratamentos sejam exatos, as estimativas
realizadas com base nestes cálculos são inexatas. E a probabilidade do valor adotado
para o imóvel avaliando, impresso no laudo de avaliação, ser o verdadeiro valor de
mercado para este mesmo imóvel é praticamente zero. Este conceito, proveniente da
inferência estatística, já é de conhecimento tanto dos profissionais que atuam com
avaliação no Brasil, como também de muitos contratantes de Laudos de Avaliação.
Assim, nem sempre as avaliações pontuais atendem aos anseios e desejos dos
contratantes, pois em muitos casos já está em andamento alguma negociação e o
preço a ser praticado já foi sugerido pelo incorporador ou empreendedor. Decorre daí a
necessidade de serem elaboradas, além das avaliações pontuais, avaliações
intervalares, fornecendo um ou mais intervalos de valores admissíveis para o imóvel
em estudo.
Hoje, o Governo Federal por intermédio da Caixa Econômica Federal, é o maior
demandante de serviços de avaliação no país e a totalidade de laudos de avaliação
(incluindo todos os órgãos federais) deve superar a marca de 1.000.000 laudos / ano.
Estes laudos são produzidos, na maioria das vezes, para subsidiar operações de crédito
imobiliário, onde o valor adotado para o imóvel servirá de base para constituir a
garantia da operação ou para sinalizar a viabilidade na produção de unidades
habitacionais.
Quando um incorporador ou empreendedor apresenta um novo empreendimento
habitacional, é fornecido junto com os projetos preliminares o preço sugerido para
venda e/ou locação. Caberá ao contratante o estudo para identificar se o preço
sugerido é compatível com o valor do imóvel no mercado imobiliário. Nasce daí o
seguinte dilema: de um lado está o incorporador / empreendedor com uma proposta
para o preço da unidade habitacional que pretender produzir; do outro lado está o
laudo de avaliação elaborado por profissionais habilitados, onde consta o valor adotado
para a mesma unidade habitacional. Considerando as características heterogêneas dos
imóveis no mercado imobiliário e o fato do preço / valor serem variáveis contínuas
(pode-se dizer que cada transação no mercado imobiliário é única) é pouco provável
que o preço proposto seja exatamente igual ao valor que consta no laudo de avaliação.
3
Assim, o que os gerentes e responsáveis pelo desenvolvimento urbano do país
necessitam não é somente de uma avaliação pontual, mas sim de uma estimativa
intervalar que indique qual a faixa de valores admissíveis para o imóvel a ser
produzido, viabilizando ou não o empreendimento. Este intervalo de valores
admissíveis tem sido discutido em diversas esferas (públicas e privadas) e as soluções
existentes hoje na NBR 14.653 são: o intervalo de predição, de confiança e o campo
de arbítrio.
Embora as soluções tenham sido apresentadas e discutidas nas reuniões do projeto de
revisão da NBR 14.653-2, existem ainda entendimentos diferenciados, muitas vezes
distorcidos dos conceitos estatísticos que geraram estes intervalos. E estas distorções
trazem prejuízos para o processo de avaliação, atrasos na entrega dos trabalhos e no
início da fase de implantação do empreendimento imobiliário e discussões infundadas
acerca dos valores prováveis para os imóveis. O entendimento sobre o mercado
imobiliário e a formação dos preços dos imóveis neste mercado, aliado ao
conhecimento da teoria estatística, são fundamentais para a melhoria do processo de
avaliação de bens no Brasil. Este trabalho irá apresentar alguns conceitos básicos
sobre o mercado imobiliário, sobre estimativas pontuais e intervalares e demonstrar o
uso e aplicação destes conceitos nas avaliações de imóveis urbanos.
2. O Mercado Imobiliário no Brasil e as Avaliações de Imóveis
Urbanos
Nos últimos dois anos o mercado imobiliário brasileiro apresentou um forte
aquecimento, com os preços dos imóveis sendo negociados em patamares bem acima
do que se poderia prever naquela época. Este forte aquecimento, verificado em
diversos municípios brasileiros, tem sido discutido por engenheiros, analistas e
economistas, pois em uma análise superficial, parece ferir a lei da demanda:
“considerando os demais aspectos permanecendo constantes, quando o preço de um
produto aumenta, as quantidades demandadas do produto diminui”. E o que se
vivenciou foi um forte aumento nos preços mas também na demanda por imóveis,
tanto para uso residenciais como comerciais. Então, o que pode estar ocorrendo?
Observe que na definição da lei da demanda, encontramos a frase3 “considerando os
demais aspectos permanecendo constante”. Existem, na verdade, outras variáveis
afetando a disposição dos consumidores para a aquisição de imóveis: melhorias na
renda, ofertas de crédito, preços de alugueis, população e demografia e principalmente
a imperfeição do mercado imobiliário.
Tem sido noticiado com freqüência, nos principais meios de comunicação do país, que
os brasileiros estão mais otimistas em relação à queda da inflação, expansão da renda
pessoal, melhoria da situação financeira e redução no endividamento. O Boletim Focus,
que é uma publicação do Banco Central, indica pela 16ª semana consecutiva alta na
estimativa para o crescimento do PIB. A projeção para a taxa básica de juros foi
elevada de 12% para 12,13%. Houve baixa na previsão para o crescimento da
produção industrial de 11,94% para 11,91%, mantendo a expectativa em relação a
2011 (5%). O país vive uma grande euforia econômica.
3
O termo utilizado pelos economistas é “ceteris paribus”, o que significa todo o resto igual, em latim.
4
Sobre esta perspectiva de crescimento, para os economistas e profissionais do
mercado imobiliário pairam algumas dúvidas:








Existem riscos para a consolidação de um cenário inflacionário e conseqüente
desvalorização nos preços dos imóveis?
Existe descompasso entre oferta e demanda no mercado imobiliário?
Estamos crescendo num ritmo sustentável ou produzindo bolhas para que
sejam estouradas após as eleições, como as que vimos nos EUA?
Se o crédito continuar aumentando forte, estas bolhas podem ser formadas?
É preciso cuidado nas estimativas de valores dos imóveis no mercado
imobiliário?
Que bens e serviços estão sendo produzidos e como estes são produzidos? Em
que escala?
Quem receberá os bens e serviços produzidos?
As construtoras / incorporadoras escolhem como produzir os bens e serviços
que vendem ou a sociedade está decidindo o que produzir adequando a oferta
à demanda?
As respostas às estas perguntas estão sendo produzidas e publicadas por profissionais
que atuam no mercado imobiliário. Uma boa fonte de pesquisa é o blog da colunista
Míriam Leitão do jornal O Globo4. Neste blog é possível levantar diversas informações
sobre economia e mercados imobiliários, considerando temas sobre o Brasil, EUA e
Europa.
Entretanto, é importante lembrar que, conceitualmente, as sociedades organizam suas
economias de duas maneiras principais: economias centralmente planejadas e
economias de mercado. Na primeira é o governo que decide como os recursos
econômicos serão alocados e na segunda são as decisões das famílias e das empresas
que interagem em mercados que alocam os recursos econômicos necessários ao seu
desenvolvimento.
Nas economias centradas e planejadas, o governo é que decide como aplicar os
recursos, quem irá produzir e a quem será destinado o produto ou serviço final. Estas
economias estão presentes em países comunistas.
Em uma economia de mercado as empresas têm que produzir bens e serviços que
atendam aos anseios dos consumidores ou irão à falência. Assim, são os consumidores
que decidem que bens e serviços serão produzidos. Como as empresas em uma
economia de mercado competem entre si, estas são pressionadas para maximizar a
eficiência de mercado produzindo o melhor produto com o menor custo possível.
E o mercado imobiliário brasileiro? É uma economia centrada e planejada pelo governo
ou uma economia de mercado? Na verdade, o mercado imobiliário brasileiro é um
mercado de economia “mista”, onde a maioria das decisões econômicas é resultante
da interação entre compradores e vendedores, mas com o governo desempenhando
um papel extremamente significativo na alocação de recursos e na escolha das
empresas que irão produzir. Esta interferência governamental altera significativamente
a eficiência do mercado:
4
http://oglobo.globo.com/economia/miriam/
5


a eficiência alocativa, onde a produção está de acordo com as preferências do
consumidor, é substituída pela
eficiência produtiva, onde o produto final é escolhido com base na melhor
relação custo/benefício na ótica das empresas produtoras.
E assim este mercado deixa de ser um mercado de “Concorrência Perfeita”. O mercado
imobiliário, no segmento residencial de baixa renda, tem sido visto como um oligopólio
ou um mercado de concorrência monopolista. Oligopólios são setores com apenas
algumas empresas produzindo os bens e serviços para atender à grande parte da
demanda. Nestes mercados, as ações de qualquer incorporador ou empreendedor têm
um grande impacto sobre o lucro de todos os demais. É comum que as grandes
incorporadoras desse mercado se beneficiam com a cooperação, realizando reuniões
constantes, e agem como se fossem monopolistas, porém os incentivos à ação de
maximizar os lucros impedem que atinjam resultados iguais aos do monopólio. Desse
modo, há sempre tensões nítidas entre a cooperação e o interesse próprio. Na medida
em que aumenta o número de vendedores fica mais difícil chegarem a um acordo
quanto ao preço ofertado.
E porque os oligopólios existem? Porque não existem muitas empresas neste segmento
com capacidade para romper as barreiras à entrada no mercado, onde os ganhos
incorporam altos lucros econômicos.
A barreira econômica mais importante à entrada de novas empresas são as economias
de escala. Quanto maiores forem as economias de escala, menor será o número de
empresas que estarão no setor. Além das economias de escala, existem as barreiras
impostas pelo governo – muitas grandes empresas empregam lobistas para convencer
os governantes a publicar leis e regulamentações que sejam favoráveis aos seus
interesses econômicos. Estas empresas, além de terem acesso total aos governos
(municipal, estadual e federal), se reúnem constantemente ditando regras e impondo
condições para a produção das unidades habitacionais. Algumas regras básicas para a
implantação de grandes empreendimentos imobiliários, que se caracterizam pelo
elevado número de unidades habitacionais (acima de 100), têm sido ignoradas, como
por exemplo, a análise do projeto proposto pelo incorporador e o impacto deste
empreendimento na infra-estrutura urbana do município. Em muitos casos são
propostos empreendimentos em regiões afastadas do centro urbano do município a
que pertencem, com projetos arquitetônicos inadequados e com execução de baixa
qualidade, mas com preços propostos bem acima dos praticados no mercado.
Um interessante texto5 foi publicado no blog da Miriam Leitão, intitulado “Vale Tudo”.
Em destaque, a seguinte frase: “Hoje, ameaças à democracia não são mais ações dos
quartéis. Esse é um tempo superado. Agora, o risco é de se avacalharem regras com o
desrespeito continuado”.
Obviamente, todos estes problemas não existiriam se o mercado fosse de concorrência
perfeita, mais não é. E o que tudo isto tem a ver com o intervalo de confiança,
intervalo de predição e campo de arbítrio? A resposta é simples: fornecer intervalos de
valores admissíveis, com determinada precisão e fundamentação, subsidiando as
tomadas de decisão por parte dos contratantes, buscando viabilizar empreendimentos
adequados para a população ao qual se destina.
5
http://oglobo.globo.com/economia/miriam/posts/2010/07/04/vale-tudo-305190.asp
6
3. Avaliação de Imóveis Urbanos – Estimativas pontuais
As avaliações de imóveis urbanos têm uma grande importância para a economia do
país, pois decisões gerenciais são tomadas com base nestas avaliações. O resultado
final do trabalho é um relatório técnico, intitulado Laudo de Avaliação, e este deve ser
produzido por um engenheiro civil ou arquiteto. A principal pergunta a ser respondida
é: Qual o valor do imóvel avaliando?
Embora seja esta uma pergunta fácil de ser formulada, a resposta não é geralmente
trivial. Para se produzir uma reposta com fundamentação, precisão e tempestividade,
são necessários conhecimentos em diversas áreas, como estatística, engenharia e
economia. É uma atividade multidisciplinar.
Voltando à pergunta anterior, “Qual o valor do imóvel avaliando?”, a primeira resposta
tende a ser uma estimativa pontual. Para fornecermos esta estimativa pontual,
necessitamos de um estimador pontual.
Definição 2.1 – Um estimador pontual é qualquer função W(X1,...,Xn) de uma amostra;
em outras palavras, qualquer estatística é um estimador pontual.
A definição acima parece ser muito vaga, entretanto o objetivo aqui é não eliminar
qualquer candidato a ser um estimador pontual. A definição em 2.1 é geral e é a partir
dela que podem ser derivadas definições mais completas e específicas para cada
estudo.
A idéia por trás da estimativa pontual é muito simples. Quando uma amostra é
coletada em uma população que possui uma pdf f ( x |  ) , o conhecimento sobre 
leva ao conhecimento de toda a população. Então, é natural pensar na escolha de um
bom estimador para o ponto  , ou seja, um bom estimador pontual.
Neste momento é importante fazermos uma distinção entre estimador e estimativa.
Um estimador é uma função de uma amostra, enquanto a estimativa é o valor obtido
para o estimador, ou seja, um número que é calculado assim que o estimador é
definido e a amostra coletada.
Em muitos casos existirão candidatos naturais ou óbvios para um estimador pontual
para um parâmetro populacional em particular. Por exemplo, uma média aritmética
simples é uma candidata natural para a média da população. Entretanto, a utilização
de uma média aritmética simples pode levar a resultados desastrosos. Por este motivo,
existem diversas técnicas que nos permitem eleger possíveis candidatos para o
estimador pontual. Dentre elas, a regressão linear tem sido a mais utilizada nas
avaliações de imóveis urbanos, quando o método comparativo de dados de mercado é
selecionado. Isto obviamente não significa que é a melhor estimativa, mas sim a mais
utilizada. Não é objetivo deste trabalho apresentar e identificar os métodos para a
escolha de estimadores pontuais, mas sim buscar o entendimento e a aplicação da
teoria estatística nas avaliações de imóveis urbanos. A literatura sobre Inferência
Estatística é vasta e uma seleção especialmente feita pela Pelli Sistemas Engenharia foi
anexada a este trabalho.
7
E como fazer a conexão desta teoria com a prática nas avaliações de imóveis urbanos?
Vamos supor que uma empresa foi contratada para realizar o serviço de avaliação de
um apartamento situado em determinada região de um grande centro urbano. Após a
vistoria ao imóvel avaliando e identificação da região de influencia, a empresa
contratada procedeu à coleta de dados no mercado imobiliário. Vamos ainda supor que
esta amostra foi composta de dados homogêneos, em quantidade de seis transações
efetivamente realizadas dentro do mês da avaliação. Será necessário agora eleger o
estimador pontual. No presente caso, as premissas são: os dados coletados no
mercado são de imóveis homogêneos, então se presume que todos os imóveis no
mercado também sejam homogêneos e que a média aritmética simples é uma
candidata natural para a média dos preços de imóveis assemelhados no mercado
imobiliário local. Assim, a empresa elegeu como estimador pontual para a média dos
preços praticados naquele mercado imobiliário a média aritmética simples. A estimativa
pontual pode ser então realizada, pois o estimador pontual foi eleito e, uma vez
coletada a amostra, os cálculos podem ser realizados. O valor final adotado para o
imóvel avaliando será atribuído com base na estimativa pontual (média aritmética da
amostra) e será apresentado no laudo de avaliação.
Em um segundo trabalho de avaliação, a mesma empresa deparou com uma amostra
de dados heterogêneos, em uma quantidade de quinze elementos efetivamente
transacionados dentro do mês da avaliação. Sendo os dados heterogêneos (supondo
os atributos áreas, localização e padrão construtivo), a média aritmética dos preços já
não é mais uma candidata natural para o estimador pontual, pois esta média não
considera as diferenças existentes entres os atributos dos imóveis. Dentre as
candidatas ao estimador pontual, vamos supor que a empresa elegeu a regressão
linear, pois esta média irá ponderar as diferenças de preços considerando as diferenças
entre os três atributos identificados acima. O estimador pontual para a média de
preços de imóveis no mercado imobiliário é a regressão linear e, após os cálculos
estatísticos com base na amostra coletada, a estimativa pontual pode ser calculada e o
valor do imóvel será atribuído com base nesta estimativa pontual e apresentado no
laudo de avaliação.
O que na verdade a empresa apresentou no laudo de avaliação? Foi o valor estimado
para o imóvel avaliando? Como interpretar estes resultados? A resposta é simples: nos
dois trabalhos foram apresentadas as estimativas pontuais para os parâmetros
populacionais, a primeira utilizando como estimador pontual a média aritmética
simples, e no segundo caso, a regressão linear, sendo os valores dos imóveis
atribuídos com base nestas estimativas. Em ambos os casos a interpretação destes
resultados é:
“O valor estimado para o imóvel avaliando foi atribuído com base na estimativa pontual
da média dos preços praticados no mercado imobiliário onde a amostra foi coletada.
Qualquer imóvel com características assemelhadas aos dos imóveis da amostra
coletada pode ter seu valor estimado, pois o estimador já foi eleito e a estimativa
pontual para este estimador já é conhecida”.
É importante frisar que neste momento não foi realizada nenhuma inferência
sobre o valor pontual do imóvel avaliando, mas sim uma estimativa pontual para
a média populacional e esta estimativa pontual foi utilizada para atribuir valor ao
imóvel avaliando. Voltaremos a este assunto nas definições de intervalos de confiança
e de predição.
8
Notem que no primeiro caso foi utilizada a média aritmética dos dados coletados, pois
os bens são homogêneos, e no segundo caso a regressão linear, pois embora o esforço
seja para coletar dados com características as mais homogêneas possíveis, os dados
coletados possuíam atributos diferenciados e por este motivo a média aritmética não é
mais a candidata natural para o estimador pontual. Reforçamos que os conceitos aqui
apresentados são conceitos gerais e não estamos abordando os métodos usuais para
avaliar e selecionar os estimadores pontuais.
4. Testes de Hipóteses nas Avaliações de Imóveis Urbanos
Na seção anterior utilizamos um método de inferência chamado de “Estimativa
Pontual”. Agora, vamos apresentar outro método de inferência chamado “Teste de
Hipótese”.
Definição 3.1 – Hipótese. Uma hipótese é a afirmação sobre um parâmetro
populacional.
Esta definição novamente é de caráter geral, mas o importante agora é saber
simplesmente que uma hipótese é uma afirmação sobre um parâmetro populacional. O
objetivo do teste de hipóteses é decidir, com base em uma amostra, qual das duas
hipóteses complementares é a verdadeira: H0 ou H1.
Definição 3.2 – H0 é chamada de hipótese nula e H1 de hipótese alternativa.
Vamos supor que  é um parâmetro populacional. A forma geral de apresentação das
hipóteses nula e alternativa tem a seguinte configuração: H 0 :    0 e H 1 :    c0 .
Interpretando: Na hipótese nula o parâmetro  está compreendido dentro de um
subconjunto no espaço dos parâmetros possíveis, e na hipótese nula o mesmo
parâmetro está contido no espaço complementar. Exemplificando: após uma coleta de
dados no mercado imobiliário, o engenheiro ou arquiteto responsável pelo trabalho de
avaliação necessita eleger o estimador pontual. A dúvida está na escolha entre a média
aritmética simples e a regressão linear simples. A dificuldade na escolha do estimador
pontual se justifica em virtude de, ao coletar os dados no mercado imobiliário, alguns
imóveis apresentaram divergências no atributo “área total construída”. Os demais
atributos são idênticos, ou seja, os imóveis são assemelhados nas demais
características. A pergunta a ser respondida é: As diferenças detectas nos dados
coletados para o atributo área não são suficientes para supor que os imóveis são
heterogêneos e a escolha adequada é a média aritmética simples, ou elas são
suficientes para caracterizar os imóveis como heterogêneos e eleger como estimador
pontual a regressão linear simples? Se  representa a elasticidade área/preços, o
profissional está interessado em testar a hipótese H 0 :   0 versus a hipótese
H 1 :   0 . A hipótese nula diz que mudanças nas áreas dos imóveis não afetam os
preços dos imóveis contra a hipótese alternativa que diz que alterações nas áreas dos
imóveis alteram os preços praticados. Assim, neste tipo de problema, após coletar os
dados de mercado, o profissional deve decidir entre aceitar a hipótese nula como
verdadeira ou rejeitar a hipótese nula por ser falsa e decidir pela hipótese alternativa.
9
Aceitar a hipótese nula como verdadeira levará o avaliador a eleger a média aritmética
simples como estimador pontual para os preços dos imóveis e, caso rejeite a hipótese
nula, a hipótese alternativa levará a eleger a regressão linear como o estimador
pontual.
Novamente, não é objetivo deste trabalho apresentar os métodos de escolha para a
realização dos testes de hipóteses. O importante é entender o que eles representam,
pois os mesmos possuem uma forte correlação com as estimativas intervalares e com
a construção de intervalos de confiança e de predição. Na verdade, podemos
generalizar e dizer que todo intervalo de confiança corresponde a um teste de hipótese
e vice-versa.
5. Estimativas Intervalares nas Avaliações de Imóveis Urbanos
5.1
– Intervalos de confiança
Na seção 2 discutimos sobre as estimativas pontuais de um parâmetro  , onde a
inferência tem como resultado um único valor. Agora, vamos discutir as estimativas
intervalares, mais especificamente sobre os intervalos de confiança e os intervalos de
predição, que fazem parte de um conjunto de estimativas. O problema sobre as
estimativas intervalares é que o parâmetro  pertence a um conjunto de valores
possíveis, ou seja,   C , onde C   , e assim usualmente é preferível uma
estimativa intervalar C a um único valor  .
Definição 4.1.1 – Uma estimativa intervalar de um valor real para um parâmetro  é
qualquer par de funções, I ( x1 ,..., xn ) e S ( x1 ,..., xn ) , de uma amostra que satisfaça
I ( x)  S ( x) para todo x  X . Se X  x é observado, a inferência I ( x)    S ( x) pode
ser realizada.
O intervalo fechado [ I ( x), S ( x)] para uma estimativa intervalar de um parâmetro  ,
baseado em uma amostra aleatória
X  ( X 1 ,..., X n ) representa os valores que
desejamos para construir as estimativas intervalares. Novamente, a definição dada
aqui é geral e, a partir dela, podemos derivar novas definições, construindo intervalos
abertos ou semi-abertos (abertos em uma extremidade e fechada na outra).
Qual a vantagem de trabalhar com uma estimativa intervalar versus uma estimativa
pontual? A resposta é que, associando alguma precisão em nossas estimativas, vamos
ganhar alguma confiança ou, em outras palavras, segurança sobre as certezas de
nossas afirmações.
A proposta de usar um estimador intervalar ao invés de um estimador pontual é
termos alguma garantia de estarmos capturando o parâmetro de interesse no estudo.
Definição 4.1.2 – Um estimador intervalar [ I ( x), S ( x )] de um parâmetro  se traduz
na probabilidade de que este intervalo aleatório contenha o verdadeiro parâmetro  .
10
Estimadores Intervalares, agregando uma medida de confiança (usualmente chamado
de grau de confiança) são intitulados como Intervalos de Confiança. Existem diversos
métodos para eleger os estimadores intervalares e a partir destes construir os
intervalos de confiança.
Existe uma série de questões a serem discutidas e derivadas destas definições.
Entretanto, a mais importante delas é entender que o intervalo de confiança construído
é aleatório e não o parâmetro  . Assim, quando escrevemos na forma
P 0 (  I ( X ), S ( X )) estamos indicando que a probabilidade é do X , não do  . A
forma P 0 ( I ( X )   , S ( X )   ) indica melhor sobre a aleatoriedade de X .
Sugerimos a leitura dos tópicos sobre Inferência Estatística que podem ser obtidas na
relação de livros relacionados ao final deste trabalho. O nosso interesse aqui neste
trabalho é verificar e demonstrar como estes intervalos podem ser utilizados nas
avaliações de imóveis urbanos.
5.2
– Intervalos de Predição
No tópico 4.1 discutimos os intervalos de confiança e apresentamos uma definição
geral para este intervalo. Agora, vamos discutir outro intervalo, dentro de várias outras
opções possíveis, chamado de Intervalo de Predição.
Definição 4.2.1 – O intervalo de predição com 100(1   )% para um valor não
observado de uma variável aleatória Y , baseado na observação de X é um intervalo
também aleatório [ I ( x), S ( x )] com a propriedade de que P 0 ( I ( X )  Y  S ( X ))  1  
para todos os valores de  .
Vamos colocar lado a lado os intervalos de confiança e os intervalos de predição, pois
assim poderemos notar melhor as semelhanças bem como as diferenças. São eles:

Intervalo de Confiança: P 0 ( I ( X )    S ( X ))  1   ou P 0 (  I ( X ), S ( X ))

Intervalo de Predição: P 0 ( I ( X )  Y  S ( X ))  1  
Existe semelhança na definição dos intervalos, entretanto o intervalo de confiança é
construído para um parâmetro  , que é constante, enquanto que para o intervalo de
predição o mesmo é construído para uma variável aleatória Y . Intuitivamente,
considerando que uma variável aleatória é mais variável do que um parâmetro (que na
verdade é uma constante) é esperado que o intervalo de predição seja maior do que o
intervalo de confiança, para um mesmo nível de confiança.
Até agora temos apresentado conceitos generalizados para os intervalos de confiança,
de predição e para os testes de hipóteses. A partir de agora, vamos estudar um caso
em particular, que é a regressão linear, pois é o assunto em discussão na parte 2 da
NBR 14.653. Entretanto, vale ressaltar que estas definições podem ser ampliadas para
outros casos, como as Redes Neurais Artificiais e a Regressão Não Linear.
Entretanto, antes de iniciarmos o estudo de caso, onde entra a definição de Campo de
Arbítrio nas Avaliações de Imóveis Urbanos?
11
6. Campo de Arbítrio – Avaliação de Imóveis Urbanos
O significado da palavra “Arbítrio” pode ser encontrado nos dicionários da língua
portuguesa. O Michaelis apresenta o significado listado a seguir:
ar.bí.trio
sm (lat arbitriu) 1 Resolução que depende só da vontade. 2 Julgamento de árbitros. 3 Opinião, voto. 4 Expediente, meio, alvitre.
5 Com Cálculo estimativo da maior vantagem do câmbio de moedas, em razão dos lugares, valor dos metais e outras
circunstâncias. Livre-a.: indeterminação da vontade, ou poder do ser humano, consciente, de decidir livremente.
e o Aurélio online:
arbítrio
s.m. Resolução, determinação dependente apenas da vontade. / Vontade, talante. / Juízo, sentença de árbitro. // Livre arbítrio,
poder, faculdade de decidir, de escolher, de determinar, dependente apenas da vontade. // Ao arbítrio de, ao talante de, à
vontade de, à mercê de.
Está claro o significado da palavra Arbítrio. Segue então que, aplicando este significado
nas avaliações de imóveis urbanos, podemos construir um intervalo de valores, cujo
nome é Campo de Arbítrio e dentro do qual o valor pontual a ser atribuído ao imóvel
avaliando deverá estar contido. Ou seja, C a [ I ( X )  Y  S ( X )] .
Entretanto, sendo o arbítrio uma opinião ou uma resolução que depende somente da
vontade do profissional avaliador, devem existir restrições ao seu uso, pois o uso
indiscriminado invalida todo o trabalho até aqui desenvolvido. Qual o significado de
construir modelos de regressão, eleger estimadores intervalares, se ao final do
trabalho podemos lançar mão do campo de arbítrio e simplesmente desprezar todos os
resultados estatísticos? A resposta não é trivial. Temos questões ainda a estudar.
Vamos a elas.
A primeira norma brasileira de avaliação de bens a introduzir o conceito de Campo de
Arbítrio foi a NBR 5676. O texto está reproduzido logo a seguir:
3.5 – Campo de arbítrio
Intervalo fechado de valores, obtido por processo estatístico compatível com a amostra, dentro do qual o
engenheiro de avaliações pode adotar, justificando, aquele que seja representativo do valor do imóvel
avaliado.
No item 7.6.8 da mesma NBR, que trata das avaliações com nível de rigor “rigorosa”,
diz que:
“O valor final da avaliação, a ser indicado pelo engenheiro de avaliações em função do tratamento
estatístico adotado, tem de estar contido em um intervalo de confiança fechado e máximo de 80%. ...”.
Já no item 7.6.10 que trata das avaliações com nível de rigor “rigorosa especial”,
estipula que
“subitem c) o campo de arbítrio do engenheiro de avaliações é correspondente ao intervalo de confiança
máximo de 80% ...”
A NBR 5676 mantinha a coerência na definição do campo de arbítrio com os conceitos
estatísticos, pois limitava o campo de arbítrio ao intervalo de confiança, estipulando o
nível de confiança máximo de 80%. Assim, até a NBR 5676 ser substituída pela NBR
14.653-2, as avaliações de imóveis urbanos, para os níveis de rigor “rigorosa” e
“rigorosa especial”, eram realizadas utilizando estimadores pontuais ou intervalares,
considerando que:
12


no caso dos estimadores pontuais, o valor final adotado era calculado
atribuindo-se a estimativa pontual obtida com a regressão linear;
e no caso dos estimadores intervalares, utilizava-se do intervalo de confiança
para, ao arbítrio do avaliador e desde que justificado, definir o valor final
adotado. Obviamente, se eram utilizadas estimativas intervalares, os valores
máximos e mínimos eram conhecidos e poderiam ser apresentados no laudo de
avaliação.
A atual norma de avaliação de bens, a NBR 14.653-2, desassociou os intervalos de
confiança e o campo de arbítrio. É inconsistente e por este motivo necessita de ser
redefinido. O texto em consulta nacional da NBR 14.653-2 apresenta as seguintes
definições:
“3.69
valor final adotado
estimativa pontual, dentro do campo de arbítrio, adotada como resultado final da avaliação.
Se o valor final adotado vai ser atribuído com base em uma estimativa pontual, é porque um
estimador pontual foi eleito. Se este for usado, não tem porque falar em campo de arbítrio.
Assim, o que se entende por estimativa pontual estar dentro do campo de arbítrio, já que são
dois conceitos distintos de estimativa intervalar e pontual? Uma nova definição pode ser
sugerida:
Definição 5.1 – Valor final adotado. O valor final adotado é o valor atribuído ao imóvel avaliando
a partir de uma estimativa pontual ou a partir de uma estimativa intervalar e neste caso o valor
deve estar contido dentro do campo de arbítrio.
Em 8.2.1.5 do texto em consulta pública da NBR 14.653-2 temos a definição de campo de
arbítrio:
8.2.1.5
Campo de arbítrio
8.2.1.5.1
O campo de arbítrio definido em 3.8 da ABNT NBR 14653-1:2001 é o intervalo de mais
ou menos 15%, em torno da estimativa pontual de tendência central utilizada na avaliação.
8.2.1.5.2
O campo de arbítrio pode ser utilizado quando variáveis relevantes para a avaliação do
imóvel não tiverem sido contempladas no modelo, por escassez de dados de mercado, por inexistência de
fatores de homogeneização aplicáveis ou porque essas variáveis não se apresentaram estatisticamente
significantes em modelos de regressão, desde que o intervalo de mais ou menos 15 % seja suficiente para
absorver as influências não consideradas. Quando o intervalo não for suficiente, o modelo não é
apropriado para fundamentar a avaliação pelo método comparativo direto de dados de mercado. Em
alguns casos, é possível utilizar outros procedimentos complementares para remediar essa insuficiência
(por exemplo, ao avaliar terreno com necessidade de muro de arrimo a partir de uma amostra de terrenos
planos, pode-se deduzir da estimativa obtida no modelo para terrenos planos o valor correspondente ao
custo de construção do muro).
8.2.1.5.3
O campo de arbítrio não se confunde com o intervalo de confiança de 80 % calculado
para definir o grau de precisão da estimativa.
e no anexo A temos a definição de Avaliação Intervalar:
“A.9 Avaliação intervalar
A.9.1
A avaliação intervalar, prevista em 7.7.1.b da ABNT NBR 14653-1, tem como objetivo
estabelecer, quando solicitado pelo contratante, um intervalo de valores admissíveis em torno do valor
final adotado.
13
A.9.1.1 O intervalo de valores admissíveis deve apresentar amplitude igual ou inferior, simultaneamente:
a) à amplitude do intervalo de predição de 80% para a estimativa pontual de tendência central;
b) à amplitude de mais ou menos 15% em relação ao valor final adotado.
A.9.2
No caso de utilização do valor final adotado diferente da estimativa pontual de tendência central,
este fato deverá ser citado e não será calculada a probabilidade associada ao intervalo.”
Estas definições incluem, na verdade, diversos conceitos diferentes e podem levar a
interpretações dúbias. Vamos apresentar uma nova definição para campo de arbítrio:
Definição 5.2 – Campo de Arbítrio. O campo de arbítrio definido em 3.8 da ABNT NBR 146531:2001 deve ser calculado com base em um estimador intervalar, podendo ser utilizado ou o
intervalo de predição ou de confiança, calculado em torno da estimativa pontual utilizada na
avaliação, limitado a mais ou menos 15% em relação a esta estimativa pontual.
Obviamente se impõe restrições ao uso do campo de arbítrio. Este pode ser utilizado
nas seguintes situações:

Quando o imóvel avaliando não apresentar nenhuma singularidade e as
justificativas pela não adoção da estimativa pontual tiverem subsídios com base
no posicionamento do imóvel avaliando em relação aos atributos presentes na
amostra efetivamente utilizada;

Quando o imóvel avaliando apresentar singularidades de tal magnitude que as
variáveis relevantes para a avaliação do imóvel não tiverem sido contempladas
no modelo, por escassez de dados de mercado, por inexistência de fatores de
homogeneização aplicáveis ou porque essas variáveis não se apresentaram
estatisticamente significantes em modelos de regressão.
Quando o intervalo de predição, limitado ao campo de arbítrio, não for suficiente para
conter o valor a ser atribuído ao imóvel avaliando, o modelo não é apropriado para
fundamentar a avaliação pelo método comparativo direto de dados de mercado. Nestes
casos, é possível utilizar outros procedimentos complementares para remediar essa
insuficiência (por exemplo, ao avaliar terreno com necessidade de muro de arrimo a
partir de uma amostra de terrenos planos, pode-se deduzir da estimativa obtida no
modelo para terrenos planos o valor correspondente ao custo de construção do muro).
Em seguida, apresentamos nova definição para avaliação intervalar:
Definição 5.3 – Avaliação Intervalar. A avaliação intervalar é a estimativa intervalar
calculada com base no intervalo de predição, e será realizada a pedido do contratante,
estando limitada ao desvio de 15% em relação à estimativa pontual que gerou os
limites do intervalo de predição.
Agora que o intervalo de confiança, de predição e o campo de arbítrio já estão
definidos, vamos aplicar estes conceitos em um estudo de caso para avaliação de
terrenos urbanos.
14
7. Estudo de Caso – Avaliação de Terreno Urbano
Para o nosso estudo de caso será utilizado o software SisDEA Windows, desenvolvido
pela Pelli Sistemas Engenharia Ltda., especificamente para auxiliar o profissional de
avaliação de bens. Embora o SisDEA possua como ferramentas, além da regressão
linear, a regressão não linear, as redes neurais artificiais e o envelopamento de dados
(EDO/DEA), iremos utilizar neste trabalho somente a regressão linear. Os dados
utilizados são de um dos exercícios rotineiramente utilizados nos cursos de avaliação
de imóveis urbanos, instalado junto com os aplicativos SisDEA e SisReN, o que facilita
a verificação dos resultados aqui obtidos pelos nossos clientes e usuários. A proposta
do exercício é avaliar dois lotes urbanos com as seguintes características:





Área total de 636,0 m²;
Frente principal de 14,60 m;
O posicionamento do primeiro lote é no meio de quadra e do segundo na
esquina;
Uso potencial residencial;
O índice fiscal do imóvel é 60, extraído da planta de valores do município.
Durante a fase de pré-processamento foram eliminadas as variáveis e dados que se
mostraram estatisticamente inconsistentes. O modelo final adotado possui 5 (cinco)
variáveis independentes e 30 (trinta) dados de mercado efetivamente utilizados. Todos
os dados utilizados possuem o posicionamento no meio da quadra. O modelo de
regressão utilizado foi:
Pu  e
( 9 , 44930 ,8247 ln( Área )  0 , 6880*ln( Frente ) 
64 , 3097
 0 , 0507*UsoPotencial  0 , 08863*Evento )
IndiceFiscal
Pu representa os preços unitários dos dados coletados.
Com base no modelo de regressão acima, as estimativas pontuais e intervalares podem
ser realizadas e os resultados apresentados na tabela abaixo:
Estimativas
Pontual
(Regressão Linear)
Intervalar
(Intervalo Confiança)
Intervalar
(Intervalo Predição)
Campo de Arbítrio
Avaliação
Intervalar
Valor adotado
Terreno 1 (R$)
Terreno 2 (R$)
96.700,00
96.700,00
90.000 (7,03%)
104.000 (7,56%)
90.000 (7,03%)
104.000 (7,56%)
82.000 (15,36%)
114.000 (18,15%)
82.000 (15,36%)
114.000 (18,15%)
82.600 (15%)
111.000 (15%)
82.600 (15%)
111.000 (15%)
Terreno 1 (R$)
82.600 (15%)
111.000 (15%)
96.700,00
Terreno 2 (R$)
82.600 (15%)
111.000 (15%)
105.000,00
Considerando que o terreno 2 é de esquina, o valor final adotado está dentro do
campo de arbítrio, mas não corresponde à estimativa pontual. É importante lembrar
que a estimativa intervalar foi calculada utilizando o intervalo de predição, mas como
os limites deste intervalo ultrapassam o campo de arbítrio, o valor final adotado não
pode ser superior a 15% da estimativa pontual, que é o caso em estudo.
15
8. Conclusões e Recomendações
Neste trabalho foram apresentados os conceitos existentes na NBR 14.653 sobre os
intervalos de predição, de confiança e de campo de arbítrio. Entretanto, estes
conceitos, na forma como foram formulados, podem levar a interpretações dúbias e
confusas e assim, novas definições foram aqui apresentadas. Estas serão submetidas
oportunamente para apreciação da comissão de estudos do projeto de revisão da NBR
14.653-2, como parte de uma proposta global da Pelli Sistemas Engenharia para o
texto hoje em consulta pública.
Embora a partir de 2004 o intervalo de confiança tenha sido desassociado do campo de
arbítrio, não existem argumentos técnicos factíveis que possam embasar tal decisão.
Como conclusão, a proposta é que o campo de arbítrio seja novamente associado a um
estimador intervalar com a definição a priori do nível de confiança adequado. Se
revisitarmos alguns trabalhos publicados no X Congresso Brasileiro de Engenharia de
Avaliações e Perícias do IBAPE, ocorrido em 1999 em Porto Alegre / RS, veremos que
naquela época as definições sobre os intervalos de confiança e campos de arbítrio
estavam em plena fase de discussão e assim foram apresentados argumentos
propondo a construção de um campo de arbítrio independente das estimativas
intervalares. Entretanto, estes argumentos se baseiam mais em questões da
modelagem de dados e dos cuidados que devem ser observados durante o processo de
ajuste do modelo de regressão, do que na conceituação e aplicação das estimativas
intervalares no mercado imobiliário. Obviamente, uma modelagem inadequada não
pode ser parâmetro para a definição de um novo campo de arbítrio.
A conclusão é pela utilização de avaliações intervalares, com a definição a priori dos
níveis de confiança6 adequados. Elas são de grande valia para o apoio aos gerentes e
agentes do mercado imobiliário, tendo que vista que o resultado da avaliação poderá
fornecer uma faixa de valores admissíveis, permitindo que as negociações neste
mercado sejam realizadas dentro dos níveis de precisão e de fundamentação definidos
na NBR 14.653.
Entretanto, é importante relembrar que, no momento atual, o mercado imobiliário
brasileiro, principalmente no segmento residencial de baixa renda, possui
características de um oligopólio ou, na melhor das hipóteses, um mercado de
concorrência monopolista, onde os incorporadores agem de maneira ordenada,
conhecem bem o público alvo e usam de todos os artifícios para a venda de seus
produtos em patamares de preços inconsistentes com outros produtos similares no
mercado. Neste mercado as várias empresas vendem produtos similares, mas que não
são exatamente iguais e, portanto, possuem alguma liberdade de escolha de preço, já
que cada produto é único. O preço tende a ser muito maior do que o custo marginal de
produção, e os ganhos de escala são evidentes. As empresas neste tipo de mercado
oferecem produtos diferenciados e se assemelha ao monopólio na definição do preço.
Quanto ao bem estar social, o excedente total não é maximizado e o estudo da
demanda tem sido constantemente negligenciado, pois pode haver entrada insuficiente
de empresas no mercado, devido às barreiras impostas, levando à produção de bens
inadequados ao público alvo. Este fato não ocorre em um mercado de concorrência
perfeita.
6
O uso do nível de confiança de 80% deve ser revisto, podendo ser segmentado por mercado e por tipologia.
16
A publicidade é um fator-chave nos oligopólios e na competição monopolística. Ela
torna os mercados menos competidores, as curvas de demandas menos elásticas e
pode ser utilizada para passar a falsa impressão de qualidade. Neste contexto, o
conteúdo do anúncio não é mais relevante e as pessoas tendem a concluir que quem
investe caro em propaganda é porque tem um bom produto. Assim, surgem as marcas
que ajudam a manter esta visão da qualidade e que dão a falsa sensação de segurança
ao comprador para que este adquira um produto de “alta qualidade”, quando na
verdade o induzem a ver diferenças onde elas não existem. A publicidade pode
manipular as preferências do consumidor, criando um desejo através de mensagens
sublimares, que não abordam a qualidade ou o preço final do produto, dificultando a
competição. As publicidades em geral, nos oligopólios e nos mercados monopolistas,
tentam convencer que os produtos são mais diferentes do que realmente são e assim
permitir um markup maior sobre o custo marginal.
No contexto atual, que antecede as eleições, e com a boa oferta de crédito, aliada a
uma demanda caracterizada e bem conhecida pelos grandes incorporadores, o trabalho
de avaliação de bens passa a ter uma maior importância e por estes motivos cuidados
especiais devem ser tomados, principalmente para avaliação de produtos visivelmente
inadequados para a localização proposta.
O êxito que o Brasil vem demonstrando como país emergente é a prova de que a
estabilidade macroeconômica, o crescimento sustentável e o combate à pobreza são
mais do que compatíveis. Na verdade, elas se reforçam mutuamente. Conforme dito
pelo nosso Presidente da República em uma entrevista recente, ao ampliar a renda e,
portanto, o poder aquisitivo dos segmentos mais pobres da sociedade, o país não está
apenas fazendo justiça social e estendendo os direitos básicos de cidadania a todos os
brasileiros, mas também ampliando o mercado consumidor para a produção nacional.
A demanda resultante do maior poder aquisitivo da população movimentou o comércio
de bens e serviços no País e pela primeira vez em nossa história vemos que é
perfeitamente possível combinar crescimento econômico com distribuição de renda, ou
seja, com a redução das desigualdades sociais.
Assim, nossa economia e nosso mercado imobiliário possuem características
diferenciadas de outras economias do primeiro mundo e não se vislumbram problemas
similares àqueles que ocorreram na economia internacional em 2008 / 2009.
Entretanto, toda cautela é necessária e o acompanhamento dos indicadores
econômicos nacionais e internacionais deve ser incluído nas tarefas cotidianas dos
profissionais que atuam com a engenharia de avaliações no país. Estes profissionais
possuem grande responsabilidade em todo este processo de desenvolvimento, pois são
eles que sinalizam pela viabilidade técnica e econômica dos empreendimentos e dão
suporte aos gestores das empresas públicas e privadas para que possam tomar
decisões mais acertadas e com a tempestividade necessária. É dever dos profissionais
que atuam nesta área zelarem pela boa prática da engenharia de avaliações.
Julho de 2010
17
BIBLIOGRAFIA
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS: Norma
Técnica de Avaliação de Bens, Procedimentos Gerais – NBR 14653:1,
Rio de Janeiro: 2001.
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS: Norma
Técnica de Avaliação de Bens, Imóveis Urbanos – NBR 14653:2, Rio de
Janeiro: 2004.
CASELLA, G. , BERGER, R. L., “Statistical Inference” – International Student
Edition – Duxbury, 2002.
COSTA NETO, P. L. O., Estatística - 18º Reimpressão, São Paulo: Editora
Edgard Blucher, 2000.
FÁVERO, L. P. L., “Precificação e Comercialização Hedônica – Uma aplicação
ao Mercado Imobiliário” – Saint Paul, 2006.
GREENE, W. H., “Econometric Analysis” – Pearson 6 º. Edição, 2008.
GONZÁLEZ, M. A. S., Metodologia de Avaliação de Imóveis – Novo Hamburgo,
SGE, 2003.
GUJARATI, D. N., Econometria Básica – 4ª Ed. – São Paulo: Editora Elsevier,
2006.
HUBBARD, R. G., O’BRIEN, A. P., “Introdução à Economia” – 2º. Edição,
Editora Bookman, 2010.
WERKEMA, M. C. C., AGUIAR, S., “Análise de regressão: como entender o
relacionamento entre as variáveis de um processo”, V. 7, Belo Horizonte:
Fundação Cristiano Ottoni, Escola de Engenharia da UFMG, 1996.
18
Download

Voto de Antonio Pelli - abenc-ba