ARTIGO
RESPONSABILIDADE CIVIL À LUZ DA TEORIA DO DIREITO DE
HART
João Carlos Adalberto Zolandeck
Mestre em Ciência Jurídica – Fundinopi
Especialista em Direito Processual Civil – IBEJ
Coordenador e Professor do Curso de Direito da FAMEC
RESUMO
O pensamento dos Teóricos do Direito é de importância capital para o entendimento da
responsabilidade civil, recaindo, o presente estudo, na concepção de Hart, que através de
expressões da época e enfoques diferentes, de enorme aceitação entre os Operadores do
Direito, acaba por contemplar a moderna teorização a respeito da responsabilidade civil,
principalmente a partir da análise de casos difíceis.
Palavras-chave: Responsabilidade civil. HART, Herbert. Positivismo. Direito civil.
INTRODUÇÃO
O objetivo desse estudo é refletir a respeito da responsabilidade civil, sob o viés da
teoria do direito de Hart.
"Nos meados do século XIX esboçou-se o movimento jurídico contrário à
fundamentação subjetiva da responsabilidade. Sentiu-se que a culpa não abarcava os
numerosos casos que exigiam reparação” (RIZZARDO, 1997, P. 23). Hart e outros teóricos
do direito refletiram ou não a esse respeito, esse é o enfoque do presente estudo, sem intenção
de mensurar a responsabilidade civil e suas facetas, mas apenas sustentar a responsabilidade à
luz da teoria do direito de Hart.
CONCEPÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Como ponto de partida, faz-se necessário aduzir a respeito da concepção de
responsabilidade, que segundo Marton, citado por Aguiar Dias1 corresponde à "situação de
quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposto às conseqüências desagradáveis
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decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas que a autoridade encarregada de velar pela
observação do preceito lhe imponha, providências essas que podem, ou não, estar previstas"
(1973, p. 9, v. 1)
A responsabilidade pode ser vista em seu duplo aspecto, que consiste na
responsabilidade civil contratual e na responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana. "A
justificativa da responsabilidade contratual se põe na quebra do contrato e o da extracontratual
na violação de um dever legal de não prejudicar a ninguém, expresso pelo Direito Romano
através da máxima 'neminem laedere'. Costuma-se afirmar que a diferença entre elas reside no
vínculo obrigacional. Quando preexiste esse vínculo, aparece a responsabilidade contratual.
Na ausência dele, o dever de ressarcir funda-se na responsabilidade extracontratual ou
aquiliana”(MONTENEGRO, 1999, P. 3-4).
FASES DA RESPONSABILIDADE CIVIL E PRINCÍPIOS COMUNS
Parafraseando Odoné Serrano Junior (2001, p. 151), ao comentar a evolução
histórico-dogmática do dever indenizatório do Estado, é de ressaltar que a responsabilidade
civil demarca três fases bem distintas, quais sejam: irresponsabilidade, civilista e publicista.
No seu ver a primeira fase se caracterizou pela total irresponsabilidade do Estado por
qualquer dano causado aos seus cidadãos, pois que justificavam com base nas idéias de que o
rei não pode errar, não pode fazer mal, já que sua vontade e tudo que lhe agradava tinha força
de lei.
A segunda fase denominada civilista, "porque sua formulação teórica adotava os
conceitos da responsabilidade subjetiva do direito civil, é fruto do avanço da ideologia
individualista-liberal do século XIX” (op. cit., p. 151). Argumenta que nesta fase
"contemplava-se a responsabilidade do Estado pelos atos de gestão, nos quais o Poder Público
era equiparado ao particular no gerenciamento de seus interesses , com base na relação de
preposição entre o Estado e o agente público, de forma idêntica à responsabilidade do patrão
ou comitente em face da conduta culposa lato Celso (dolo ou culpa) e danosa de seus
empregados ou prepostos, se caracterizada a culpa in vigilando ou in eligendo. Quanto aos
atos de império, praticados no exercício de sua soberania, o Estado não tinha qualquer
obrigação de indenizar.
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"Três condições se exigiram, então, para que se pusesse em jogo a responsabilidade
civil de uma pessoa, em face dessa doutrina: um dano, a culpa do autor do dano e a relação de
causalidade entre o fato culposo e o mesmo dano”(MELO DA SILVA, 1974, p. 14).
A terceira fase denominada publicista, inicia-se "a partir do famoso caso Blanco,
julgado em 1873 pelo Conseil d'Etat da França. (...) A grande mudança ocorre no regime
jurídico da obrigação de indenizar. A responsabilidade do Estado tinha natureza de direito
público, não podendo ser regida por princípios de direito civil, mas por princípios e normas de
direito constitucional e administrativo”(SERRANO JÚNIOR, p. 151-152).
É peculiar e de nítida importância à lição de Aguiar Dias a respeito dos princípios
comuns a todos os casos de responsabilidade civil, anote-se:
Convém esclarecer, aqui, que todos os casos de responsabilidade civil obedecem a
quatro exigências comuns: a) o dano, que deve ser certo, podendo, entretanto, ser
material ou moral; b) e a relação de causalidade, a caual connexion, laço ou relação
direta de causa a efeito entre o fato gerador da responsabilidade e os danos são seus
pressupostos indispensáveis; c) a força maior e exclusiva culpa da vítima tem, sobre
a ação de responsabilidade civil, precisamente porque suprimem esse laço de causa
a efeito, o mesmo efeito preclusivo; d) as autorizações judiciárias e administrativas
não constituem motivos de exoneração de responsabilidade (1973, p. 123-124).
Acrescente-se o entendimento de Montenegro, segundo o qual os pressupostos da
obrigação de indenizar são:
a) o dano, também denominado prejuízo; b) o ato ilícito ou o risco, segundo a lei
exija ou não a culpa do agente; c) um nexo de causalidade entre tais elementos.
Comprovada a existência desses requisitos em um dado caso, surge um vínculo de
direito por força do qual o prejudicado assume a posição de credor e o ofensor, a de
devedor. Em outras palavras, a responsabilidade civil (1999, p. 3).
A RESPONSABILIDADE CIVIL SEGUNDO A TEORIA DO DIREITO DE HART
Analisados os pressupostos básicos da responsabilidade civil é possível, verificar se a
teoria do direito de Hart contempla a possibilidade da responsabilidade civil por danos, seja
na concepção subjetiva, seja na objetiva.
É de fundamental importância uma discussão preliminar lingüística, parafraseando
Pablo Larranaga2, o termo responsabilidade, permite a Hart reconhecer quatro sentidos, quais
sejam:
responsabilidade
como
capacidade;
responsabilidade
como
causalidade,
responsabilidade como deveres próprios e responsabilidade como sancionalidade, que afloram
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na essência do contexto. Todos acomodam definições próprias, porém, sempre estarão direta
ou indiretamente vinculados à idéia de responsabilidade como sancionalidade, sentido original
e primário do termo.
Segundo o autor em comentário, o sentido original ou primário do termo
responsabilidade, para Hart se aproxima da concepção de sancionalidade.
Por mais enganosas que suas teorias possam ser em outros aspectos, Austin e Hart,
pelo menos perceberam, e tentaram explicar, por que as pessoas nem sempre tratam
a resposta a uma questão jurídica como uma resposta automática à questão política
sobre o que deveriam fazer os juízes. Afirmaram que as proposições jurídicas são
factuais em essência e que, portanto, não fazem, por si mesmas, nenhuma afirmação
sobre o que realmente deveria fazer qualquer autoridade ou cidadão. Se rejeitarmos
essas teorias porque tratamos a doutrina como interpretação, e não como análise
lingüística, devemos oferecer uma explicação alternativa dessa distinção , e minha
descrição do conceito de direito, que associa tão estreitamente o direito à política,
poderia parecer um ponto de partida medíocre. (...) o direito oferece, em princípio,
uma justificativa para a coerção oficial (DWORKIN, 1999, p. 135).
O resgate do positivismo através de Hart viabiliza raciocinar com a responsabilidade
civil pressupondo culpa, pois que em sua análise lingüística fundamenta com maior
propriedade a responsabilidade como sancionalidade. Além disso, ao primar pela análise de
casos concretos, tendo o direito um viés político, não descarta a possibilidade tácita da
responsabilidade civil independente da presença do elemento culpa, leva crer assim, pela
viabilidade da responsabilidade objetiva, hoje presente no Estado Brasileiro. Essa presença é
notada tanto, na esfera da responsabilidade do Estado, como no sistema consumerista
brasileiro, que pressupõe a presença de relações de consumo “relações jurídicas por
excelência, pressupondo, por conseguinte, dois pólos de interesse: o consumidor-fornecedor e
a coisa, objeto desses interesses” (GRINOVER, 1999, p. 42-43).
No referente "positivismo de Hart", anote-se o entendimento de Dworkin (1999, p.
143): "A versão do positivismo de Hart é ainda mais nitidamente convencional, pois sua regra
de reconhecimento é uma regra que foi aceita por quase todos, ou pelo menos por quase todos
os juízes e outros juristas, não importa qual seja o conteúdo de tal regra".
Um pouco mais adentro da teoria do direito de Hart, observa-se que:
a mais importante e fundamental reformulação dessa idéia encontra-se no livro The
Concept of Law (O conceito do direito), de H. L. A. Hart, publicado pela primeira
vez em 1961. Hart refutava a opinião de Austin de que a autoridade jurídica era um
fato puramente físico de comando e obediência habituais. Afirmava que os
verdadeiros fundamentos do direito encontram-se na aceitação, por parte da
comunidade como um todo, de uma regra-mestra e fundamental (que ele chamou de
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'regra de reconhecimento' que atribui a pessoas ou grupos específicos a autoridade
de criar leis. Assim, as proposições jurídicas não são verdadeiras apenas em virtude
da autoridade de pessoas que costumam ser obedecidas, mas, fundamentalmente, em
virtude de convenções sociais que representam a aceitação, pela comunidade, de um
sistema de regras que outorga a tais indivíduos ou grupos o poder de criar leis
válidas (DWORKIN, 1999, p. 42).
Bem observou a problemática Cleyson de Moraes Mello, no artigo intitulado "A
Teoria dos Casos Difíceis no Direito - Uma visão à Luz dos Ensinamentos de Herbert Hart e
Ronald Dworkin", publicado na Revista Jurídica n. 3, artigo n. 15 da Universidade Estácio de
Sá.
Sustenta que:
A origem e desenvolvimento da teoria Hartiniana encontram-se diretamente
relacionados ao problema mais inquietante da Teoria Jurídica, qual seja: "O que é o
direito ?", haja vista a grande dificuldade em diferenciar o direito com os sistemas
de regulação social (moral, costumes etc).
Teoria Hartiniana, utilizando-se de ferramentas como a filosofia analítica (estudos
de J.L.Austin e Ludwig Wittgenstein), tenta explicar qualquer sistema jurídico
vigente de uma sociedade contemporânea complexa. É um estudo descritivo, na
medida em que é moralmente neutro, e não tem propósitos de justificação, ou seja,
não procura justificar, por razões morais ou outras, as formas e estruturas que
surgem em sua exposição geral do direito.
O estudo da teoria Hartiniana pode ser apresentado a partir de, pelo menos, duas
características principais:
a) seu propósito não é dar uma significação da palavra direito e, sim, descrever a
estrutura característica de um sistema jurídico contemporâneo; e
b) sua atenção é centrada na prática social, isto é, na forma em que as pessoas atuam
nas situações reguladas pelo direito e a linguagem que se valem para referir-se a
elas.
Regra de Reconhecimento
Segundo César Rodríguez, Hart estabelece a distinção entre regras primárias e
secundárias. As regras primárias impõe deveres positivos (ações) ou negativos
(omissões) aos indivíduos. As regras secundárias foram classificadas por Hart da
seguinte forma:
a) Regras de Câmbio - Proporcionam aos particulares e legisladores a criação das
regras primárias;
b) Regras de Adjudicação - São normas sobre o exercício da função judicial;
c) Regra de Reconhecimento - Esta tem uma importância particular na teoria jurídica
de Hart, onde representa um dos pilares da reconstrução do positivismo. É a
possibilidade de identificar o direito vigente em uma sociedade a partir de um
parâmetro independente da moral.
A base para a tese de Herbert Hart sobre a interpretação do direito e as decisões
judiciais nos casos difíceis é a constatação lingüística inicial, onde a precisão da
linguagem humana, em especial, a linguagem jurídica, é limitada.
Ainda, segundo o professor César Rodríguez, o tipo mais freqüente de caso difícil é
aquele no qual a norma aplicável é de textura aberta, ou contém uma ou mais
expressões lingüísticas vagas, como diria Hart. A "textura aberta" da linguagem se
acentua no campo das regras jurídicas por razões fundamentais:
a) as regras jurídicas não estão dirigidas a pessoas ou coisas particulares, senão a
classe de pessoas ou coisas. Consoante exemplo do professor colombiano, as normas
sobre trânsito não se referem ao automóvel de 'fulano de tal', mas, sim, a veículos e
condutores; e
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b) as regras permanecem vigentes durante períodos largos e, portanto, se aplicam a
situações que não podem ser previstas no momento de sua criação.
Através desse parâmetro, diga-se sustentável, é possível resolver conflitos de
interesses que envolvam a responsabilidade civil, seja a subjetiva, seja a objetiva, inclusive
frente ao Estado, com base na teoria do direito de Hart. O próprio autor, no artigo referido
propõe resolver um caso que intitula "à responsabilidade penal objetiva e, em especial, à
apropriação indébita em leis especiais".
Apresenta como solução, pelo prisma de Hart, ao caso concreto enunciado as
seguintes hipóteses: a) Tanto a tese que defende a inconstitucionalidade como a que defende a
constitucionalidade contam com o apoio do texto constitucional. Não crê que haja uma única
solução correta para o caso. São soluções razoáveis. b) Não existe uma resposta correta para o
caso e a sua decisão é a que considera mais aconselhável, de acordo com as preferências
morais e políticas".
Nota-se pelo contexto, que segundo Hart, o juiz possui certa discricionariedade para
a resolução do caso concreto, podendo utilizar-se do formalismo, com enfoque então - no
direito positivado, mas também, quando não for possível por essa via, pode se utilizar do
senso subjetivo de justiça que não se confunde com o acometimento de abusos. É nesse
sentido o raciocínio desenvolvido no artigo supracitado de autoria já declinada, como ora se
observa:
A verdade para Hart se encontra no ponto médio entre o formalismo e o realismo.
Nos casos fáceis, o formalismo é o mais adequado, tendo em vista que basta um
silogismo para conectar a norma à solução (presente na maior parte dos litígios). De
outro modo, nos casos difíceis a posição realista é mais adequada. O juiz não conta
com normas precisas, deve, pois, eleger entre as alternativas razoáveis. Ainda,
segundo o autor inglês, a existência de casos excepcionais permite que o direito
cumpra uma de suas funções: deixar uma margem de flexibilidade para regular as
relações sociais, permitindo considerar as circunstâncias do caso concreto.
Vale lembrar que esta discricionariedade não está ao bel prazer do magistrado.
Estes, quando utilizarem a discricionariedade para solucionar um caso difícil, devem
considerar as seguintes 'virtudes judiciais', a saber:
a) imparcialidade e neutralidade ao examinar as alternativas existentes,
considerando, sempre, os interesses de todos os afetados no conflito;
b) uma preocupação por desenvolver algum princípio geral aceitável com base
razoável para esta decisão; e
c) realizar uma 'ponderação' e um 'balanço' em seu esforço de fazer justiça em meio
aos interesses do conflito.
Em notas, a sistemática de resolução de casos difíceis, segundo Hart, na concepção
de Moraes Mello3.
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Diante dos fundamentos enunciados é possível sustentar o dever de indenizar, pelo
prisma da responsabilidade civil subjetiva e também da objetiva. Considera-se desta forma
que a teoria do direito de Hart, acomoda tanto uma como outra esfera da responsabilidade, via
de conseqüência está consoante a atual doutrina da responsabilidade objetiva do Estado e da
responsabilidade civil nas relações de consumo.
Ressalta-se que essa possibilidade possui base principiológica, posto que os
princípios são consagrados como valores fundamentais da ordem jurídica, nesse sentido,
Canotilho (1995), referindo-se a Hart, reconhece que as normas jurídicas têm limites incertos
(textura aberta) e dá conta dos casos difíceis através do exercício da discricionariedade
judicial exercida pelo magistrado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este
breve
estudo
primou
por
reproduzir
questões
básicas
atinentes
a
responsabilidade civil, tendo como ponto de partida, a responsabilidade contratual e
extracontratual, além de observar as influências de regimes políticos e ideológicos em três
fases distintas: irresponsabilidade, civilista e publicista.
Restou evidente, pelo contexto, que Hart prima pela análise lingüística dos termos
em exame, sugere adequar o tema "responsabilidade" às facetas: capacidade, responsabilidade
como causalidade, responsabilidade como deveres próprios e responsabilidade como
sancionalidade.
A teoria do direito de Hart, ao resgatar o positivismo, ao mesmo tempo abre
parêntese para a resolução de casos concretos não amparados pelo mesmo, como ficou
verificado pelo estudo de caso prático, cujo resultado consiste em atribuir certa margem de
discricionariedade ao Magistrado, entretanto discricionariedade com responsabilidade, quando
enuncia as virtudes judiciais que devem ser observadas, quais sejam: imparcialidade e
neutralidade ao examinar as alternativas existentes, considerando, sempre, os interesses de
todos os afetados no conflito; preocupação por desenvolver algum princípio geral aceitável
com base razoável para esta decisão e realizar uma 'ponderação' e um 'balanço' em seu esforço
de fazer justiça em meio aos interesses do conflito.
Pela teoria da responsabilidade objetiva, ou sem culpa, como é denominada por
muitos, o fator culpa seria nula relevância. O autor do dano indenizaria pelo só fato
do dano mesmo sem se indagar de sua culpabilidade, ou não, no caso. Bastaria que
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demonstrasse apenas a relação de causalidade entre o dano e seu autor para que daí
decorresse para o agente a obrigação de reparar. (MELO DA SILVA, 1974, p. 14)
É sustentável entender que a teoria de Hart contempla e explica a responsabilidade
civil, cuja conseqüência é fixar o dever de indenizar, nas mais variadas espécies, justamente
porque abre caminho para uma análise não só pelo prisma do direito posto, mas também pelo
bom senso do juiz, com base principalmente nos princípios gerais do direito e na interpretação
jurídica do caso concreto, além de atribuir ao magistrado certa margem de liberdade
(discricionariedade responsável).
Isso significa que mesmo diante da ausência de norma regulamentadora a tratar da
responsabilidade civil, seja subjetiva ou objetiva, à luz da teoria do direito de Hart, viável
seria, ao magistrado, justificar uma decisão, reconhecendo o direito em debate, seja pelo
prisma dessa ou daquela teoria, com base na abertura do estudo de caso concreto e na
politização do direito.
NOTAS
1
Toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade." (Aguiar Dias, obra citada.
p. 7).
2
LARRANAGA, Pablo. El concepto de responsabilidad. Biblioteca de Ética del Derecho y Política: México,
2000. p. 194. "Un análisis lingüístico del término 'responsabilidad' permit a Hart reconocer cuatro sentidos
del término; a) 'responsabilidad' como capacidad; b) 'responsabilidad' como causalidad; c) ' responsabilidad
como deberes proprios de um cargo o papel social y d) 'responsabilidad' como sancionalidad. Aunque estos
cuatro sentidos del término 'responsabilidad' son susceptibles de definiciones independientes, todos se pueden
vincular, directa o indirectament, com el sentido de 'responsabilidad' como sancionalidad". La
'responsabilidad' como sancionalidad representa el sentido central o primario del término
'responsabilidad' en el direcho(LARRANAGA - pp. 197).
3
"Para o jusfilósofo inglês Herbert Hart, a decisão dos casos difíceis exige uma interpretação razoável: os juízes
devem usar a discricionariedade para escolher a interpretação que consideram a mais apropriada. Quando a
regra aplicada é imprecisa, o juiz não tem outra saída a não ser escolher, prudentemente, a opção que
considerar mais adequada. Vale ressaltar que, nestas circunstâncias excepcionais, o juiz não está aplicando o
direito, eis que as regras não lhe indicam uma ou outra direção, senão criando o direito para caso concreto"
REFERÊNCIAS
AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil. 5. ed. Forense: Rio de Janeiro, 1973.
v.1.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina,
1995.
Conhecimento Interativo, São José dos Pinhais, PR, v. 1, n. 1, p. 10-18, jul./dez. 2005
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João Carlos Adalberto Zolandeck
DWORKIN, Ronald. O império do direito. Martins Fonte: São Paulo, 1999.
GRINOVER, Ada Pellegrini, et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor:
comentado pelos autores do anteprojeto. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 42-43.
LARRANAGA, Pablo. El concepto de responsabilidad. Biblioteca de Ética del Derecho y
Política: México, 2000.
MELO DA SILVA, WILSON. Responsabilidade sem culpa. 2. ed. Saraiva: São Paulo,
1974.
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos: pessoais e materiais. 6.
ed. São Paulo: Lumen Juris, 1999.
RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes de trânsito. 7. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997.
SERRANO JUNIOR, Odoné. A obrigação do Estado de indenizar os danos decorrentes do
mau funcionamento dos serviços judiciários. Argumenta: Revista do Curso de Mestrado
em Ciência Jurídica, da FUNDINOPI, Faculdade de Direito do Norte Pioneiro, Jacarezinho,
v. 1, n. 1, p. 151, 2001.
18 Conhecimento Interativo, São José dos Pinhais, PR, v. 1, n. 1, p. 10-18, jul./dez. 2005
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